A descida para o café da manhã foi um mergulho em uma realidade que parecia, de repente, tridimensional demais. Os degraus da grande escadaria de mármore da mansão Blackwolf, antes familiares, agora rangiam sob seus pés como se protestassem contra o peso da verdade recém-revelada. O perfume de café forte e pão fresco assado subia, misturando-se com o cheiro do mar da Costa da Lua, um aroma salgado e selvagem que a fez se sentir um pouco mais aterrada.
Quando entraram no salão de jantar, o burburinho de vozes cessou abruptamente. O som da louça tilintando e os murmúrios de conversa casual foram engolidos por um silêncio carregado, quase espesso. Todos estavam ali: os sogros, os pais dela, os irmãos de Bryan emos
Irmãos de Mia , suas esposas e cunhadas de Mia , membros da alcateia , amigos íntimos. A preocupação em seus olhares era nítida.
A atmosfera estava um pouco tensa, densa como o ar antes de uma tempestade. Ninguém mencionava o ocorrido diretamente, mas a tensão era quase um personagem à parte, um nó sufocante que apertava a garganta de todos.
Bryan, ao lado de Mia, sentiu-lhe a mão estremecer levemente. Ele apertou-a com discrição, um gesto silencioso de apoio que apenas Mia percebeu. Mas algo mais estava acontecendo — uma conexão mental, sutil e urgente, que apenas ele e Benjamin podiam perceber.
_“Bryan… você disse a Mia que foi envenenado?”Que Lívia usou a planta proibida do uivo carmesim em você?”_
“— Não disse, mais não importa, Ben… não vou ficar justificando o que fiz. O que eu fiz já está feito e agora o que me resta é pedir perdão e mostrar a ela o quanto a amo… mais do que a mim mesmo….”
Benjamin sentiu a determinação misturada com culpa na mente de Bryan. O olhar de ambos se cruzou por um instante enquanto Mia e Lívia trocavam farpas — um duelo silencioso, mas mortal, à vista de todos.
Lívia sorria para Mia. Era como se Lívia estivesse dizendo sem palavras: “Eu venci, Mia. O jogo é meu.”
Quando Mia a viu conversando casualmente com Chloe, sua irmã, a sensação foi avassaladora. A dor se intensificou, misturando-se com a fúria. O desprezo que ela sentia por Lívia, e o m*l-estar crescente de saber que aquela mulher era sua própria irmã, tornou-se quase insuportável. Mia não conseguia evitar a sensação de que tudo o que havia tentado construir, todas as suas tentativas de estabelecer limites, eram um mero jogo para Lívia. A visão delas, sorrindo e trocando palavras como se nada tivesse acontecido, fez Mia se sentir horrível, como se estivesse presa em um pesadelo do qual não podia acordar. Sua loba interior se mexia desconfortável, uma energia pulsante correndo sob sua pele. Algo nela estava alerta, pronta para afundar as garras naquela mulher, rasgar a fachada de superioridade que Lívia carregava com tanta facilidade.
Mas, por dentro, o turbilhão não era apenas sobre Lívia. Mia estava consumida pela dúvida.
Eu perdoaria Bryan? Ela pensava.
Será que conseguirei lidar com tudo o que ele me mostrou essa manhã?
O que fazer com as emoções que ele despertou em mim? Os pensamentos a arrastavam para um abismo, enquanto sua mente tentava processar os últimos momentos com ele antes de descerem para o café.
As palavras dele, o toque, a súplica em seu olhar… Mas havia algo mais: uma raiva profunda, um medo paralisante de ser ferida de novo. Ela não sabia o que faria com essas sensações. Mas que se dane a vingança por enquanto, pensou. Eu não vou perder para Lívia. Não vou me colocar de joelhos para a loba de olhos amarelos que está à minha frente. Não mesmo. Os pensamentos a consumiam.
Ela respirou fundo, sentindo o ar queimar em seus pulmões. Eu sou a p***a da loba mais forte daqui. Lívia só ganharia essa luta por cima do meu cadáver. Com um movimento quase mecânico, ela se aproximou de Bryan, ainda tentando controlar o turbilhão dentro de si.
Foi ali, com todos os olhos da alcateia voltados para ela, que Mia fez algo que ninguém esperava.
