As lembranças vieram com tudo, daquela manhã, depois da noite que passamos juntos… Eu nunca esqueci aquele dia:
FLASH BACK ON 10 ANOS ATRÁS.
...
Merda! Eu dormir de mais... Estava exausto, aquela noite foi surreal, a entrega de Clarisse, foi a nossa primeira briga e a nossa primeira reconciliação...
Mas eu perdi a cabeça e paguei pelas consequências...
Assim que entrei em casa, ainda com a adrenalina de acelerar a toda velocidade pra chegar antes do acordar dos meus pais, mas foi em vão.
senti o golpe no estômago, assim que meus olhos bateram neles parados no meio da sala.
Malas espalhadas no hall, funcionários correndo de um lado para o outro, carregando caixas, fechando portas, como se tudo já estivesse decidido e eu, o último a saber.
— O que é isso?
minha voz saiu dura, incrédula.
Minha mãe me encarou como quem dita uma sentença.
— Sua avó passou m*l, Estamos indo embora. Agora. E Você não passa mais um dia nessa cidade imunda.
Eu ri, nervoso.
— Indo embora? Você não pode fazer isso, eu tenho coisas aqui!
— Você? Está vendo... Agora até o respeito ele perdeu. E você não tem nada aqui, Edgar! A sua avó pode está morrendo sabia? E é nessa menina que você está pensando?
ela cortou, cada palavra mais fria que a outra.
— É só uma menina vulgar que conseguiu virar você contra nós. Você não vai destruir o nosso nome por causa dela.
Virei para o meu pai, o único que ainda podia colocar razão naquela cena.
— Pai?
Ele apenas suspirou, fechando a mala com calma, sem me olhar nos olhos.
— Os negócios não deram certo. Não precisamos mais estar aqui.
Senti o sangue ferver.
— Como assim não deram certo? Você mesmo disse que esse lugar seria o seu trunfo! Agora simplesmente… desiste?
O olhar dele foi de repreensão, quase de aviso.
— Eu sei o que faço. Estamos indo embora.
Minha mãe avançou um passo, olhos faiscando.
— Ou você entra nesse carro conosco, ou perde tudo. Dinheiro, futuro, respeito. Vai querer viver aqui como essas pessoas? Vai trocar a vida que tem por uma menina sem futuro?
ela ergueu o queixo, venenosa.
— Só espero que ela não tenha engravidado, porque eu não vou criar filho de dois irresponsáveis.
Cada palavra dela me queimava por dentro. Eu queria gritar, queria enfrentá-la, mas meu pai se aproximou, a voz mais baixa, quase conspiratória:
— Deixa a poeira baixar, filho. Depois você volta, explica tudo a ela. Se você enfrentar sua mãe agora, ela vai destruir essa menina. É isso que você quer?
Meu peito estava em guerra.
Tudo dentro de mim gritava para correr de volta para Clarisse, mas eu sabia que ele tinha razão. Minha mãe era capaz de tudo.
Engoli seco.
— Alguns dias filho… espera ela esquecer. Depois você volta.
— A minha avó não está doente não é?
Ele só negou, cúmplice. Suspirei pesado sentindo o rancor que crescia a cada segundo a mais em mim.
— Entra no carro, eu dou minha palavra que faço você voltar aqui...
...
Foi assim que eu entrei naquele carro, calado, com a sensação de estar abandonando metade de mim.
Mas minha mãe não parou ali.
Após o pouso, ela fez questão de fincar a faca ainda mais fundo.
Quando o carro parou em frente à mansão, eu a vi: Liana, minha ex, acompanhada dos pais.
— Você chamou eles aqui?
perguntei, incrédulo.
— Você deve uma explicação a Liana. Não se termina um namoro por celular. Principalmente a filha de pessoas tão queridas pra nós, o sócio do seu pai! E Depois disso, vai por a cabeça no lugar.
A voz da minha mãe era de ferro.
Desci do carro furioso. Liana abriu um sorriso pequeno, tímido.
— Edgar…
Passei direto, sem nem olhar para ela.
Cada passo que eu dava, a raiva crescia. Minha mãe podia ter me arrancado de Clarisse, mas nunca conseguiria apagar o que eu sentia.
Nunca.
...
Os dias seguintes.
Minha mãe cuspia veneno, me jurando que nunca mais eu veria Clarisse.
Meu pai me segurando pela palavra, prometendo que depois me ajudaria a voltar.
Demorou. Demorou muito. Mas ele cumpriu.
Quando finalmente consegui voltar àquela cidade, já era tarde demais.
