" Boas recordações é o que levamos desse plano."
Por: Larissa.
Como pode, de um dia para o outro, as coisas mudarem tanto?
Ontem foi um sábado incrível. Estavam perto de mim aquelas pessoas que amo e tenho um carinho imenso. A alegria preenchia cada canto da minha casa. Foi meu aniversário, completei dezenove anos, então fizemos uma pequena comemoração com direito a churrasco, bolo de coco e o tradicional chimarrão. Não gosto muito, mas meus convidados sim.
Relembro das minhas amigas perguntando- me, quando eu daria uma chance para o Daniel, filho do dono de um comércio agropecuário que fica na cidade. O rapaz é bonito, loiro, alto, de olhos claros, mas não senti "as borboletas voando no estômago" quando trocamos uns beijos. Na realidade, meu primeiro beijo foi com ele.
Apesar de ter ficado encantada quando o conheci na festa expor-agro da nossa cidade, hoje só o tenho como um amigo.
O encanto acabou quando nos beijamos. Não senti nada, nenhuma mísera faísca percorreu meu corpo. Foi frustrante!
_ Estás sempre a ler esses livros de romance água com açúcar, criando expectativas. A vida real é bem diferente, docinho.- disse Marina, tacando uma almofada em minha direção.
Estávamos sentadas no tapete do meu quarto, conversando sobre nossas vidas afetivas. Na realidade, eu ouvia mais as minhas amigas falarem.
Marina, Sophia, Amanda e Amália tinham mais bagagem quando o assunto são as coisas do coração. Já eu, fico esperando que as sensações me mostrem que realmente estou amando. Não quero ter um relacionamento só por ter, quero mais que isso. Muito mais!
_ Meus livros não têm influência nenhuma sobre minhas escolhas, apenas não quero namorar agora. - rebati, mentindo. Meus livros têm sim influência!
Amália saiu em minha defesa, sempre tomando as dores dos outros como suas.
_ Ela está certa! Se não gosta do Daniel, é melhor nem dar esperanças. Vocês pararam para pensar se o cara fica obcecado pela Larissa e começa a persegui-lá, por não aceitar, sei lá, que a menina não quer mais nada com ele? Isso se porventura, eles tivessem um "rolinho" e Lari terminasse? Não quero ter uma amiga fazendo parte das estatísticas do feminicídio.
O silêncio se instala e as meninas ficam com os olhares assustados, feições pensativas.
_ Vamos deixar esse assunto, Larissa e Daniel, de lado. - falou Amanda impaciente - Revelarei algo para vocês, contudo me prometam que o que vou falar não vai sair daqui! - ela olha para nossos rostos com expectativa - Prometem? - perguntou eufórica - Estava ansiosa para dividir isso com vocês! - completou com evidente empolgação na voz.
Todas nós curiosas prometemos, olhando para a ruiva.
Amanda levou às mãos ao rosto, depois de uns minutos disparou" transei com o Renato".
Ficamos meio inertes diante da confissão.
_ Sua safada! As quietinhas são as piores!- falou Sophia.
_ Como foi isso?- perguntei sem acreditar no que eu tinha ouvido.
_ Como foi isso! Não acredito que você não saiba como os bebês são feitos, Larissa? - Marina falou em sussurros.
_ Não sou tão puritana Marina, me refiro ao fato do Renato ter namorada!- falo relembrando as minhas amigas esse detalhe.
_ Caramba é verdade, Sophia! Apesar deles ficarem naquela de cão e gato, separando e reatando, estão quase noivos. Bom, é o que a mãe dele fala quando conversa com a minha.- Amália falou, enquanto puxava um fio da franja da almofada.
_ Como é mesmo o nome da garota?- perguntou Sophia varrendo nossos rostos com o olhar.
_Clarisse. O nome da dela é Clarisse, filha de um dos tratadores do senhor Greco.-respondi.
_ Eu não gosto dela, muito nariz em pé. - Marina falou arrumando o cabelo com os dedos - Prova de que é tão metida, é o fato de ter dez anos que a Lari mora aqui e nunca conversaram, né amiga?- perguntou me olhando.
Eu suspirei, pensando que Amanda está muito ferrada por se envolver com alguém comprometido e ainda por cima cultivar amores por este.
_ Na realidade nos trocamos poucas palavras. Ela é uma pessoa muito na dela.- respondi, desviando o olhar para Amanda que esta sem jeito com o rumo da conversa. Deve ser muito r**m ouvir falar da namorada de quem se ama.
Acho que Sophia também percebeu o mesmo, pois mudou o foco do assunto.
_ Mas vamos ao que interessa! Conta pra nós os detalhes Amanda, onde foi, como foi.... vamos amiga! Estou me corroendo de curiosidade! - no mesmo instante nós ficamos com a atenção fixa na garota.
A ruiva ficou rubra, deu um sorrisinho e logo começou a narrar por alto.
