Capítulo 26. Fim do jantar

1046 Palavras
Em determinado momento da noite, quando o prato principal já havia sido servido e a conversa entre os adultos se voltava para investimentos e acordos futuros, Adrian apoiou o cotovelo na mesa, inclinando-se de forma quase casual na direção de Eleonora. Ele parecia tranquilo demais. Tranquilo de propósito. — Sabe, Eleonora, — começou ele, baixo o suficiente para que só ela escutasse, mas ainda com aquele sorriso impecável — seus pais têm razão. Talvez eu devesse realmente ficar mais de olho em você no internato. Ela estreitou minimamente os olhos, ainda sem virar o rosto. — Por quê? Tem medo de que alguém se interesse por mim? — Não. — Ele mexeu o vinho na taça, pensativo, teatral. — Tenho medo de que você se interesse por alguém. —Deu um sorriso lento. — E aí vai ser um trabalho enorme confortar o coitado quando ele perceber quem você é de verdade. A mão dela, que segurava o garfo, apertou o metal com um pouco mais de força. Ninguém notou. Ninguém, exceto ele. — Engraçadinho, — ela sussurrou, com os lábios quase imóveis. — Pelo menos eu não preciso fingir nada pra impressionar. Adrian não recuou. Pelo contrário. Ele se aproximou mais um centímetro, sem encostar, mas o suficiente para deixá-la consciente demais de sua presença. — Claro que não precisa. — A voz dele se tornou macia, provocante, irritantemente autoconfiante. — Afinal, você já impressiona muito só entrando num lugar. Hoje, por exemplo… Ele percorreu o corpo dela com um olhar rápido, elegante, calculado. — …você causou um impacto. Ela manteve a expressão neutra, mas ele viu. O músculo no maxilar, tensionando. O rubor sutil subindo no pescoço. A respiração ligeiramente mais contida. Ela estava irritada. E ele adorou isso. — Não confunda impacto com intenção, — ela retrucou entre dentes. — Eu não me arrumo pra você. — Eu sei. — Ele deu um sorriso que ela odiou instantaneamente. — Mas não posso controlar quem repara… e eu reparei. Ele ergueu a taça novamente, brindando apenas com ela. — E achei interessante. Eleonora continuou olhando para frente, mas sua perna que antes estava tranquila agora balançava sob a mesa, mínima, nervosa. Adrian recostou-se na cadeira, vitorioso em silêncio. Ele tinha virado o jogo. E só ele ,só ele tinha percebido o quanto isso mexera com ela. Eleonora respirou fundo, recompondo o rosto na mesma expressão elegante e desinteressada que sempre usava quando queria esconder qualquer emoção. Ela pegou a taça de água, bebeu devagar e, sem olhar para Adrian, deixou um sorriso quase imperceptível surgir no canto dos lábios. Quando colocou a taça de volta na mesa, ela finalmente virou o rosto para ele. Os olhos brilhavam com algo perigoso. — Sabe o que é engraçado, Adrian? — começou num tom leve, quase amigável, mas venenoso na medida certa. — Você age como se fosse o único capaz de me desestabilizar. Como se eu passasse o dia pensando em você. Ele arqueou uma sobrancelha, atento. — Mas eu tenho notícias para você: — ela inclinou o corpo levemente para frente, ficando tão perto que apenas Adrian podia ouvir — existe uma fila bem grande de meninos esperando por um minuto da minha atenção no internato. Adrian ficou rígido. Ela percebeu. E sorriu de verdade dessa vez. — O que significa, — ela continuou, arrastando as palavras propositalmente — que você é só mais um na multidão. Eleonora deu um pequeno tapinha no braço dele, como se fosse um gesto amistoso. — Mas fico feliz que você ache que tem algum impacto. Adrian arregalou os olhos por um breve segundo, pego de surpresa. Eleonora então virou o rosto para a mãe e começou a comentar animada sobre a decoração do restaurante, como se nada tivesse acontecido. Como se não tivesse acabado de fincar uma faca na costela do Adrian e torcido. Adrian manteve a postura, coluna reta, mandíbula firme. Mas Eleonora muito atenta viu a maneira como ele apertou o talher com força demais. Ela provocou mais uma vez. Virou-se de leve, tocando a mecha solta do cabelo, e murmurou: — Relaxa, Adrian. — Não fica com ciúmes. Um ataque direto. Deliberado. E o golpe final: — Você fica menos bonito assim. O sorriso dele sumiu por completo. A batalha, que antes estava equilibrada, acabava de virar. E ele sabia. Eleonora tinha acabado de ganhar aquela rodada. O jantar finalmente terminou, para alívio secreto dos dois. O clima entre as famílias continuava impecável sorrisos, elogios, promessas de novos encontros. Mas entre Adrian e Eleonora, o ar parecia eletrificado. Na saída do restaurante, todos começaram a se despedir. Abraços, apertos de mão, agradecimentos. Quando chegou a vez de Adrian se despedir de Eleonora, ele deu um passo à frente antes que ela pudesse recuar. — Foi… agradável te ver aqui, Eleonora, — disse com um sorriso suave, educado demais para ser verdadeiro. Ele avançou, envolvendo-a num abraço rápido. Um abraço formal, mas perto o suficiente para que ela sentisse sua respiração perto da orelha. E então ele sussurrou: — “Pelo menos hoje você conseguiu chegar no horário.” O corpo dela endureceu instantaneamente. Adrian sorriu por cima do ombro dela enquanto soltava, satisfeito com a provocação. Eleonora não deixou nem dois segundos passarem. Assim que ele se afastou, ela deu um passo para frente educada, graciosa levantou a mão como se fosse ajeitar a gravata dele. Um gesto perfeitamente inocente para os adultos observando. Mas quando seus dedos tocaram o tecido… Ela apertou. Firme. Bem mais firme do que precisava. A gravata ajustada ao pescoço dele se tornou um laço sufocante por um breve instante. Os olhos de Adrian se alargaram não de dor, mas de surpresa. Eleonora inclinou a cabeça com um sorriso doce. — Pronto. — disse baixinho. — Desarrumado assim você não pode ficar. Ela soltou a gravata com precisão cirúrgica e recuou, deixando ele recuperar a postura. Adrian passou a mão pelo colarinho, sentindo o aperto. E quando olhou para ela… Eleonora já estava virando de costas, cumprimentando seus pais com toda a elegância do mundo. Mas antes de entrar no carro com a família, ela lançou um último olhar sobre o ombro. Frio. Provocador. Vitorioso. Adrian percebeu perfeitamente o recado silencioso: Ela não deixaria nenhuma provocação barata ficar sem resposta.
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