Prefácio

1542 Words
Quase três anos atrás....  Olhei a mata com atenção a procura de minha caça. Assim como meu nome significa, Teça, olhos atentos, estou atento a tudo a minha volta, sempre à procura do melhor. Sempre procuro o melhor! No ritual de passagem de criança para adultos tenho que caçar sozinho e levar para tribo. Tenho que prover o alimento para meu lar e para minha tribo, para isto tenho que provar que não sou mais um menino, sim um homem! Mas, hoje há algo muito estranho naquele ponto da mata. Sinto minha pele se arrepiar só de estar andando por ali. Barulhos estranhos estão espalhados naquele lugar, mas não são animais, então o que são? Muitos meninos estão espalhados pela floresta caçando desde ontem à tarde. Só podem voltar quando cumprissem o ritual ou aceitasse a vergonha. O que é inaceitável! Os outros foram para outra parte da floresta, mas escolhi está por ser menos explorada. Agora... estou arrependido! Andei cuidadoso por entre a mata, que é muito densa e quente ali. Vi vários tipos de pegadas de animais como pacas, antas, capivara, onça... Nossa! Esta sim seria uma ótima caça, além da carne posso usar a pele. Seria um troféu é tanto!!! O silêncio é mortal neste lugar, e isso, está me deixando muito receoso. Percebi isto depois de andar mais alguns metros. Nenhum som.... Nada... Absolutamente nada! Algo está muito errado. Guaraci estava começando a se pôr quando vi uma luz estranha. Com cuidado aproximei-me, pois segundo o nosso chefe homens ruins e armados andavam nas nossas terras atrás de ouro, caça, arvores... Isto é quando não traziam contrabando! Tempos difíceis e perigosos estes. A luz estranha é verde e intensa, posso sentir a sua força de onde me encontro. Subi numa árvore alta de longos galhos fortes e aproximei-me devagar, vi uma menina no meio dela, mas não consegui ver o rosto, pois está coberto pelos cabelos e folhas. O seu cabelo é como o barro da beirada dos rios, a pele branca como os raios de Guaraci, mas é magra como um filhote de cervo ou uma menina de dez anos. As suas roupas são estranhas! Acredito que os filhos de Terán são mais pesados que ela! Animais curiosos se aproximam, mas a luz os repelia. Até mesmo uma paca gigante se aproximou, mas é repelida. Será que está a protegendo? Qual feitiço que protege aquela menina? Quem foi o feiticeiro? Olho novamente para todos os lados, mas não vejo vestígio de nenhum homem ou mulher. De onde ela teria vindo? Fiquei na dúvida se ia me aproximar ou não, pois ainda tenho que caçar, mas não gosto da ideia de deixar a menina naquele lugar. Lembro dos ensinamentos da minha avó, me fazendo respirar fundo. E resignado desço devagar me amaldiçoando por escolher aquele lugar. Ubatã que devia a ter encontrado, pois, é mais forte e maior que eu, não teria problemas de levá-la. Temeroso aproximo-me da estranha luz e levo a minha mão várias vezes para junto dela, mas desisto no último instante. Ah se o meu chefe visse-me agora... Bufo irritado olhando para os céus, me amaldiçoando pela milésima vez. Eu nunca seria aceito como um homem de verdade na minha tribo senão a levasse. Respiro fundo novamente, tomado de coragem os meus dedos tocaram a luz estranha, mas não me repeliu, para minha surpresa. Sinto algo quente me envolvendo e sugando para dentro do círculo. Quando estou dentro olho ao redor, não vejo nada de mais, ou mesmo uma a******a, é uma meia-lua perfeita. Posso enxergar através dela e ver ondas se movimento ao seu redor. A temperatura está muito agradável, ao contrário da quentura e humidade excessiva lá de fora. Retiro meu arco e flechas e coloco de lado, examino a menina com cuidado. Ainda está viva, constatei surpreso, mas tem um corte grande e f**o na cabeça como se tivesse levado uma pancada. Balancei o seu corpo um pouco, mas só a fiz gemer baixinho. _ Quem é você? - lhe perguntei baixinho. Minha resposta foi um gemido sofrido. Anahi, a minha irmã ficaria muito preocupada e brigaria comigo se eu a deixasse aqui para ser devorada pelos bichos. _ Terá que me ajudar. - falei com ela quando a puxei com cuidado e a coloquei em minhas costas. Não era um homem, mas conseguiria levá-la sem grandes problemas pela mata. Amarei suas mãos e pernas em mim, para evitar que caia e comecei a andar devagar. Só espero que não encontre nenhum animal perigoso. Minha tribo, os Korubo, é uma tribo isolada, mas nos últimos anos sempre éramos visitados pelos homens brancos