O Vice Presidente

2071 Words
Hoje é domingo e para variar, acordei cedo. Então decidi sair para correr, uma coisa que sempre gostei de fazer, ajuda a reorganizar os pensamentos e me sinto revigorada, ainda mais ouvindo música super alta. É uma sensação de liberdade. Quando estou nesses momentos - descabelada e suada, costumo ficar alheia todos que passam por mim, estou estragada demais para cumprimentar alguém conhecido, mas não posso ignorar o homem gigante que veio correndo na minha direção. Não pude porque ele colidiu comigo em um baque, me deixando sem ar por um momento. Posso garantir que o ar raleou não apenas pelo impacto. Caio na calçada e agradeço silenciosamente por isso, pois uma ÓTIMA visão do espécime acima de mim, alto, ombros largos, olhos verdes... Antes que eu pudesse falar – ou pensar em qualquer coisa além de sua beleza excessiva, ele se agacha me estendendo a mão. - Você se machucou? – Pergunta avaliando meu rosto. Tudo que consigo pensar é em como eu nunca tinha visto um homem tão grande e gracioso em seus movimentos, em meio a meu estado de estupor não respondo nada, embora eu tenha ouvido perfeitamente bem. Impaciente, ele repete a pergunta. Acordo do meu devaneio e levanto em um salto, dispensando a mão estendida, de repente me sentindo muito estressada e envergonhada, por que ele não olha por onde anda? - Olha por onde anda da próxima vez – digo rispidamente. E sigo correndo. Que homem bonito era aquele? Eu amo homens bonitos. Sorrio comigo mesma e então reparo que ele corre ao meu lado, sinto meu corpo esquentar dos pés à cabeça. - Não vou perguntar se está bem pois aparentemente está, mas você nem deixou eu me desculpar – dou créditos a ele, que parece genuinamente envergonhado. Dou um sorrisinho debochado para ele: - Olha, ele tem educação... - Eu já pedi desculpas e você não aceitou, então quem é a sem educação agora? – Seu olhar é desafiador. - Não sou eu quem saio derrubando as pessoas na rua. - Eu já pedi desculpas. - Você já disse isso – olho para ele – desculpas aceitas. Ele abre um sorriso perfeito e acena com a cabeça. - Eu sou Joseph – diz. - Muito prazer Joseph. - E seu nome é? - Por que eu diria meu nome para uma pessoa desconhecida? – e acelero o passo, sabendo que ele viria atrás. Ele veio. - Eu não diria que somos desconhecidos, já que deu uma boa olhada... Paro minha corrida para encará-lo, ele faz o mesmo, percorrendo o olhar por todo o meu corpo, quando fizemos contato visual, sorrimos um para o outro. - É bom conhecer alguém, estou aqui a trabalho. - Hmmm, deve ser por isso que não te reconheci, eu costumo reconhecer os rostos que correm aqui de manhã. - É um hábito seu? - O melhor deles. - Parece que agora vou correr todos os dias de manhã. Reviro os olhos e digo: - Vou ter que começar a ir pra outro lugar agora... Ele abre outro sorriso de tirar o fôlego, estendo a mão: - Prazer, Josefina. - O QUE? - Ele franze as sobrancelhas – Sério? - Sim – respondo mantendo uma expressão neutra – algum problema? - Quais as chances de eu conhecer uma Josefina? Eu não aguento segurar o riso. - Você está tirando com a minha cara? - Aham – digo entre as risadas - mas agora estamos quites por você ter me derrubado. - E o seu nome é? - Catarina. - Mesmo? - Até onde me lembro, sim! – Ele ainda parece desconfiado – quer ver meu RG? - Só o seu telefone já seria bom. Franzo as sobrancelhas, que abusado! - Vai sonhando. Depois daquele encontro embaraçoso - porém divertido, fui para casa e logo esqueço da existência de Joseph. Tomei um banho, comi um papaia com aveia e fiz minha rotineira aula de yoga. Amanhã tenho que auxiliar Nat – minha chefe – em uma apresentação detalhada sobre nos processos da empresa esse ano, e preciso me concentrar nisso agora. Todo começo de ano é preciso fazer uma