Capítulo Três

4917 Words
Anneliese caminha sem rumo pela cidade. Por toda vez que encontrava uma pequena pedra no caminho, ela tentava chutar, mas seu pé passava completamente por dentro da pedra, sem ao menos balançar o objeto inanimado. Com os olhos cheio de lágrimas, Anneliese avista um parque infantil onde um pequeno g***o de crianças brincavam em um círculo de terra branca, enquanto suas mães aproveitavam para colocar o papo em dia. Ela passa olhando para as crianças e por alguns milésimos de segundo sorrir ao ver a beleza e inocência daqueles pequenos seres humanos. Pensar em que o único problema daquelas crianças era se teriam iogurte ou achocolatado para o lanche a tarde a fazia se sentir mais deprimida ainda. Atrás do parquinho circular de areia havia um parquinho com brinquedos infantis, como escorregador, balanço e outros. Anneliese atravessa as cercas do parque de areia e vai até o balanço. Quando era criança e ficava chateada com alguma situação na escola ou até mesmo em casa, ela sempre arrumava um tempo, o mínimo que seja, apenas para balançar, assoviar alguma canção e organizar os sentimentos e pensamentos. Quando era criança, os sentimentos que a levava para o balanço infantil pareciam o fim do mundo, mas agora, levando em consideração os acontecimentos atuais, os sentimentos anteriores não eram nada. Respirando fundo, Anneliese se aproxima do balanço e tenta se sentar no objeto de madeira, mas seu corpo fantasmagórico o transpassa por completo e termina sentada sobre a grama abaixo do brinquedo. -Eu não posso nem ao menos balançar. -Anneliese esconde o rosto entre as mãos e desaba em lágrimas. -O que está acontecendo? Por que comigo? A noite virou dia e Anneliese nem ao menos percebeu a passagem do tempo. Ela não se moveu durante todo o período, nem ao menos quando o balanço era levemente empurrado e atravessava sua cabeça por várias vezes. Anneliese só voltou a reagir e levantar quando o sol de meio-dia estava no centro do céu batendo bem no centro do topo de sua cabeça. -Preciso ver a minha mãe. -Anneliese, por instinto, passa as mãos sobre a roupa para retirar a terra, mas não havia nenhum resquício que ela estavasentada sobre a areia. Anneliese caminha ao ponto de ônibus e sentada sobre o meio-fio espera que a condução para a casa de seus pais passe. -O lado bom de ser invisível é não pagar passagem. -Anneliese passa pelo motorista e acena, mesmo sabendo que será vista. -Espero que meus pais possam me ver. Anneliese fica em pé sobre a calçada olhando para a porta principal de sua casa, criando coragem e expectativa para tocar a companhia e ser recebida de abraços abertos por seus pais ou o seu dedo atravessar a companhia e seus pais não a enxergarem e cair definitivamente a ficha que ela é um fantasma e que ninguém jamais vai voltar a vê-la e ouvi-la. A casa dos pais de Anneliese é simples e iguais as casas dos vizinhos, exceto a cor das paredes externas, que foi repintada para a cor laranja escuro. A frente há dois ipês plantados, um a cada lado da porta, um era uma árvore de copa branca e a outra Ao dar um passo a frente, a porta principal da casa dos pais de Anneliese se abre lentamente e dela sai uma senhora de mais ou menos 56 anos segurando um saco preto de lixo. Com um sorriso enorme e o coração batendo tão rápido que os tímpanos doíam, as mãos de Anneliese tremiam violentamente, mas mesmo assim ela conseguiu abrir os braços e sorrir alegremente a espera de um abraço de sua mãe que vinha em sua direção. Todos sabem que o abraço materno é capaz de aquecer e melhorar em 100% o dia de uma pessoa e isto era tudo que Anneliese queria e precisava. Mas logo se deu conta que havia perdido esta oportunidade quando sua mãe atravessou seu corpo fantasma sem nem ao menos se dar conta do que havia acabado de fazer. Despedaçada e sem chão, Anneliese segue sua mãe até o interior da casa. A sala da casa é tipicamente de uma família comum. Paredes beges cheias de retratos de família, inclusive dos cachorros que a família já teve. A estante