PRÓLOGO
É o oposto do que imaginei...
Está sendo diferente do que acreditei que viveria...
Ainda escuto os gritos dele e o som do copo se estilhaçando contra a parede. Enquanto isso, algo espesso escorre em minha garganta e meu olhar percorre a sala, que está em total desordem, com a mesa central completamente destruída. Meia dúzia de vasos finos, delicados e aparentemente caros não eram mais do que destroços espalhados pelo chão. Meu peito se contrai.
— A vida é uma questão de aparências e, em nome delas, devemos fazer o que for preciso. Precisamos ser sábios — Alef gritava, apontando o dedo indicador para mim.
Vagueio por lembranças recentes.
— Tiana, o motorista de Alef está aqui para te buscar — disse Úrsula.
Com os joelhos fracos e o corpo trêmulo, me forço a ficar de pé. Pego a bolsa que estava sobre o sofá. Creio que estou pálida, pois me sinto fria, com o coração batendo desconfortavelmente dentro do peito.
— Qualquer problema, me liga. — Apenas balanço a cabeça em sinal de afirmação.
Caminho em direção à porta, com os saltos batendo contra o piso, sem firmeza. m*l consigo me manter em pé.
Passo em frente ao espelho acima de um aparador de madeira e me olho uma última vez: meus cachos estão esticados, meu rosto maquiado para disfarçar as olheiras da noite m*l dormida. Ele me controla como se fosse meu dono.
Respiro fundo, deixo a sala e atravesso a porta.
— Tiana! — Seguro a porta aberta e me viro para Úrsula.
— Boa sorte, está bem? — Balanço a cabeça em confirmação.
Sorte foi algo que deixei de lado quando fiz o que não deveria.
— Obrigada, Úrsula. — Viro-me e saio, fechando a porta com um estalo seco.
Tudo aqui é sempre frio e cinza, assim como ele, que é n***o e gélido.
Caminho em direção a Tristan, que gentilmente abre a porta do carro luxuoso. Entro, recosto-me no assento de couro confortável e fecho os olhos enquanto o carro se afasta, saindo da mansão de Alef em direção ao prédio onde está a empresa dele.
Meus olhos se fixam na aliança; sinto vontade de retirá-la e jogá-la pela janela do veículo, como fiz uma vez.
Aperto as mãos em punhos. O dia em que me casei foi o dia em que ocorreu o funeral da minha alma. Uma fúria ardente surge em meu interior e sobe pela minha garganta, envolvendo minha língua com um gosto amargo e ácido.
Abro os olhos enquanto o carro segue sem pressa. Olho pela janela e observo cada rosto que passa apressado, como se aqui vivêssemos um dia comum. Acontece que não existe dia comum na vida de ninguém, muito menos na minha.
Sinto que não tenho nada, apesar de carregar um sobrenome de grande prestígio e importância. Aqueles que realmente se importavam comigo ficaram para trás.
Tristan fala com alguém pelo ponto que usa na orelha.
Tenho quase certeza de que é ele, Alef; ergo meu queixo e o encaro, observando os fios grisalhos que salpicam seu cabelo escuro.
— Estamos chegando, senhora — pronuncia em um português sofrível.
— Obrigada — murmuro enquanto fazemos uma curva.
De longe, avisto o prédio; é lindo, bonito de se observar.
Tristan entrou com o carro em uma garagem subterrânea.
— Chegamos, senhora Wolfgang.
Estávamos, de fato, na garagem do edifício WFW. O motorista já havia saído, contornado o veículo e aberto a porta para mim. Esfreguei as mãos numa tentativa de reanimar os sentidos e, em seguida, saí, recebendo a brisa fria diretamente no rosto. Novamente, me vi entrando no edifício e seguindo em direção ao elevador, acompanhada por três seguranças. O escritório dele fica no quadragésimo terceiro andar, e a sensação que me invade é de déjà vu; a tensão é a mesma da última vez, com o mesmo frio nas palmas das mãos e o mesmo ataque de nervos, mas desta vez há um pânico a mais.
Ao entrar na recepção, a secretária dele me observa. Essa mulher não me suporta, percebo pelo seu olhar, que é bem claro e direto.
— O senhor Wolfgang lhe aguarda, pode entrar — diz um dos seguranças que está vigiando a porta na parte externa.
Diferente do Alef que conheci no Brasil, que andava sozinho e sem seguranças, aqui me deparei com um homem completamente diferente em todos os aspectos. Agradeci e, por um instante, do lado de fora, hesitei em continuar com meus passos, apenas o observando com as mãos nos bolsos, olhando pela vidraça para o horizonte. O céu cinzento, repleto de nuvens pesadas, criava uma cena viva de movimento; era uma imagem linda que cativava, ao mesmo tempo que trazia uma sensação de melancolia. Alef parecia relaxado e emanava uma grande energia de poder.
Qualquer hesitação em entrar no escritório se dissipou.
Quando dei o primeiro passo, Alef se virou ao me ver quase atravessando a porta, avançou em minha direção, estendeu a mão e me fez entrar em seu escritório, fechando a porta atrás das minhas costas com firmeza.
— Relaxe. Não farei nada desagradável — disse ele.
Sua voz tinha um tom de zombaria, e minha atenção se voltou para o homem vestido impecavelmente.
— Gostaria de compartilhar uma coisa — disse Alef, afastando-se e deslizando o indicador e o dedo médio pelo tampo de madeira escura de sua mesa.
Minha mandíbula tremia enquanto eu observava seus movimentos calmos.
Penso que algum momento de tortura será infligido a mim durante o tempo que passarei aqui.
Alef aperta a ponta do nariz e, em seguida, olha para mim, indicando com a mão a poltrona para que eu me sente.
Os olhos do homem se estreitaram ao se fixarem nos meus, e o canto de sua boca se curva em um sorriso sarcástico. Meus músculos se contraem sob a superfície da minha pele. Meu desejo é estar longe desse país e dessas pessoas...