Liguei outra vez. Nada. Outra. Nada. Até que…
— Aqui é a Donna, amiga dela.
a voz firme cortou a linha.
— Não liga mais pra ela, Edgar!
Minha respiração falhou.
— Onde ela está?
— Você acha pouco o que já fez? Escuta bem: se você voltar mais uma vez, eu mesmo acabo com você. Deixa ela em paz!
— Eu preciso falar com ela! Me escuta, onde ela está?
— Pra quê? Pra enganar de novo? Pra machucar? Ela já tinha superado, sabia? Estava feliz… até você aparecer e virar a vida dela de cabeça pra baixo em uma semana!
— Eu a amo, p***a!
berrei, a garganta queimando.
— Amo pra c*****o! Tá tudo uma merda, mas eu não tenho escolha!
O silêncio dela foi pior que qualquer insulto. Quando voltou a falar, veio como punhal.
— Você sempre tem escolha, Edgar. O problema é que ela nunca é a sua.
O peito ardeu como se tivesse levado tiros.
— Agora aceita tua merda de escolha, vai lá… faz tua família. E espero, de coração, que seja muito infeliz.
A ligação morreu.
Eu urrei. Joguei o celular contra o vidro da frente, o barulho estilhaçou o silêncio do carro. Bati no volante, xinguei, praguejei. Nada aliviava.
Respirei fundo, tentei religar.
O Celular deu desligado.
Olhei pro hospital.
Mas não voltei.
Não queria olhar na cara de ninguém.
Ninguém ali me entenderia, ninguém entenderia o que Clarisse era pra mim.
E então, por ironia.
O telefone tocou.
O coração disparou. É Ela!
Peguei rápido. Mas não. Era Cadu.
Atendi, frustrado.
— Que foi?
— Edgar? c*****o, soube que a Liana passou m*l. Sua irmã tá surtando. O que aconteceu?
Passei a mão no rosto, tentando organizar o caos.
— Preciso que me ajude com uma coisa.
— Fala logo.
— Preciso encontrar a Clarisse. Tem que ser agora.
A risada irônica dele veio como tapa.
— Sua noiva no hospital e você preocupado em achar a garota?
— A Liana está bem! Já tá medicada, foi só estresse. Escuta, Eduardo… eu tô a um passo de fazer a maior burrada da minha vida. Eu vou casar com a Liana, mas preciso encontrar a Clarisse. Você vai me ajudar ou não?
Ele suspirou, hesitando.
— A tua irmã vai me matar se souber que tô te ajudando a achar a mulher que tá destruindo essa merda toda.
— Ela não precisa saber.
Um silêncio tenso, até ele ceder.
— Tá… vem pra cá. Vou tentar dar um jeito de achar ela pelo sistema.
Meu peito disparou.
— Tô indo!
Desliguei. Liguei o carro. Acelerei. Não havia volta.
....
CLARISSE:
Eu estava em pedaços, domada, despedaçada de tanto amor não correspondido.
Me joguei nos braços da Donna, chorando como uma criança.
— Por que comigo, Donna? Por que a vida insiste em me fazer sangrar desse jeito?
soluçava, engasgada em dor.
Ela acariciou meus cabelos, firme, mas doce.
— Porque você é boa demais pra ele, Clarisse. Boa demais pra qualquer um.
Chorei como se tivesse engolido uma tempestade inteira. As lágrimas caíam pesadas, quentes. Donna não soltou. Achou um lenço, limpou meu rosto.
Eu acreditei por um instante que dessa vez, a gente fosse dar certo ... Que por um momento, ele podia desistir de tudo, de me escolher.
Mas Donna estava certa, a todo momento ele sempre teve escolha, mas eu nunca fui ela.
Estava cansada de chorar, cansada de dar murro em ponta de faca, estava exausta disso!
Ergui minha muralha. Precisava. Se não, eu morreria ali, sufocada.
— Chega, Donna... Chega!
enxuguei os olhos, firme, decidida.