_ Foi incrível! Ele foi super carinhoso, eu estava muito nervosa. Foi minha primeira vez!- falou tapando o rosto com às mãos, tipico de quem está com vergonha- Senti dor no começo mas foi muito bom depois, as sensações indescritíveis. No final ficamos agarradinhos debaixo do cobertor. Ele foi tão cuidadoso, me limpou e até já tinha uma pílula do dia seguinte para que eu tomasse.- relatou com os olhos brilhantes.
_ Você é louca Amanda! Se seus pais souberem.- falei incrédula com a coragem da garota.
_ Nem fala uma coisas dessas Larissa! Minha mãe me esfola viva, meu pai nem sei do que ele é capaz de fazer! Mas, fiz e não me arrependo!- disse sem receio algum.
Marina, que dentre nós é a mais experiente no assunto desatou à falar.
_ Só não pegar barriga, seja esperta! E usa camisinha. Não seja burra, se ele tem namorada e trepou com você, trepa com mais mulheres. Pílula do dia seguinte não vai te previnir de uma doença. Agora amiga, fode bastante mesmo aproveita porque o negócio é gostoso pra c****e!
Fiquei horrorizada com o linguajar de Marina; ela tem uma vida s****l muito ativa, porém procura parceiros longe da nossa cidade para que os pais não descubram.
Comparando a situação de Amanda com a de Marina, vejo tanta diferença. Amanda se entregou por gostar de Renato, embora ela esteja errada por ele ser comprometido. Agora, Marina, no início, só procurou sexo por curiosidade e agora por prazer, diz ser viciada no ato.
Eu não tenho essa coragem de me deitar com um homem só por ter vontade, desejo. Eu desejo mais que isso.
Lembro que nossa conversa foi interrompida por minha mãe nos chamando para almoçar.
Depois do almoço, teve o bolo e uma enxurrada de fotos.
Naquele dia, olhando para minhas amigas, percebi que elas fazem parte de mim, são as irmãs que não tenho.
Nós nos conhecemos na escola e desde então não nos separamos mais.
Deixo as lembranças num canto da minha mente e olho apreensiva pela janela, a chuva fina cai sem trégua. Nenhum sinal do meu pai e muito menos da minha mãe. Hoje, está um domingo estranho, triste e de clima pesado.
Logo pela manhã, meu pai recebeu um telefonema. Era o gerente da fazenda pedindo ajuda. Pelo que ele falou, seu Gerardo caiu nas baias dos cavalos, se retorcendo de dor. O homem berrava pelo telefone, visivelmente nervoso. Meu pai saiu desesperado, entrou na caminhonete e correu para o local.
Minha mãe foi para a mansão dos Grecco e eu estou aqui aflita, sem saber o que está acontecendo.
"Será que o seu Gerardo caiu de um dos cavalos? Será que um dos animais deu um coice no patrão ?"- Fico formulando perguntas para tentar aplacar esse nervosismo que estou sentindo.
Olho para o celular em minhas mãos, não recebi nenhuma ligação dos meus pais até o momento.
Minha mãe ficou de me dar notícias e até agora nada!
"São dez horas. Quando o gerente ligou eram sete da manhã. Será que foi algo grave?"- pergunto mentalmente para mim mesma.
Sou desperta pelo barulho do aparelho tocando, olho o visor e atendo a chamada.
_ Oi, mãe!
_Filha, esquenta a comida que tem na geladeira só para você, eu vou ficar aqui na mansão e seu pai não vai comer em casa.- diz com a voz de preocupação .
_ O que houve com o seu Grecco? Ele está bem?- pergunto curiosa.
_ Não sei ainda. Seu pai e o gerente levaram ele para o hospital, dona Violeta foi junto com os seguranças. Até o momento seu pai não me deu notícias.
_Será que é grave mãe?
_ Não sei Larissa, vamos orar para que não seja.
_ Sim mãe, bom qualquer notícia a senhora me avisa, tá?
_ Tá minha filha. Lari não esquece de ligar para sua tia e perguntar sobre o curso na faculdade, ela ficou de avisar quando iria abrir as inscrições para as novas turmas, no entanto com a correria do dia a dia, ela pode esquecer, você sabe.
_ Está bem, eu vou ligar. Beijos.
_ Beijos.
Peço a Deus em silêncio para que guarde e proteja o senhor Gerardo. Apesar de ele ser rude comigo, é um ser humano e me compadeço.
Ligo para minha tia, irmã do meu pai, que mora em Minas Gerais, e fico sabendo que não há previsão ainda para a formação de novas turmas, já estamos no final de março. Minha indecisão sobre o que cursar levou-me a perder alguns vestibulares em universidades públicas. Então, meu pai me incentivou a procurar por uma particular que ele custeará.
Decidi procurar uma faculdade fora do estado e resolvi ir estudar em Minas Gerais, onde minha tia mora. Uberlândia tem universidades particulares e, após pesquisar, decidi pelo curso de Engenharia Civil.
Minha mãe torceu o nariz para minha escolha, pois queria que eu fizesse Veterinária. Na realidade, não sei nem a razão para escolher o curso de Engenharia, mas o que me empolga é poder morar em outro lugar, saindo do Rio Grande do Sul.
"Quem sabe o amor da minha vida é de outro estado ?Na vida tudo é imprevisível."-penso.