Hospital – Consultório da Psicóloga | Tarde

1713 Palavras
Dreew chegou à sala com o semblante carregado, mas um olhar mais esperançoso do que nas visitas anteriores. A psicóloga o aguardava com a pasta em mãos. Ela lhe ofereceu um leve sorriso ao vê-lo entrar. — Senhor Dreew, por favor, sente-se. Já temos os laudos da Maris. Ele obedeceu em silêncio, ajeitando-se na cadeira, o coração batendo um pouco mais rápido. — A bala se alojou na coluna lombar — ela explicou, com voz clara e firme —, numa área muito sensível, mas não houve dano total. A boa notícia é que ela mantém reflexos, e o exame neurológico mostrou resposta nas pernas, ainda que tênue. Isso significa que ela não perdeu completamente os movimentos. A má notícia é que a retirada do projétil poderia causar um dano irreversível. Então, a equipe decidiu mantê-lo onde está. — Ela vai andar de novo? — ele perguntou, quase sem respirar. — Com fisioterapia intensa, longo prazo e disciplina, sim. Há uma boa chance. E o mais importante: ela está emocionalmente mais receptiva. Está refletindo muito sobre as escolhas que fez, sobre a filha, sobre o senhor. Ela chorou, agradeceu a segunda chance. Está em um estágio em que a verdade pode ser uma ponte, não um abismo. Dreew passou as mãos pelo rosto, aliviado e aflito ao mesmo tempo. — E a Brittany? A senhora acha que ela está pronta? — Essa é a outra boa notícia — ela sorriu de leve. — A Brittany já está sob acompanhamento psicológico desde o nascimento dos bebês. Desde a UTI neonatal, mesmo já estando com eles no apartamento. Nós adaptamos um plano de cuidados para que ela pudesse ficar com os gêmeos, mesmo com incubadoras portáteis e o acompanhamento de enfermagem. — Eu sei, euvejo como ela cuida deles. Parece que o mundo dela agora são só eles. — E é. Mas essa centralização é também um mecanismo de proteção. Ela transformou a dor em zelo, e isso a fortaleceu. Os sintomas de estafa emocional diminuíram bastante. O vínculo com os bebês é forte e positivo. O que antes poderia levá-la ao colapso, agora se transformou em uma fonte de resiliência. Ela se inclinou um pouco à frente. — Quando a senhora Maris entrou em coma, nós optamos por não contar nada a Brittany. Agora, com o quadro estabilizado e o risco de sequelas graves sendo controlado, acredito que seja o momento. E eu gostaria que o senhor estivesse comigo quando eu fizer isso. Andreu balançou a cabeça, concordando com firmeza. — Eu vou estar com ela. O que você precisa que eu diga? — Nada além da verdade. Mas com delicadeza. Eu vou conduzir a conversa. A senhorita Brittany já demonstrou melhora significativa no manejo das emoções. A abordagem será cuidadosa: iniciarei falando sobre superações na maternidade, depois sobre acidentes com recuperação e, então, sobre a situação da Maris. Ela finalizou: — O senhor só precisa estar ao lado dela. O toque da sua mão, o acolhimento do seu olhar. Isso vai ser fundamental. Depois, se ela quiser ver a mãe, organizaremos uma visita breve e gradual. — Entendido. A psicóloga anotou algo na prancheta. — Às 17h farei a primeira abordagem. Se tudo correr bem, às 17:30h levamos Brittany até Maris. — Obrigado... por tudo que está fazendo. — A reconstrução emocional também é uma forma de cura, senhor Andreu. E hoje, parece que todos estão prontos para começar. O som leve do chorinho de um dos bebês era abafado pelas risadinhas cúmplices das três jovens. Lena embalava o menino enquanto Missy ajeitava a touquinha da menina. Brittany observava a cena com olhos marejados, mas com um sorriso genuíno. — Eles são meu milagre... — sussurrou, ajeitando a mantinha azul do filho no colo da irmã. Nesse instante, a psicóloga apareceu na porta entreaberta e bateu levemente. — Com licença… Boa tarde. As três voltaram o olhar e sorriram. — Oi, doutora! — Brittany cumprimentou, surpresa. A psicóloga entrou com suavidade no olhar, percebendo o ambiente leve, acolhedor e positivo. O clima era favorável. Drew chegou logo em seguida, abrindo a porta com um buquê de flores brancas e um olhar terno nos olhos. — Oi, filha — disse ele, curvando-se para beijá-la na testa. — Meus netinhos estão lindos… — Oi, pai… — ela sussurrou, emocionada. — Eles dormiram agora. Drew acariciou a bochechinha do menino no colo de Lena e sorriu com os olhos brilhando. A psicóloga, de pé ao lado da cama de Brittany, observou a troca com atenção. A conexão com o pai estava forte. Era hora. Ela se aproximou com serenidade e puxou uma cadeira para sentar-se de frente para Brittany. — Brittany… eu preciso conversar com você. Posso? A jovem assentiu, levemente desconfiada, mas sem medo. — Nos últimos dias, conversamos muito, não foi? Falamos sobre sua força, sobre como você transformou dor em amor… E eu acompanhei, passo a passo, sua evolução. A psicóloga fez uma pausa, deixando o tom mais suave. — Mas tem algo que nós não contamos. E não foi por maldade, foi por proteção. Eu pedi para que você não fosse informada sobre isso antes… porque, naquele