Capítulo 9. Ameaça velada

439 Palavras
O corredor estava mergulhado num silêncio gelado quando fechei a porta do quarto de Clarice.Os pais dela já haviam se afastado, mas Henry permanecia ali encostado na parede oposta, as mãos nos bolsos, o olhar fixo em mim. Por um instante, apenas o som distante do respirador da UTI preencheu o espaço entre nós. — Doutor Oliver FrankWood. — disse ele por fim, num tom polido demais. — Posso tomar um minuto do seu precioso tempo? Assenti, mesmo sabendo que aquele tipo de conversa raramente durava apenas um minuto.Ele se aproximou com um meio sorriso o tipo de sorriso que não tem calor, apenas cálculo. — Clarice falou muito bem do senhor — começou. — Disse que foi… gentil. Que ficou ao lado dela mesmo fora do horário de plantão. — Eu apenas cumpri meu dever — respondi. — Claro. — Henry inclinou levemente a cabeça, como quem analisa uma peça rara. — Mas devo admitir que poucos médicos demonstram tanta… dedicação. Havia uma insinuação escondida na frase.Não precisei ouvir o tom para reconhecê-la estava nos olhos.Na forma como me observava, medindo cada reação. — Eu cuido de todos os meus pacientes da mesma forma — repliquei. — Clarice passou por um trauma severo. A presença médica constante ajuda na recuperação. — Imagino. — Ele deu um passo mais perto, diminuindo a distância. — Mas, com todo respeito, espero que não esteja confundindo zelo profissional com algo… mais pessoal. O ar pareceu mudar de temperatura.Demorei um segundo antes de responder. — Está sugerindo alguma coisa, senhor…? — Henry. — disse, com um leve sorriso. — Só Henry. Ele deu mais um passo, quase imperceptível, e baixou o tom: — Clarice é uma mulher sensível, doutor. Frágil. Está vulnerável agora. E às vezes, pessoas vulneráveis… criam laços rápidos. A forma como ele disse “laços” soou como ameaça. — Entendo sua preocupação — falei, controlando o tom da voz. — Mas pode ficar tranquilo. Eu sei bem onde termina a linha entre médico e paciente. — Que bom. — Henry voltou a sorrir, mas o olhar permanecia frio. — Porque eu também sei. E costumo defender quem amo com… intensidade. A última palavra ficou suspensa no ar.Depois ele apenas se afastou, ajeitou o casaco e caminhou pelo corredor sem olhar pra trás. Fiquei ali, imóvel, observando-o sumir na curva da ala.E por mais que tentasse racionalizar o que havia sentido, o instinto foi claro: aquele homem não estava preocupado com Clarice estava protegendo algo. Ou alguém. E pela primeira vez, uma ideia incômoda atravessou minha mente:talvez o perigo que a deixara à beira da morte ainda estivesse bem próximo.
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