que traziam remédios e presentes. Uns deles falavam de um Deus no céu que criou tudo, passávamos muito tempo os escutando, para nós, Guarani e Jaci são nossos deuses maiores, mas temos muito outros. Nosso chefe os acha inofensivos, pois nunca tentaram mudar os nossos costumes. Uns até passaram muitas luas entre nós para aprender a nossa língua e costumes. Através destes homens brancos aprendemos a nos comunicar com o povo deles, até mesmo montaram escolinhas que eu e os meus aprendemos a escrever e ler na sua língua. Também escrevemos na nossa língua e continuávamos com as nossas tradições. Gostamos muito de nos divertir com eles. Sempre que veem é uma festa na nossa tribo com muita comida e dança. Após dias de caminhada onde tive que parar algumas vezes para dar água para a menina cheguei na minha tribo. Foi exaustivo, mas finalmente consegui chegar. As crianças foram às primeiras que me viram e saíram correndo para avisar da minha chegada e contar o que estou trazendo. Sei também que a minha aparência não deve estar das melhores. Quando cheguei em frente a oca do pajé Jandir, praticamente toda a tribo está presente em frente a ela. _ Quem é ela Teça? - ele perguntou-me enquanto outros me ajudavam a colocá-la no chão. _ A encontrei no meio da floresta. - olhei a menina ainda desacordada - Uma luz brilhante estava envolta dela. Não consegui acordá-la. Nosso grande chefe Raoni parou ao lado da garota e a examinou também. _ Não pude deixá-la. Tive que abandonar o ritual e trazê-la. Perdão chefe. - me ajoelhei a sua frente. _ Você agiu com sabedoria. - Raoni lhe sorriu - Agiu como um verdadeiro adulto e guerreiro. Jandir se aproximou dela e verificou seu pulso e estado. _ Viu se havia outros? - quis saber Raoni enquanto olha para as roupas dela. _ Nada chefe. Não havia destroços de nenhuma embarcação ou queda de avião. Olhei em volta e examinei o solo, sem pegadas. _ Como os animais não a devoraram? - disse assombrado Jandir - Sozinha, desacordada, no meio da mata... _ A luz verde a protegía. Eu vi. - todos me olharam agora entre surpresos e duvidosos - Quando um animal se aproximava ela o repelia. Os animais estavam com medo e não se aproximavam. - expliquei. O murmúrio entre o meu povo foi barulhento. _ Temos que cuidar dela. Os deuses a trouxeram até nós. Nossa obrigação cuidar. - disse Jandir. _ Tem razão. - Raoni me olhou sério - Como você a encontrou vou deixá-la em sua oca Teçá. - se levantou - Amanhã você vai nos levar a onde a encontrou. Descanse. _ Sim chefe. _ Jandir a leve para a oca de Teçá e ensine Anahi a cuidar dela. Os missionários devem chegar daqui a três luas. Quero que ela esteja bem para ser levada por eles. Eu queria protestar, mas me calei. Tinha consciência que talvez outras pessoas a estivessem a procurar também, talvez uma família. Mesmo assim sinto tristeza em meu coração. Como havia falado fomos eu, Raoni mais três guerreiros no dia seguinte para onde encontrei a menina, mas não havia mais luz verde estranha, só minhas pegadas com a menina nas costas. Vasculhamos tudo, mas foi em vão. Na volta consegui caçar uma bela paca e foi celebrada com alegria pela tribo. Jandir com todos os seus conhecimentos e rituais fazia de tudo para despertar a garota, mas ela não acordava. Isso preocupa toda tribo! Uns até oram a Jaci por ela. Estávamos preocupados de que fosse morrer, pois, não comia nada, e bebia muito pouco com a insistência de Anahi. Minha irmã apegou-se muito a menina, para ser franco... eu também. Uns até zombam de mim por causa disso. Não ligo é claro, mas meu coração se entristecia a cada dia. Diante do aparecimento dela a tribo a chamava de Yebá Bëló que significa mulher que apareceu do nada, bem adequado para a garota, mas também é o nome de uma deusa de nossa cultura, a deusa criadora do mundo. Achei muito lindo é claro! Para minha tristeza vi os missionários chegarem antes do prazo e após falarmos o que aconteceu e mostrarmos a garota, um deles que é médico, uma espécie de curandeiro e feiticeiro, falou de levá-la embora enquanto antes. Vi eles colocarem algo no braço fino e delicado, algo parecendo água desce num tubinho e some no seu corpinho. Tristeza me consumiu quando a vi ser levada. Esperava que a deusa Yebá Bëló a guardasse e que me desse à oportunidade de vê-la novamente. *********************************************************************
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