- Ok, ok! Eu assumo que fui eu que te beijei. - Dani adorava ouvir Isabella dizer isso.
- Agora que você já admitiu eu deixo você falar o resto. - Era a vez de Isabella se alegrar - Eu só te beijei, porque você me provocou até o limite e não tomou atitude! - Pronto, estavam felizes por admitirem mais uma vez como tinha começado tudo.
Enroladas no edredom estampado em preto e branco com a imagem do cristo redentor, as duas se preperavam mais uma vez para começar o dia de trabalho. Uma era produtora de eventos e a outra comandava a equipe de planejamento em uma agência publicitária de médio porte, mas que só existia ainda pelo dedicado trabalho de Dani. Ah sim, elas moravam nos Estados Unidos.
Dani foi direto para o chuveiro enquanto Isabella ia preparar o café. Como a cafeteira já estava programada, na verdade, ela só ia colocar o café na caneca e encontrar Dani no banho. Era assim todas as manhãs, e as duas não se cansavam. Diziam que pela vida inteira teriam aquela rotina e não se importariam.
Há 8 anos atrás.
O celular vibrou no bolso de Dani. Pelo horário só podia ser Isabella perguntando onde ela estava. As duas trabalhavam juntas e coordenavam equipes de produção de evento. Adoravam o trabalho que faziam ali, ainda mais depois de se conhecerem. Tudo parecia um pouco mais exato e perfeito. E de quebra, tinham o cenário da cidade maravilhosa como palco do dia a dia.
O email, como já imaginava Dani, era de Isabella, que estava no botequim em frente ao prédio onde trabalhavam esperando para tomarem café juntas, rotina diária. Dani nem respondeu, já estava chegando no local de sempre. Elas se tornaram amigas como num passe de mágica. Um dia no ônibus o trânsito estava um pouco pior do que o normal e a conversa um pouco mais animada. Em mais ou menos 20 minutos elas se tornaram melhores-amigas-de-infância e já conheciam todos os sórdidos detalhes da vida da outra. Daí pra frente, foi fácil. Todos os dias juntas, trabalhando de domingo a domingo quase que 24 horas por dia era inevitável a aproximação. Elas não se importaram, estavam se dando super bem e cada vez mais surgia a vontade de estarem juntas. Uma amizade dessas especiais que não se encontra em qualquer esquina - mesmo que neste caso tenha sido exatamente assim.
Isabella era muito pé no chão, mas nunca deixou de sonhar, só não tinha a fé neles necessária para expressá-los. "Fechada para balanço" como costumava dizer, estava focada no trabalho e na faculdade que fazia. Não estava nem um pouco afim de relacionamento. Muito menos se apaixonar! Era praticamente, tema proibido.
Já Dani era uma eterna sonhadora, apaixonada por tudo e todos e que não sabia mais viver sem amar, sem o frio na barriga e sem alguém pra chamar de seu. Já se formando estava doida para trabalhar cada vez mais e ir mais fundo ainda nos seus sonhos, ela não tinha nenhum pé, ou dedinho no chão. Mas gostava muito de viver assim.
Dani apesar de focada no seu trabalho, como uma típica geminiana, tinha milhões de focos ao mesmo tempo. Estava em um relacinamento há quase 3 anos, o mais longo que ela já esteve. Namorava com uma menina chamada Rafaela e se dizia perdidamente apaixonada, era o amor da sua vida. Isabella logicamente sabia desse namoro, Dani contava tudo para ela.
A verdade é que aquele namoro já tinha perdido a graça pra Dani, não tinha mais novidade, não tinha mais paixão, era um carinho enorme, um amor forte, mas que não a preenchia como ela precisava. Ela queria mais e precisava de mais, ela precisava do frio na barriga de novo, das pernas bambas, do olhar perdido na lua, da vontade de chorar de saudades. Algo que ela não encontrava com Rafaela já fazia um tempo. E Isabella sabia disso, apesar de não acreditar muito.
Durante algum tempo Dani e Isabella permaneceram como grandes amigas, nada de diferente tinha passado pela cabeça de nenhuma delas. Só na cabeça de Rafaela, mas as coisas na cabeça dela eram sempre um pouco diferentes. Ou quem sabe as coisas na cabeca dela eram um pouco antecipadas, bom, não sei, ninguem sabe.