momento, o seu nível de estresse estava muito elevado, e havia risco real de colapso físico e emocional. Brittany arregalou os olhos, o coração A psicóloga puxou a cadeira para mais perto da cama, com aquele sorriso calmo que Brittany já conhecia dos últimos dias. Sentou-se ao lado dela, esperou a respiração da jovem se estabilizar, e então tocou com suavidade sua mão. — Brittany, antes de qualquer coisa, quero te dizer que você está indo muito bem. Você tem sido uma mãe maravilhosa, presente, atenta… e isso é admirável. Você está superando desafios enormes com muita coragem. Ela fez uma breve pausa, percebendo que Brittany a olhava com atenção. — Nós seguramos algumas informações por um tempo… porque a sua saúde, dos seus filhos, e o seu equilíbrio emocional estavam em primeiro lugar. E agora que você está mais forte, mais centrada… acredito que podemos conversar com mais tranquilidade sobre algumas coisas. Brittany arregalou os olhos, levemente apreensiva. — O que aconteceu, doutora? A psicóloga respirou fundo, sua voz baixa e afetuosa. — A sua mãe passou por um episódio difícil. Ela foi vítima de um ato violento… algo que nos preocupou muito. Mas… ela está viva, Brittany. Consciente. Acordou hoje pela manhã, está sob cuidados médicos, sendo acompanhada de perto, e perguntou por você. O queixo de Brittany tremeu. As lágrimas começaram a se formar, mas ainda não escorriam. Ela apertou a manta dos bebês entre os dedos. — Por que… ninguém me disse antes? A psicóloga se inclinou levemente, mantendo o tom suave. — Porque no momento em que isso aconteceu, você ainda estava se recuperando da cesárea, com os bebês na UTI. Seu corpo e sua mente estavam no limite. Qualquer informação adicional poderia causar um desequilíbrio perigoso — e isso te afastaria dos seus filhos e da chance de viver esse momento com eles. Era preciso esperar o tempo certo… e ele chegou. — Ela está… muito m*l? — Brittany perguntou com a voz embargada. — Ela está consciente, sim. Com sequelas temporárias, talvez. A bala ficou alojada em uma região delicada… mas os exames mostraram que ela pode se recuperar com fisioterapia. O mais importante: ela está viva, e emocionalmente muito mais sensível do que antes. Está reflexiva… e quer muito ver você. — Eu… — Brittany começou a chorar. — Eu tratei ela m*l no nosso último encontro… — Não se culpe agora, meu bem. Esse reencontro pode ser um novo começo. Não há cobrança nesse momento. Há afeto. Verdade. Cura. Drew se aproximou e segurou os ombros da filha com carinho. — Eu também estava com medo. Mas agora… agora eu só vejo uma oportunidade. Vai lá, filha. Por vocês duas. A psicóloga esperou Brittany respirar fundo e assentir com a cabeça. A emoção estava presente, mas o equilíbrio também. — Nós vamos até ela. Devagar. Você vai segurar a mão dela… e tudo o que for preciso dizer, virá com o tempo. Eu estarei com você. Você não está sozinha, Brittany. Preparação de Brittany para o reencontro A psicóloga se levantou devagar, após secar discretamente uma lágrima que teimava em escapar. — Brittany, agora que você sabe… eu quero que você respire fundo. Nós vamos fazer isso com calma, tá bem? Brittany assentiu, enxugando os olhos com o lenço que Drew havia colocado em suas mãos minutos antes. O peito ainda doía, mas havia também um calor novo: o desejo de ver a mãe, de reencontrá-la. — Eu vou à frente, preparar sua mãe — explicou a psicóloga com voz firme, porém carinhosa. — A Maris ainda está emocionalmente abalada. O corpo dela também. Vamos evitar qualquer sobressalto. Mas ela está esperando por você. Ela quer te ver. — E eu quero vê-la — disse Brittany, com a voz baixa, mas convicta. — Não importa como. Eu só quero olhar nos olhos dela… e dizer que ela não está sozinha. A psicóloga sorriu, tocou de leve o ombro dela. — É isso. Essa sua força, Brittany… é o que vai transformar esse momento num marco de cura pra vocês duas. Ela virou-se para Drew. — Senhor Drew… o senhor pode acompanhá-la? O ideal é que ela vá em uma cadeira de rodas, para evitar qualquer sobrecarga física. A emoção será grande. — Claro — respondeu ele imediatamente. — Eu mesmo vou empurrá-la. A psicóloga fez um gesto afirmativo e seguiu em direção ao corredor. — Eu já vou para o andar da sua mãe. Quando chegarem, toquem a campainha do apartamento. Eu estarei lá dentro, preparando tudo. Brittany segurou firme nas mãos do pai enquanto ele a ajudava a se sentar na cadeira de rodas. Drew abaixou-se diante dela, com ternura nos olhos. — Você está pronta? — Acho que nunca vou estar completamente pronta — ela sussurrou —, mas estou decidida. Ele sorriu com orgulho, ajeitou os pés dela no apoio e empurrou a cadeira com cuidado, em direção ao elevador. A tensão era palpável, mas havia também… esperança. Enquanto isso, a psicóloga caminhava com passos leves pelo corredor do hospital. Já ia preparando o coração da mãe para o reencontro que mudaria tudo.
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