marrom escura suporta o aparelho de televisão e uma vitrola antiga que Anneliese usava horas a fio para escutar seus discos favoritos. Ela tinha apenas 15 anos quando escutou pela primeira vez uma canção por um disco de vinil, era "I Want Out" da banda alemã de power metal Helloween, e deste então ela nunca mais abandonou seus discos de vinil. Enquanto todos os jovens juntavam dinheiro para sair aos finais de semana com os amigos e virar a madrugada bebendo álcool e escutando músicas remixadas, Anneliese trabalhava o dobro para comprar seus amados e preciosos discos. Dias de chuvas eram os dias preferidos de Anneliese para deitar sobre o sofá da sala, colocar um LP na vitrola, pegar um bom livro e passar longos e deliciosos minutos e horas aproveitando o momento. Anneliese ignora a televisão que está ligando em um canal que transmite apenas séries com tema investigativos e caminha em direção a prateleira da estante onde está seus discos. Ao estender a mão e tentar passar os dedos sobre a capa do álbum de disco superior, ela percebe a ponta de suas unhas atravessar levemente os discos de vinil. Ao ouvir um leve ruído, Anneliese olha para trás e avista seu pai sentando sobre o sofá em frente a televisão. Usando apenas uma bermuda velha e um par de sandálias, o pai de Anneliese tem o cabelo levemente grisalho molhado. -Pai. -Anneliese rapidamente levanta e corre em direção ao pai. -Pai, pai, pai. - Mesmo o chamando de forma incessante, ele não a escuta. -Por favor, me escutem. Ela acena, pula e grita em frente aos seus pais que estão mudando os canais de televisão a procura de um programa para assistir. Os dois tem olhos fundos e profundos, como se apenas o corpo estivesse presente e os pensamentos estivesse viajando para as mais longes terras que a imaginação permite. -Por que ninguém me escuta. -Anneliese sobre o tapete marrom e felpudo entre o sofá e a estante de televisão. -Eu estou desesperada, não sei o que está acontecendo, eu preciso saber o que aconteceu. -Com as mãos sobre o rosto, Anneliese volta a chorar. -Tem uma estranha na minha casa, minhas mãos atravessam objetos e as únicas pessoas que confio e amam também não podem me ver. -Você já acendeu uma vela hoje, querida? -Pergunta o pai de Anneliese a sua esposa. -Me sinto inútil, Marcos. -A mãe de Anneliese se aninha nos braços do marido. -Já faz dois anos e a única coisa que podemos fazer é acender uma vela paranossa filha. -Eu sei que h******l, querida. -Marcos afaga o cabelo da esposa. -Mas nossa doce e linda filha agora está cercada de anjinhos. -Anjinhos? Anjinhos? -Anneliese olha ao seu redor, a procura dos anjos. -Por que eu estaria com anjos? Não me digam que eu realmente estou morta? -Dois anos se passaram e eu ainda sinto a mesma dor. -Com a mão direita sobre o peito, a mãe de Anneliese segura o choro. -Temos que seguir em frente, querida. -Entrelaçando os dedos com da esposa, Marcos beija carinhosamente a mão dela. -Temos que seguir em frente igual gostariamos que ela seguisse caso fosse a gente que tivesse morrido. -Então realmente estou... -Sem conseguir terminar a frase, Anneliese levantaàs pressas e corre em direção ao seu quarto. O corredor é repleto de quadros amadores que sua mãe pinta e de pequenos vasos de bonsai que seu pai começou a aprender a fazer, todos estes objetos dão um grande constraste com a parede azul marinho e o piso de porcelana. A porta do quarto de Anneliese é pintada de preta com um pequeno poster do cantor Alice Cooper e um chaveiro em formato de abóbora de halloween preso sobre a maçaneta. Ela estende a mão e tenta segurar a maçaneta, sem sucesso, como era o esperando, ela então respira fundo e fecha os olhos, atravessando a porta e só abrindo os olhos alguns minutos depois. O quarto se encontra da mesma forma que ela se lembra, as paredes pretas com estrelas desenhadas por ela mesmo, o teto branco repleto de adesivos brilhantes em formatos de planetas e cometas. Sua cama de solteiro abaixo da janela, com um grande golfinho rosa de pelúcia sobre o travesseiro