The Challenge

4738 Palavras
— Então, como vai funcionar? As duas amigas estavam em silêncio, ainda absorvendo o eu topo que Pierre soltou como se não fosse nada. O moreno trocava o olhar de uma para a outra, esperando uma resposta. — Bom... — Lou murmurou, sem acreditar no que estava acontecendo. — São tarefas, uma por semana. — Lottie continuou, quase que mecanicamente, seus divertidamente correndo desesperadamente como se a sala central estivesse pegando fogo. — Caso não dê para cumprir algum deles, perdemos a chance de ter um encontro com você. — Ninguém além de nós três pode saber sobre o desafio — a ruiva citou a próxima regra, os olhos sérios. — E a parte mais importante de todas: independente de quem ganhar, não podemos deixar que isso acabe com a nossa amizade. — Ótimas regras. — Ah, também tem a de que tínhamos que te contar e só continuaríamos se você concordasse em participar. Não seria justo ou correto fazer pelas suas costas. Pierre assentiu vagarosamente, achando tudo muito organizado — elas tinham pensado nos mínimos detalhes. Nada podia dar errado, certo? Ele sorriu, encarando-as. — E quais são os desafios? As amigas riram, Charlotte cobrindo a boca com as mãos, escondendo o sorriso gengival que não se orgulhava de ter e Louise colocou uma mecha do cabelo atrás da orelha. Eram manias que tinham quando se sentiam envergonhadas ou se sentiam à vontade — dois extremos. — Será surpresa — a morena disse, colocando as mãos nas coxas por baixo da mesa. — Justo — concordou Renaud, sentindo certa ansiedade. Ele não fazia ideia do que esperar. — Quando começamos? O trio se encarou, as meninas não tinham pensado nesse detalhe. Elas estavam tão focadas no que ele diria e em como explicar como seria, que planejar quando, de fato, iniciariam passou despercebido. Pela lógica, tinha que começar em uma segunda e já era quinta feira, restando apenas uma resposta — a não ser que quisessem adiar. Charlotte não se importaria se fosse picado, no entanto, Fontaine e o amigo tinham um pequeno problema com TOC. — Vocês querem esperar as provas passarem? — questionou o moreno, seguindo o raciocínio da ruiva, mesmo sem saber o que ela pensava. — Pode ser mais tranquilo s- — Semana que vem — Lottie disse com firmeza, a ideia de aguardar mais alguns dias era desesperador, a ansiedade a mataria. Lou trocou um olhar com a amiga, conversando por ali e assentiu, confirmando o que ela tinha dito. Seria complicado no meio da bagunça que era estudar vinte e quatro horas para as avaliações, mas daria tudo certo. — D’accord, vamos assinar algum tipo de contrato? É mais seguro — Renaud sugeriu. E, sim, Pierre podia ter um lado totalmente voltado para advocacia, devia ser pelo fato de ter sido criado por uma família inteira de advogados. Tinha sido um completo milagre não ter seguido por essa linha, já que fazia fisioterapia, contudo, ninguém — além da sua avó materna — falava com ele, nem em datas comemorativas por ter. Renaud nunca se importou, sempre foi sozinho em sua vida — menos por ele, Charlotte e Louise —, mas isso não era importante ainda. Lottie piscou, aturdida. Será que precisavam mesmo assinar aquilo? Ele esperava que desse algo errado assim logo de cara? — Seria uma boa — Lou se pronunciou, achando válido que se protegessem. — Assim teremos certeza de que seguiremos as regras. Pierre então pegou três guardanapos e a ruiva lhe ofereceu a caneta vermelha que sempre carregava consigo. Ele escreveu algo rapidamente, assinou e os entregou para Fontaine fazer o mesmo. Quando chegou a vez da morena, ela ainda parecia avoada, pensando coisas aleatórias como se todas as suas ideias para realizar as tarefas estivessem fadadas ao fracasso. — Lottie? — Louise a chamou carinhosamente, segurando sua mão por debaixo da mesa, a caneta e papéis na outra. Com aquele gesto, a Roux soube que por mais que alguma coisa saísse do controle, teria sua melhor amiga ao seu lado — não tinha mais nada para se