- ALESSANDRO: DESCOBRINDO SOBRE ELA

1780 Palavras
Ponto de vista de Alessandro Estou no meu quarto. Acabei de saber que Aurora e Kira saíram juntas. Me contorço em pensamentos, uma inquietação me consome por dentro. Nessas últimas duas semanas, fiquei ainda mais próximo de Kira — e cada vez mais fascinado por ela. Ela não é apenas uma combatente letal. Vai muito além disso. É estratégica, fria, mas ao mesmo tempo surpreendentemente lúcida, inteligente e astuta também fora do campo de batalha. Tivemos uma conversa que me desmontou por dentro, me deixou atordoado, extremamente excïtado com a mente que habita aquele corpo fenomenal. FLASHBACK — Bom dia, Sr. Alessandro — disse ela com sua postura impecável e voz controlada. — Não precisamos de formalidades nesse momento — comento, tentando soar casual, mas a verdade é que quando ela me chama de "senhor", meu päu pulsa violentamente. Ela me lança um sorriso discreto. Seu olhar brilha como a lâmina de sua monokatana — afiado, perigoso, irresistível. — Sr. Alessandro, revisei algumas cláusulas do meu contrato — ela começa, com a mesma serenidade de quem lê uma receita de bolo. — E percebi algo curioso. Sendo eu propriedade da BioCom, tecnicamente, pertenço mais ao Sr. Hugo Hëinz do que ao senhor. O tom muda. Fica mais provocativo. — Então, se algum dia ele quiser me reivindicar, terei que obedecê-lo. Mas não me sinto à vontade com isso. Fico em silêncio por um segundo. O que ela quer? O que está propondo? — E o que você sugere, Kira? — pergunto, tentando sondar até onde ela pretende ir. — Que o senhor se torne o sócio majoritário — responde, com um ar de inocência que beira o teatral. Ou será real? Ela entende do que está falando? Será que sabe o que está propondo? Estou curioso e intrigado. — Kira, as ações da BioCom valem milhões. Estamos falando de uma das empresas mais valiosas do Brasil, temos contrato até mesmo na Europa. Para assumir o controle, eu teria que queimar fortunas — levo a mão ao queixo, observando sua expressão atenta. — Levaria anos para recuperar esse investimento. E mais: duvido que algum dos sócios vá abrir mão de suas ações agora, ainda mais com a valorização constante da empresa. E então ela me surpreende. O que ela fala me atinge em cheio. — Eu sei, Sr. Alessandro. Por isso sugiro que façamos o valor de mercado da BioCom despencar. Radicalmente. Eu conheço uma maneira de fazer isso. Podemos desestabilizar a empresa por dentro, abalar a confiança do mercado, minar a credibilidade da corporação. Os acionistas entrarão em pânico. Quando as ações despencarem, o senhor poderá comprá-las. Tornar-se o majoritário. E, enfim, meu dono legal. Ela sorri. Um sorriso cínico, quase crüel. Mas absolutamente encantador. Como alguém que acabou de arquitetar o crime perfeito e ainda pergunta se você quer participar. Fico em silêncio por um instante. O coração batendo forte. A mente girando. Ela tem noção do que está propondo? Ou pior, será que já tem um plano? — Kira... — minha voz sai mais baixa. — Primeiro: o que exatamente faríamos para derrubar as ações? Segundo: como vamos reerguer a empresa depois? Para que eu não fique com uma joia destruída nas mãos? Ela sorri de novo. — Iremos lançar o Anastasys para o mercado médico. A dröga da ressurreição. Só nós temos o medicamento e o aparelho necessário para a reanimação. Vai custar uma fortuna — ela fala com um tom displicente, quase entediado. Eu faço um gesto com a mão, encorajando-a a continuar. Quero ouvir tudo. Cada detalhe que ela pensou. — O Anastasys tem falhas graves — ela prossegue, olhando nos meus olhos com calma desconcertante. — Além da perda de memória, a primeira versão — aquela sem o meu DNA — provoca psicopatias severas, surtos de fúria incontrolável e, em alguns casos, deformações físicas bizarras como efeito colateral. Ela sabe o peso de cada palavra que solta. — Quando começarem a usar e os pacientes começarem a despertar com essas sequelas... — ela faz uma breve pausa, como se escolhesse a próxima frase com cuidado — os órgãos reguladores vão processar a BioCom. Vai chover ação judicial. Vão exigir restituições pesadas. Então virão os processos, os bloqueios, as condenações... Danos morais, danos materiais, devolução dos produtos, recall internacional, custos altíssimos de produção e armazenamento, será um colapso financeiro. E os acionistas, desesperados, venderão as ações por migalhas. Ela pára de falar. Seu silêncio pesa mais que qualquer palavra. Me encara com curiosidade genuína, esperando minha reação. Como se dissesse: “E então, vai jogar comigo ou não?” Fico em silêncio por alguns segundos. Estou absorto. Ela sabe sobre o Anastasys. Ela sabe que foi usada na primeira versão. Que o próprio DNA dela foi incorporado ao projeto para corrigir as falhas mais graves. E, mesmo assim, ela não parece com raiva. Não há revolta em sua voz. Nem rancor. Não há dor. E isso, por algum motivo, me desconcerta. Essa mulher é um abismo. E eu estou caindo. Caindo por ela, por sua mente afiada, por essa presença que me arrasta para um lugar de onde talvez eu não queira — ou não consiga — voltar. Mas então, com a garganta seca e o coração pulsando, deixo escapar a pergunta inevitável: — E como iremos