Um amigo para confiar

2274 Palavras
•*'¨'*•.¸¸.•*'¨'*•.¸¸.•*'¨'*•.¸¸.•*'¨'*• Naquela vez, o sonho era diferente. O jardim parecia mais brilhante, colorido, como um grande arco-íris. A água também estava brilhante, atraente. Daria um mergulho se não tivesse medo de qualquer água que não fosse do chuveiro. Mas Bryan Collors Willow não parecia ter medo. Passeava os dedos pela água, sentindo sua temperatura, as vezes passando no rosto e no cabelo para sentir mais. Ele parecia relaxar com a sensação. Deixei-o como estava e me contetei em olhar para as flores, surpresa em como o jardim ficava mais colorido a cada dia que eu voltava a sonhar. Mas mesmo que me sentisse encantada, também me sentia nostálgica e triste. Aquele jardim fora cuidado pela minha família antes de meu nascimento, era o meu refúgio quando os problemas pareciam sufocar. Eu me sentia angustiada de estar ali, meu coração dobrava, esmagado. Sentia tanta falta dos meus pais que doía, só de lembrar o sorriso deles em me observar correndo pelo jardim me deixava em lágrimas. Mesmo que eu já estivesse acostumada com os sonhos, as lembranças eram mais fortes e dolorosas. Foi uma rosa amarela estendida à minha frente que me tirou dos devaneios. Olhei para o lado e lá estava o moreno, me olhando com ternura e me estendendo a rosa. A segurei em minha mão delicadamente, olhando para as pétalas brilhantes. — Rosa amarela significa amizade - Bryan quebrou o silêncio — e com essa, eu quero dizer que sei que algo te deixa triste e que você tem um amigo aqui, para que não se sinta sozinha e sufocada pela tristeza - sentir seus toques ainda era estranho, mas eu já estava acostumando. Seus dedos começaram a passar pelos meus ombros em um aviso claro de conforto. Um sorriso simples, mas bobo, se abriu em meus lábios com o gesto. — O que te aflige, Minah? Aconteceu algo em sua realidade? - perguntou com cautela, temendo que alguma palavra me machucasse. Balancei levemente a cabeça para os lados afim de tranquiliza-lo. — Lembranças tristes do passado...- nem percebi que começara a falar, de tão concentrada que estava em seu carinho sob meus braços e seu corpo tão próximo do meu — lembra que eu disse, no primeiro dia que te vi nesses sonhos, que esse jardim em que estamos era da minha infância? O moreno assentiu em confirmação, ainda calado, apenas me escutando falar. — Eu adorava vir para esse campo quando estava triste. A vista, o vento calmo, as flores, tudo me acalmava. Também costumava fazer piquenique com meus pais perto do lago - sorri instintivamente, apesar das lembranças não estarem mais tão dolorosas. Talvez porque finalmente eu estava as compartilhando com alguém. Bryan me observava falar, tentando compreender meus gestos, mesmo que fossem tão reservados. — Você perdeu sua família, como eu - concluiu, apertando de leve meus ombros. Confirmei com um rápido movimento de cabeça e o encarei. — Fui adotada uns anos depois, mas ainda me sinto uma órfã perdida e sem uma família de verdade - desabafei um sentimento que nem mesmo meus melhores amigos sabiam. Seu rosto parecia mais acolhedor, compreensivo. Podia sentir sua aura, emocionado por ter encontrado alguém que o entendesse. — Acho que agora estou começando a entender porque entramos na vida um do outro - completou, tirando uma de suas mãos que repousavam em meu ombro e fechando-a em minha bochecha. Paralisei com o gesto, surpresa. Mesmo sabendo que era um gesto de amizade, tinha medo de meu coração brincar comigo e me machucar no final. Ele era alguém inalcansavel, seu coração já pertencia a alguém, mesmo que essa pessoa não estivesse mais aqui. Fiquei aliviada quando senti-me acordar para a realidade. •*'¨'*•.¸¸.•*'¨'*•.¸¸.•*'¨'*•.¸¸.