Capítulo 54

1499 Palavras
Alícia (Dois dias atrás) Eu tava tremendo, as mãos suadas, o coração batendo tão forte que parecia que eu ia infartar. O banheiro do apartamento do Humberto parecia girar enquanto eu olhava praquele teste em cima da pia. Duas linhas. Nítidas. Rosas. — Não… não pode ser… — sussurrei, nervosa. Dei dois passos pra trás e bati as costas na parede. Peguei o teste sobre a pia e ele caiu no chão, e o som dele batendo no piso me fez fechar os olhos. Por um segundo, um filme passou na minha cabeça, e a realidade bateu na minha cara. Sem casa, morando num barraco cheio de mofo e sem um real furado. — Jesus… — levei a mão na cabeça, enfiando os dedos no cabelo, o corpo inteiro tremendo. — Isso não pode estar acontecendo… não pode. Me abaixei, pegando o teste de novo, mesmo sabendo que não ia mudar p***a nenhuma. Olhei outra vez. As duas linhas ainda estavam ali, me encarando. O chão fugiu do meu pé, o banheiro pareceu pequeno demais pra caber eu e aquele resultado. Sentei no vaso, tentando respirar, o coração batendo na garganta. E, no meio de tudo isso, uma pontinha de riso escapou — um riso nervoso, sem sentido. — Grávida… eu tô grávida. — falei baixinho. E por incrível que pareça, no meio do caos, eu me sentia... feliz. Feliz por ter um pedacinho do Humberto dentro de mim. Encostei as mãos no rosto, dei risada e chorei ao mesmo tempo. O medo veio primeiro, depois o desespero. Mas aí... aí veio o pensamento nele, e foi como se tudo dentro de mim ficasse diferente. O susto virou alegria, o medo virou uma vontade absurda de contar logo. Eu conseguia imaginar a cara do Humberto de alegria. Já vou começar a trazer as minhas coisas pra cá, pensei. Tenho certeza que, a partir de agora, tudo vai mudar… tudo vai ser diferente. Eu tava disposta a vir morar aqui, íamos criar nosso filho juntos, e eu nunca mais ia precisar pisar naquela droga de lugar. Levantei, lavei o rosto na pia e sorri ao me olhar no espelho. O sorriso saiu tremido, meio bobo, meio confuso, mas saiu. — Ele vai ficar feliz, Alícia… tenho certeza. — falei pra mim mesma e acariciei a barriga lisa. Peguei o celular na pia e fiquei olhando pra tela, sem coragem de mandar mensagem. O dedo tremendo sobre o nome dele, mas o coração... tava a mil. Mensagem: Vem almoçar em casa hoje. Quero te contar uma coisa. Surpresa boa. Ele visualizou. Mas não respondeu. Saí do banheiro com as pernas tremendo, o coração ainda disparado, e joguei o celular na cama. Comecei a andar de um lado pro outro no quarto, tentando me acalmar. Abri o guarda-roupa, puxei minha roupa que estava guardada ali — uma blusinha branca e uma calça jeans apertada — me troquei às pressas e penteei o cabelo. Peguei o celular e saí. O sol tava quente pra c*****o, um sol pra cada um nesse Rio de Janeiro. E eu nem sabia direito pra onde tava indo, só sabia que queria fazer uma surpresinha legal pra ele. Peguei o ônibus e fui parar no shopping. Andei por várias lojas até achar uma caixinha bonitinha, branca, com um lacinho dourado. Comprei. Na loja ao lado, vi um sapatinho de bebê de crochê amarelinho e uma chupetinha combinando. Meu coração derreteu e comprei também. Passei na farmácia e comprei outro teste, daqueles digitais que mostram as semanas. Voltei pro apartamento do Humberto e fui direto pro banheiro. Fiz o teste de novo e esperei os segundos mais longos da minha vida. “2-3 semanas.” Era inacreditável, eu realmente estava grávida. Peguei a caixinha, ajeitei o sapatinho de um lado, a chupetinha do outro, o teste no meio. Ficou lindo. Perfeito. Escrevi um bilhetinho à mão, minha letra tremida de emoção. "...De um amor que parecia impossível, nasceu algo puro, inesperado e forte o bastante pra encher o nosso mundo de amor.