Vivendo algo novo!

1470 Palavras
LARA NARRANDO Eu decidi que precisava dar um passo a mais na minha vida. Tinha me inscrito para conseguir passagem para a cidade vizinha todos os dias, a Heloisa também ia, nós iríamos procurar um emprego, de um jeito ou de outro. Hoje seria o primeiro dia, e por mais que fosse contra a vontade da minha mãe, porque ela prefere muito mais que eu esteja ali para fazer tudo o que ela quer, dar banho nas crianças e tudo mais. Só que infelizmente eu preciso ir contra o que ela quer, finalmente chegou a hora de viver para mim e a favor do que eu quero, eu preciso ir atrás dos meus sonhos, coisa que se eu não fizer, ninguém vai fazer por mim. Acordei era 4h30 da manhã, ainda estavam todos dormindo. Lavei o rosto, penteei o meu cabelo e passei um pouco de água na franja pra ela poder ficar lisinha, ou pelo menos colada no couro cabeludo. Por mais que o meu cabelo seja liso, ele está muito m*l cuidad, eu só lavo ele com sabão em pedra que minha mãe faz, não temos dinheiro para shampoo e condicionador. Coloquei uma calça jeans que já faz uns 3 anos que tenho ela, está com um pequeno furo no meio das pernas, mas conforme eu ando não dá pra ver. A blusa era uma preta, mas que já estava um pouco cinza, por conta de tanto que já foi usada também. Eu sei que quando vamos procurar emprego temos que estar bonitas e bem apresentadas, mas é tudo o que eu tinha. Heloisa ia me emprestar uma sandalinha que amarra atrás do calcanhar, porque eu mesma só tenho chinelo. Então coloquei o chinelo, peguei meu documento e fui pra casa dela. Chegando lá ela estava fazendo de tudo para não acordar a mãe dela, e disse que segundo o que o médico disse, aquele remédio que era novo ia fazer ela dormir até umas 15h da tarde, que por coincidência era justo o horário que o ônibus volta para Acauã. — Amiga, toma aqui o seu currículo, eu pedi pro meu primo que trabalha na lan house imprimir pra gente. — Ela disse cochichando para não acordar a mãe dela. — O que é currículo meu Deus, nunca ouvi falar. — Eu disse pra ela, eu realmente não sabia o que era isso. — Currículo é o que você precisa para conseguir um emprego uai. Eu fiz o seu assim, era o que eu sabia sobre você. — Ta bom amiga, vai dar tudo certo. — Sim vai sim, já está dando. — Ela disse pegando a bolsinha dela, os currículos dela e fomos saindo. Nós teríamos que chegar bem rápido no ponto de ônibus, porque se chegar lá e tu não tiver, meu amor eles te deixam pra trás sem nem pensar duas vezes. Isso porque a moça que é guia do motorista sempre tem a lista de quem vai e quem não vai. Chegamos e não deu dois minutos e o ônibus encostou também, estendi o braço e ele parou. Assim que entramos, sentamos nos últimos dois bancos que estavam vagos, realmente os lugares ali é contadinhos, graças a Deus que conseguimos arrumar vaga a tempo. Minha barriga já estava roncando, Heloisa me perguntou se eu tinha comido alguma coisa antes de sair e eu disse que sim, por vergonha de falar para ela que eu nem me lembrava quando tinha sido a última vez que eu tinha comido de verdade, uma refeição que eu realmente pudesse dizer que estava satisfeita. Comecei a olhar pela janela do ônibus e parecia que um filme ia passando pela minha cabeça, eu estava muito confiante de que tudo ia dar certo, e que isso ia acontecer o quanto antes. Deus nunca me desamaparou e eu vou confiar nele até o fim! Ainda ali, no caminho para a cidade que a gente ia tentar encontrar alguma coisa, comecei a ler o tal dos currículos, e lá tinha todas as informações. Eu comecei a comparar o meu com o da Heloisa e não consegui entender porque no dela tinha mais coisas e no meu só tinha meu nome completo, meu endereço e o que eu queria conseguir na empresa que fosse me contratar. — Amiga, nessa parte aqui de experiências no seu tem um monte de coisa e no meu nada. Por que? — Eu questionei ela enquanto ia apontando para