" Certas palavras são piores do que uma agressão física, as palavras tem o poder de ferir a alma e nem o tempo é capaz de apagar suas marcas."
Por: Larissa.
Acordo com o alarme do celular, berrando. O quentinho debaixo das cobertas faz com que eu queira ficar mais um pouco deitada.
_ Vamos, Larissa. Temos serviço de sobra hoje - a voz da minha mãe invade o meu quarto, junto com sua cabeça que aparece na porta entreaberta.
Levanto-me e vou à procura de uma roupa sóbria, como o entojado falou.
_ Custava falar "roupas de cores neutras", tinha que gourmetizar a frase. Pior foi eu que tive que procurar o significado do que ele falou na internet! - murmuro sozinha.
Pego uma calça jeans clara e uma blusa de moletom branca. Sigo para o banho, que é uma tortura nesse frio de lascar.
Depois devidamente arrumada, vou para a cozinha tomar café com meus pais.
_ Bom dia! - falo assim que chego.
_ Bom dia, princesa! E aí, nos conta o que foi que aconteceu ontem na casa dos Grecco? - meu pai pergunta.
Paraliso com a xícara a caminho da boca. Olho para os dois.
_ Fala, Larissa. Carmem me contou por alto depois que dona Violeta veio até mim para me dizer que você ficará encarregada na limpeza dos quartos e não mais ajudando a servir à mesa - minha mãe diz, cruzando os braços.
Sem saída, repouso a xícara no pires.
_ O filho da senhora Grecco não gostou de me ver servindo à mesa com o cabelo solto. Acontece que foi sem querer, não tenho costume de prendê-los e acabei esquecendo de fazer isso. - Falo apreensiva.
_ Não se preocupe, Lari, amanhã a nova funcionária vai começar no serviço. O senhor Pietro aprovou uma candidata dentre as entrevistadas, portanto hoje será o seu último dia .- minha mãe revela.
Sinto algo pesar dentro do meu peito, uma angústia subir pela minha garganta.
" Droga, eu deveria estar feliz e não me sentindo ...triste."- fico pensativa.
_ O que houve filha? - meu pai pergunta.
_ Nada, só estou pensando em fazer aquele cursinho de línguas estrangeiras que o senhor comentou comigo, lembra? Preciso ocupar meu tempo. - minto descaradamente e em seguida coloco um pedaço de bolo na boca para não ter que falar mais nada.
_ Claro, minha menina!- ele fala com um sorriso no rosto- Hoje mesmo farei sua inscrição.- completa cheio de empolgação.
Não demora muito para minha mãe e eu estarmos cruzando o limiar da porta da cozinha da mansão dos Grecco. Meu coração começa a acelerar só de pensar que vou cruzar com o metido a b***a.
_ Fique por aqui, enquanto ajudo as meninas na sala de jantar.- minha mãe pede.
_ Sim. - respondo.
Fico parada perto da janela, observando o horizonte. O verde da vegetação ao longe fica mais viçoso conforme os raios de sol a iluminam. Passo a mão pelo meu cabelo e o posiciono de um lado do pescoço.
De repente, sinto que estou sendo observada. Minha pele queima e meu corpo é cortado por uma eletricidade. Ao me virar, levo um susto ao ver o homem parado na entrada da cozinha, me olhando com seus olhos de águia, suas mãos posicionadas dentro do bolso da calça que veste, exalando mistério por todos os poros.
_ O senhor precisa de algo? - pergunto, gaguejando.
Ele não fala nada, apenas sai do local, me deixando com as bochechas em chamas.
Tremendo feito uma vara de verde, pego um copo de água e engulo o líquido em grandes goles.
" O que foi isso?"
Apoio-me na ilha e tento controlar minha respiração descompassada.
_ Acho que vai ser bom mesmo eu me afastar daqui. Ficar vendo esse homem não está me fazendo nada bem.
Depois de uns quarenta minutos contados no relógio, minha mãe surge na cozinha.
_ Pode começar com a limpeza, Larissa, aproveita que dona Violeta e o filho saíram.
_ Tentarei ser o mais ágil possível, mãe. Por onde eu começo?
_ Pelo terceiro andar, limpe primeiro o quarto dos patrões e depois os demais. Não precisa lavar os banheiros sociais, eles estão limpos. Não retire a roupa de cama, hoje não é dia.
Escuto tudo com atenção, pego os produtos necessários e os demais utensílios e começo a minha jornada.
A suíte da dona Violeta parece mais pertencer a um palácio. O luxo reverbera pelo lugar. Sem tempo para admirar cada item que compõe a decoração, trato de lavar logo o banheiro, que é imenso.
Quando finalizo, começo a arrumação e a limpeza dos móveis.
O calor me consome, então retiro a blusa de frio e a amarro na cintura.