•*'¨'*• Acordei com um leve sobressalto, como sempre acontecia. Depois de quase um mês nesses sonhos, já havia acostumado. Levantei para mais um dia, era sábado e eu não trabalharia, Celeste foi gentil em me dar um dia de folga. Já havia feito todos os exames de verificação diários na esperança de uma melhora no caso de Bryan Collors, mas o moreno continuava inconsciente. Eu já não sabia como podia salva-lo, mas esperava que encontrar e alertar a família de sua noiva pudesse deixá-lo suficientemente em paz para acordar e recomeçar sua vida. Infelizmente eu fui a única dos meus amigos a conseguir uma folga no fim de semana. Minho trabalharia na UTI o dia inteiro e naquela área todos estavam sempre agindo com pressa, tentando salvar várias vidas ao mesmo tempo. Eu tinha o dia inteiro para descansar e fazer o que quiser, mas estava sozinha. Não era muito animador. Após tomar um café bem reforçado, peguei a pasta com registros de Suzane Duarte e me sentei na mesa de jantar para analisá-los. Havia apenas uma cópia de sua identidade, uma certidão de casamento que infelizmente não fora assinado, e alguns registros telefônicos. Na identidade havia seu nome completo, idade e o mais importante, nacionalidade. Japonesa. Suspirei enquanto lia a certidão incompleta de casamento, que seria assinada na cerimônia, mas que agora era algo inútil. Porém, algo ali me chamou atenção, que foi a identificação de Bryan. Mesmo depois de semanas que cuidava dele e conversava com ele em sonhos, não sabia muita coisa sobre sua vida. Porém, ali estava um documento que dizia em algumas linhas onde ele trabalhava, onde havia nascido, onde morava. Deixei o documento de lado e fiz uma anotação mental de guardá-lo, poderia ser útil para ajudá-lo. Ouvi o telefone tocar, me impedindo de continuar minha pesquisa e deixei os papéis de lado para atender. " Minah? Aqui é o Alex " Fiquei surpresa, mas ao mesmo tempo me sentia feliz? Desde que nos esbarramos Alexander me telefonara apenas duas vezes, e imaginei que havia me esquecido. Aparentemente eu estava errada. — Olá, Alex! Achei que não me ligaria mais - fui direta, me recostando melhor na cadeira para ficar confortável. " Oh, me desculpe, andei ocupado. Mas estou ligando agora justamente porque lembrei da minha mais nova amiga " o riso dele me fez sorrir, aliviada. — Bom, estou feliz que ligou. Parece que você adivinhou que eu estava de folga do trabalho - brinquei enquanto alargava o sorriso. " Mais que coincidência, eu também estou! Que tal nos encontrarmos em alguma cafeteira para conversar e nos conhecer melhor? " Pensei um pouco antes de responder. Eu tinha que continuar minha pesquisa pelos pais da noiva de Bryan, que infelizmente eram difícieis de achar por serem de outro país e o celular da jovem ainda estar destruído pelo acidente. Mas, como Leon vivia alertando, eu tinha que parar de focar só no trabalho e pensar um pouco mais em mim. E ali estava uma oportunidade. — Parece ótimo! Nos encontramos em meia hora? - sugeri, buscando um tempo adequado para me arrumar e pegar o carro para encontra-lo. " Claro, vou mandar o endereço da minha cafeteria favorita por mensagem " Concordei e desliguei a ligação, me apressando em reunir os papéis e guardá-los de volta na gaveta do meu guarda-roupa. Não sabia bem o que esperar daquele convite, apesar de Alexander ser uma pessoa legal eu não deixava de desconfiar quando conhecia uma pessoa nova. Esperava não me envolver amorosamente, não me sentia pronta ainda para dividir minha vida com alguém tão intensamente. Então decidi ir com uma roupa simples, de cores claras e tecido leve. Para os finais de semana eu tinha preferência em vestidos. Preferi deixar o cabelo preso como sempre, devido ao clima quente da cidade. Ir de carro era confortável e rápido, e o trânsito estava calmo. Agradecia por isso, mas decidi dirigir devagar para aproveitar mais a estrada e a música que tocava no rádio. Thelepathy (BTS) Nos dias que parecem sempre os mesmos (nos dias) Eu me sinto o mais feliz quando te encontro (feliz) Mesmo na rotina que é diferente todo dia (na rotina) Você é a pessoa mais especial para mim (especial) Nunca havia ouvido essa música antes, mas meu coração aquecia enquanto ouvia a troca de vozes e a melodia encher meus ouvidos. Mesmo que estejamos distantes agora Nossos corações são os mesmos Mesmo que você não esteja ao meu lado, sim Mesmo que eu não esteja ao seu lado, sim Sabemos que estamos juntos Envolvida pela música, a imagem de um rosto pálido e de olhos tristes, mas com um sorriso acolhedor e cabelos escuros passou pela minha cabeça, me fazendo suspirar e sentir meu coração bater fortemente. Mas não passou de meros segundos, logo respirei fundo e desliguei o rádio. Não sei porque a música me fizera pensar em Bryan Collors, mas não podia confundir minha cabeça daquela forma. Ele era inalcansavel, eu nem mesmo o conhecia direito ainda. Éramos amigos apenas em meus sonhos, eu nem mesmo sabia se ele se lembraria de mim quando acordasse. Por sorte, eu já estava chegando no endereço mandado por Alexande •*'¨'*•.