e uma colcha do Scooby Doo sobre a cama. A colcha de cama, Anneliese ganhou de presente quando completou 23 anos e seus pais disseram que ela poderia escolher qualquer presente que quisesse, eles esperavam que ela fosse pedir uma viagem ou até mesmo um carro, mas ela os levou até um shopping e entraram em loja especializada em roupas, camas, mesa e banho e apontou para um conjunto de roupas de cama com a temática Scooby Doo. A princípio acharam que ela estava brincando, mas logo perceberam a alegria no olhar da filha em mostrar o conjunto a eles e para a surpresa de seus pais, sua filha com recém 23 anos de vida completado saia da loja especializada abraçada e sorridente à um conjunto com temática de um desenho antigo. Mesmo que seus pais quisessem dar um presente mais adulto, ficaram felizes que apesar de está crescendo a cada dia, ficando mais responsável e entendo as dificuldades da vida adulta, Anneliese não se deixava abalar e muito menos perder a sua essência e não tinha vergonha de ser ela mesmo. Anneliese nunca fingiu ser alguém que não era, sendo sincera em todas as ocasiões, mesmo que isto fizessem os outros a acharem estranha. Além da cama, o quarto de Anneliese contém uma pequena estante em madeira pintada de preto com seus livros a mostra e pequenas estatuetas de decoração com temáticas jogos de video game. Não se parecia um quarto de uma mulher adulta, mas era o paraíso de Anneliese e muitos daqueles pertences seriam levados para o apartamento de Anneliese assim que ela conseguisse um maior que coubesse todos os seus pertences. Anneliese fica imóvel no centro do seu quarto, queria tocar em seus objetos, mas sabia que suas mãos atravessariam por completo qualquer objeto que tentasse pegar. O sentimento de solidão e desespero começa a se fazer presente. -Nunca chorei tanto em vida. -Anneliese esfrega os olhos. Sobre a estante ela ver o seu brinco de diamantes azul e por instinto coloca a mão sobre o lóbulo direito da orelha, ela sente o objeto sobre a orelha e então coloca a mão sobre a orelha esquerda e não sente o objeto. -Mas eu perdi um brinco. -Anneliese continua com a mão sobre a orelha. -Não lembro como e nem onde, mas sei que perdi. Com as pontas do dedo ela tenta tocar no brinco e um fio de energia azul se conecta em seu dedo e de repente Anneliese sente seu corpo ser puxado em direção ao brinco e assustada fecha os olhos. Imagens começam a se formar diante de si, a princípio estava embasadase confusas, mas alguns segundos depois começaram a tomar forma. Anneliese se vê a frente sobre a bicicleta esperando as crianças atravessarem a faixa de pedestre. -Como eu estou lá e aqui ao mesmo tempo? -Pergunta confusa. Ela então ver um carro desgovernado ir em sua direção, sua bicicleta é jogada para o outro lado da rua com uma violência absurda. As pessoas ao redor começam a gritar e algumas correm para longe, enquanto outras corre em direção a Anneliese. Anneliese fantasma caminha lentamente em direção ao carro. Arranjando um espaço entre as mães e pais que foram buscar seus filhos, ela ver a si mesmo deitada sobre a calçada. Os olhos estavam fechados e a respiração rápida e descompassada. Um fio de sangue escorria pela testa de Anneliese. -Eu não acredito. Eu realmente estou morta. -Ajoelhada em frente a si, ela tenta tocar o próprio rosto, mas não consegue. Subitamente ela é envolta por uma nuvem n***a. Quando abre os olhos novamemte, se encontra em um hospital, em pé, ao lado de seu corpo machucado com acesso venoso e uma máscara de oxigênio. Olhando ao redor, percebe que não há nenhum médico ou enfermeira ao seu lado. Até mesmo os aparelhos médicos pareciam estar desligados -Não consigo imaginar como deve ter sido difícil aos meus pais. -Com a pontados dedos Anneliese passa sobre o próprio rosto sobre a maca. -Mas se eu morri, por que não fui ao céu? Por que estou presa a terra? Quando a nuvem n***a se aproxima novamente, Anneliese fecha os olhos e aceita o que vai acontecer, sem medo. Quando abre os olhos está novamente em seu quarto, com