Rafaela e Dani não estavam bem mesmo, as brigas aumentavam, desconfianças, ciúmes e ate traições estavam cada vez mais enchendo o relacionamento delas e fazendo com que ele se tornasse pesado. As duas já estavam ficando cansadas dele, apesar de sentirem coisa muito forte, não sabiam se daria certo como dava antes. E Isabella assistia tudo isso acontecer como a melhor amiga de Dani. Ela também estava confusa, mas era um sentimento diferente, nem ela mesmo sabia o porque daquela amiga ter se tornado tão importante e tão rapido.
Feriado. Isso não significava nada no trabalho de Dani e Isabella, elas teriam que passar o dia todo presas dentro do escritório, como sempre. Rafaela resolveu viajar com algumas amigas. Seria bom para elas duas esse tempo para pensar, e além do mais Dani poderia relaxar um pouco, iria passa alguns dias sem brigas, sem chorar e sem surtar com as dúvidas que vinha tendo ultimamente. O feriado começava na quinta, dia em que Rafaela viajou. E o único dia de folga de Dani e Isabela. No dia seguinte deveriam estar cedo no escritório. E estavam. Isabella chegou um pouco antes, mas foi realmente pouca a diferença, logo depois Dani estava lá também e com a mochila pronta, pois tinha prometido que dormiria na casa de Isabella. A noite ia ser mais longa do que elas esperavam.
O dia passou muito tranquilo para as duas amigas, estavam rindo e brincando com todos da equipe, afinal não podiam reclamar de nada ali, era muito gostoso trabalhar com pessoas que se davam tão bem, mesmo sendo um ritmo louco de trabalho, valia a pena e como elas mesmas diziam, é melhor morrer trabalhando no meio de amigos. O final do dia foi se aproximando e ninguém queria voltar para casa em plena sexta feira a noite.
Após muita discussão resolveram ir a uma festa que ficaram sabendo. E lá se foram, Dani, Isabella e o Pedro, o terceiro no "triângulo amoroso" que existia na empresa segundo as fofocas mais sórdidas. Logicamente, era mentira.
Dani, Isabella, Pedro e a namorada dele. Estavam mais do que acabados de tanto trabalho, mas estavam felizes com uma música alta, gente e um lugar para esquecer de todos os problemas, principalmente, Dani. Ela estava precisando mais do que imaginava. Não lembrava mais como era dançar tanto e se divertir daquela maneira. Mas o que mais interessa nessa noite nao é bem como a Dani se divertiu, mas sim como Isabella se sentiu. No meio da noite Dani não estava ao seu lado quando Isabella olhou, no instante seguinte ela achou a amiga, uns passos atrás dançando com um menino muito bonitinho. Não estava fazendo nada demais além de dançar e sorrir. Ela tinha até soltado o cabelo para dançar com ele. Isabella naquele momento teve vontade de puxa-la pelo braço e levar para um lugar onde só ela pudesse ficar apreciando aquela imagem linda que era ver Dani sorrindo daquele jeito. Ela não queria nem toca-la nem nada, tinha medo de estragar, ela só queria estar perto, sentir o cheiro do perfume que ela sempre usava, ouvir o sorriso e a voz dela de todos os dias, sentir o carinho na mão que ela sempre fazia no escritório. Ela sentiu ciúmes, um ciúmes diferente, nao só de amiga. Ela sentiu ciúmes de mais do que isso. Ela não entendeu nada.
Dani e Isabella estavam acabadas e ainda tinham um longo caminho de volta pra casa, moravam no fim do mundo como costumavam brincar. Saíram da pista de dança e foram pegar suas mochilas lotadas de coisas, iam pegar um taxi pra casa de Isabella, era o combinado. Estavam cansadas mas também estavam felizes por terem se divertido um pouco. Dani estava relaxada e feliz pela companhia e Isabella ainda estava muito chocada com o que sentiu ao ver Dani dançando daquela maneira com um menino qualquer. Ainda estava tentando decifrar tudo aquilo. Mas quem sabe amanhã? O sol já estava nascendo e estava na hora delas dormirem. E naquela noite os sonhos de Isabella pareciam meio estranhos, e pior, reais demais.