EMELIA
Eu sabia que ia me sentir uma merda desde o minuto em que o
sol nascesse.
Estou no chão novamente. Desta vez, estou bem perto da
janela. No vão onde se encontra a porta do banheiro privativo.
Tenho tentado me distrair com o cenário diante de mim, observando as ondas baterem contra a costa da praia dourada. Esse cenário tem sido minha única companhia. Entre olhar para ele ou enlouquecer.
Olhar para ele ou permitir-me escorregar para a miséria de
como tudo isso é fodido.
Não há relógio aqui, mas posso dizer que deve ser no final da manhã.
O voo em que eu teria ido para Florença partiu há muito tempo sem mim.
É engraçado. Quando me imaginava indo, me via na Academia,
mas não me via entrando no avião. Não fazia parte da visão. Estava faltando. Talvez seja tolice pensar em coisas assim, mas aconteceu, certo?
Eu não entrei no avião. Estou aqui, e ao perceber que aquele
avião decolou esta manhã sem eu ir a bordo, realmente aceitei que esse pesadelo seria meu novo inferno.
Continuo repassando tudo em minha mente e me perguntando
se papai nunca previu isso. Como podia ele dever tanto dinheiro? O que diabos aconteceu? Como aconteceu?
Então houve ontem à noite. Eu não poderia estar mais envergonhada pela maneira como me comportei enquanto Massimo me tocava. Eu gozei. Gozei em seus dedos, e me encontrei saboreando sua língua lambendo meu c******s. Embora eu não tenha feito nada com ele, me senti uma v***a. Não posso negar que gostei. A evidência estava lá em meus gemidos, e o d***o lambeu meu fluxo e minha dignidade.
Merda. É tudo uma merda. E o que acontecerá depois? Ele
prometeu da próxima vez.
Olhei para a pequena bandeja de comida que estava sobre a
mesa quando acordei. Eu assumi que ele trouxe. Não toquei nela. Eu não quero nada. Não posso comer até que tenha um bom plano de como eu deixarei este lugar. A praia fica perto, mas não conseguirei chegar daqui. Há uma janela, mas surpresa, surpresa... está trancada, e não há nada pesado o suficiente aqui que eu possa usar para esmagá-la. Além disso, esmagá-la alertaria as pessoas. Eu não quero isso.
Também prefiro não fugir pelo mar porque não sei nadar muito
bem. Quando eu tinha dez anos, um menino da minha escola primária se afogou. Eu tenho sido cautelosa com a água desde então.
Mas… nadarei se for essa a saída. A julgar pela falta de gente na
praia e pelo clima perfeito, eu diria que a praia que estou olhando é particular. Acho que pertence à casa. Há muita terra ao redor, como onde moro com papai. Então, suponho que haverá guardas também.
Não conhecerei bem os arredores até que Massimo decida me
mostrar. Se ele fizer isso. Não sei se ele pretende me manter trancada aqui, ou o que diabos ele fará comigo.
A chave chacoalha na porta. Meu coração aperta. Ao contrário
da noite passada, eu me levanto, me ponho de pé e me preparo para ele.
Quando a porta se abre, a tensão em meus ombros desaparece quando vejo um guarda e duas empregadas uniformizadas. Uma está carregando uma sacola da Neiman Marcus e a outra uma bandeja de sanduíches.
Ambas são italianas. Uma parece ser um pouco mais velha do
que eu, enquanto a outra parece estar na casa dos cinquenta. Elas entram no quarto, mas o guarda fica do lado de fora. Uma medida de segurança para ter certeza de que se tento fugir, ele me impedirá. Deus, isso é um pesadelo.
— Bom dia, signorina, — diz a mais nova com um sorriso. — Eu
sou Candace, e esta é Pricilla. — Ela aponta para a senhora mais velha.
— Buongiorno, — diz Priscilla, falando com um toque de
sotaque.
— Oi, — respondo, decidindo que elas parecem
inofensivas. Pelo menos eu espero que sim. Candace olha para a comida intocada.
— Você não estava com fome? — ela pergunta.
— Não, — minto. Estou morrendo de fome, mas acho que
vomitarei e nunca mais pararei se comer alguma coisa. — Você trouxe a comida para mim?
Ela acena. — Sim. Deveria tentar comer alguma coisa.
Não respondo. Ambas parecem pessoas legais, então não quero
ofender nenhuma delas.
— Você não vai provar? — Priscila pergunta.
Balanço minha cabeça. — Não quero nada, — respondo.
Elas se entreolham. Eu me pergunto o que Massimo lhes disse. Como cheguei aqui e tudo. Ele lhes disse a verdade? Que praticamente me comprou? Ou é mais apropriado descrevê-lo como sendo sequestrada e mantida em cativeiro contra a minha vontade. Imagino estar em um cenário de tribunal e o juiz ditando as diferentes sentenças. Tenho certeza de que qualquer tribunal concordaria com tudo o que foi dito acima. Eu nunca concordei com nada disso. Tudo o que alguém precisaria fazer era abrir uma porta, e eu correria para muito, muito longe, para nunca mais voltar.
— Eu trouxe algumas... hum, roupas. O Sr. D'Agostino queria
que você ficasse com isso até que suas coisas chegassem, — Candace diz, estendendo a bolsa para mim. Seu sorriso desaparece quando eu não a pego.