preocupar. E o com sorriso gengival a mostra para a ruiva, colocou seu nome no x que faltava, ciente que não não teria mais volta. Pierre ficou fascinado pela conexão que ambas demonstravam ter, uma parte do seu interior, o famoso inconsciente, desejou ter aquilo que acreditava nunca conquistar em sua vida. Contudo, sorriu terno, apreciando o que via. A vida nem sempre era perfeita, as coisas dificilmente funcionavam conforme as pessoas desejavam e foi por esse motivo que Charlotte e Louise se encontraram paralisadas em frente ao crush, que tinha aceitado participar da ideia maluca da Roux como se fosse a coisa mais normal do mundo. Óbvio que era o que esperavam, mas bem no fundo suspeitavam que ele acharia uma loucura, ficasse espantado ou até brigasse com as duas. Onde que Pierre iria ser o alvo de conquista de duas mulheres que eram suas amigas? Ele não teve muito tempo para pensar sobre o que lhe foi proposto, no entanto, o Renaud queria entender mais sobre sentimentos — já que tinha dificuldade nesse quesito — e por que não tentar compreender a si mesmo com a ajuda de suas únicas relações de amizade feminina? Não seria nada r**m namorar uma delas, ambas com seus atrativos que qualquer pessoa teria a sorte de se relacionar. Charlotte e Louise conheciam um pouco do moreno, contudo, esse desafio seria fundamental para aprofundar o que já sabiam e esperavam. Ou talvez tivessem ido com sede demais ao pote, não tendo ideia das consequências que teriam com a proposta. Lou estava muito quieta na volta para casa e Lottie odiava o silêncio — principalmente vindo dela. Depois do choque, falar sobre como funcionaria, tirar as dúvidas, mas sem tocar nas tarefas semanais, o trio conversou tranquilamente antes de voltarem para o campus. Elas deviam estar felizes e radiantes, pensando no que fariam para conquistá-lo nos meses seguintes, no entanto, a Fontaine se sentia apreensiva com tudo aquilo. Daria certo? Ela seria escolhida? Lottie ficaria triste? Elas deixariam de ser amigas? Muitas dúvidas rondavam sua mente. Entre as duas, a ruiva era a mais racional enquanto a Roux agia por impulso emocional — menos quando Lou saía para fazer compras. Elas inverteram o papel naquele momento, Louise que pensava nas várias formas de falhar naquele desafio, pois ela não era tão criativa quanto a amiga, seria desclassificada na primeira semana. — Um sorvete por seus pensamentos — sussurrou a morena no ouvido da ruiva quando pararam para atravessar a rua que levava para o dormitório. Louise sorriu, ajeitando a mochila nas costas antes de responder sinceramente — não que estivesse tentada pelo suposto sorvete que ganharia, com certeza, não. — Preocupada com a loucura da qual nos metemos. — Suspirou, olhando-a nos olhos. — Te entendo, ma bichette, fiquei assim ao assinar o contrato — admitiu, fazendo aspas na última palavra e passou o braço ao redor dos ombros dela. — Mas enquanto estivermos juntas, vai ficar tudo bem, né? A Fontaine assentiu, abraçando-a apertado por alguns minutos — aquele momento significando muito mais do que imaginavam. Seus olhos estavam fechados e não perceberam o sinal aberto para pedestres. Se separaram quando notaram a deixa e, Lottie, alheia ao que a esperava, deu um passo para atravessar a rua, Lou a segurou pela mão, sorrindo largo. — A sorveteria é desse lado. — A ruivau deu de ombros. — Você ofereceu. — Eu criei um monstro. Pierre não queria, mas estava sem alternativa: precisava de um colega de quarto. Aparentemente, o último não aguentou nenhum dos hábitos que o moreno tinha, acostumado a morar praticamente sozinho por muito tempo. Jacque era ótimo — divertido e gente boa —, mas, sendo sincero consigo mesmo, não era um bom roommate. Sua mania de bagunça ou até de deixar o sapato no lugar errado irritava além da conta o Renaud, sem contar a comida completamente fitness. O moreno não era chato, gostava de uma ordem básica — era o mínimo que ele esperava que qualquer