INCÊNDIO

1203 Words
Abri meu portão com bastante cuidado, Rodrigo tentou me desencorajar, mas quando viu que não tinha jeito me acompanhou. Estranhei que a porta estava fechada, incrédula de que aquela qualquer iria passar a noite lá, mas sim. Entrei na minha cozinha e vi que tinha panelas em cima do fogão. Se Jean almoçava no serviço e jantava na casa da minha mãe ou na dele, porque tinha comida feita em casa? Meus olhos lacrimejaram quando percebi que aquela lá estava morando em minha casa! E foi pior quando entrei na sala a caminho do meu quarto e vi minhas cortinas trocadas, meu sofá sem capa e nenhum som vindo do quarto. Eu achei que me sentiria péssima se entrasse e eles estivessem trepando. Mas me senti muito pior em saber que eles estavam dormindo! Porque não era uma aventura, não era uma fodaa de alívio porque eu estava de resguardo! Meu marido estava morando na minha casa com outra mulher! E uma com quem convivia muito antes de me conhecer. Há quanto tempo isso acontecia? Adrielle costumava dizer que eu era muito sonsa, muito boa, acreditava demais nas pessoas e era lerda. Pensava muito devagar e quando percebia, o bonde passava! Mas naquele momento, estava pensando tão rápido que até me assustei. Parei do nada e Rodrigo me deu um encontrão. Coloquei o dedo na boca pra ele fazer silêncio e fiz um gesto pra ele voltar. Ele me olhou apavorado de me deixar lá dentro sozinha, então eu avancei e ele me seguiu. Deixei porta e portão abertos e pedi pra ele acender um cigarro de maconha lá fora. — Você está louca? Eu não fumo isso não! — Você engana a mamãe que é uma boba, eu sei que você dá uns tapas. Eu preciso me acalmar, deixa eu dar uns tapas também. — Você está enganada, Helô. Esse cigarro que você pode ter visto é dos meninos. Eu não uso nenhuma droga! — Me dá o cigarro então que eu acendo! Rodrigo estava muito contrariado, mas me deu o cigarro e o Zippo dele, que era meu intuito. Eu nunca fumei nem cigarro normal, não era amamentando um bebê de um mês que ia começar. Voltei pra dentro, peguei embaixo da pia um vidro de álcool e fui pro quarto. Rodrigo não conseguiu me acompanhar. Entrei sem fazer barulho no meu quarto e fechei os olhos de novo quando eles se acostumaram com a penumbra que o abajur dava no quarto, clareando quase nada. Jean estava deitado como sempre, virado para fora da cama, com as pernas dobradas e um travesseiro no meio. Ele só conseguia dormir assim e eu sentia falta de poder dormir de conchinha uma vez na vida! Cintia estava vestindo minha camisola preferida, que eu não levei pra casa da minha mãe porque era velhinha e comprei novas para a maternidade. De bruços, com o braço embaixo da cabeça, a coberta só por cima da bundä dela. Rodrigo chegou na porta e a visão que teve foi eu em pé ao lado dela, observando os dois dormindo como um casal! Sem tirar os olhos dela, abri a garrafa de álcool e pude ouvir o grito silencioso de Rodrigo, quando entendeu porque eu queria o Zippo dele. Despejei metade do álcool em volta dela e no cobertor. Quando comecei despejar a outra metade nela, ela acordou com o líquido gelado, arregalou os olhos e mexeu a perna. E na hora que eu risquei o Zippo, Jean pulou o mais longe que pôde da cama. Eu sorri e joguei o Zippo acesso sobre ela e saí sem olhar pra trás, deixando o caos completo e as labaredas. Subi na moto e Rodrigo só falou: fudeu. Ele pilotou de volta pra casa, mas quando chegou na farmácia que estava esperando, parou. — O que foi? — Incêndio criminoso dá cadeia! Eu vou tirar você dessa situação. Ao invés de pilotar até em casa, Rodrigo entrou na favela. Parou na frente da casa do Deco, explicou a situação e eu só pude ver ele pelo rádio dando ordens, mas não entendi o que eram. Logo só se ouvia o barulho de motos saindo da quebrada e então Rodrigo veio me explicar: — Vão tentar impedir Jean de te denunciar. Mas se não rolar, seu álibi está preparado. — Meu álibi? Como assim? — Heloísa, você causou um incêndio proposital. Se ninguém morrer queimado, você pode pegar uns oito anos de cadeia. — E o que eu tenho que fazer? — Você vai pra casa do Fernando, e ele vai dizer que vocês transaram a noite inteira. Se o Jean te denunciar, você tem um álibi e um motivo pra ele querer te incriminar. Estava sendo traído pelo gerente da boca, não podia se vingar porque não conseguiria se sustentar em um confronto e por isso tentou matar a amante dele e colocar a culpa em você. Aceitei e fui encaminhada para a casa do Fernando, pensando em como bandido pensava rápido pra resolver problema com a justiça! Estava cega de ódio, de rancor e colocar fogo naquela vadiä não diminuiu meu sentimento. Então resolvi deixar meu álibi muito mais convincente e sim, fiz sexö a noite inteira com Fernando, o gerente da boca e homem de confiança dos três irmãos que comandavam a quebrada! Foi libertador e ninguém me procurou. No outro dia de manhã, Fernando falou que se eu quisesse, tinha proteção e ele me colocava no nome dele. — Nando, na boa. Você tá ligado que eu não sou mulher do crime. Crescemos juntos, estudamos juntos e até que você é gostosinho, mas essa vida não é pra mim. — Tá certo, Sereia, mas me responde uma coisa: cê vai voltar praquele Zé Ruela? — Sereia? — Com um rabão desse, mulher, te sigo até o infinito! — O Zé ruela me chama de r**o de arraia, mas gostei mais de Sereia. Eu não sei se vou voltar, mas preciso pensar agora. — Cê tá ligada que agora também é do crime, né? E bem assinado ainda. Mas se cê voltar pra ele, tá ligada que eu talariquei o mané e pode dar r**m pra mim? — Não se preocupe. É nosso segredinho. Fui pra casa ver meus filhos e dormir um pouco. A tarde, Rodrigo trouxe a informação que a v***a estava viva, mas com mais de 70 por cento do corpo queimado. Jean tentou buscar água pra apagar o fogo dela, mas não conseguiu mais voltar. Vizinhos chamaram os bombeiros e o encontraram desesperado jogando água no balde. Ele foi hospitalizado por inalar muita fumaça e quando foram tomar o depoimento dele, Eduarda já tinha comunicado que Cintia estava com problemas mentais e cada dia estava dormindo na casa de uma pessoa para cuidarem dela. Ele corroborou que ela estava dormindo no quarto das crianças e tentou seduzir ele, que não aceitou porque era um homem casado e fiel, e a esposa dele estava de resguardo na casa da mãe. Então ela fez aquilo! Lhe contaram que o depoimento dele foi tão convincente que ele até chorou do horror que presenciou. E eu passei mais de 15 dias sem o ver, até que ele me procurou…
Free reading for new users
Scan code to download app
Facebookexpand_more
  • author-avatar
    Writer
  • chap_listContents
  • likeADD