os dedos a poucos centímetros de distância de seu brinco. Anneliese senta ao chão, com as pernas cruzadas, respirando fundo ela tentando entender o que está acontecendo. Horas mais tarde, Anneliese levanta e evita seus pais até conseguir sair de casa sem vê-los. A noite chegou e com ela as ruas vazias e silenciosas, perfeitas para uma fantasma perambular sem rumo e direção. Em um banco de praça, Anneliese dobra os joelhos e abraça as pernas, escondendo o rosto sobre os braços. -Eu odeio ver pessoas chorando. -Ao levantar a cabeça, Anneliese ver Hiroshi sentado ao seu lado. -Mesmo que a pessoa seja um fantasma. -O que está fazendo aqui? -Eu moro naquele prédio. -Hiroshi aponta para um prédio recém inaugurado a frente. -E você, o que faz aqui? -Eu estou morta, Hiroshi. -Anneliese olha para os próprios pés, evitando contato visual. -Eu realmente estou morta. -Isto não é novidade para mim. -Dando de ombros levanta. -Vamos para o meu apartamento. Tenho medo que meus vizinhos vejam eu conversando sozinho e me achem maluco. -Não se pode convidar um fantasma a sua casa. -Anneliese sacode a cabeça preocupada. -A regra se aplica apenas a vampiros. -Hiroshi sorrir. -E não vejo mau em te chamar a minha casa, você n******e fazer nada, não tem como me roubar. -O seu maior medo é que um fantasma roube a sua casa? -Anneliese solta uma leve risada com a possibilidade. -E se eu começar a puxar correntes pela sua casa? -Você não tem correntes. -Hiroshi dar de ombros. -Mas então, você vem ou não? O apartamento de Hiroshi era repleto de objetos referentes a cultura oriental. Havia leques vermelhos com símbolos j*******s, lanternas j*******s brancas com detalhes de cerejeiras rosas, biombos dividindo os cômodos do apartamento e até mesmo pequenas estatuetas de dragões. -Meus avôs me deram este apartamento. -Hiroshi segura um pequeno bonsai. - Decoraram da forma que era a casa deles no Japão. -Você fala japonês? -Anneliese observa a foto de um portal japonês vermelho. -A única coisa que sei sobre o Japão é o que vejo em animes. -Hiroshi dar de ombros. - Meus pais nasceram aqui e eu também, então meus avôs ficam um pouco decepcionados que a cultura deles está sendo deixadas de lado com o passar das gerações. -Você não luta nenhuma arte marcial? -Anneliese observa os objetos orientais com uma curiosidade . -Porque todo mundo acha que todo oriental é bom em artes marciais? -Hiroshi revira os olhos enquanto vai em direção a cozinha. -Por causa dos filmes do Jackie Chan, do Bruce Lee e do Jet Li. -Anneliese sorrir e vira na direção de Hiroshi e avista ele segurando uma lata de cerveja na direção a ela. -Você não espera que eu pegue isto né? -Desculpa, força do hábito. -Sem graça, Hiroshi coloca a lata sobre a mesa de centro da sala. - A sua casa é exótica, mas é bem bonita. - Anneliese continua passeando pela casa. Ao entrar no corredor principal, uma porta aberta com uma fina luz branca passando por baixo das frestas chama a atenção da fantasma que lentamente entra no cômodo. O quadro é todo branco, uma janela enorme na parede e uma boa iluminação no teto. Não havia nenhum móvel no quarto, apenas um cavalete e várias telas para pintura em brancas encostadas na parede a direita, enquanto havia telas usadas à parede esquerda. -Você é um artista? -Estou estudando para ser. -Hiroshi está em pé, encostado sobre o batente da porta. -Por que veio até a mim? Você disse que não queria me ajudar. -Olhando pela vista que a janela dispõe, Anneliese percebe que seu reflexo não aparece. -Eu também não sei. -Hiroshi puxa um banco que estava a frente do cavalete e se senta. -Eu estava sentado justamente aqui, pensando em uma ideia para uma tela nova, quando olhei a janela, te vi sentada sozinha no banco da praça. -Você ficou com pena de uma fantasma? -Anneliese rir, fazendo o rapaz rir juntos. -Sinistro, eu sei. -Obrigada. -Hiroshi olha confuso para Anneliese, sem entender o motivo de receber um agradecimento. -Por me resgatar. -Explica Anneliese. -Se não fosse eu, quem seria? -Hiroshi pega sua