Capítulo 16

1926 Palavras
Alicia Acabou que a minha mãe saiu e não voltou mais. Meu pai e o tio RD ficaram lá em casa, rindo alto, enchendo a cara e ouvindo umas músicas antigas do tempo deles, que ecoavam pela casa inteira. Eu não tinha muito o que fazer ali no morro, só de escutar aquela barulheira. Minha vontade era de sumir. Peguei o celular e mandei uma mensagem pro Humberto. Quem sabe a gente conseguia dormir juntos hoje? Eu sabia que ele não ia trabalhar à noite, então era a chance perfeita. Enviei a mensagem e fiquei ali ansiosa, olhando a tela. Foram horas até ele responder, mas quando a notificação finalmente apareceu, meu coração acelerou: ele disse que eu poderia ir. Levantei num pulo, me arrumei correndo e peguei a bolsa da minha mãe, aproveitando que ela não tava em casa. Avisei meu pai que eu ia dormir na casa de uma amiga e ele acreditou. Então meti o pé morro abaixo em direção à casa dele. Só que na descida, claro que eu tinha que trombar com a p*****a da Nathalia. Ela tava junto com a Brendinha, duas vagabundas do mesmo nível. — Vai fingir que não conhece agente? — Nathalia soltou, me fazendo parar e encarar as duas. Revirei os olhos. — Qual foi, hein? Tô com tempo não. — Tá indo encontrar o polícia? — a Brenda debochou, mascando um chiclete que nem devia ter mais gosto. Respirei fundo, já sem paciência. — Não, terminei com ele já tem mó cota. — Engraçado que a minha mãe falou que viu tu carinha por lá outro dia. Rolou um remenber lá no prédio dele? — Nathalia sorriu de canto, me cutucando pra ver até onde eu ia sustentar a mentira. — O que vocês querem, hein? Tô com pressa. — cruzei os braços, tentando encerrar logo. — Tu não cumpriu o combinado. — Nathalia rebateu, firme. — Claro que eu cumpri. — minha voz saiu seca. — Tu me garantiu que ia ajeitar o teu coroa pra mim, e o máximo que rolou foi umas trocas de nudes no w******p. Dei de ombros, fria. — Posso fazer nada. A minha parte eu fiz. Se tu não tem competência pra conquistar uma visita intima com um homem preso, é problema teu. Virei de costas e saí andando, sem dar espaço pra resposta. O coração batia forte, não de medo, mas de raiva. Eu sabia que aquelas duas ainda iam me dar trabalho. Principalmente agora que o meu pai tá solto. Desci o morro remoendo o encontro com a Nathalia e a Brenda, mas no fundo, o problema mesmo não era nem elas. O problema era a mãe daquela desgraçada ter descoberto o meu segredo. Porque foi ela, a mãe da Nathalia, que fazia faxina no prédio e me viu lá, com o Beto. E óbvio que ela não guardou aquilo pra si. Foi direto contar pra vaca da filha dela. Desde então, a Nathalia não me deixou mais em paz. Virou uma sombra, atrás de mim. Vivi me lembrando do que tem nas mãos. Dizendo que vai me entregar pro Iago, que vai rodar meu nome na boca do morro, que vai contar pra minha mãe…e que vai transformar a minha vida num inferno. E se isso vaza eu realmente vou viver um inferno. Em troca de silêncio, ela queria o pior dos absurdos: que eu ajeitasse o meu pai pra ela. Como se fosse possível. Como se eu tivesse coragem de trair a minha mãe dessa forma. E como se o meu pai traísse a minha mãe. Então eu precisei ser inteligente. Na hora, sem ter saída, inventei essa confusão toda. Eu achava que meu pai ainda iria passar varios anos preso então comprei um chip, passei pra Nathalia como se o número fosse do meu pai e deixei ela acreditar que tava falando com ele. O resto… eu dei um jeito. Eu pegava o celular da minha mãe escondido e puxava as conversas dela com meu pai. Os áudios que ele enviava pra ela, as fotos, até aquelas imagens íntimas que eles ficavam trocando entre eles. Eu passava tudo pro meu celular e depois mandava pra Nathalia, como se fosse ele mandando pra ela. Tudo que ele tinha enviado pra minha mãe, eu enviava pra ela. Fiz isso por mais de um ano. A Nathalia achava que tava sendo a amante ofício dele, achava que tava vivendo uma com o chefão do morro. Até dinheiro eu mandava os caras da boca levar pra ela acreditar que ele quem tava dando. E assim eu fui alimentando a mentira, mantendo ela ocupada, acreditando que tinha conseguido o que queria. Só que agora que o meu pai tá de volta… eu já sei que ela vai me apertar. Vai querer ficar com ele. Vai exigir algo que eu não tenho como dar. No dia que ele saiu eu mandei uma mensagem pra ela dizendo que era pra eles pararem de conversar e bloquei o número dela. Eu não acreditei que ele realmente fosse sair da cadeia. Se não eu não tinha feito essa p***a. Porque e se isso chega no ouvido dele? Deus me livre! Meu pai é louco, ele nunca me perdoaria. E se chega no ouvido da minha mãe… nossa. Tô ficando desespera. Eu precisava calar a Nathalia de qualquer jeito. Eu não ia correr o risco de ser entregue pro Iago. Agora o que eu vou fazer pra sair dessa? Porque essa farsa pode explodir a qualquer momento e quando explodir, eu tô fudida. Iago Hoje eu dormi m*l pra c*****o. O jantar foi até maneiro, papo reto. Me trataram normal. O problema foi eu ter que engolir o ódio sentado na frente daquele verme desgraçado. Cada vez que o safado abria a