— Eu vou aceitar o convite do Gusmão. Eu vou aceitar agora!
Ela me olhou confusa.
— Eu não vou ficar aqui… Não vou assistir ele casar. Não vou ficar aqui pra ver ele tentar me convencer de receber só metade... metade meu, metade de outra mulher. Não vou assistir a vida que eu sempre sonhei com ele sendo vivida por outro corpo, por outra mulher.
Peguei o celular e, sem pensar duas vezes, mandei uma mensagem curta.
— Quero fazer a viagem. Mas tem que ser amanhã.
Donna arregalou os olhos.
— Clarisse, não toma decisão precipitada...
Eu ri sem humor.
— Decisão precipitada? Eu já tive prova suficiente de que o amor é uma ferida aberta pra mim. Eu não vou ficar aqui pra ver ele casar.
minha voz saiu quase num grito, amarga, rasgada.
Donna não retrucou. Apenas suspirou e segurou minha mão.
Logo o celular vibrou.
Era Gusmão.
— Tive um problema pessoal, vou precisar adiar a viagem... Só posso sair daqui quando resolver Bianca. A viagem só está marcada pra três dias depois...
Três dias... Justo no maldito dia em que ele estaria no altar.
Meus dedos tremeram, mas respondi rápido:
— Não tem problema. Eu vou na frente. Você vai depois, quando conseguir.
Ele tentou argumentar, perguntou o que tinha acontecido, por que tanta pressa.
Respondi seca, como quem sentencia:
— Só estou cansada dessa cidade. Mas se você não quiser, eu cancelo.”
Houve silêncio por alguns segundos. Então ele cedeu.
“— Tudo bem. Vá na frente. Eu encontro você lá assim que resolver as coisas. Passo pra te pegar pro aeroporto, eu vou resolver tudo e vou até você la.”
Assenti sozinha, limpando as lágrimas.
— Eu vou.
falei em voz alta, como se precisasse me ouvir.
Olhei pra Donna, que respirava fundo, aflita.
— Ai, amiga...
Passei as próximas horas ao lado dela arrumando minhas malas. Desativei minhas redes sociais. Enterrei aquela vida de vez.
Donna, mesmo com o coração apertado, tentava me convencer.
— Você tem uma oportunidade que nenhuma outra teve. Gusmão vai saber te amar de verdade, Clarisse. Mesmo que você não o ame...
Eu apenas acenei, sem forças pra discutir.
Aceitei que aquele seria o meu futuro.
Ou, pelo menos, era o que eu acreditava.
As horas que se seguiram foram um ritual de desmonte e montagem.
Tirei todas as fotos do meu celular que tinham cara de lembrança, desativei perfis, apaguei mensagens que poderiam voltar como faca.
Apaguei o perfil profissional por um tempo, a vida que eu tinha me abrigava, mas também me prendia.
Se eu ia longe, precisava ir limpa. Se eu ia sumir, precisava mesmo sumir de tudo. Recomeçar... Uma vida nova ao lado do Gusmão. Como sua.
Donna empacotou minha mala com mãos práticas: calcinhas simples, vestidos que não marcassem, um biquíni que eu nunca usaria para ser vista e sim para afogar o rastro da minha história.
Ela escolhia as peças como quem escolhe peças de escape. Cada dobra era um pouco de coragem costurada.
— Não faz nenhuma loucura de cabeça quente, tá? —
ela avisou, enquanto enrolava meu casaco.
— Não some por aí sem avisar. Se o Gusmão pisar na bola, eu vou atrás dele.
Eu sorri pela primeira vez de verdade naquele dia.
A voz dela, áspera de preocupação, era também uma âncora.
— Eu sei.
respondi.
— Você é a única pessoa que me amou de verdade sabia? Eu nunca vou ter como agradecer isso.
Ela me abraçou negando.
— Só não me faz chorar.. eu odeio chorar.
Acabei rindo no meio do choro.
Não era o fim... Era meu começo...
Só mais um recomeço.
Eu só… preciso ir.
E se for pra ir, que seja longe.
...