####AMOR E ATENÇÃO

1758 Palavras
O quarto da maternidade estava mergulhado num silêncio suave, apenas interrompido pelo som ritmado dos aparelhos e do ar-condicionado. A luz da tarde filtrava-se pelas cortinas semiabertas, lançando raios mornos sobre o rosto sereno de Brittany, que dormia profundamente desde as oito da manhã. A porta se abriu com delicadeza. — Psiu... — sussurrou Nice, entrando com uma marmita térmica em mãos, os passos leves como quem respeita um santuário. Lena levantou o olhar da cadeira onde estava sentada, próxima aos bebês na UTI Neonatal, visível por meio da divisória de vidro. Ela sorriu ao ver a prima. — Você chegou na hora certa, Nice. Ela dormiu como uma pedra. Desde às oito da manhã... só agora parece que está se mexendo. Brittany começou a abrir os olhos devagar, os cílios tremulando com o esforço. A voz saiu rouca e sonolenta: — Nice...? Você chegou...? — Ela piscou lentamente. — Que horas são...? Quanto tempo eu dormi...? Lena se aproximou da cama e ajeitou com carinho o travesseiro sob a cabeça da amiga. — O tempo necessário pra você descansar um pouco, meu bem. Ela sorriu doce. — Você precisava desse descanso, e conseguiu. — E... eles...? — Brittany tentou se erguer um pouco, preocupada com os filhos. — Deram trabalho? Nenhum. Eles são uns anjinhos, — respondeu Lena com um brilho de ternura nos olhos. — São sim... — sussurrou Brittany, emocionada, deixando-se cair de volta no travesseiro. Nice se aproximou com a marmita térmica e fez um gesto triunfante com as mãos. — Tcharam! Trouxe a sua alimentação. A tia T disse que vai mandar comida de resguardo pra você todos os dias, e ninguém discute com a dona Teresa. Tá aqui seu almoço. Essa térmica menor é o jantar, já tá aquecido e vai manter até a hora que eu sair. — E a que horas a enfermeira entra? — perguntou Brittany, olhando em volta como se ainda estivesse assimilando o novo ritmo. — Às dezoito horas em ponto, — respondeu Nice. — Ela vai cuidar de tudo contigo a partir de hoje. Eu fico até esse horário e amanhã continua a mesma rotina, certinho? Brittany assentiu lentamente, ainda processando aquela maré de cuidado, de apoio... de amor verdadeiro. Ela passou a mão pelos cabelos desgrenhados e soltou um suspiro longo. — Obrigada, meninas... — Nada disso, Brittany, — disse Lena, se sentando na poltrona ao lado. — Você é parte da nossa família. Nós não te adotamos como irmã? E eles não são nossos sobrinhos? Então pronto. A gente cuida de vocês com amor. Nisse completou com um sorriso travesso: — Agora escove os dentinhos, tome esse leitinho aí e deite de novo. Quem vai cuidar dos sobrinhos agora somos eu e a Lena. Você vai descansar, porque seus filhos precisam da mãe deles inteira. E a gente também precisa de você! Tem o projeto do quarto dos trigêmeos da Lana, lembra? Brittany sorriu emocionada, e foi aí que deixou o coração falar... Agora, amiga, segue a continuação da cena com o desabafo da Brittany, aquela parte profunda e linda que você já havia estruturado: — É mesmo... o quarto dos trigêmeos... — ela murmurou, com um riso cansado, mas cheio de vida. — Eu estou tão descansada... Obrigada, Lena. Obrigada, Nisse. Eu fazia tanto tempo que não dormia... mas cada segundo que eu passo com os meus filhos compensa. Eu nunca pensei que a maternidade fosse uma coisa tão linda e tão sofrida ao mesmo tempo. Lena a olhou com carinho: — Mas é sofrido como? — É, menina! Você se arrependeu, foi? — completou Nisse, fazendo graça. Brittany balançou a cabeça com convicção. — De jeito nenhum. Ela respirou fundo. — É um sofrimento de amor. Meus filhos nasceram prematuros, tão frágeis... e dependem de mim para tudo. Eu não sabia o que era viver sem dormir, sem comer direito, sem parar um segundo. Mas também não sabia que amar podia doer tanto e, ainda assim, ser tão lindo. Ela fez uma pausa, a voz embargando de emoção: — Mesmo que eles tenham vindo por acidente, da forma que vieram... Eles são o erro mais certo que eu cometi na minha vida. E eu não me arrependo nem um minuto. Lena segurou a mão dela com firmeza. — Você virou uma leoa, Brittany. Uma mãe de verdade. E nós vamos estar com você em cada passo dessa estrada. Nice assentiu com um sorriso largo: — Pode contar com a sua equipe. Brittany ficou em silêncio por alguns segundos, olhando para o teto, como se falasse consigo mesma, mas sua voz carregava uma força que emocionava. — Eu vou ser para os meus filhos tudo o que a minha mãe não foi para mim. Sua voz não tremeu — era firme como um juramento. — Eu vou ser uma mãe que dá exemplo. Vou educar com amor, com limites. Vou estar presente, nas reuniões da escola, nos teatrinhos, nas feiras de ciências, nos campeonatos. Tudo. Eu vou ser tudo o que eu sonhei ter. Ela respirou fundo, segurando as lágrimas. — Eu quero que eles se orgulhem de mim... que vejam em mim alguém que lutou por eles, mesmo quando tudo parecia perdido. Eu não quero ser um mau exemplo. Eu não quero que eles sintam vergonha