O silêncio reconfortante que se seguira ao despertar de Hideo durou pouco. Bastaram alguns minutos para a sua mente agitada mergulhar nas inquietações que fervilhavam sob a superfície. E ouvir Sayuri falar sobre a sua mãe tinha acendido seu espírito protetor em relação a ela.
— A mãe... — murmurou, erguendo ligeiramente a cabeça com esforço. — Haruki... ele ameaçou ela?
A sua voz saiu carregada de raiva m*l contida, os olhos acesos como brasas. A ideia do pai ter colocado um dedo sequer sobre a sua mãe era insuportável. Ele jamais o perdoaria se tivesse feito aquilo, jamais.
Sayuri aproximou-se, pousando a mão com cuidado em seu ombro o forçando a cair sobre os travesseiros novamente.
— Hideo, por favor, não pode ficar agitado desta forma. Ainda está se recuperando... — disse ela, com firmeza e ternura.
— Me diga! O que ouve Sayuri? — insistiu ele, tentando erguer-se de novo, mas sendo vencido pela dor.
Sayuri respirou fundo antes de responder. Ela queria que ele ao menos descansasse um pouco, mas vendo o seu olhar determinado sabia que aquilo não aconteceria em quanto ele não tivesse respostas para o que o atormentava.
— Haruki... ainda não sabe que Mei saiu para pedir ajuda para você. Não sei onde ele acha que a Tia Mei está, mas ele não sabe que foi ela que pediu ajuda. — Sayuri sabia que Haruki tinha os seus meios de saber sobre aquilo, e sinceramente ela duvidava que o homem ainda não soubesse, mas não diria aquilo a Hideo.
Hideo pareceu confuso por um instante, até que algo no tom de Sayuri o fez franzir a testa. Ele não era burro e podia entender bem as entrelinhas do que ela não estava dizendo.
— Como assim? Ela saiu para buscar ajuda? Como...?
— Ricardo — disse Sayuri, com calma, deixando o nome cair como uma pedra num lago tranquilo.
O impacto foi imediato. Os olhos de Hideo se arregalam. Ele não imaginava que a sua mãe iria atrás logo do líder da Fênix em busca de ajuda.
— Ricardo?! — Hideo arregalou os olhos. — Ele... veio por mim?
Sayuri assentiu lentamente, os olhos fixos nos dele. Durante aquele dia ela pode ver algo que a tinha deixado profundamente extasiada. A forma que os membros da Fênix tratava Hideo era algo que ela sempre levaria com muito carinho. Eles realmente o viam como parte da sua família, e ela era grata por seu cuidado silencioso.
— Sim. Ele e os outros. Ricardo usou uma dívida antiga que Haruki tinha com ele... e cobrou-a.
Hideo ficou em silêncio, atónito. Aquele nome era uma lembrança distante, uma sombra do passado que ele nunca esperara ver de novo com significado. Mas agora, de repente, era luz. Ele sabia bem qual era a dívida, assim como sabia que aquela era uma das cartas mais poderosas de Ricardo contra algumas organizações, mas ele simplesmente a atinha descartado por sua causa. Agora Hideo tinha uma dívida com o seu amigo, algo que ele jamais seria capaz de pagar.
— Ele me salvou...? — murmurou, mais para si mesmo do que para ela.
— Sim, te salvou — confirmou Sayuri. — E mais do que isso. Declarou que agora você é protegido da Fênix e dos seus aliados.
Hideo virou o rosto, lutando para compreender a extensão daquilo. As palavras de Sayuri o deixavam mais atónito a cada segundo que passava.
— Isso significa que...?
— Que Haruki, mesmo sendo teu pai, não poderá mais te tocar — disse Sayuri, com voz firme. — A partir de agora, ele sabe que se te machucar, enfrentará a fúria da Fênix. E ele provavelmente não vai querer esse problema com Ricardo.
Sayuri apertou a mão de Hideo, com um sorriso trémulo, esperançoso.
— Está seguro, Hideo. Agora sim, verdadeiramente seguro.
O coração de Hideo apertou-se no peito. Pela primeira vez em anos, sentiu o calor reconfortante da proteção verdadeira. Mas também sabia que nada seria simples daqui em diante.
— Sabe que isso não é bem verdade Sayuri. No mundo em que vivemos nunca estamos realmente seguros. — Diz ele de forma tranquila, seus olhos se fechando por um momento.
— Me diga o que aconteceu para que o seu pai te fizesse isso? — Ela estava realmente curiosa sobre aquilo. Hideo enfrentava o pai constantemente, mas daquela vez tinha sido diferente, aquele castigo quase tinha lhe custado a vida.
Um sorriso amargo curva os lábios de Hideo, ele ainda se lembrava da cara de desespero do seu pai ao ver a faca no pescoço do seu meio irmão, nojo enche o peito de Hideo.
Haruki nunca tinha demonstrado a ele aquele tipo de cuidado, desde sedo ele tinha aprendido a se cuidar sozinho, era o que um Don deveria fazer. Ver o seu meio irmão sendo cuidado daquela forma acendeu algo no seu peito que ele nem mesmo sabia que existia. Primeiro o ciumes e depois o mais puro ódio.
— Ele fez isso por que eu ameacei matar o inútil do Sora. — Diz ele com um sorriso triste no rosto.
As palavras de Hideo pareciam confusas a Sayuri, mas vendo a forma que o rosto dele se escurecia ela finalmente compreendeu do que se tratava.
— Seu meio irmão. — Diz com um suspiro. — Agora entendo.
— Ele teve a ousadia de aceitar aquele bastardo em um encontro com Masato. Ele ousou esfregar ele na minha cara me humilhando e a minha mãe. Jamais permitiria isso. — As palavras foram ditas de forma firmes. Sayuri se perguntava como elas tinham deixado os lábios dele, já que ele os apertava com tanta força.
— Nunca pensei que o Tio Haruki faria isso.
— Mas ele fez. O meu pai acha que o conhece Sayuri, mas ele esta apenas alimentando a cobra que ira picar a sua mão. — Hideo enxergava com muita clareza a natureza do seu meio irmão, e apenas lamentava que o seu pai não pudesse ver o mesmo. Ele apenas torcia para que Haruki abrisse os olhos antes que fosse tarde.