reunião com os diretores para sabermos como está tramitando os processos relacionados a empresa, as relações trabalhistas e tudo mais envolvendo a área jurídica, cabendo aos outros diretores demonstrar o mesmo em relação a suas áreas, entre elas finanças, marketing... Eu trabalho em uma transnacional chamada Murphy LTDA, tradicionalmente, o dono da empresa, Anthony Murphy, visita uma ou duas de suas filiais espalhadas pelo mundo, para ver como está indo, conhecer seu pessoal, o homem é demais, e eu infelizmente não o conheci ainda. E pensei que essa seria minha chance de ver o lendário Antony Murphy, um homem que começou a vida vendendo âncoras, varas de pescar e iscas, e que hoje detém o mercado de produtos para pesca, contando com centenas e talvez milhares de funcionários, com filiais espalhadas pelo mundo todo. Mas ontem, Nat me informou que quem veio ao Brasil foi seu filho, que assumirá a presidência quando Anthony se aposentar. Antes de começar trabalhar, vou preparar uma xícara de chá, enquanto espero a água ferver, minha mãe entra na cozinha, usando um vestido azul claro de alcinhas, contrastando com minhas roupas de ficar em casa, que se resumem a pijamas – sempre. Minha mãe está em São Paulo me visitando a uma semana. - Bom dia filhotinha – e me da um abraço bem apertado. - Tão grudenta – digo. - Te abraço quando posso, me deixa. Dou um sorrisinho para ela: - Bom dia, quer chá? – Ela faz que não e acrescento: - Adorei o vestido. - Vou fazer aquele meu cafézinho – ela só toma o café que ela faz. - Vou trabalhar hoje. - Toma café comigo antes – olho para o relógio, ainda são dez horas, e ela me direcionou aquele olhar que torna impossível dizer não. - Tá bom, mas realmente preciso trabalhar depois. - A Tati está na cidade – Tati é a melhor amiga dela - nós vamos àquele museu que você se recusou a ir comigo – me olha de esguelha, como se eu fosse reconsiderar. - Mãe pelo amor de Deus você sabe que eu odeio essas coisas, ainda mais um museu de arte – resmungo, o que a faz rir. Observo minha mãe colocar americanos e xícaras no balcão para tomarmos café. - Cat Cat, você não muda... As vezes parece que não dou o valor que Mari Vasconcelos merece, mas eu dou. E reconheço que somos muito diferentes, ela é toda alegre, ama conversar, gosta de tudo colorido, tem o riso fácil. E eu sou o oposto dela e quando digo isso, quero dizer que sou totalmente o oposto, tanto na aparência quanto na personalidade, mas eu a amo muito e sou grata por sempre tê-la por perto me apoiando. Nos sentamos nos banquinhos do balcão e ela pergunta: - Você falou com seu pai hoje? - Ainda não, por quê? - Só para saber, ele disse que da próxima vez vai vir te ver. - Espero que cumpra com a palavra dele. - Cat... - O papai nunca vem me visitar, se depender dele eu largo esse emprego e vou morar lá perto de vocês. - Porque pra ele não faz sentido você trabalhar tão longe de casa por tão pouco, esse valor você ganha trabalhando perto de nós. Eu sei que para eles não faz o menor sentido eu morar em São Paulo ganhando dois mil e quinhentos reais, o que eu realmente consigo no Paraná, mas eu trabalho em uma transnacional com inúmeras possibilidades, além de morar em uma das maiores capitais do Brasil. Enxergo isso como um passo para um futuro, fora das influências dos meus pais, onde ninguém opina em minha vida. - Mãe – digo pacientemente - eu saí de casa e não pretendo voltar, quero ser independente, construir minha própria vida. - Você tem meu apoio, e sabe disso – assinto de leve me levanto. - Eu preciso trabalhar mãe, bom passeio, te amo. - Obrigada filha. Quando passo por ela, ganho um beijo no topo da cabeça. Esperei minha mãe sair e passei o restante do dia trabalhando que foi muito produtivo. Até que uma mãe, bem-humorada demais, chegou cheia de