ALEX NARRANDO
Como assim me casar? Eles estão achando que estamos na época medieval? Eu não sou alguém que sirva para casar, de qualquer forma. p***a, como assim?
Subi as escadas e olhei para os dois de forma assustada. Minha mãe também estava assustada, parecia que havia sido pega fazendo algo de errado.
— Que parte dessa conversa você ouviu, filho? — Meu pai disse de forma calma.
— A parte em que vocês vão me casar com alguém como se eu fosse a p***a de uma princesinha.
— Filho... — Minha mãe fechou os olhos. — Por favor, deixa a gente te explicar.
— Explicar o que? Que vocês querem mais uma vez decidir minha vida? Agora até com quem eu vou casar? Eu nem queria casar, mãe. O que vocês fizeram? Por que isso?
— Filho, muito tempo atrás, havia uma guerra entre dois grandes poderes daqui. O meu, e o de um grande amigo do passado. Para selarmos um acordo de paz, fizemos um pacto de sangue, que será selado com um casamento. Foi a melhor opção na época... Nenhum de nós quebrará o acordo, entendeu?
— Que merda de amigo é esse que joga a filha no colo de um estranho? — Resmunguei.
— Ele trabalhou por anos comigo antes de mudar para o outro lado da Irlanda, para uma região mais estratégica para os nossos negócios. Ele mudou e ampliou o ramo de negócios dele, enquanto eu quis ficar na parte das artes. Mas o pacto ainda está em pé. — Eu girei os olhos, indignado.
— Isso é ridículo.
— Não é. As coisas são assim na nossa sociedade e cabe a você aceitar. Em poucos anos você estará livre e poderá ficar com quem bem entender. — Meu pai parecia mais firme comigo, como se quisesse impor aquilo tudo.
— É? Pois então case você, aceite esse destino você. Tenha duas esposas. Você que se f**a, você fechou esse acordo, você se vira! Eu não aceitei nada disso! — Gritei.
— Você tá me desafiando, Alex? — Meu pai veio para cima de mim. Acho que ele se cansou de me ouvir gritar.
Minha mãe entrou na frente dele, chorando.
— Por favor, Brian! Pára com isso!
— Meu amor, você sabe que não podemos quebrar o acordo! — Meu pai disse.
— Brian, dá um jeito nisso!
— Não há jeito! — Pela primeira vez, vi tristeza nos olhos do meu pai. — Você acha que eu queria isso? Você não se lembra de como eu fiquei quando assinei o contrato? Era o único jeito de manter a paz, Louise! Eu não tive escolha! Seria uma guerra, meu amor... Você acha que não quero que nosso filho seja feliz e se case por amor? É claro que eu quero!
— Então vamos fazer alguma coisa! — Minha mãe disse.
— Nós vamos. Vamos casar nosso filho e depois ele poderá ficar com quem quiser. Não compliquem as coisas, por favor.
Eu fui andando para o meu quarto com ódio. Bati a porta com força e peguei meus cigarros, acendendo um. Enquanto eu fumava, me senti um lixo. O meu dia deu todo errado, minha namorada que eu nem gostava me traiu e eu vi, meus pais querem me casar com uma estranha... Só falta um pombo cagar na minha cabeça pra completar a desgraça.
Na hora do jantar, desci para comer porque não comi nada o dia todo. Estava morrendo de fome. Quando cheguei, meus pais estavam sentados como se me esperassem.
— Filho... — Meu pai tentou falar comigo.
— Eu não quero conversar com você. — Falei.
— Não faça isso comigo, por favor. — Ele disse.
— Você tá acabando com a minha vida, me roubando os melhores anos, e eu tenho que conversar com você? Quer falar sobre o que? Sobre as flores do meu casamento com uma estranha? Ou sobre como a família dela é chata e perfeita como a nossa?
— Filho, não seja ignorante com seu pai! — Minha mãe disse.
— Você diz me amar tanto, mãe... Por que você deixou isso acontecer? — Ela olhou para baixo.