pessoa tivesse —, contudo, tinha outros itens que ele precisava para aceitar alguém que fosse morar consigo. Confiança era o primeiro ponto. Era por isso que estava colocando um aviso nos murais do campus inteiro à procura de alguém que estivesse interessado em dividir as despesas do apartamento com ele — sua última alternativa. Seus pais poderiam ajudar, porém, Pierre queria sua independência daqueles que não faziam questão dele, achando que podiam o comprar com dinheiro como fizeram até seus quinze anos. No entanto, sua esperança de achar alguma compatibilidade com seus requisitos estava bem baixa. Foi só quando grampeou o último papel que viu aquele que jamais esperava encontrar ali na universidade, pelo menos não por agora. — Thomas? — perguntou, descrente. O moreno mais alto virou a cabeça ao ouvir seu nome ser chamado, surpreendendo-se ao ver seu antigo professor particular lhe olhando com olhos arregalados. Faziam alguns anos desde a última vez que se viram, tornando o reencontro um tanto estranho e inesperado. — Perry? Nossa, quanto tempo! — Ele se aproximou, rindo suavemente. — Você cresceu bastante desde nossa última aula — apontou Renaud, levantando a mão para bagunçar o cabelo do mais novo, ficando nas pontas dos pés. Leroy revirou os olhos para o comportamento do outro, arrumando os fios, agora, desalinhados. Tinha, pelo menos, uns seis anos que Pierre começou a ser o professor particular dele e uns três quando as aulas acabaram. — Não sou mais um adolescente — disse timidamente, fugindo do olhar do outro moreno. — Mas graças a você, consegui me formar no ensino médio e ingressar na melhor universidade de Paris. — Ele abriu os braços para mostrar onde estavam. Sua atitude foi controversa com o que tinha dito, agindo como se ainda fosse um colegial envergonhado e baixinho. — O mérito é todo seu, Tommy. — Mon Dieu, Perry, esse apelido é embaraçoso. — Leroy corou, enquanto o outro ria. Eles se encararam por alguns segundos, o silêncio os envolvendo em uma bolha só deles — mas não tão desconfortável quanto parecia. Muitas coisas se passavam na cabeça de cada um, boas memórias do que viveram juntos naqueles anos, sentindo-se muito felizes de terem se reencontrado. — O que estava fazendo? — indicou o mural com o queixo atrás do mais velho. Pierre deu de ombros, apontando a folha com as vagas para colega de quarto com o dedo. — Preciso de alguém para ajudar com as despesas do apartamento, odeio ter que recorrer aos meus pais. — Renaud não percebeu que fez um biquinho ao final da frase, o que era totalmente adorável na opinião do Thomas, ou qualquer outra pessoa. Era incrível como um homem de vinte e seis anos, alto, o cabelo liso até abaixo dos ombros, barbudo e todo sério conseguia ser charmoso até quando não tinha a menor noção do poder que possuía. — Entendo... — murmurou, querendo ser útil de alguma forma, mas sem saber como. — Espero que encontre alguém legal. O sorriso fofo foi um pouco desconcertante para Pierre processar qualquer informação e formular uma resposta coerente nos segundos seguintes. — Você já tem onde ficar? — Sim... — Ele quase disse infelizmente, contudo, conseguiu segurar antes que saísse. — Dei entrada hoje para pegar um quarto no dormitório masculino. Só começo a estudar no semestre que vem e me disseram para resolver o quanto antes, porque pode demorar. — Ouvi isso também, tenho certeza que já separaram o seu. — Trocaram sorrisos. — Mas me conta, o que achou do campus até agora? Charlotte caminhava saltitando, extremamente feliz com o seu copo gigante de vários sabores de sorvete, quase cantarolando no processo — com direito a brain freeze, já que enchia a colher a cada degustação. Lou ria dos gemidos sofridos da amiga toda vez que isso acontecia, comendo como uma pessoa normal aquele doce gelado de um sabor só no seu copo médio. A ruiva não era louca por sorvete tanto quanto a morena — preferia qualquer coisa que tivesse chocolate no meio —, contudo, não recusava comida nenhuma. Sabia que aceitar a oferta da amiga a deixaria alegre e aquele dia tinha sido quente o suficiente para se refrescar, colocando um aviso mental em seus pensamentos para pegar o remédio para gripe antes de dormirem. O dia estava quase no fim, perto das oito da noite, quando decidiram finalmente voltar para casa, desfrutando da delícia durante o caminho. As aulas da manhã e tarde foram deveras cansativas, sem contar o almoço com Pierre e toda a situação do desafio deixou o clima um pouco tenso — pelo menos até tudo começar a dar certo —, Lou só queria dormir horas seguidas depois daquela montanha russa de emoções. — Que tal uma mudança? — Charlotte sugeriu do nada, pensativa. — De qual tipo? — Existiam muitas opções. — Vai mexer no cabelo? — Queria. — A morena suspirou, pegando os fios compridos com os dedos livres. — Pensei no nosso quarto. Cansei do jeito monótono daqueles móveis. Louise riu, concordando silenciosamente com aquele fato. O dormitório era padronizado, no entanto, havia a possibilidade de mover o que quisessem ou até colocar novos. — E qual é a sua ideia? Lottie demorou para responder, tinha acabado de encher a boca com uma porção bem generosa de tutti-frutti, tendo que parar para balançava as mãos, esperando que não morresse congelada ali mesmo. — Vamos começar pelo quarto, as camas de um lado e as mesas de estudo do outro — explicou, mostrando como ficaria visualmente através de gestos. — Teremos mais espaço dessa forma. O que acha? A Fontaine analisou a proposta, imaginando todo o trabalho que teriam, no entanto, ela tinha razão — melhor distribuído e, com certeza, não teria mais problemas com o encontro desastroso entre seus dedos dos pés e a madeira no meio do caminho. — Adorei — confessou, sorrindo sinceramente para a amiga, que a olhava esperançosa pelo veredito. Charlotte fez uma dancinha muito embaraçosa para comemorar. Elas tinham muito o que celebrar naquele dia, mas deitar era sua prioridade assim que chegasse, após um bom banho relaxante. A festinha teria que esperar mais algumas horas. — Vamos, ma bichette, ainda dá para começarmos hoje se acelerarmos o passo — chamou a morena, puxando-a pela mão livre. — Você acredita mesmo que vou arrastar qualquer móvel hoje, Lottie? A Roux parou, olhando-a com olhos pidões — uma cópia barata do famoso gato de botas —, tentando persuadi-la daquela forma. A sorte da mais nova era que a ruiva não resistia aqueles olhos claros como um lindo dia de céu azul. — Nem vem, Charlotte. — A ruiva negou com a cabeça, resistindo pela primeira vez. — Estou exausta e amanhã cedo tenho aula. Podemos fazer na parte da tarde. — Posso começar sem você? — Não, porque vai ser barulhento e dormir assim é impossível. A morena ficou quieta, sabendo que tinha perdido aquela batalha, esbanjando um biquinho nos lábios como uma criança birrenta que não ganhou o que queria. Elas voltaram a caminhar normalmente, o silêncio era reconfortante — apenas o som ambiente da rua ainda movimentada e o burburinho das outras pessoas conversando ao redor. Faltava pouquíssimo para chegarem ao dormitório, então, ambas aproveitaram aquele momento de paz — como se soubessem que acabaria muito em breve, mas, recusando-se a tocar no assunto. A questão era que Lottie e Lou nem saberiam o que dizer, sendo melhor deixar como estava. — Nunca mais te dou doce após as quatro da tarde. — Quanta injustiça — a morena disse m*l humorada, rindo logo em seguida ao abraçar a melhor amiga, como se fosse um filhote de coala. — É para o bem do mundo, ma bichette — ironizou, mas falou sério. — Ou você destruiria a galáxia. — Acha mesmo que eu conseguiria? — perguntou Lottie, os olhos brilhando. — Não tenho dúvidas. — Óbvio que você me ajudaria, meus planos só funcionam quando minha parceira de crime está junto. Elas trocaram sorrisos cúmplices, Lou bagunçou o cabelo da morena, que lhe mostrou a língua. Por estarem com os rostos colados, a