¸¸.•*'¨'*•.¸¸.•*'¨'*•.¸¸.•*'¨'*• — Fiquem a vontade e bom apetite - disse o garçom após colocar nossos pedidos na mesa. Bolo de cereja com suco de morango para Alex e apenas um capuccino para mim. O loiro assentiu para o funcionário e dirigiu o olhar à mim, a qual retribui com um sorriso ladino. — Então, conseguiu encontrar a pessoa importante do seu amigo? - ele começou a perguntar, tentando descontrair o clima. Estávamos sentados perto da janela, com vista para a rua movimentada. Ainda era metade da manhã, logo o horário do almoço viria e Alex já estava comendo doce. Eu me perguntava como ele se alimentava diariamente ou se aquela era apenas uma exceção. — Ainda não, mas já avancei um pouco. As pessoas que procuro são estrangeiras, é um pouco mais difícil achar - comentei enquanto mexia o canudo no copo plástico, uma mania que eu tinha sempre antes de começar a beber o conteúdo. Alex assentiu, atento a tudo que eu falava enquanto mexia em seus pequenos talheres para pegar o pequeno pedaço de bolo. — Você trabalha de detetive ou algo assim? - ri de sua confusão. — Na verdade sou enfermeira, a pessoa que procuro são parentes de uma pessoa que um paciente perdeu — corrigi, um pouco tímida em falar sobre meu trabalho — Ele meio que me pediu para encontra-los já que ainda não podia - não dei tantos detalhes. O loiro fez um breve movimento de cabeça, compreendendo tudo. Em poucos minutos de conversa já via que o mesmo era um ótimo ouvinte. — Espero que você encontre esses parentes então - desejou, sorrindo calorosamente — caso precise de ajuda, não hesite em me ligar. Agradeci a oferta com um sorriso. Pela confiança que ele passava, eu realmente não recusaria em aproveitar a oferta. Alexander me passava uma calma que eu só tinha sentido até então com Leon. Com Bryan também, mas não sabia se sonhos contavam. — E você, Alex? No que trabalha? - perguntei para mudar o assunto, sem me aprofundar no que eu fazia. O loiro repousou seus talheres no pratinho, dando atenção à sua bebida. — Sou editor em uma livraria - comentou após alguns goles do suco. Arregalei os olhos, impressionada. — Parece um trabalho excelente! - elogiei, arrancando uma expressão satisfeita e orgulhosa do maior. Seus fios loiros estavam caídos na altura dos ombros, perfeitamente penteados, em contraste com a blusa creme de mangas curtas que usava. Parecia que tínhamos combinado de usar roupas claras, apesar de ter sido uma coincidência. — É bem agradável mesmo, eu amo o que faço. Passar o dia com livros..não tem nada melhor - suspirou enquanto falava, encantado e feliz ao me ouvir pedir mais detalhes. Eu só conseguia sorrir e achar fofo a forma como me falava mais de seu trabalho, vez ou outra dando algum detalhe do meu. Alexander ficou encantado ao saber que eu costumava trabalhar no berçário, ele adorava crianças e me contou que tinha um irmão pequeno. — Meus pais estão sempre viajando e não estava sendo saudável para a criança viver viajando, por isso decidi trazê-lo para morar comigo recentemente - contou enquanto andávamos lado a lado pela calçada. Saímos da cafeteria assim que terminamos de comer e decidimos continuar a conversa durante uma caminhada. — E vocês sentem saudade dos seus pais? - quis saber, sensibilizada. Assuntos sobre família eram delicados para mim. Alexander apenas deu de ombros, com um sorriso constrangido. — Com o tempo nos acostumamos. Eles ligam uma vez ao dia para saber como estamos, então conseguimos viver melhor com a ausência - explicou, escondendo as maos no bolso da calça — e a sua família? Gelei um pouco com a pergunta, delicada. — Eu não possuo família aqui. Sou só eu - foi a única resposta que dei. Pelo meu tom, Alexander entendeu que eu ainda não queria falar sobre e mudou o rumo da conversa para algo mais banal e agradável, perguntando quais meus filmes e séries favoritos e afins. Conversar com ele era extremamente agradável, ele conseguia manter o clima bom e calmo sem muito esforço e respeitava meu espaço. Sentia que ali nascia uma grande amizade.
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