Balanço minha cabeça para ela. f**a-se as gentilezas. f**a-se
tudo.
Eles estão todos juntos nisso. Eu não quero nada.
— Não quero nada disso. Ele me sequestrou e me trouxe aqui para morar com ele. Eu não quero nada. Não preciso de comida. Não preciso de roupa. Definitivamente não quando tenho a minha própria. Eu tenho mais do que meu quinhão de roupas. Não preciso de novas. — As palavras saem da minha boca enquanto cerro os punhos ao meu lado.
Ambas parecem não saber o que dizer para mim. Não posso
culpá-las, pois eu também não saberia.
Os lábios de Priscilla se abrem como se ela fosse dizer algo, mas
suspira.
— Que tal deixá-las aqui? — Candace oferece, colocando a bolsa
no canto da penteadeira. — Talvez você mude de ideia na hora do almoço.
— Eu não quero almoçar ou jantar. Não quero nada. Só quero ir
para casa. — estremeço. Olho para Priscilla, que parece oferecer mais simpatia.
— Desculpa, querida. Nos disseram para deixá-la confortável.
Não podemos fazer mais nada, — diz ela.
Excelente. Simplesmente ótimo. Perfeito.
Levo minha mão à cabeça e me forço a não chorar
novamente. Sem mais lágrimas. Eu não posso chorar mais. Já chorei o suficiente.
— Quando minhas coisas chegam aqui? — exijo.
— Nós não sabemos, — Candace responde.
— Posso fazer uma ligação? — Eu quero ligar para Jacob. Chamar a polícia seria a coisa razoável a se fazer, mas no meu mundo, eu sei que não devo ligar para policiais. Se sair de uma situação como a minha, vai para as colinas e reza para que o inimigo nunca te encontre. — Preciso ligar para meu amigo.
— Receio que isso não seja possível, — responde Priscilla.
— Eu não posso usar um telefone? — suspiro. A agonia na
minha voz é evidente.
— Vamos falar com o Sr. D'Agostino sobre isso.
Sinto aquela sensação de tontura novamente, como se eu fosse
desmaiar. — Posso ir lá fora? Para um pouco de ar fresco.
Quando Candace morde o interior do lábio, recebo minha
resposta. — Ainda não, — diz ela.
— Onde está Massimo? Onde ele foi? — Minha voz soa murcha.
— Ele vai estar em reuniões de negócios o dia todo.
— É domingo, — aponto, me sentindo estúpida. Talvez o negócio seja um código, como geralmente é. Talvez seja código para trepar. Ele é rico. Por que estaria em reuniões o dia todo em um domingo?
— Nós vamos sair e dar-lhe algum tempo. Eu voltarei e checarei
você mais tarde, — Candace promete.
As duas saem e a porta se fecha. A chave chacoalha e meu
coração aperta.
Estou trancada novamente.
Eu ando até à parede e dou um soco nela, machucando minha
mão. Não me importo. Isso me faz sentir algo diferente de impotente e inútil.
Eu me afundo contra a parede, retomando minha antiga postura
patética, e fico lá.
As horas passam. Candace vem como ela prometeu. Ela tenta
sempre falar comigo, mas eu sou uma concha. Priscila também vem. Doulhe o mesmo tratamento. Eu também não como. Não posso.
A noite cai. Fecho os olhos, adormecendo na minha nova
prisão. Lembro-me de pensar em viver com meu pai como sendo mantida em uma gaiola dourada.
Isso não era nada. Eu estava bem naquela época. Só não sei por
que ele cuidaria tão bem de mim e permitiria que isso acontecesse. Eu o culpo, mas no fundo sei que ele foi forçado. Essa é a única explicação. Os monstros D'Agostino forçaram sua mão. Foi por isso que ele se comportou do jeito que o fez.
Mas ele me vendeu.
Não havia outra maneira?
Não sei no que acreditar e o que fazer. Tudo me dói
profundamente, e cada vez que penso na Itália, meu coração se parte um pouco mais.
Eu vagueio e flutuo em um sonho, então a queima faz cócegas
no meu nariz e eu me mexo. Fumaça. Fumaça de tabaco como o tipo que meu avô costumava ter. Papai também fuma quando tem companhia, mas meu avô sempre tinha um charuto.
Meus olhos se abrem para ver a luz do sol brilhante. É de
manhã, e uma brisa suave acaricia minha pele.
Brisa. Meus olhos se arregalam. Eu me viro em direção à janela,
mas paro no meio do movimento quando o vejo.
Massimo está sentado no parapeito da janela — sem camisa, fumando um charuto.
Minha respiração falha por dois motivos. A primeira é a visão
dele sem camisa. A outra é o medo.
Tenho medo dele. Não vou mentir para mim mesma ou ser uma
heroína e acreditar que posso dominá-lo. Não posso.
Ele apaga o charuto e se levanta, me dando uma visão melhor de seu corpo. Há tatuagens cobrindo todo o lado esquerdo de seu abdômen e por todos os braços. Há um anjo tatuado em seu peitoral esquerdo, e então o que parece ser uma escrita em árabe ao longo do lado direito de seu torso e quadril esquerdo. Eu não sei nada do que dizem, porém, e não darei a ele o prazer de ficar olhando por muito tempo. Não quando ele parece chateado. Eu me levanto quando ele se aproxima e rezo silenciosamente para que meu coração não bata no peito. E que eu não morra de susto.