Depois de deixar o quarto imperial brilhando, rumo para o próximo, que é o que o senhor Pietro ocupa.
Ao entrar, sou recebida por um perfume marcante com notas amadeiradas. Olho ao redor e o ambiente está impecável, com a cama forrada e nada fora do lugar. Sigo para o banheiro, esperando encontrar uma bagunça tremenda, e me engano redondamente.
"Cruzes, nem parece que alguém dormiu aqui!" - penso.
Mesmo assim, faço a higienização do local.
O tempo voa e finalmente só resta um quarto do segundo andar para limpar. Eu me encontro um caco, com a pele coberta por uma camada fina de suor, cabelos desgrenhados num coque fajuto que fiz, unhas lascadas e com as costas doendo.
_ Céus, isso é pior do fazer exercícios na academia. - reclamo, andando com um monte de produtos nas mãos, fazendo um equilíbrio ferrenho.
Caminho até a porta que fica no final do corredor.
_ Não entendo a razão para tantos quartos de hóspedes se não recebem ninguém. Ficam parados sem uso, verdadeiros depósitos de pó. - falo baixinho para mim mesma.
Coloco os utensílios no chão e, ao girar a maçaneta da porta, percebo que está trancada. O som ríspido de uma voz conhecida para os meus ouvidos me paralisa.
_ O que pensa que está fazendo, garota atrevida? Afaste-se daí imediatamente.
Sou arrancada com brusquidão do lugar onde estou. Arregalo meus olhos conforme Pietro me segura pelos braços, aplicando um aperto mortal.
_ Vocês, subalternos, nunca sabem o lugar que ocupam, bando de ignorantes sem instrução! Não sabem cumprir uma ordem! Todos aqui sabem que é proibido entrar nesse quarto! Qual é o seu problema, sua chucra dos diabos? Sua roceira infeliz! - ele vocifera ofensas, enquanto dá sacudidelas em meu corpo.
Tento falar, mas sou lançada para o outro lado do corredor, meu corpo colide com a parede. Sinto uma dor irradiar-se por meus ossos.
Pietro aproxima-se de mim, seu corpo se chocando com o meu, intimidando-me.
_ Suma daqui, sua caipira do c*****o! Nunca mais apareça na minha frente! - esbraveja a plenos pulmões.
Saio correndo do local, deixando tudo para trás. Escuto, quando estou perto da escada, um grito animalesco e em seguida o barulho de um soco forte sendo dado na parede.
Desço os degraus rapidamente e sou amparada por Carmem e minha mãe, que aparecem correndo, assustadas.
_ O que foi, menina? Você está gelada e tremendo feito um filhote de passarinho.
Não consigo contar o que aconteceu, sinto meus joelhos fraquejarem e apenas olho para o topo da escada, onde o sujeitinho surge transtornado. Ele aponta para mim e percebo que sua mão está ferida, sangue escorre pelo dedo.
_ Essa fedelha está proibida de entrar aqui e se alguma de vocês se compadecer dessa i****a, que sigam o mesmo caminho: rua!- berra .
Minha mãe se empertiga e, no momento em que vai abrir a boca, eu seguro a sua mão com o restante da força que tenho e balanço a cabeça, num pedido de silêncio, para que não fale nada.
É loucura querer discutir com alguém completamente alterado; seria como colocar gasolina no fogo e provocar um incêndio.
_ Por favor! - sibilo para dona Luzia.
Carmem me guia para a cozinha, onde me dá um copo de água com açúcar. Minhas mãos tremem tanto que um pouco do líquido cai no chão.
_ Acalme-se, Larissa. Precisamos saber o que aconteceu - minha mãe diz.
Respiro fundo.
_ Não sei, fui limpar o último quarto que faltava do segundo andar e de repente, ele surgiu começou a gritar e... ele é louco, um desequilibrado - falo aos tropeços.
Dona Luzia e Carmem trocam olhares.
_ Eu esqueci de avisar, filha que nós funcionárias não podemos entrar num dos quartos que fica no segundo andar, é o que se encontra no final do corredor. É um comodo proibido, regras da casa. Me perdoa, Larissa. - olho para a minha mãe que está com a expressão aflita.
_ Não fica assim, Luzia. É normal esquecermos, somos humanos e cometemos falhas. Agora, a atitude exagerada do senhor Pietro é imperdoável. Eu disse que esse homem não é coisa boa. Eu sinto as energias das pessoas e a dele é densa, pior do que a do senhor Genaro - Carmem fala.
_ Vai para casa, filha. Descanse e não pense mais nisso.- minha mãe se manifesta.
Me sentindo péssima, catando o resto do orgulho que tenho, deixo a residência dos Grecco, desejando nunca mais cruzar com Pietro.