Eleonora atravessou o gramado devagar, o sol da manhã iluminando o vestido lilás leve que balançava com o vento. As flores bordadas brilhavam discretamente, e o coque bagunçado, preso por uma presilha em forma de flor, dava a ela um ar etéreo tão natural quanto elegante.
Adrian, que estava rindo de alguma piada interna com os amigos, simplesmente congelou.
— Mano… olha quem tá vindo aí. — murmurou Miles, cutucando o ombro dele.
— Não pode ser — Adrian respondeu automaticamente, mas sua voz já denunciava o impacto.
As amigas que estavam ali também perceberam. Algumas trocaram olhares curiosos, outras nitidamente interessadas no motivo de Eleonora se aproximar daquele grupo pela primeira vez.
Eleonora caminhava com a postura impecável, mas a expressão neutra aquela que ela usava quando não queria revelar nada.
Quando os olhos dela encontraram os de Adrian, houve um tempo suspenso. Ele desviou primeiro.
— Bom dia — ela disse, educada, mas com o fio de provocação que só ele entendia.
— Bom dia… — respondeu Ryan antes que Adrian pudesse. — Veio nos dar a graça, princesa?
Eleonora sorriu brevemente.
— O gramado não é exclusivo de vocês, é?
As meninas riram, algumas de forma simpática, outras meio tensas. Adrian pigarreou, ainda sem se recompor totalmente.
Ela se sentou perto, mas não tão perto só o suficiente para que Adrian sentisse sua presença. A saia do vestido se ajeitou ao redor dela como um campo de flores lilás.
— Você tá… — Adrian começou, sem perceber que falava em voz alta. — Diferente.
— Diferente como? — ela ergueu uma sobrancelha.
— Sei lá. — Ele limpou a garganta. — Formal demais pra um domingo no gramado.
— Ou talvez você esteja desleixado demais, Adrian.
Os amigos riram, e Adrian lançou a eles um olhar assassino.
— Ela te pegou — sussurrou Derek.
— Cala a boca — Adrian rebateu entre dentes.
Eleonora, fingindo não notar, tirou um livro da bolsa. Mas não abriu. Ficou ali, completamente calma, sabendo que tinha causado efeito.
E ele… realmente tinha sido pego desprevenido.
Por que ela estava ali?
Por que daquele jeito?
Por que tão bonita num dia qualquer?
Adrian tentou manter a conversa com os amigos, mas sua atenção era inevitavelmente puxada para ela para o modo como a luz batia nas flores do vestido, para os fios loiros escapando do coque, para a serenidade calculada dela.
Até que, mais cedo do que esperava, Eleonora ergueu os olhos do livro sem realmente ter lido nada e disse:
— Adrian, hoje ainda preciso te perguntar sobre um exercício da aula de ontem. Pode ser depois da janta.
Ele piscou, pego de surpresa por ela trazer o assunto do reforço ali, diante de todos.
— Pode, claro.
— Ótimo.
E ela voltou a olhar para o livro, deixando Adrian dividido entre irritação e… outra coisa que ele preferia não nomear.
Os amigos, claro, não perderam a oportunidade:
— Mas o que tá rolando entre vocês dois, hein? — provocou uma das meninas.
Adrian suspirou fundo.
— Nada está rolando.
Mas quando Eleonora ergueu os olhos e cruzou o olhar com o dele de propósito, só por meio segundo ficou claro que, para ambos, “nada” era a maior mentira possível.
Os amigos de Adrian começaram a trocar olhares, semicercando os dois como quem assiste a um documentário raro sobre animais prestes a brigar.
— Tá, chega — disse uma das meninas, inclinando-se curiosa. — Alguém explica o rolê de vocês? Porque é óbvio que tem história aí.
Eleonora fechou o livro devagar, como quem se prepara para uma cirurgia delicada.
— Não tem “rolê”. — Ela respirou fundo. — A gente só… cresceu juntos. Desde pequenos. Nossas famílias são amigas há anos e sócias também.
— O quê?! — Isabela arregalou os olhos. — Vocês se conhecem de infância?
— Sim — Eleonora confirmou com a voz calma. — Brincávamos juntos todo dia. Nossos pais viajavam juntos. Passávamos os verões na mesma casa de praia. Era… normal.
Adrian cruzou os braços, desconfortável.
— E aí vocês só… se afastaram? — perguntou uma das meninas.
Eleonora assentiu.
— Foi quando ele veio para o internato. Depois disso…
— Pera aí. — Adrian interrompeu, olhando para ela com aquele meio sorriso irônico que só aparecia quando ele estava prestes a provocar. — Não foi por causa do internato. Não começa a inventar.
Eleonora estreitou os olhos.
— Não estou inventando. Você veio pra cá e sumiu. Nunca mais respondeu minhas mensagens.
— Eu sumi? — Adrian soltou uma risada curta. — Eleonora, por favor. Você que se afastou primeiro, lembra dos seus amigos? Aquela turminha metida que dizia que eu “não combinava” com vocês?
Os amigos de Adrian fizeram um “ooooh” coletivo, já se inclinando para frente.
Eleonora ergueu o queixo.
— Eles não tinham nada a ver com isso.
— Tinham tudo a ver. — Adrian rebateu. — Do nada você parou de aparecer. Quando eu chegava, você ia embora. Quando eu falava com você, seus amiguinhos ficavam cochichando e rindo.
— Isso é coisa da sua cabeça! — Ela se defendeu, agora claramente irritada.
— Claro, porque você nunca admite estar errada, né? — Ele provocou, com aquele sorrisinho perigoso.
— Melhor do que alguém que inventa desculpa pra tudo. — Ela respondeu de imediato.
Os amigos estavam hipnotizados.
— Gente… vocês estão discutindo como um casal casado há vinte anos — sussurrou Miles.
— Nós não somos um casal, Miles! — Eleonora disparou.
— Graças a Deus — Adrian completou.
Ambos se encararam por um longo momento e para todos os presentes, havia uma tensão elétrica ali, impossível de ignorar.
Eleonora respirou fundo, voltou-se para o grupo e tentou recuperar a compostura.
— Enfim. Foi só isso. A gente cresceu junto, depois cada um seguiu sua vida. Simples.
— Simples? — Adrian murmurou, encarando-a. — Nada entre nós dois foi simples.
Ela o olhou de volta, com um brilho estranho uma mistura de desafio, frustração e algo que ninguém soube decifrar.