ponta do músculo encostou na bochecha da ruiva, sendo totalmente acidental, porém, causou arrepios na Fontaine — pelo contato gelado ainda pelo sorvete e por um sentimento que ela não saberia nomear, ainda. Charlotte não era uma pessoa matutina, tinha o terrível hábito de dormir e acordar tarde — coisa que aprendeu na pré-adolescência quando descobriu as mais diversas sagas de livros dos mais variados temas. Ela não conseguia parar de ler por um segundo, deixando de comer, tomar banho, escovar os dentes e, obviamente, descansar. As professoras da sua escola sempre reclamavam que ela caía no sono durante as aulas — chegando a babar completamente seus cadernos e apostilas —, às vezes aproveitando para ali mesmo, não prestando atenção na matéria, irritando-as ainda mais. Desde então, levantar cedo era uma guerra interna, dando graças ao bom Dieu que só tinha um dia desse pesadelo particular, poupando-a do sacrifício no resto da semana. No entanto, ao entrar na universidade e morar com sua melhor amiga, aprendeu — por livre espontânea pressão — a aproveitar melhor o seu tempo ou não sobraria nada para estudar, fazer os inúmeros trabalhos e, o mais importante de todos, divertir-se. Naquele dia, surpreendentemente, não conseguiu ficar na cama como de costume, enrolando com o celular lhe distraindo com as várias inutilidades que ele poderia lhe entreter. Dizer que não estava animada para o que tinha planejado na parte da tarde com Louise seria mentira, a ansiedade borbulhava dentro dela. Talvez isso a tivesse despertado tão cedo — meia hora depois da ruiva sair para sua aula. Seu corpo inteiro coçava de uma forma estranha para que começasse sem a amiga, mas tinha prometido não fazer nada sozinha. — Por que faço essas promessas que sei que não consigo cumprir? — choramingou a Roux, bagunçando o cabelo em um desespero que só ela entendia. — Já sei, preciso me manter ocupada. O sorriso radiante da ideia perfeita que acabou de ter não durou muito, pois não sabia ainda o que faria para isso. Ela olhou ao redor do quarto, escaneando-o completamente em busca de sua salvação, sem muito sucesso, porque por mais que tivesse várias coisas implorando por sua atenção não era nada que ela realmente quisesse fazer — tinha que ser algo divertido. Contudo, após uma discussão interna com seus divertidamente, começou pelo mais difícil para si: o guarda roupa. Ser uma bagunceira graduada não era fácil, ainda mais com Louise Fontaine, a maluca por organização no seu pé o tempo todo. Tudo bem, Charlotte estava sendo muito exagerada pensando assim, a ruiva não era tão r**m quanto a imagem que se fez quando ainda estudavam no cursinho. Ela só brigava quando a morena deixava louça suja na pia — o resto tinha um limite de uma semana para que fosse devidamente arrumado. Com a playlist perfeita já tocando no maior volume, a Roux começou verificando quais roupas estavam sujas — indo para um monte no chão — e as limpas eram dobradas para voltar para o armário, infelizmente, apenas duas peças. O restante das prateleiras e gavetas precisariam de uma atenção extra, no entanto, a máquina de lavar iria fazer sua parte naquela tortura inteira, enquanto ajeitava o resto. Uma hora e vinte minutos depois, Lottie estava jogada no sofá desleixadamente, desejando que sua melhor amiga chegasse logo — mas ainda faltava uma hora e meia. E ela teria se deixado levar no conforto daquele estofado maravilhoso quando sua barriga roncou muito alto, lembrando que não tinha comido nada até então. A morena acabou por se distrair mais do que esperava, tinha começado com seu guarda roupa e quando viu já tinha passado uma vassoura, pano e ainda limpado a pia do banheiro. Como uma deixa para sua próxima distração, a ideia de preparar uma refeição especial — a preferida da ruiva — e, quem sabe, alguns aperitivos durante o processo — não custava nada e caso não fizesse, morreria antes mesmo de terminar o almoço. A boa notícia foi que