— Nós dois não tivemos escolha. — Meu pai respondeu.
— Eu espero que seja verdade, porque se não... Eu nunca mais vou conseguir olhar nos olhos de vocês.
— Filho...
— Quando esse casamento acontece? — Questionei.
— Em dois meses. No dia do seu aniversário de dezoito anos. — Arregalei os olhos.
— Você vai fazer eu me casar com dezoito anos? Tô fora, eu vou embora daqui. — Saí andando e corri para o meu quarto de novo. Eu tranquei a porta e olhei ao redor.
Peguei meu taco de baseball que estava pendurado na parede e nesse momento, senti uma injeção de adrenalina no meu sangue. Soltei um grito muito alto e comecei a quebrar tudo.
Ouvir o vidro quebrando, os objetos, meus três troféus de artes quebrados pareciam um reflexo do que eu sentia em minha alma: Eu estava quebrado, fodidamente quebrado. Sempre estive, de certa forma.
Quando eu era pequeno, meu pai não era muito presente. Sempre foi muito ocupado, e eu o entendo. É um cara de negócios, trabalha com gente rica e desesperada. Mas o que realmente me tornou quem eu sou foi algo que não sei explicar. Eles sempre me apoiaram em tudo, me deram tudo que eu precisava, mas com o passar dos anos eu fui ficando mais triste, fechado, sentindo que o mundo não era bom e comecei a me apegar na arte. Desenhos, pinturas, histórias... Tatuagens. Eu queria ser um pintor de quadros, mas não sei se sou bom o suficiente.
Quando terminei de destruir meu quarto, olhei ao redor e percebi que já não restava nada inteiro. O quarto agora refletia quem eu era.
Ouvi batidas na porta.
— Filho, por favor... Me deixa conversar contigo!
— Não, mãe.
— Por favor! — Eu ouvi um soluço. Minha mãe estava chorando. Então, eu abri a porta. — Filho... — Ela me abraçou com força. — Por favor, se acalma, não fica com raiva de nós dois!
— Eu estou me sentindo traído. Eu vou fugir, mãe. Para o mais longe possível. — Ela se afastou de mim e me olhou nos olhos. Parecia ler minha alma.
— Você sabe que pra onde você for, sua cabeça vai contigo, não sabe? — Ela olhava ao redor, vendo o quarto destruído.
— Mas pelo menos eu não vou casar com uma estranha. — Sorri de forma vitoriosa. Ela suspirou.
— Fuja. — Ela sussurrou. — Eu te ajudo se você conseguir me manter informada. — Arregalei os olhos.
— Tá... Falando sério? — Ela concordou com a cabeça.
— Mande notícias. É tudo que eu peço. Vá antes que passe pela cabeça do seu pai que você pensa em fugir. — Eu concordei. Minha mãe saiu do meu quarto e em dois minutos voltou com um maço de dinheiro. — Vai embora, filho. Foge para o mais longe possível.
— E a escola? — Ela passou as duas mãos pelos cabelos longos e castanhos.
— Nós daremos um jeito.
Eu peguei o dinheiro e ela saiu, fechando a porta. Minha mãe me mandou fugir de casa, isso parece mais sério do que eu pensei.
Coloquei algumas roupas dentro de uma mochila, meus documentos e passaporte, peguei o dinheiro e joguei ali dentro. Eu me olhei no espelho e suspirei. Eu não passo desapercebido. Sou um garoto de um e oitenta, levemente forte, de olhos azuis e cabelos loiros como meu pai. Preciso dar um jeito nisso.
E então, eu fugi de casa. Saí pela porta dos fundos para nunca mais voltar, com apenas algumas roupas, meu caderno de desenho e meu estojo que não saio sem. Nem o celular levei.
Dizem que artistas são filósofos, todos eles. No meu caso, se eu for um grande artista, quero que todos saibam que minha liberdade não será vendida por preço nenhum.