reerguer depois da queda? Ela ergue os olhos para mim com um brilho ardente, os lábios curvando-se num sorriso sutil, quase cúmplice. — Você vai culpar a Pegasus Med, fizemos a pouco um acordo com eles, e eles estariam responsáveis pela finalização e lancamento desse projeto. — ela diz, a voz firme, os olhos dançando com excitação — Reassumiremos o projeto com tudo, após a falha miserável da Pegasus Med e então lançaremos a versão melhorada. Aquela que contém meu DNA. Sua expressão é um misto de empolgação e algo que beira a apreensão, talvez receio de como eu vou reagir. Mas ela não pára. — A versão final ainda causa perda de memória, sim — ela admite sem rodeios — mas os outros efeitos colaterais desapareceram. Então, o que vamos vender é algo muito mais que uma simples dröga. Vamos vender um conceito. Ela se levanta, caminha com leveza, como se dançasse entre palavras e ideias, e então lança a frase com orgulho: — "Com Bi-O, você pode voltar à vida e ter uma nova vida." Deixo que a ideia se infiltre nos meus pensamentos, mas ela não me dá tempo para processar. Está tomada por sua visão. — A pessoa volta e no pacote, ganha uma nova identidade. Se era um Sicário e não quer mais essa vida, se sonha em ser Astro do rock, tocar funk, hip-hop, se quer largar tudo e viver como artista ou chef de cozinha, tanto faz. A mente dela será uma folha em branco, pronta para ser reescrita. Ela pára diante de mim, e agora seus olhos estão brilhando. Como se sua alma pulsasse ali, através do olhar. E continua, empolgada: — Vamos inserir os conhecimentos, os talentos, as aptidões necessárias por meio dos pacotes do Bi-O. Você acorda, e já sabe viver a nova vida que escolheu. E melhor, a vida que comprou. Fico completamente atônito. Ela pensou em tudo. Absolutamente tudo. E o pior — ou melhor — é que funciona. A ideia funciona. Quantas pessoas não dariam tudo por uma segunda chance? Uma vida nova, livre dos erros do passado, sem as dores, as perdas, as culpas? Ela percebe meu silêncio e decide avançar mais fundo, como quem sabe que já venceu a guerra, mas quer fincar a bandeira bem no centro do meu peito. — Você que sofreu uma decepção amorosa... que perdeu alguém importante. Você que foi traído ou que traiu. Você que está preso em um emprego miserável, ou que não consegue mais se olhar no espelho... — ela diz em um tom suave, quase doce, quase venenoso — Essa é a sua chance. Você quer ser outra pessoa? Quer deixar tudo pra trás? Quer esquecer que foi traído, enganado, rejeitado? Quer deixar de ser um fracassado e renascer como astro do rock, ou um gênio da física, ou só alguém bonito e feliz? Com o Bi-O, isso é possível. A nova vida é feita sob medida. E então sorri. Um sorriso singelo, quase inocente. Mas aquele sorriso... aquele sorriso mexe comigo como um terremoto silencioso, me fazendo vacilar por dentro. E percebo: ela não é apenas brilhante. Ela é irresistível. Me aproximo, os passos pesados como se eu estivesse me aproximando de algo que pode me engolir por inteiro — e talvez seja exatamente isso. — Kira, documente tudo. Quero os dados, todos os detalhes. — Minha voz sai firme, mas não consigo disfarçar a excitação contida. Eu preciso entender ela, eu preciso descobrir sobre ela. Ela simplesmente se vira, caminha até sua mochila com uma naturalidade quase calculada e, sem pressa, retira de lá uma pasta firme, escura, com acabamento de material reforçado. Ao abri-la sobre a mesa, temos uma pilha organizada de documentos. Diagramas, fórmulas, relatórios técnicos — e dois chips de dados, protegidos por um invólucro à prova de violäção. — Está tudo aqui. — A voz dela é limpa, precisa. — O Anastasys, versão inicial e versão final. O Projeto Bi-O, completo. Pacotes de reconfiguração física, alterações cognitivas, modulação de DNA com ajustes genéticos para eliminar predisposições a doenças degenerativas, problemas cardíacos, câncer e vários outros problemas. Ela separa um dos documentos e me encara com algo entre curiosidade e provocação. — E este é o contrato do pacote de Eutanásia. Minha expressão deve ter sido de choque, porque ela sorri de canto antes de explicar. — Serve para quem está vivo, mas quer morrer. Morrer para recomeçar do zero. O paciente assina, entra em estado de morte induzida, o corpo é tratado, reconfigurado, a mente limpa, habilidades inseridas. Ele "morre", e depois volta à vida com uma nova identidade, uma nova história, um novo corpo. Um recomeço completo de acordo com o pacote adquirido. Sinto o ar escapar dos meus pulmões. Fico imóvel, absorvendo o que ouvi. Meu coração está acelerado. Meus pensamentos fervem. Minha pele arrepia. Ela segura os chips com tanta delicadeza quanto se estivesse segurando o destino da humanidade. Talvez esteja, de alguma forma eu sinto isso. Existe algo a mais na intenção sobre o Anastasys. Meus olhos não conseguem desgrudar dos seus. Minha mente está em combustão. E meu corpo reage. Fisicamente. Violentamente. Meu mëmbro está duro como pedra. Não posso me mover. Não agora. Não sem me expor. Ela apenas fecha a pasta com calma, guarda os chips e me oferece um olhar firme e imponente, enquanto sai da sala. FIM DO FLASHBACK
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