de mim, como eu senti da minha mãe tantas vezes... Nesse momento, Lena e Nice se entre olharam discretamente. O olhar de uma para a outra dizia tudo — ambas sabiam da gravidade do estado de Maris. Sabiam que, naquele momento, enquanto Brittany fazia promessas com o coração em brasas, a mãe dela ainda lutava entre a vida e a morte numa UTI silenciosa e fria. Mas nenhuma das duas disse uma só palavra. Apenas sorriram com doçura. Lena apertou de leve o ombro da Brittany. Nice ajeitou a almofada por trás das costas dela e respondeu com delicadeza: — Você vai ser tudo isso e mais um pouco. E eles já te amam. Mesmo tão pequenininhos... sentem. Eles sabem quem é a mãe deles. Brittany sorriu pela primeira vez em muito tempo. Um sorriso cansado, mas cheio de verdade. — Obrigada. Por tudo. Por estarem aqui. Por me fazerem sentir que eu tenho uma família. Eu sei que foi difícil. Eu fui arrogante. Eu fui injusta. Mas vocês não me viraram as costas. Obrigada por isso. — E vamos continuar aqui — respondeu Lena. — Pra cuidar de você e dos seus três milagres. Nice piscou para ela, tentando esconder a emoção. — Agora, chega de drama. Coma, tire seu leite... e depois vai descansar. Porque hoje à noite, a mamãe vai descansar e quem cuida dos sobrinhos somos nós, viu? Brittany riu baixinho. — Eu não mereço vocês. — Merece, sim — respondeu Lena. — Você está tentando, e isso já é muito. O amor muda tudo, Brittany. E você já começou a mudar. Quarto de Britney – 16h30 O som leve da porta sendo aberta fez Britney erguer os olhos da manta onde repousava. A enfermeira já havia saído, e agora quem entrava era a psicóloga do hospital, a mesma que a acompanhava desde o parto emergencial. — Boa tarde, Britney. Posso entrar? — Claro, doutora — respondeu com um sorriso sereno, bem diferente da mulher exausta e aflita de dias atrás. A psicóloga sorriu e olhou ao redor. Lena estava sentada ao lado da poltrona de amamentação, enquanto Nice dobrava uma mantinha com cuidado sobre o bercinho vazio. — Que bom ver você com esse semblante mais tranquilo. Dormiu um pouco hoje? Britney assentiu com firmeza. — Dormi, sim. Das oito até as treze horas. E depois tomei banho, tomei café, almocei, lanchei. E às dezoito eu janto, se essas duas me deixarem... — disse, brincando, apontando para as meninas. — Ela tá obediente, doutora — respondeu Nice, sorrindo. — E comendo tudinho, o que Teresa mandou para ela se alimentar. — E dormiu bem — acrescentou Lena. — Tão bem que nem se mexeu. A psicóloga se sentou ao lado da cama e anotou calmamente no prontuário. Depois, olhou diretamente para Britney, com a voz calma, mas firme. — Britney, eu pedi à sua obstetra que prescrever um medicamento leve, chamado Fluoxetina Flora. Ele vai ajudar a controlar a sua ansiedade, que está diretamente relacionada ao estresse do parto prematuro e aos episódios anteriores de insônia. É um antidepressivo de última geração, compatível com a amamentação. Não vai afetar os bebês nem a sua produção de leite, fique tranquila quanto a isso. Britney respirou aliviada. — Eu estava mesmo... me sentindo à beira de um colapso. — E estava mesmo — disse a psicóloga, sem rodeios. — Por isso estou aqui. Para ser sincera com você: os seus filhos precisam de uma mãe inteira, emocionalmente saudável. Mas antes deles, você precisa reagir por você mesma. Porque você também merece estar bem. E está dando os primeiros passos. Dormiu, se alimentou, aceitou ajuda. Está no caminho certo. Britney assentiu, apertando os lábios com emoção. — Você tem muita sorte, Britney. Seu pai passa aqui todos os dias antes do trabalho. E hoje mesmo me informou que contratou uma enfermeira especializada em bebês prematuros para te ajudar no período da noite. Ela olhou para Nice e Lena, depois para Britney novamente. — E como você mesma disse... suas “irmãs do coração” estão aqui com você. Isso faz toda a diferença. Ninguém vence sozinho. Lena tocou de leve a mão de Britney. — Ela vai voltar a ser a Britney que era antes — disse com carinho. Mas a resposta veio imediata, com um sorriso irônico: — Deus me livre de voltar a ser a Britney que eu era antes! Aquela lá... nem eu me aguentava. Vocês que aguentaram, são santas. Todas riram. A psicóloga também. — O bom humor está voltando. Isso é sinal de que a alma está respirando melhor. Amanhã, passo novamente antes de começar o meu turno. Quero saber se você dormiu bem com a ajuda da enfermeira e do novo medicamento, e como está se sentindo, tá bom? — Obrigada, doutora — disse Britney, sincera. — Vamos cuidar dela, doutora — garantiu Nice. — Essa versão nova da Britney já está conquistando a gente. — E a gente vai cuidar dos sobrinhos também — completou Lena. — Ela só vai precisar se preocupar em tirar o leite e descansar. A psicóloga sorriu mais uma vez, satisfeita com o progresso. Despediu-se e saiu com a tranquilidade de quem sabia que, naquela noite, Britney teria um pouco de paz.
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