O tempo vai passando e um silêncio constrangedor vai tomando conta do lugar. Heloisa e minha mãe evitam se olhar. Então o Matheus começa a falar sem parar.
Depois do café vamos pra sala. Assim que sentamos, minha mãe levanta minha blusa que ainda estava jogada no chão.
- Vejo que você perdeu os bons modos e o capricho que eu te ensinei! - minha mãe diz levantando minha blusa.
- Não exagera mãe, é só uma blusa! - digo pegando da mão dela.
Minha mãe senta à nossa frente.
- O que aconteceu com a sua perna? - minha mãe pergunta pra Heloisa e é a primeira vez no dia que elas se falam diretamente.
- Acidente no palco - Heloisa diz um pouco nervosa.
- Eu vou guardar a blusa - digo saindo da sala e arrastando o Matheus comigo - Por que diabos trouxe a minha mãe pra cá? Sabe que ela odeia a Maraisa! - digo assim que nos afastamos dela.
- Eu liguei ontem, não sabia que a Heloisa ia vir pra cá! - ele diz - Agora deixa eu guardar essa blusa e volta pra sala antes que as duas se matem! - ele ri.
- Eu não acredito que você tá rindo! - digo - Que tipo de amigo é você?
- Para de drama e volta pra lá se ainda quer ter uma mãe e uma namorada! - ele ri mais e acabo rindo também.
- Do que vocês estão falando? - pergunto me sentando ao lado da Heloisa no sofá.
- De nada - minha mãe responde com sinceridade, pois as duas nem se olhavam, que dirá falar.
Heloisa pega a carta da Universidade sobre a mesinha de centro.
- O que é isso? - ela pergunta.
- É a carta da minha mãe! - pego da mão dela antes que ela possa ler alguma coisa - Aqui sua carta, mãe! - digo entregando nas mãos de minha mãe.
- Bom, já que você já achou a minha carta, vou indo! - minha mãe diz levantando - Vou chamar um táxi.
- Eu levo a senhora, é aqui pertinho! - digo levantando também.
- Não pode sair e deixar sua namorada sozinha! - ela diz olhando pra Heloisa.
- Por mim não tem problema! - Heloisa se apressa em responder.
- Já volto meu amor! - digo beijando a testa dela.
Pego a chave e vamos pro carro em silêncio. Minha mãe carregava a carta na mão.
Dirijo em silêncio. Quando paro o carro, olho pra ela.
- Já pode começar o sermão! - digo.
- Sua carta! - ela diz me entregando o envelope - Não acredito que você não contou pra ela.
- Eu nem sei se eu vou mãe!
- Que? - minha mãe grita comigo - Não se atreva a jogar seu futuro pela janela assim! Tudo bem você abandonar seu apartamento e ficar correndo atrás dessa sua namoradinha famosa, mas não aceitar uma bolsa na Universidade que você sempre sonhou em estudar é passar de todos os limites! Não se esqueça de tudo que lutou pra chegar até aqui! Não se esqueça que você deve isso às pessoas que te apoiaram toda a sua vida!
- Mãe, você não pode me obrigar a ir! A senhora sempre disse que minha felicidade estava em primeiro lugar.. eu amo ela mãe, ela me faz feliz!
- Não vou permitir que recuse a bolsa!
- É a minha vida! Me deixa decidir!
- Eu sou sua mãe e sempre te apoiei em tudo, até aceitar essa relação estranha eu aceitei, mas isso eu não vou aceitar! Eu não vou aceitar, você me ouviu? - ela sai do carro e bate a porta.
Tudo o que eu não precisava era de mais pressão.
Volto pro apartamento e vejo o Matheus e a Heloisa sentados na sala, os dois muito sérios.
- O que foi? - pergunto me aproximando.
- Nada! - Heloisa me abre um sorriso - Ainda não superei o baque de enfrentar a sua mãe à essas horas da manhã!
- Da próxima vez, lembrem de recolher as roupas! - Matheus diz rindo.
- Cala a boca, Matheus! A culpa é toda sua! - digo jogando a almofada do sofá nele.
- Culpa minha nada, culpa de vocês que não conseguiram cativar a dona Sônia! - ele diz rindo.
- Cala a boca, Matheus! - repito jogando outra almofada nele.
- Bom, eu vou sair com um boy magia, não me esperem pois não vou voltar pra casa hoje! - ele diz levantando do sofá.
- Matheus, são dez da manhã! Onde você vai? - pergunto rindo.
- Me divertir, mona! Me divertir! - ele diz jogando os braços pro alto e desfilando pro quarto.