conseguiu que ficasse pronto bem a tempo da melhor amiga chegar — colocando a mesa de uma forma fofa e diferente —, porém, a pequena cozinha estava irreconhecível, sujeira e utensílios por todo lado. Teria que manter Louise longe daquela parte do dormitório até que criasse coragem o suficiente para limpar tudo. — Mon Dieu, estou frita — sussurrou ao ouvir o barulho da porta da frente abrindo. A tarde do dia seguinte chegou mais rápido do que Fontaine estava preparada. Ela tinha dormido como um anjo na noite passada, de tão exausta, física e emocionalmente, tanto que acordar cedo e, principalmente, levantar foi muito complicado, por mais que tenha descansado bem — odiava acordar cedo, ainda que o fizesse todos os dias desde a escola. A aula foi boa, distraindo-a do trabalho pesado que teria em algumas horas. Então, quando chegou em casa, foi surpreendida com o aroma mais gostoso que recordava ter sentido, encontrando o almoço pronto. A mesa improvisada da sala estava arrumada do jeito mais fofo que já viu Charlotte fazer — e ela era um desastre com essas coisas. — Oh, você chegou bem na hora — recepcionou a morena, sorrindo largamente enquanto carregava a bacia com a melhor macarronada com ovo e muito queijo, usando o avental do Loki que a ruiva tinha lhe dado no aniversário passado. — Fiz o seu preferido — cantarolou. Louise entrou vagarosamente, sem saber o motivo daquilo tudo — não que estivesse reclamando, todavia, será que tinha esquecido alguma data especial? Ela deixou a mochila pendurada no lugar próprio para bolsas e casacos ao lado da porta, seguindo a amiga até a mesinha da sala — elas só comiam ali nas datas comemorativas. — Obrigada, Lottie — agradeceu, fazendo um carinho no cabelo da morena. — Antes que pense qualquer coisa, é apenas uma pequena demonstração de gratidão — começou acanhada, seu rosto aquecendo e o olhar focado nos seus dedos em seu colo. — Você sempre esteve comigo desde que nos conhecemos, embarcando de cabeça em qualquer furada que consigo nos colocar e nós duas sabemos que foram muitas. — Ambas riram, as memórias passando como um filme de comédia em suas mentes. — Eu só queria dizer que te amo muito. Com a última frase, a morena ergueu as safiras para encarar as esmeraldas brilhantes da ruiva, que estava emocionada. Charlotte não era muito boa falando sobre o que sentia, enrolando-se com as palavras — o que era engraçado porque em qualquer outro assunto, ela não calava a boca —, no entanto, era só estar perto da Fontaine ou ser sobre a mais velha que tudo saía tranquilamente. Lottie acreditava que Lou tinha um super poder, deixando a morena à sua mercê. — Você é muito fofa, sabia? — Argh, não estraga o momento, ma bichette — reclamou a Roux, tentando fugir das mãos da amiga, mas Lou conseguia ser bem forte quando queria — talvez os vários cursos profissionalizantes de massagem tivessem lhe dado mais esse poder, era a única explicação que fazia sentido para a morena. Por isso, com alguns segundos de luta — totalmente injusta —, Lottie se encontrava praticamente no colo da ruiva, ganhando muitos beijinhos no rosto e cabelo. A boca não foi tocada, no entanto, as bochechas, nariz, testa e queixo — até o ouvido ganhou um —, não foram poupados. Charlotte não admitiria nem tão cedo o quanto adorava ser mimada por sua melhor amiga — independente de como fosse. Ela sabia que aquele era o jeito da Fontaine dizer que a amava também. — E aí? O que achou? — a mais nova perguntou, suor pingando por todos os seus poros ao que terminaram de mover os móveis do quarto. Louise estava deitada, completamente esgotada, na cama mais próxima — que era a morena. Sua respiração estava falha e curta, os braços esticados — com a certeza de que não funcionariam nunca mais. A ruiva tentou fazer um joinha com a mão direita, contudo, foi em vão, seus membros não a obedeciam de forma alguma. — Vou levar isso como um você é incrível, Charlotte! — Ela gargalhou, girando o olhar