novidades sobre um museu que eu não dou mínima, mas escutei e dei atenção porque era isso que estava escrito no manual... Na segunda de manhã, acordo no horário de sempre, tomo um banho e vou tomar café. Depois disso, seco meus cabelos, deixando-os bem lisos, preencho minha sobrancelha e passo corretivo abaixo dos olhos, bronzer e finalizo com rímel para deixar meus olhos mais acentuados. Opto uma calça flare de coro branco, um body verde e uma botinha preta. Me avalio no espelho antes de decidir que estou pronta para o dia, que com certeza será tenso. Pego minha bolsa, e antees que eu me esqueça, coloco um par de brinquinhos dourados pequenos de argola e saio para pegar o metrô. Quando chego no prédio em que trabalho dou uma boa olhada, alto, preto e imponente. Enquanto passo o cartão pela catraca me lembro da primeira vez em que estive aqui, eu sinceramente pensei que fosse vomitar de tanto nervosismo, mas foi tudo bem, todos são muito acolhedores. Vou direto para os elevadores, faltam 20 minutos para a reunião começar. Quando o elevador chega, entro e pego meu celular para ver se Nat falou alguma coisa. - Josefina? – Não. Pode. Ser. Olho pro lado e me deparo com olhos verdes como jade me encarando. Meu estomago da um nó. - Joseph? Bom dia – dou uma boa olhada, ele fica ainda melhor de terno. - Bom dia, quase não te reconheci de cabelo arrumado. Hmmm, então ele vai ficar me alfineteando? Os cabelos dele vão um pouco abaixo da orelha, loiro bem escuro, quase castanho. Por que não reparei antes? - Bom te encontrar sem ser praticamente atropelada – devolvo. Sorrimos um para o outro e o elevador chega ao meu andar. - Bom, eu me despeço aqui, bom vê-lo novamente Joseph – e saio do elevador. Estou no quinto andar, onde ficam as salas de reunião. - Eu também estou nesse andar, sala principal? - Estou indo para lá agora – assim que digo isso meu celular toca, é minha chefe, Nat – Preciso atender, segue o corredor à esquerda, a sala fica no final - ele assente e sai. - Oi Nat, já chegou? - Ai Cat, você me perdoa? - pra ela já começar assim... - Estou parada em um congestionamento e não vou conseguir chegar a tempo, você revisou tudo né? Eu sei que sim. Consegue começar sem mim? – sinto um peso em meu estômago. - Como assim? Hoje o filho do Murphy vai estar aqui, você não pode fazer isso comigo – ok, eu quero chorar. - Catarina, eu sou sua chefe e preciso que faça isso, te recompenso com um jantar hoje! Eu sei que você consegue. Beijos Cat, boa sorte – e desliga. Não pode ser, apresentar para o vice-presidente da matriz. Sozinha. Uma coisa é auxiliar em uma coisa ou outra, mas é totalmente diferente fazer tudo sozinha e sem supervisão. Respiro fundo e sem ter o que fazer, sigo para a sala de reuniões com a cabeça a mil. Quando entro, vejo que o Diretor Financeiro - que eu nunca me lembro do nome, acho que é Pablo, está conversando com Joseph, que está em pé nos fundos da sala. No meio daquela confusão esqueci de perguntar o que ele fazia aqui. Pablo olha para mim e pergunta: - Dra. Natália já chegou? - Bom dia, ela ficou presa no congestionamento e não vai conseguir chegar a tempo - todos, incluindo o Joseph, olham para mim. - Você vai substituir ela? - Perguntou Pablo, ou é Paulo? - Sim, vou começar a apresentação sem ela – digo, tentando ignorar o frio na barriga. - Você consegue - diz baixinho a sempre simpática, Dra. Marina, Diretora de marketing. Olho em volta tentando me situar, parece que todos já estão aqui, menos... - Bom, sendo assim, Catarina, esse é Joseph Murphy, o vice-presidente da Murphy LTDA – Por que eu não pensei nisso? d***a. Ele sorri para mim de maneira acolhedora. Eu devia ter suspeitado, um desconhecido, simpático e bonito demais para ser qualquer um.
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