Rimos juntas e eu deito a cabeça no ombro dela.
- Tudo bem? - ela me pergunta.
- Sim, só me deixa ficar um tempinho assim, em silêncio com você!
Ela me abraça e fica mexendo no meu cabelo.
Matheus volta arrumado e sai.
Preparo pipoca e assistimos a um filme triste juntas. Confesso que chorei, mas não prestei atenção no filme. Eu estava tão confusa e toda aquela pressão estava me deixando louca.
Quando o filme acaba ela limpa meu rosto.
- Chorona! - ela diz rindo.
Rio também.
O celular dela toca. Ela atende.
-Oi, Helena! Já vão? Ok. Ainda não sei. Tá bom, ligo pra avisar sim!
Ela desliga.
- O que foi? - pergunto.
-Eles tão indo pra casa hoje. Helena queria saber quando vou voltar pra casa. Pensei em passar o fim de semana aqui e ir embora na segunda - ela diz pausadamente forçando um sorriso.
- Por que? Você não ia passar a semana aqui e depois voltaríamos juntas?
- Queria ir pra minha casa! Não me sinto bem aqui.
- É por causa da minha mãe? Ela quase não vem aqui.
- Não! Não sei porque, eu só quero ir pra minha casa.
- Eu passo mais tempo na sua casa do que na minha, o que custa você passar uma semana aqui?
- Tá bom, Sarah! - ela diz num tom que não lhe é habitual.
- Se não quer ficar pode ir! - digo levantando do sofá.
Ela puxa meu braço e me faz sentar de novo.
Ela me beija tão intensamente que fico sem reação. Suas mãos me apertam e me puxam pra mais perto.
- Isso vai ser mais difícil do que eu pensei - ela sussurra ainda me segurando e com o rosto pertinho do meu.
- Do que tá falando? - digo também sussurrando.
- Nada! Esquece! - ela volta a me beijar.
Quando para, continua me segurando ali pertinho e me olhando nos olhos.
Os olhos dela estavam com um brilho diferente. Parecia que ela estava prestes a chorar.
- Eu te amo! - digo baixinho.
Ela sorri me beija. Depois me solta e se afasta fazendo uma careta.
- O que foi? - pergunto assustada.
- Meu pé, tá doendo! - ela diz sem desfazer a careta.
Levanto e pego os remédios dela. Lhe entrego com um copo de água. Ela toma e se deita no sofá.
Me sento na mesinha de centro e fico olhando pra ela deitada.
- Você vai embora na segunda? - pergunto depois de muito tempo em silêncio.
- Eu não sei! - ela diz olhando pro teto.
- Eu vou com você! - digo me ajoelhado no chão pra ficar mais perto dela.
- Você tem que ficar e resolver seus problemas! - ela olha pra mim - Eu ficar aqui só vai te atrapalhar.
- Você não vai atrapalhar e, se você for pra casa, eu vou junto! - digo tocando o rosto dela.
- Tem alguma forma de eu te convencer do contrário? - ela pergunta.
- Não! Nada do que me disser vai me fazer ficar aqui sem você!
Ela sorri, mas seu riso não está feliz.
- Tá bom, eu fico. São só seis dias - ela diz passando a mão em meu rosto.
- Obrigada! - digo beijando de leve os lábios dela - Como tá seu pé?
- Dói um pouquinho, mas vai passar.
- Quer que eu faça alguma coisa? - pergunto.
- Só fica aqui pertinho de mim! - ela pede beijando minha mão.
- Nunca, por nada nesse mundo, esqueça que eu amo você e que eu daria qualquer coisa por você! Me promete que não vai esquecer!
- Eu não vou esquecer! - ela sorri e eu a beijo com ternura.
- Se não fosse esse seu pezinho, eu ia te fazer gemer tanto até esquecer seu próprio nome! - digo na orelha dela.
- Não acenda meu fogo se não for apagar! - ela diz rindo.
- Deixa esse pezinho melhorar que você vai ver! - digo antes de beija-la novamente - Vou arrumar alguma coisa pra gente almoçar.
- Não tô com fome! - ela diz me segurando - Fica aqui pertinho de mim.
- Com todos esses remédios que você tá tomando não é bom que você fique sem comer.
- Vai adiantar eu debater e dizer que não quero comer? - ela pergunta rindo.
- Não!
- Então, pode ir!
Beijo a testa dela e vou pra cozinha. Preparo o almoço e a acordo pra comer.
Ela senta no sofá e comemos na sala mesmo.
Passamos o resto do dia juntas no sofá assistindo filmes. Na verdade passamos o dia nos beijando enquanto os filmes passavam na TV.