o papel, tentando mostrar o que eu queria dizer. — Amiga essa parte aí é de onde você já trabalhou.. — Ela disse e fez uma cara um pouco sem graça. — Ah, verdade né miga. Eu nunca trabalhei pra ninguém.. — Eu disse concordando com ela, abaixei a cabeça e guardei os papéis de volta no saquinho pra não amassar e nem sujar. Agora chegou o meu momento, quero só ver quando mainha acordar e ver que nem em casa eu estou, até porque tudo que eu fiz para conseguir sair hoje, a vaga no ônibus e tal ela nem tava sabendo. Pelo jeito que eu bem conheço, ela pode até mandar eu dormir fora de casa, ainda mais do jeito que ela está insuportável. As vezes eu até entendo o meu pai, por ele ter ido embora, eu acho que ele já não aguentava mais a vida que vivia, minha mãe extremamente mandona e autoritária. Conviver com uma pessoa assim é uma das piores coisas que eu já vi na minha vida. — Vamos Heloisa, chegamos!! — Eu disse cutucando ela enquanto o motorista olhava com uma cara de bosta pelo retrovisor, esperando só a gente descer. — Oi, oi, vamos!! — Disse ela acordando e pegando as coisas, parecia que nem sabia onde estava. Eu nem consegui dormir, a ansiedade estava me consumindo desde o dia anterior. Eu nem fazia idéia do que tinha que falar, muito menos como agir. Meu único medo é que as pessoas rissem da minha cara quando eu entrar nos lugares. Mas eu acho que nada que eu passar aqui hoje se compara ao que eu vivo na minha casa e na minha vida de merda! Resolvemos que iria cada uma pra um lado e depois nos encontraríamos em um lugar em tal horário. Porque nenhuma das duas tinha celular, então não tinha como ser de outra forma. Peguei os meus currículos e fui entrando em algumas lojas. Já era 8h30 da manhã, e algumas já estavam abertas. Eu ia entrando e a primeira coisa que as pesssoas faziam era me olhar de cima em baixo, e assim as minhas esperanças iam diminuindo cada vez mais, eu sentia medo, sentia vergonha de simplesmente ser eu. Primeira loja era de roupas de bebê, pensei até que se desse certo eu poderia comprar algumas roupas pros meus irmãos, mas a moça disse que se caso precisasse iria me ligar, mas disse de um jeito que eu tinha certeza que se tinha uma coisa que ela não ia fazer, essa coisa era me ligar. Segunda tentativa uma loja de cosméticos, assim que entrei a moça disse: — Bom dia!! Em que posso ajudar? — Ao mesmo tempo que o seu olhar ia subindo e descendo, observando todos os detalhes possíveis. — Posso deixar um currículo meu? Eu estou precisando de um emprego para ajudar meus irmãos e minha família. — Eu disse e dei um sorriso amarelo. A cara dela de quem estava me medindo de cima abaixo só piorou, até que tudo ficou pior ainda quando ela disse: — Olha moça se quiser eu até posso chamar a minha gerente, mas eu acho que vai ser perca de tempo. Não sei se tu reparou mais aqui é uma loja de cosméticos, a vendedora tem que estar pelo menos limpa né? — Ela disse e naquele momento fixou ainda mais os olhos em mim. Eu nunca tinha me sentido tão humilhada, por mais que eu já tenha sentido todas as coisas ruins possíveis, humilhada foi a primeira vez. Me senti completamente inútil, como se ela tivesse total razão. Dentro de mim infelizmente eu estava concordando com ela. Me senti sem forças e a única coisa que eu consegui dizer para ela foi: — Tem razão. Muito obrigada. — Eu disse e virei as costas, o nó na garganta era tudo o que eu conseguia sentir. E dois passos que eu dei depois de ter respondido ela e agradecido, foi tudo o que eu consegui dar antes da lágrima cair... Uma lágrima atrás da outra, ia pingando no meu currículo que estava em mãos e fora do saquinho. Era aquele tipo de choro que mais dói, que acontece em silêncio, sem expressão, a lágrima era a única coisa que realmente indicava que eu estava chorando. Esse é o tipo de choro mais dolorido que existe!
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