paleta de tintas e começa a passar o pincel pela tela branca. -Você disse que morreu, como descobriu? Anneliese senta no chão, ao lado de Hiroshi e conta para ele tudo que descobriu enquanto observa os traços de tinta sem sentidos formarem aos poucos árvores, pássaros e riachos. Hiroshi escutava tudo, prestando atenção em cada palavra de Anneliese, sem demonstrar nenhuma reação. -Assistir um filme uma vez e nele fala que os mortos ficam presos a terra quando morrem e deixam algo pendente. -Dando uma pincelada final na tela, Hiroshi olha para a fantasma ao seu lado. -Você deixou algo pendente antes de morrer? -Várias. Projetos do meu trabalho, sonhos futuros, tantas coisas. -Admirado com o resultado final do quadro de Hiroshi, a fantasma tenta tocar. -Algum projeto em questão lhe prende aqui. Só precisa descobrir qual e resolver. -Hiroshi pega um copo de água e mergulha os pinceis usados. -E por que só você pode me ver e ouvir? -Teremos que descobrir isto também. -Com paciência e técnica, Hiroshi lava individualmente os seus pincéis. -Talvez eu não tenha sido uma boa pessoa em vida. -Anneliese dar de ombros. -Quem era você? - Limpando as mãos delicadamente, Hiroshi olha para a fantasma. -Trabalhava com animações. Criava personagens de desenhos animados. -Somos ambos artistas, talvez seja este o motivo de nossa conexão. - Por costume, Hiroshi tenta apoiar a mão gentilmente sobre o ombro de Anneliese, mas sua mão atravessa por completo. -Não acho que seja um motivo válido. -Anneliese rir ao perceber a estranheza de Hiroshi ao ter sua mão dentro de uma fantasma. -Somos de classes desvalorizadas. -Pegando a tela recém pintada e colocando sobre o suporte para secar. -As pessoas só nós dar valor depois de mortos. -Não é verdade. Os quadros de Van Gogh, Leornado da Vinci e outros valem milhões e milhões. -Valem agora. -Suavemente tocando a própria obra, Hiroshi pega um fino pincel e com tinta preta faz sua assinatura na tela. -Em vida, Van Gogh passava dificuldades financeiras, não era visto como um incrível pintor como hoje em dia. -Hiroshi apoia a tela sobre o suporte e se afasta. -Não conseguia vender seus quadros em vida. Mas foi só ele morrer, que os quadros receberam valores imensuráveis. -Pegando uma tela em branco e colocando sobre o cavalete, Hiroshi cruza os braços e observa a tela em branco. -E isto aconteceu com muitos outros artistas em vida. -E como você se sente sobre isto? -Anneliese continua sentada ao pé da cadeira de Hiroshi, olhando para a tela em branco. -Quero ser diferente. Quero ser reconhecido em vida. -Hiroshi olha para Anneliese e sorrir. -Desculpa, estou falando em vida, enquanto você não está mais. -Não é culpa sua. Quando estamos vivos, não temos certeza se nossos sonhos serão realizados, se seremos felizes, se teremos sorrisos, mas sabemos que o amanhã pode nunca mais chegar. A vida não nos dar certeza de nada, exceto que um dia, quando se menos esperar, ela vai escorrer de seus dedos e você não poderá fazer nada, além de observar. -Com os olhos marejados, Anneliese se levanta e olha para Hiroshi. -Eu vou para casa. -A sua casa? -Confuso, Hiroshi se levanta. -Ou para... -Apontando para o teto, ele espera que ela entenda a referência para o céu. -Para a casa dos meus pais. -Sorrindo ela se despede com um aceno e atravessa as paredes dos cômodos. Sentada em frente a calçada da casa de seus pais, Anneliese observa as crianças brincando de bola na rua, as luzes dos postes eram fracas e o asfalto não era dos melhores, mas isto não impedia que as crianças se divertissem chutando e correndo atrás da bola. Aquele era o momento, aquele era o mundo delas naquele instante, o depois não importava e e o antes eles nem lembrava mais. Ao ver de Anneliese, trabalhar com a imaginação das crianças é algo que a surpreendia todos os dias, pois as ideias não faziam sentidos para ninguém além deles, mas eles não ficavam frustrados, continuavam criando brincadeiras e histórias apartir do nada. Nenhum adulto deveria esquecer da beleza e a inocência de ser uma