A manhã estava silenciosa coberta por um céu denso e enevoado. O som seco da porta se fechando ecoou pelos corredores antigos da casa Ross. Mattheo passou calmamente seguindo em direção ao salão principal. O ar ali parecia mais frio do que o normal, e a lareira, mesmo acesa, não trazia conforto.
De trás de uma das poltronas, uma voz firme e rígida se fez ouvir:
— Vejo que saiu de madrugada de novo.
Mattheo parou no meio da sala.James Ross, seu pai, o observava com o olhar estreito, a varinha apoiada sobre a mesa.
— Estive… praticando. — respondeu Mattheo com calma, retirando as luvas e as colocando sobre a mesa.
Mas James se levantou.
— Praticando? — repetiu, o tom repleto de suspeita. — Não me venha com evasivas. A sua aura está... diferente.
Mattheo ergueu os olhos.
— Diferente como?— Perguntou em tom neutro, baixo.
— Como se tivesse conjurado algo que não devia. — James deu um passo mais próximo.— Eu sinto resquícios de magia antiga em você, Mattheo. Algo poderoso... e perigoso.
— Achou mesmo que eu não perceberia ? Eu que te ensinei tudo que sabe, moleque.— Continuou em tom firme
Mattheo manteve a postura ereta, mas o maxilar tenso denunciava a irritação.
— Não deve se intrometer nas minhas práticas. Não sou mais um menino, pai.
— Não é um menino — James interrompeu, a voz firme, — mas ainda age como um. Mexer com magia de vínculo, magia de sangue...
Mattheo o encarou, os olhos escurecendo como se uma sombra passasse por eles.
— O senhor não entende.
— Entendo perfeitamente! — James ergueu a voz, batendo a palma da mão na mesa. — Está se enfiando num caminho que já destruiu muitos bruxos tolos! Magias como essa corrompem, Mattheo. O Sanguis Vinculum não é um laço... é uma maldição, se usado da maneira errada.
— Eu não usei da maneira errada. — Mattheo respondeu entre os dentes.
O silêncio se instalou por um instante.James se aproximou mais, a sombra dele se projetando sobre o rosto de Mattheo.
— Você se ligou a ela, não foi? À garota Tomeras.
Mattheo desviou o olhar, mas não respondeu. Isso foi o bastante para confirmar.
James bufou, incrédulo e irritado.
— Você tem ideia do que fez? Agora vocês estão conectados por sangue. Tudo o que acontecer com ela, afetará você. Se ela for ferida… se for amaldiçoada...
— Eu sei dos riscos. — Mattheo rebateu com firmeza, os olhos faiscando. — E foi exatamente por isso, que fiz.
James ficou em silêncio por um momento, e então, com um suspiro carregado de raiva contida, murmurou:
— Eu jamais faria isso, você é um t**o!
Mattheo ergueu o queixo, o olhar frio e decidido.
— Pouco me importa se você faria ou não, eu fiz. — Mattheo responde ríspido.
O silêncio voltou a dominar a sala, denso, tenso, cheio de verdades não ditas.James o observou por longos segundos, até finalmente virar as costas.
— Vai se arrepender, moloque — murmurou, antes de desaparecer pelo corredor.
Mattheo permaneceu ali, parado, sabia que seu pai estava certo sobre uma coisa: aquele feitiço os havia unido de uma forma que ninguém mais entenderia.
Mas, ao contrário do que ele pensava, Mattheo não se arrependia.