…" Dobrei, amarrei junto do laço dourado e fiquei olhando praquilo, emocionada. Arrumei a mesa e botei as panelas em cima. O frango fritei que ele gostava, arroz, feijão, batata e deixei uma Coca gelando. Tudo no capricho. Tudo uma delícia. Fiquei olhando o ponteiro do relógio marcar uma, uma e meia e duas horas. Até que ouvi o barulho da porta abrindo. Corri, com o coração saindo pela boca. — Amor! — sorri, indo pra cima dele, pronta pra abraçar. Mas ele entrou direto, distante. Fui beijar e ele virou o rosto. — Que foi? — perguntei baixinho. Sem entender nada. — O que foi o quê? — respondeu e nem olhou pra minha cara direito. — Eu fiz uma surpresa pra você... preparei a comida que você ama. — Surpresa? — ergueu a sombrancelha. — Tu me chamou só pra isso? Tô cheio de coisa pra fazer. — Não é só isso... é que eu precisava te contar um negócio. Aí eu pensei em fazer um almoço pra te contar de um jeito bonitinho. Fiz até aquele frango que você ama... — Já comi na rua — cortou. — Mas... — Fala logo que tô com pressa — soltou, impaciente. Engoli seco, super sem graça e senti meu coração sendo esmagado aos poucos. — Tá... tá bom, pera aí. — saí correndo pro quarto, trêmula. Peguei a caixinha em cima da cama, respirei fundo e voltei pra sala. Ele tava sentado no sofá, cotovelo apoiado nos joelhos, cabeça baixa e o olhar perdido em algum lugar. Cheguei devagarinho, sorrindo. — Pra você. — falei, tirando a caixa de trás do meu corpo. Ele levantou os olhos e me olhou sem expressão. — Que é isso? — perguntou, sem mexer um músculo. — Pega... — estiquei a mão, sorrindo. Ele pegou a caixa.. — Tem um bilhetinho aí. — falei, animada. Ele desfez o laço, puxou o papel e começou a lêr. Fiquei olhando pra ele, ansiosa. — Lê alto. — pedi rindo, mexendo no cabelo, nervosa. Ele leu de novo, baixo e franziu a testa. — Não entendi. Que p***a é essa? — jogou o papel no chão. Meu sorriso morreu ainda no rosto. — Abre a caixa. — falei baixo. Ele abriu, olhou o sapatinho, olhou o teste, voltou pro sapatinho e olhou pra mim. Fiquei sorrindo igual uma tonta, o rosto molhado de lágrima. Enquanto ele não dava um sorriso e se mantinha imóvel. — Eu tô grávida, amor... — sussurei, o sorriso abrindo de orelha a orelha. — A gente vai ter um bebê... O olhar do Humberto era gelado. Ele levantou lentamente, segurando o teste na mão e jogou longe. — Que p***a é essa, Alícia? — segurou meu braço com força, me puxando pra perto dele. — Tu sabia que eu nunca quis ser pai. Como assim tu tá grávida? — Eu... eu não sei o que aconteceu... eu sempre tomei a pílula certinho, juro... só que eu mudei a marca... eu te falei... deve ter sido por isso... — as palavras saíam emboladas, atrapalhadas umas nas outras. — Se tu sabia que podia dar merda, por que veio esfregar essa b****a pra mim? — Humberto... — falei, incrédula. Com os absurdos que saiam da boca dele. O homem na minha frente não era o mesmo. Apesar dele sempre ter me tratado m*l, ele nunca tinha sido tão e******o como tava sendo agora. — Eu não quero ser pai. Nunca quis. Tu não pode simplesmente arrumar uma barriga e jogar pra cima de mim, não! — Como assim arrumar? Esse filho é teu! — gritei, chorando — Eu nunca me deitei com ninguém além de você, Humberto. Você foi o meu primeiro! Ele riu, debochado. — Perdeu comigo, né? Pois é... perdeu comigo e achou com o morro todo. Ele soltou meu braço de uma vez e eu senti tanta raiva que virei a mão na cara dele na hora. — ME RESPEITA! — gritei, empurrando ele. — Te respeitar? Não, eu não te respeito. Tu é uma mentirosa do c*****o. Que mentiu até o teu nome, p***a! Mentiu sobre tua mãe, teu pai, até onde mora! E acha que eu sou o****o de acreditar em tu? — Eu não acredito em nada que venha da tua boca, Alícia! — gritou na minha cara. As lágrimas desciam uma seguida da outra. — Você não pode fazer isso comigo... — O negócio é o seguinte — disse frio — eu não quero ter filho, nunca quis. Então tu vai dar teu jeito de tirar isso. — Quê? — minha voz falhou. — Você tá maluco? — Tô não. Resolve essa p***a. Eu não quero saber como. Mas resolve. Ele pegou as coisas, o celular, a carteira e foi indo em direção à porta. — Humberto, você não pode ir embora assim! Eu tô grávida! Vamos conversar — gritei. Ele virou de lado, me olhando com desprezo. — Problema é teu. Se vira.
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