capítulo 7

938 Palavras
Fantasmas na Cabeça de Adrian ​Adrian acordou com a cabeça surpreendentemente fresca, mas com a mente inquieta. Em sua cama de fazenda, longe do barulho da cidade, ele se pegou revisando as fotos que tinha da sala do escritório. Em uma delas, o "peãozinho" Ramires estava agachado com a vassoura, a imagem da competência teimosa. ​No entanto, o fantasma mais insistente em sua cabeça era o daquela moça da padaria. ​Pensa numa mulher bonita. Os olhos cor de mel e o cabelo comprido eram uma visão rara, e ele lamentava ter estado tão ocupado com e-mails que m*l olhou para ela. Ele não a tinha visto antes na cidade, mas prometeu a si mesmo que ela voltaria àquela padaria. Ele voltaria também. ​Tinha que tirar aquilo da cabeça, pois agora era hora de trabalho. Conseguiu alguns clientes no dia anterior graças à fama do pai—o que era útil, embora irritante. Ele precisava de alguém competente para organizar a base do escritório. Amanhã, ele falaria com o pai sobre contratar um assistente. ​O Coque de Lúcia e o Escândalo de Sandrinha ​No Rancho, Lúcia levantou-se antes do sol. Cuidou de sua higiene e, no ritual matinal, penteou os longos cabelos. Ela havia tirado a Lace – a peruca curtinha que usava como parte da identidade Ramires – e penteava a cabeleira que batia no bumbum, um gosto que ela cultivava para a alegria de sua mãe. ​Lúcia aproveitou a carona do pai para a cidade. Para ir à escola, ela não usava o disfarce masculino completo, mas também não se apresentava de forma chamativa. O cabelo, preso em um coque firme e alto, ficava totalmente escondido sob o chapéu country que ela não abria mão. O estilo era cowgirl, não Ramires, o peão. ​Ao chegar na escola, o drama a esperava. Sandrinha, deslumbrante e pronta para causar, fez um escândalo. ​"Prima! Faz dias que não aparece por aqui, hein! Mas não tem problema, todo dia eu falo com o meu peão gostoso, o Ramires. Cadê ele?" Sandrinha riu, piscando para um grupo de rapazes. ​"Sandrinha, toma jeito! Você sabe das coisas," Lúcia repreendeu. ​"Eu sei das coisas, mas eles não! Ramires é Ramires para a cidade inteira, e ele é meu. Tenho que pôr banca, né?" Sandrinha provocou, reforçando a mentira que, ironicamente, protegia a verdade de Lúcia. ​Lúcia logo se dirigiu à secretaria. Ela entregou as atividades, e a secretária, seguindo as ordens do padrinho, lhe entregou o bloco de provas. Lúcia sentou-se, pegou seu estojo e começou a trabalhar. ​"Senhorita Lúcia, celular proibido," alertou a secretária. ​Lúcia sorriu, mostrando o pequeno telefone de teclado. "Não se preocupe, meu celular nem internet pega." ​A secretária ficou indignada. "Senhorita Lúcia, como assim? Você não tem um smartphone como todo mundo usa hoje em dia?" ​"Todo mundo menos eu," Lúcia respondeu com serenidade. "Gosto de curtir a vida de verdade. Se quiser falar comigo, mensagem de texto ou me ligue." ​Ela ignorou o olhar de desaprovação da secretária e mergulhou nas provas. Matemática, Português, Ciências... Lúcia terminou o bloco inteiro em três horas, bem antes do tempo limite. Pegou seu envelope de novas atividades e saiu. ​A Lama e o Tereré ​Lúcia procurou pelo pai, mas ele já havia partido, deixando uma mensagem de texto. Ela tomou seu café e chipa na padaria, e o destino irônico a fez esbarrar em Adrian novamente, que sequer a reconheceu. ​De volta ao rancho, a c****a Diana, com seu barrigão de prenha, veio ao seu encontro. Lúcia a acariciou, pedindo ao pai que tomasse cuidado com ela. Em seguida, trocou de roupa e partiu para o campo na figura de Ramires. ​Havia um boi sumido há dois dias. Ramires, desconfiado, pegou dois peões e foi atrás dele. A desconfiança estava certa: o boi bravo estava atolado no brejo. Foi um trabalho infernal. Eles lutaram contra a lama, o bicho teimoso, e o terreno pantanoso. Ramires liderou o resgate com força e estratégia, tirando o animal ileso. ​Quando voltaram, já era noite. Eles estavam cobertos de barro da cabeça aos pés. ​O pai, apesar de olhar a bagunça, estava visivelmente satisfeito por ter o boi de volta. ​Ramires foi direto para o chuveiro externo. Tirou a roupa e, como a Lace estava completamente suja de lama, removeu a peruca curtinha que a ajudava no disfarce, lavando-a para secar. Lúcia emergiu do banho e foi para sua rede, vestida com roupas leves. ​Ela pegou sua cuia de Tereré , uma bebida gelada de erva-mate que ela havia adquirido em uma viagem com o pai. O Tereré era seu pequeno vício, saboroso, e um momento de introspecção. Enquanto os peões reclamavam que a bebida "tirava a gente do trabalho", Lúcia a usava para relaxar e pensar. ​Ela pensou no dia: o encontro irônico com Adrian, a velocidade com que fez suas provas, e a satisfação de trazer o boi de volta. ​Lúcia ligou seu radinho. A música country ecoava. Ela sorria ao ouvir Ana Castela, Alex Ivan, e os clássicos Chitãozinho e Xororó. Ela podia não ter w******p, mas estava conectada com o que realmente amava. ​Adrian Santiago, na sede, estava cansado de ler processos. Ele queria um assistente e queria aquela garota. ​Lúcia, na rede, tinha o que queria: sua liberdade disfarçada, seu dever cumprido, sua inteligência intacta e seu tereré gelado. O playboy da cidade e a cowgirl do campo estavam em rota de colisão, cada um vendo apenas uma parte da verdade.
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