A casa dela não era mais a mesma. Os pais tinham se separado, e ninguém sabia direito onde Clarisse estava.
Na escola, tudo o que encontrei foram risadas nojentas, moleques imbecis zombando de mim, falando sobre ela… e sobre um maldito vídeo.
— Olha lá, o playboyzinho voltou pra procurar a namoradinha!
um deles debochou.
— Será que ele já viu o vídeo dela? Que potência em, até eu voltaria.
Meu sangue ferveu.
Não fazia ideia do que aqueles imbecis falava, mas já estava no limite do surto e partir pra cima dele. O empurrei enfurecido..
— O que você disse?
O primeiro soco partiu dele, mas eu devolvi. Eu precisava calar aquelas bocas, precisava arrancar aquelas palavras da existência.
Apanhei. Bati também. Mas nada daquilo apagava o que eu tinha ouvido.
...
Corri até a casa onde morávamos.
Talvez, só também ela estivesse lá, me esperando.
Mas senhora que abriu a porta disse que Clarisse tinha aparecido algumas vezes… procurando por mim.
Eu fiquei sem chão. Ela me procurou. Ela esteve ali. E eu não estava.
Como alguém simplesmente some assim?
Desesperado, procurei pelo vídeo. E quando encontrei…
Meu mundo desabou.
Era ela. Clarisse. Exposta, gravada, reduzida a um objeto de escárnio barato. Meu peito queimou e a raiva tomou conta.
Soquei o carro até os nós dos meus dedos abrirem, mas nada me devolvia o que eu tinha perdido.
Eu não sabia por onde começar.
Fazia dias que ninguém a via. Até que me disseram: uma semana antes, a família dela tinha ido embora. Envergonhados, de malas feitas, sem olhar para trás.
E eu? Eu fiquei em um beco sem saída.
13 dias... Foi o que eu perdi, se eu chegasse um pouco antes, talvez tudo fosse diferente.
Procurei parentes, vizinhos, qualquer rastro. Nada. Só silêncio.
Meu pai me ligou, exigiu que eu voltasse.
Minha mãe descobriu, estava fora de si, ele disse que ela passou m*l, estava hospitalizada, mas eu sabia que isso era só mais uma das suas manipulações pra me manter sob seu controle doentiu.
Eu a odiava a cada dia mais.
— Ela sumiu pai! Sumiu... E eu não vou sair daqui sem encontrar ela.
Ele Jurou que me ajudaria. Eu obedeci, mas voltei pior do que tinha saído. Mais vazio.
Os anos de procura foram intermináveis. Vasculhei redes sociais, cadastros, qualquer canto que pudesse ter o nome dela. Mas era como se Clarisse tivesse evaporado do mundo.
E a vida não parou para me esperar.
Assumi parte dos negócios do meu pai.
Liana sempre estava lá, em cada festa, em cada jantar, em cada maldito evento da minha mãe.
Eu resisti o quanto pude, mas a angústia foi corroendo. O peso de não encontrar Clarisse foi matando qualquer esperança, até que… eu me deixei levar.
Liana não era Clarisse. Nunca seria. Mas estava ali, oferecendo o que podia, enquanto eu afundava.
Anos depois meu pai adoeceu. Parkinson. Não conseguia mais segurar uma caneta sem tremer, quanto mais assinar contratos. E eu não tive escolha, precisei assumir tudo sozinho.
Foram cinco anos de procura incansável. Depois, outros cinco anos apenas existindo. Vivendo no automático.
A marca que Clarisse deixou em mim era irreparável, nunca cicatrizava.
Nada me deixava satisfeito, e eu fui me fechando, me entregando a bebidas, a saída noturnas, a farras. Tudo na tentativa de esquecer.
E eu esqueci...
Até agora.
Porque hoje, Clarisse voltou para mim como um furacão.
Hoje, o olhar dela rasgou minha alma e me fez sentir tudo de novo.
A mesma dor.
O mesmo vazio.
A mesma culpa.
Eu fui imaturo.
Podia ter batido o pé. Podia ter ido atrás até o fim.
Mas eu era só um garoto.
Posso ter perdido a mulher da merda que é minha vida..
Mas não acabaria assim! Ela vai ter que me ouvir...
Tudo que ficou entalado por todos aqueles anos. Eu precisava saber onde ela estava, porque nada tinha seu nome.
Por anos eu achei que ela tinha até morrido, não era possível alguém sumir daquela forma. Era um mistério que eu faria tudo pra desvendar.
E eu não vou parar até que isso aconteça.
...