boca pra me perguntar qualquer coisa, eu lembrava dos meus pais sendo levados algemados na minha frente. Me dava vontade de sacar a pistola ali mesmo e estourar os miolos dele na p***a da mesa de jantar, espalhar sangue no prato de porcelana, na toalha branca. Quantas vezes eu já não sonhei com isso? Quantas vezes desejei olhar na cara dele e fazer esse cuzão sentir na pele o mesmo que eu senti? Levantei da cama e fui até o espelho. Fiquei encarando meu reflexo, os olhos vermelhos de ódio. Ontem, vendo aquele merda rindo, cercado da família perfeita que ele tanto se orgulha, eu decidi que não vou parar só no que meu pai queria. Vou mais longe. Vou tocar no que ele mais ama. Vou arrancar o coração dele do peito antes de mandar ele pra cidade do pé junto. Se ela é tudo pra ele então eu vou destruir esse tudo. Lavei o rosto, escovei os dentes, arranquei a roupa. Entrei no banho gelado e deixei a água cair nas costas. Tentando esfriar a mente, mas só serviu pra me deixar mais acordado. Saí enrolado na toalha, sequei o cabelo rápido e olhei no relógio. Já era nove em ponto.Tinha marcado dez horas com a Maria Clara. Joguei uma camiseta preta no corpo, bernuda jeans escura, boné e meus anéis que brilhavam nos dedos. Passei um perfume forte, vesti o tênis no pé e caí pra rua. BMW ligada, desci o morro, mas antes dei um pulo na casa dos meus pais. Passei pela porta e já vi os dois sentados na mesa, café da manhã lotado de coisa: pão, bolo, suco, fruta, até iogurte com granola. — c*****o, deu até fome agora. — falei, passando a mão na barriga. — Coisa da tua mãe. — meu pai respondeu, virando o copo de suco de laranja num gole só. — Come, meu filho. Tem iogurte fresquinho. — minha mãe esticou a garrafa, mas neguei com a mão. — Não, vou comer depois. — Sério? — ela voltou a sentar, toda tristinha, e meu pai passou o braço no ombro dela. — Deixa o moleque, Manuela. — disse, e eu fiquei olhando pros dois de canto, pensando no quanto eles se completam. Cruzei os braços e soltei: — Cadê tua filha? — Tua irmã, Iago. — minha mãe me corrigiu séria. — Tá, cadê ela? — Saiu ontem, dizendo que ia dormir na casa de uma amiguinha. — meu pai respondeu tranquilo. Bati a língua no dente, encostado na pia. — Amiguinha, pai? Essa garota vive mais fora do morro do que aqui dentro. Tá metida em alguma p***a. Certeza, que tem homem no meio. — Será? — minha mãe perguntou, mordendo o bolo. — Certeza. Anota. — apontei o dedo pra ela. — Já te falei pra ficar de olho na Alícia. Meu pai só completou, com voz firme: — Bota um menor atrás dela então. Se ela tiver de caô nos descobre. — Ah não, pera aí. — minha mãe reclamou. — Uma coisa é dar uns tapas, outra é ficar seguindo a menina. Meu pai olhou sério. — Tu sabe onde ela tá? — ela negou. — Então pronto. Faz o bagulho, Iago. — Pode crer. Já tava pensando nisso. — confirmei. Minha mãe levantou levando a xícara pra pia e meu pai virou pra mim, ajeitando o corpo na cadeira. — E como foi ontem? — perguntou, se referindo ao jantar na casa do promotor. — Certinho. — respondi curto. Minha mãe levantou a sobrancelha. — O que tem ontem? — ela fala me encarando. — Nada. — cortei logo, olhando pro meu pai, que só balançou a cabeça entendendo. — Vou nessa. — soltei me afastando do balcão onde eu estava encostado. — Vem almoçar aqui hoje. — minha mãe pediu. — Vem não! — meu pai riu falando. — Tô adorando essa casa vazia, dá até pra lembrar do tempo que era só eu e ela metendo em todos os cantos. Igual dois cachorrinhos — falou, soltando a risada alta. Minha mãe ficou vermelha na hora e começou a bater nele. Eu só neguei rindo. — Credo. Me poupe desses detalhes. — soltei rindo e saí ouvindo ela brigando com ele. Ainda bem que não moro mais lá, senão ficaria traumatizado. Entrei no carro e parti pro condomínio da Maria Clara. Assim que encostei na entrada, vi ela em pé me esperando com uma mochila preta nas costas e um vestido claro que batia na coxa. Cabelo solto e celular na mão. Tava bonita. Destravei a porta, ela entrou e a primeira coisa que fez foi ajeitar o cinto. O perfume caro dela tomou conta do carro todo. — Trouxe tudo que que tu pediu. — falou, colocando a mochila no colo. Assenti, botei o carro pra andar. — Onde tu vai me levar? — perguntou, olhando desconfiada. — Pediu até roupa de banho... — Angra. Ela arregalou os olhos, o rosto todo em choque. — Tá brincando, né? Amanhã cedo eu tenho atendimento! — me olhou nervosa. — Avisa que aconteceu um imprevisto, vai ter que faltar. Avisa teus pais também. — respondi frio, por trás do óculos escuro. Ela riu nervosa e balançou a cabeça em negação. — Você é louco. Eu não posso fazer isso. Devia ter perguntado se eu poderia ir. — Se eu perguntasse, tu vinha? — falei sem olhar, focado no volante. — Não. — respondeu direta. — Então pronto. — aumentei a playlist, deixei o braço apoiado na janela, girando o volante com uma mão. De canto de olho, vi ela me observando às vezes. Quando percebia, disfarçava e virava a cara pra janela. — Te garanto que vai ser o melhor domingo da tua vida!
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