Em determinado momento da noite, quando o prato principal já havia sido servido e a conversa entre os adultos se voltava para investimentos e acordos futuros, Adrian apoiou o cotovelo na mesa, inclinando-se de forma quase casual na direção de Eleonora.
Ele parecia tranquilo demais.
Tranquilo de propósito.
— Sabe, Eleonora, — começou ele, baixo o suficiente para que só ela escutasse, mas ainda com aquele sorriso impecável — seus pais têm razão. Talvez eu devesse realmente ficar mais de olho em você no internato.
Ela estreitou minimamente os olhos, ainda sem virar o rosto.
— Por quê? Tem medo de que alguém se interesse por mim?
— Não. — Ele mexeu o vinho na taça, pensativo, teatral. — Tenho medo de que você se interesse por alguém.
—Deu um sorriso lento. — E aí vai ser um trabalho enorme confortar o coitado quando ele perceber quem você é de verdade.
A mão dela, que segurava o garfo, apertou o metal com um pouco mais de força. Ninguém notou.
Ninguém, exceto ele.
— Engraçadinho, — ela sussurrou, com os lábios quase imóveis. — Pelo menos eu não preciso fingir nada pra impressionar.
Adrian não recuou. Pelo contrário. Ele se aproximou mais um centímetro, sem encostar, mas o suficiente para deixá-la consciente demais de sua presença.
— Claro que não precisa. — A voz dele se tornou macia, provocante, irritantemente autoconfiante. — Afinal, você já impressiona muito só entrando num lugar. Hoje, por exemplo…
Ele percorreu o corpo dela com um olhar rápido, elegante, calculado.
— …você causou um impacto.
Ela manteve a expressão neutra, mas ele viu.
O músculo no maxilar, tensionando.
O rubor sutil subindo no pescoço.
A respiração ligeiramente mais contida.
Ela estava irritada.
E ele adorou isso.
— Não confunda impacto com intenção, — ela retrucou entre dentes. — Eu não me arrumo pra você.
— Eu sei. — Ele deu um sorriso que ela odiou instantaneamente. — Mas não posso controlar quem repara… e eu reparei.
Ele ergueu a taça novamente, brindando apenas com ela. — E achei interessante.
Eleonora continuou olhando para frente, mas sua perna que antes estava tranquila agora balançava sob a mesa, mínima, nervosa.
Adrian recostou-se na cadeira, vitorioso em silêncio.
Ele tinha virado o jogo.
E só ele ,só ele tinha percebido o quanto isso mexera com ela.
Eleonora respirou fundo, recompondo o rosto na mesma expressão elegante e desinteressada que sempre usava quando queria esconder qualquer emoção. Ela pegou a taça de água, bebeu devagar e, sem olhar para Adrian, deixou um sorriso quase imperceptível surgir no canto dos lábios.
Quando colocou a taça de volta na mesa, ela finalmente virou o rosto para ele.
Os olhos brilhavam com algo perigoso.
— Sabe o que é engraçado, Adrian? — começou num tom leve, quase amigável, mas venenoso na medida certa. — Você age como se fosse o único capaz de me desestabilizar. Como se eu passasse o dia pensando em você.
Ele arqueou uma sobrancelha, atento.
— Mas eu tenho notícias para você: — ela inclinou o corpo levemente para frente, ficando tão perto que apenas Adrian podia ouvir — existe uma fila bem grande de meninos esperando por um minuto da minha atenção no internato.
Adrian ficou rígido.
Ela percebeu.
E sorriu de verdade dessa vez.
— O que significa, — ela continuou, arrastando as palavras propositalmente — que você é só mais um na multidão.
Eleonora deu um pequeno tapinha no braço dele, como se fosse um gesto amistoso.
— Mas fico feliz que você ache que tem algum impacto.
Adrian arregalou os olhos por um breve segundo, pego de surpresa.
Eleonora então virou o rosto para a mãe e começou a comentar animada sobre a decoração do restaurante, como se nada tivesse acontecido. Como se não tivesse acabado de fincar uma faca na costela do Adrian e torcido.
Adrian manteve a postura, coluna reta, mandíbula firme.
Mas Eleonora muito atenta viu a maneira como ele apertou o talher com força demais.
Ela provocou mais uma vez.
Virou-se de leve, tocando a mecha solta do cabelo, e murmurou:
— Relaxa, Adrian.
— Não fica com ciúmes.
Um ataque direto.
Deliberado.
E o golpe final:
— Você fica menos bonito assim.
O sorriso dele sumiu por completo.
A batalha, que antes estava equilibrada, acabava de virar.
E ele sabia.
Eleonora tinha acabado de ganhar aquela rodada.
O jantar finalmente terminou, para alívio secreto dos dois. O clima entre as famílias continuava impecável sorrisos, elogios, promessas de novos encontros. Mas entre Adrian e Eleonora, o ar parecia eletrificado.
Na saída do restaurante, todos começaram a se despedir. Abraços, apertos de mão, agradecimentos. Quando chegou a vez de Adrian se despedir de Eleonora, ele deu um passo à frente antes que ela pudesse recuar.
— Foi… agradável te ver aqui, Eleonora, — disse com um sorriso suave, educado demais para ser verdadeiro.
Ele avançou, envolvendo-a num abraço rápido. Um abraço formal, mas perto o suficiente para que ela sentisse sua respiração perto da orelha.
E então ele sussurrou:
— “Pelo menos hoje você conseguiu chegar no horário.”
O corpo dela endureceu instantaneamente.
Adrian sorriu por cima do ombro dela enquanto soltava, satisfeito com a provocação.
Eleonora não deixou nem dois segundos passarem.
Assim que ele se afastou, ela deu um passo para frente educada, graciosa levantou a mão como se fosse ajeitar a gravata dele. Um gesto perfeitamente inocente para os adultos observando.
Mas quando seus dedos tocaram o tecido…
Ela apertou.
Firme.
Bem mais firme do que precisava.
A gravata ajustada ao pescoço dele se tornou um laço sufocante por um breve instante.
Os olhos de Adrian se alargaram não de dor, mas de surpresa.
Eleonora inclinou a cabeça com um sorriso doce.
— Pronto. — disse baixinho. — Desarrumado assim você não pode ficar.
Ela soltou a gravata com precisão cirúrgica e recuou, deixando ele recuperar a postura.
Adrian passou a mão pelo colarinho, sentindo o aperto.
E quando olhou para ela…
Eleonora já estava virando de costas, cumprimentando seus pais com toda a elegância do mundo.
Mas antes de entrar no carro com a família, ela lançou um último olhar sobre o ombro.
Frio.
Provocador.
Vitorioso.
Adrian percebeu perfeitamente o recado silencioso:
Ela não deixaria nenhuma provocação barata ficar sem resposta.