Foi nesse momento que Lívia, com seu sorriso sarcástico, decidiu cortar o silêncio e testar os limites. Ela virou-se para Bryan, os olhos dourados brilhando com uma malícia que Mia imediatamente reconheceu.
— Então, Bryan… como está o divórcio? — A pergunta foi disparada com um tom de desafio, sua voz suave, mas carregada de veneno que escorria pelas sílabas. Ela a olhou diretamente, um brilho de triunfo em seu olhar, como se soubesse que estava criando uma fissura na frágil fachada de Mia e Bryan.
A sala pareceu congelar. Os olhos de todos estavam sobre eles, como se aguardassem uma resposta, a respiração suspensa no ar. Mas antes que Bryan pudesse reagir, a voz de Elizabeth, a mãe das duas, cortou o ar como uma lâmina afiada.
— Lívia, não faça isso. — Elizabeth falou com firmeza, a expressão serena, mas carregada de um peso de autoridade que todos na sala reconheciam. Seu olhar, frio como gelo, fixou-se na filha. — Não seja esse tipo de mulher. Respeite a sua irmã. Ela é sua Luna e companheira de Bryan. O vínculo entre companheiros destinados pela Deusa da Lua é sagrado e inaceitável que você se meta nesse tipo de jogo.
Mia tinha duas opções: ignorar a lâmina ou devolver o corte no lugar exato. Todos estavam ali — pais, sogros, cunhados, membros da alcateia — reunidos naquela enorme mesa. As crianças estavam em outra mesa, cuidadas pelas babás ômegas. Dentro dela, algo rosnava baixo e feroz: “essa v***a… vamos arrancar a garganta dela fora.” Mika, a loba, gritava, faminta.
O olhar de Lívia vacilou por um segundo, a ponta de seu sorriso quase sumindo, mas ela não recuou, apenas um piscar rápido que Mia percebeu. Mia, no entanto, sentiu o calor da fúria subindo em suas veias novamente, uma queimação familiar. Não, Lívia não vai ganhar, pensou. Eu não vou me deixar abalar. Não aqui. Não agora.
Lívia, não contente com a tensão já instalada, decidiu injetar mais veneno no ambiente. Com um sorriso afiado de autossatisfação, ela lançou a adaga que julgava mortal:
— Que patético, irmãzinha… — Sua risada ecoou, debochada e estridente, tentando forçar uma naturalidade que soava falsa como moeda de mentira. — Tentando forçar uma felicidade que não existe, quando todo mundo nesta mesa sabe que seu casamento não passa de fachada. Bryan não te ama — cuspiu as palavras com doce malícia. — Ele nem sequer se dá ao trabalho de disfarçar. Está contigo por dever, não por amor.
Lívia recostou-se na cadeira, triunfante, convencida de que cada sílaba atingira como um projétil envenenado.
Dentro de Mia, Mika rosnava, uma fera acuada exigindo sangue. _“Vamos arrancar a língua dessa c****a insolente!”_
Mas Mia não era uma loba comum. Era uma Sigma, uma Rainha Luna. E Rainhas não caem em provocações baratas. Em vez de recuar, seus dedos envolveram uma torrada com movimentos deliberadamente lentos. A faca deslizou sobre o cream cheese com precisão cirúrgica, cada movimento um ato de domínio sobre o caos.
Então, ergueu os olhos. Eram como gelo sob a luz da manhã — afiados, translúcidos e mortalmente frios.
Mia não recuou. Com movimentos leves, precisos, ela pegou a torrada, e a mordeu de forma delicada com um gesto quase ritualístico, e só então estreitou os olhos — afiados como lâminas polidas. Olhou para Lívia do outro lado da mesa, perfeitamente calma, elegantemente fria.
— Vejo que está desesperada por atenção, irmã — disse, com um sorriso teatral, quase compassivo, como quem lamenta a desgraça de um brinquedo quebrado. — O seu alfa não te dá atenção, não é? Sabe, eu me compadeço da sua frustração… deve ser triste viver à sombra de alguém tão superior como eu… E saber que seu marido só está com você para ficar perto de mim, deve ser realmente difícil nunca ser a primeira opção.
O silêncio que se seguiu era quase palpável. Cada palavra carregava uma tensão mortal. Axel Blackwolf observava, imóvel, como se calculasse cada movimento de Mia.
A batalha entre lobas estava apenas começando…