n**o: Temos que te deixar no hospital, c*****o! Tá perdendo muito sangue, parceiro.
— fala com a voz alta, a preocupação estampada no rosto dele, seus olhos se fixam em mim com um misto de desespero e urgência.
RD: Segue a p***a do plano! — Falo, tentando soar firme, mas minha voz enfraquece, e a visão começa a turvar. A adrenalina tá se esvaindo, e a dor parece tomar conta, como uma sombra que se estende a cada segundo.
Gordo: Entra em contato com o Terror menor.
— ele fala pro n**o que tá no banco do carona, e assente.
RD: Quem tá na frente do bagulho sou eu e tô dando ordem pra fazer essa p***a do jeito que eu tô mandando. Que p***a de falar com Terror, tá de marola, c*****o? — falo com o resto de força que ainda tenho, mesmo com a dor crescendo.
Não posso deixar eles perceberem que tô fudido. Sinto a dor rasgando, mas mantenho a cara de inabalável. Se os moleques sacarem que tô vacilando, o plano vai de ralo. Não tem papo de hospital nenhum. Se eu der as caras por lá, os verme do RJ inteiro vão cair matando em cima. Melhor morrer no meio do caminho que acabar preso como um Zé Ruela.
Nego: RD, essa p***a tá feia, tu precisa de ajuda, irmão. Tá maluco? — tenta argumentar, o rosto dele cheio de pânico, como se ele quisesse me carregar à força.
RD: Que hospital o quê, n**o! – solto com raiva. — Tira essa ideia da cabeça! Antes morto que preso, tá maluco? Segue o plano e acabou, c*****o!
A cada palavra, me esforço pra manter o tom firme, ignorando o zumbido na cabeça. Sinto o peso dos olhares deles.
Gordo: Mas, RD, vai dar merda isso! Tá sangrando demais mano.— tenta insistir, um desespero no olhar, a voz dele quase embargada enquanto acelera. Ele olha no retrovisor, meio dividido entre seguir o plano ou me arrastar pra um hospital.
Dá pra ver que ele tá com duvida do que fazer, mas não vou deixar ele nem pensar nessa p***a.
RD: Já falei! Esquece essa p***a de hospital. Cês me levam pro ponto de troca e depois cada um no seu rumo! – rebato, a respiração pesada, tentando controlar o corpo que insiste em fraquejar. — É agora que vocês mostram que tão fechados comigo nessa p***a!
Forço um olhar firme neles, engolindo a dor, e a adrenalina me empurra pra frente. Dou o comando e vejo a hesitação neles sumir, cada um deles se recompõe, entendendo que comigo não tem volta, só ida.
Assim que chegarmos no ponto de troca, vamos nos separar em dupla, e cada um vai pegar um carro pra dar fuga num lugar diferente.
Daqui a sete dias, nós encontramos na mata. Encostamos os carros, e cada um vai saindo devagar, dividindo o dinheiro em silêncio, cada pacote pesado de cem mil, todo mundo com a cara séria. Nos despedimos rápido, o clima de tensão no ar, porque a essa altura deve ter polícia até brotando do chão atrás da gente. Cada um sabe que um vacilo agora pode custar caro.
Nego: Bora, RD, vamos juntos – ele diz, segurando firme a porta do Fiat prata, esperando eu entrar.
RD: Não, tu vai – empurro o celular pra ele. — E vai levar essa p***a aqui. Escuta bem nesse c*****o, só liga essa b****a daqui a sete dias, entendeu?
Ele pega o aparelho, me olhando meio confuso, mas concorda com a cabeça, guardando no bolso.
RD: Só vai ligar ele quando já estiver na mata, com geral junto. O Terror vai entrar em contato com tu explicando o próximo passo.
Nego: Beleza... mas não entendi por que tá me dando essa p***a. Tu mesmo pode trocar ideia com ele, vamo tá geral junto.
Ele me olha com a testa franzida, como se não acreditasse no que tô sugerindo.
RD: Não sei se vou conseguir, irmão – solto, mantendo o olhar fixo nele, sentindo o peso das palavras. — Se eu chegar, cheguei. Se não, já sabe o que fazer.
Nego: Qual é, RD? Papo de o****o, meu chapa. Tá vacilando, irmão. — Ele se aproxima, a mão apertando meu ombro.
RD: Segue o plano, c*****o. Se eu conseguir, vou aparecer lá – falo com firmeza, afastando o braço dele. — Cê sabe como é, menor. Cês tão carregando a missão.
Nego: Não saio daqui sem tu, irmão.
— Ele diz, com a voz embargada, insistindo, a respiração acelerada, olhando de um lado pro outro, como se quisesse encontrar outra saída.
RD: Claro que sai. Tu acha que levei esse tiro atoa, menor? — rio sem mostrar os dentes, tentando aliviar a tensão.
Nego: Terror vai me culpar mano, por não te levar comigo, cê sabe disso. – ele solta, o rosto marcado pela tensão. Tá nervoso, mas sabe que tô certo, que não dá pra arriscar.
RD: Não dá pra ir com você, irmão, vou fazer peso morto e logo logo os bota pegam nós dois. – respiro fundo, sentindo a dor me rasgar, mas tentando segurar a pose. — Só mete o pé daqui e fala com a Tatiany pra ficar de boa. Eu sempre dou meu jeito menorzin.
Nego: Já é, então... se cuida, irmão – ele fala, hesitando, mas estende a mão e fazemos o toque. Ele entra no carro sem olhar pra trás, acelerando na curva.
Entro no carro e fico olhando pro ponto onde o Fiat desapareceu na estrada. O silêncio pesa, e enquanto aperto o volante, sinto a dor latejar cada vez mais, me rasgando por dentro. Respiro fundo, mas cada movimento parece arrancar um pedaço, e o sangue ainda escorre quente, marcando o banco. Penso na droga de vida que me meti, no inferno que é estar aqui sozinho, com a sensação de que o tempo tá acabando.
Dizem que, quando a gente tá morrendo, a vida passa como um filme. E aqui tô eu, rindo de canto de boca, balançando a cabeça. Não sei se tô morrendo, mas sinto como se cada cena da minha vida estivesse passando em câmera lenta na minha mente. A infância, as decisões erradas, os tiros, as brigas. Só que uma coisa pesa mais que todas: meu filho. A única pessoa pra quem eu realmente devo alguma coisa nessa vida, e eu falhei. Falhei com ele antes mesmo de ter a chance de ser pai.
Piso no acelerador, a dor queimando mais fundo a cada quilômetro. Não sei se vou aguentar, não sei até onde consigo ir. Mas não vou morrer sem lutar. Com as mãos firmes no volante e a cabeça latejando, sigo, enquanto tiver forças vou tentar, por ele.