Da Ordem à Partida
Adrian fechou a mala, sentindo o peso da obrigação. A dor de cabeça tinha diminuído, substituída por um humor azedo. Ele era um advogado de sucesso em seu próprio domínio, e a perspectiva de trocar o ar condicionado do escritório pelo calor empoeirado do Rancho Dakota era quase insuportável.
"Não acredito que meu pai fez um negócio desses comigo," resmungou para si mesmo.
No entanto, ele era prático. Se precisava ir, precisava ir. Não adiantava adiar o inevitável. Durante a manhã, ele foi metódico: reuniu todos os arquivos que poderiam ser gerenciados remotamente, deixou instruções claras para Hugo, seu sócio, e organizou as finanças. Hugo, um amigo fiel, mas insatisfeito com a ausência do parceiro, prometeu cuidar da parte presencial, enquanto Adrian garantiria as decisões importantes via telefone ou internet.
Com tudo resolvido, Adrian se despediu do amigo no aeroporto da capital. Sem enrolação. Despachou a mala, deu um abraço rápido em Hugo, e embarcou no voo que o levaria à pequena cidade próxima ao rancho. A Fazenda o esperava, e ele não queria prolongar a agonia.
O Banquete e a Missão de Ramires
Enquanto Adrian sobrevoava a paisagem rural, no Rancho Dakota a manhã seguia agitada. Ramires, depois do café e da bronca das botas, acompanhou o Sr. Rodrigues para resolver os problemas da fazenda. A chegada de um caminhão lotado de gado premium trouxe um novo foco para o dia.
O padrinho, que também era patrão do rancho e parceiro do pai, chegou para revisar a papelada e supervisionar a nova aquisição. Ele sorriu para Ramires e, em seguida, para o pai dela.
"Ramires, pode desembarcar os bois. Olhe como é que estão, se tem algum machucado, qualquer coisa, e me avisa, tá bom?"
"Pode deixar. Vou lá, vou ver se vem algum bravo," Ramires respondeu, faceira.
Era o que ela mais gostava de fazer. Sua paixão por bois, por manejá-los e montá-los, já havia rendido-lhe troféus em campeonatos regionais—o motivo do orgulho contido de seu pai. Ela saiu para coordenar a descarga, feliz por estar no meio da lida.
No casarão, Dona Margarete, a mãe de Adrian, estava em êxtase. Ela havia recebido a mensagem de que o filho viria hoje.
"Dina! Prepara o quarto do meu filho! Tira todo o pó, troca o forro de cama, organiza tudo!" ordenou à governanta, que m*l conseguia acompanhar a euforia. "Meu filho já passou muito tempo longe de casa. É bom que ele venha. Eu convenci seu pai que ele tinha que voltar, e ele fez isso!"
Logo, a ordem desceu ao campo. O Sr. Rodrigues chamou Ramires.
"Ramires, o Adrian, filho do patrão, está chegando no aeroporto da cidade. Você vai lá buscá-lo. E a sua mãe já preparou a lista: você aproveita e faz as compras para o banquete de boas-vindas. Traga tudo o que ela pediu."
Ramires sorriu, um brilho divertido nos olhos. "Patrãozinho, é?"
"O Adrian é filho do nosso patrão, certo? Então ele também é patrão, igual ao nosso aqui. Isso é verdade, filha," confirmou o pai, sério.
Ramires aceitou a missão com resignação profissional. Seria rápido. Ela pegou a lista de compras, entrou na camionete do rancho e partiu para a cidade. Chegou mais cedo, fez as compras que a mãe pediu e estacionou em frente ao pequeno aeroporto municipal, esperando.
O Exame Silencioso
Ramires tinha visto fotos de Adrian—a madrinha, amiga de Dona Margarete, fazia questão de mostrar as imagens do "orgulho" dela. O Adrian das fotos era um homem polido, elegante.
Enquanto esperava, Ramires aproveitou para revisar umas planilhas do rancho, o bloco de notas apoiado no volante. O tempo passou até que o avião pousou e, finalmente, Adrian e suas malas apareceram.
Ele estava impecável, o terno amarrotado pela viagem, mas ainda assim chamando atenção no ambiente simplório do aeroporto. Adrian procurou por um motorista com uniforme ou um capataz de meia-idade. Em vez disso, encontrou Ramires, encostado na caminhonete.
Adrian examinou o sujeito de cima a baixo: a camisa de flanela, o jeans gasto, o boné sujo de poeira e o rosto jovem e sério que não entregava nenhuma emoção. O sujeito parecia um matuto. O tipo de gente que Adrian não falava há anos.
Adrian não disse nada. Simplesmente entregou a mala.
Ramires não pestanejou. Abriu a porta traseira, guardou a bagagem sem proferir uma palavra e entrou no banco do motorista. Não houve conversa, nem apresentação. O silêncio era pesado, preenchido apenas pelo motor da caminhonete e pelo som da estrada.
Adrian foi deixado na porta do casarão.
"Aqui está," Ramires indicou, sem descer do carro.
Adrian desembarcou e olhou para o rapaz de forma desconfiada. "Obrigado," ele murmurou.
Ramires apenas acenou com a cabeça e deu a volta na casa para entregar as compras na cozinha, deixando Adrian sozinho na entrada da mansão rural.
"Aqui estão as compras, mãe," Ramires anunciou, empilhando as sacolas.
Dona Alice, animada, perguntou: "Ah, que bom que você chegou, Ramires! E como é que o Adrian está?"
Ramires deu de ombros, indiferente. "Não sei. Não falou nada. Está com cara fechada, de quem comeu e não gostou, sabe? Ah, mãe, nem sei o que te falar. Mas já chegou, está aí. Trouxe ele do jeitinho que peguei lá, está aqui."
O Quarto de Adrian
Adrian entrou, sentindo uma pontada de familiaridade. Era seu quarto. O déjà vu o atingiu. Foi ali que cresceu antes de ir para a capital e nunca mais olhar para trás.
Ele olhou pela janela, vendo a caminhonete se afastar.
"Tem aquele sujeito lá embaixo que me trouxe. Um matuto. Gente do campo," ele pensou com desdém. Ele tentou se lembrar do nome. Ramires. Se era de confiança do pai, tudo bem. Parecia ser bem novo, o que Adrian achou um tanto estranho, mas não era problema dele.
Com seu humor azedo, ele se recostou na cama.
"Depois eu falo com ele. Agora não. Só a mamãe tem certeza de que eu sou bem-vindo," ele concluiu.
De fato, não demoraria muito para que Dona Margarete batesse à porta, iniciando o cerimonial de boas-vindas, e, pior, iniciando o seu plano de casamento.