para o espaço organizado que tinham feito. — Agora temos luz decente para estudar. — Realmente um gênio. — Não gostei do seu tom irônico — apontou, uma carranca em seu rosto. — Não vou levar para o pessoal, porque, definitivamente, arrasei. Louise riu, conseguindo bater no espaço vazio ao seu lado na cama, chamando-a para deitar consigo e relaxarem um pouco. Lottie aceitou o convite sem pensar muito sobre — seu corpo pedindo por um descanso —, enganchando as pernas nas dela, usando seu ombro como travesseiro. Não era tão comum que ficassem assim, tão juntas, no entanto, com essa mudança, Fontaine demoraria um pouco até se acostumar com a disposição das camas, indo para a da amiga com muito mais frequência do que poderia contar nos dedos. E a Roux, com o bom coração que tinha, jamais expulsaria a ruiva do conforto que era dividir aquele petit colchão de solteiro — estranhamente, seus corpos se encaixavam em uma sintonia perfeita. O céu estava estrelado naquela madrugada, nenhuma nuvem passeando por ali — os meteorologistas prometeram uma semana ensolarada para os parisienses. Eram quase três da manhã e a maioria das pessoas estavam aproveitando o clima fresquinho para recuperar a energia perdida do dia anterior, principalmente Charlotte, que ressoava pacificamente em sua cama — o cobertor jogado no chão. A morena tinha a mania de se mexer bastante durante o sono, incrivelmente não caindo. No entanto, Louise, apesar de exausta pela recente mudança, não conseguia dormir de jeito nenhum. Era por isso que lia um livro qualquer sob a luz mínima do celular — não queria acordar a amiga ou sofreria a fúria da bête Roux. Com uma única tentativa inocente para pedir ajuda em uma receita que queria fazer em uma tarde chuvosa, aprendeu a lição de nunca ousar cometer esse terrível ato novamente. Sua mente estava em outro lugar, não fazendo ideia do que li exatamente, seus olhos apenas passavam pelas palavras que não faziam o menor sentido, virando as páginas automaticamente. Ela sabia que precisava descansar urgentemente, ainda que amanhã fosse sábado e não tivesse que sair para canto algum, haviam duas matérias acumuladas para colocar em dia e a limpeza do dormitório — sem contar que não podia trocar a noite pelo dia como fazia na adolescência. Foi pensando nisso que decidiu fechar o livro, desligando a luz do aparelho, caminhando às cegas para o quarto — pedindo silenciosamente que não batesse seus dedos do pé em qualquer móvel que não via. Nesse momento, Fontaine não raciocinava o que estava fazendo, agindo pelo impulso semi sonolento, querendo apenas comprimir os olhos e afundar no mundo dos sonhos. Era pedir muito? O mais quieta que conseguia ser, agachou para que ficasse à altura da orelha da amiga, apoiando o joelho no colchão macio dela. — Char, posso deitar com você? — sussurrou, tentada a acariciar os fios espalhados por todo seu travesseiro. — Não consigo dormir. A ruiva esperou por uma resposta que não veio. Atravessar o sono profundo da morena era quase impossível, contudo, não quis arriscar mais do que isso. A melhor amiga precisava daquele descanso tanto quanto ela após tudo o que passaram no dia anterior. Sorriu ao lembrar da surpresa que ganhou mais cedo, levantou-se devagar para tentar a sorte na sua própria cama, no entanto, uma mão quente e pequena a segurou pelo short do pijama que usava.. Louise não conseguiu ver seus olhos — pois estavam fechados e a escuridão a impossibilitava de ver muitos detalhes —, mas riu nasalado com a frase embolada que se seguiu de seus lábios, permitindo que a Fontaine deitasse ao seu lado. Parecia que aquela cama — e o calor da morena — tinha algum feitiço, bastando repousar a cabeça pesada de pensamentos no tecido fofo da amiga, que suas pálpebras começaram a se fecharem sozinhas. E antes que caísse totalmente no mundo dos sonhos, Lottie a abraçou, dormindo nos braços da melhor amiga.
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