criança. De como o mundo visto pelos olhos de uma pequena e inocente pessoinha é completamente diferente da visão dos adultos. Principalmente daqueles desiludidos. O vizinho de Anneliese chuta a bola em direção ao gol, mas erra a mira e acaba acertando o portão de uma casa. Assustados e achando graça ao mesmo tempo, todas as crianças saem correndo para longe da casa, com medo de levar uma bronca por terem acertado o portão da casa. Anneliese contou os minutos que as crianças demoraram para criar coragem e voltarem a rua para continuar a partida. Foram exatos 4 minutos de silêncio total, mas passado este tempo todos jogavam normalmente como se nada tivesse acontecido. Virando a esquina, Anneliese avista seu pai vindo com sacolas de supermercado nas mãos. Ela levanta do meio fio e com um sorriso enorme vai em direção ao seu pai. -Me dar um pouco,pai. -Ao estender os braços para pegar as compras, Anneliese tem todo o corpo atravessado pelo pai. -Ah é, você n******e me ver. -Ela desfere um próprio t**a na testa. Andando ao lado do pai, Anneliese observa o mesmo. Ela percebe que mesmo estando sempre por perto, não havia percebido como o pai estava envelhecendo. O rosto estava cheio de rugas e algumas manchas já se formavam no rosto senil. -Provavelmente, o senhor sempre achou que ia morrer primeiro, mas acabou sendo eu. -Ela aproxima os dedos sobre o rosto do pai, sem tocá-lo. -Eu não suportaria te perder, nem a mamãe. Foi melhor eu ter ido primeiro. Em casa, Anneliese sentou em frente a televisão e assistiu alguns filmes com seus pais, mesmo que eles não soubessem. No dia seguinte: -Como pode ser tão difícil encontrar um asiáticona faculdade. -Anneliese anda por toda a faculdade a procura de Hiroshi. -Com as características físicas dele, devia ser fácil encontrá-lo. -Resmunga. -Eu devia ter feito faculdade. -Ela olha para um g***o de garotos sentados em círculo enquanto estudavam. -Tem garotos bem bonitos aqui. Depois de andar por vários corredores, Anneliese encontra Hiroshi na fila da lanchonete. Ela tenta de aproximar, mas desiste quando percebe que ele está conversando animadamente com uma garota. -Então o Hiroshi tem namorada. -Anneliese se esconde atrás de uma pilastra e fica observando a cena. -Mas por que estou me escondendo mesmo? - Anneliese atravessa a pilastra. -Eu sou um fantasma. Hiroshi está segurando a mochila por apenas uma alça, enquanto a outra mão segura uma tela em branco. A garota a frente segura apenas uma pasta e mexe bastante com as mãos. A garota tem cabelos vermelho vibrante, usa uma saia jeans e uma camiseta sem alça juntamente com um par de botas preto. -Eles formam um casal bem bonito. A garota pega um copo de café e se despede de Hiroshi, que ao tentar acenar em despedida se atrapalha e acaba deixando a tela cair ao chão. -Você está caidinho por ela. -Anneliese se aproxima de Hiroshi, o assustando e deixando a tela cair novamente. -d***a, não me assuste. - Hiroshi olha f**o para a fantasma, que apenas acha engraçado a feição do amigo. -Vocês são namorados? Apenas revirando os olhos, Hiroshi segue em direção a sua sala, ignorando a fantasma em seu encalço. -Por que está me ignorando? -Anneliese para em frente a Hiroshi, mas ele continua andando. -O que eu fiz errado? -Nada. -Olhando para os lados, Hiroshi sussurra. -Não quero que as pessoas pense que eu sou doido a me verem conversando sozinho. -Mas não é sozinho. Eu estou aqui. -A fantasma cruza os braços. -Ah, ninguém pode me ver. Parados em frente a porta de madeira, Hiroshi aponta para a placa informando que está indo para a aula de Introdução a Arte Moderna. Anneliese apenas assente e dar as costas, mas assim que Hiroshi entra na sala, ela volta e coloca a cabeça pela porta. Um professor idoso, com cabelos bastante grisalhos e óculos fundo degarrafa escrevia na louça branca, enquanto os alunos começavam a escolher suas cadeiras e se sentarem. Haviam poucas cadeiras e todas eram iguais, feitas de madeira e pintadas de branca. As paredes da sala são pintadas da metade superior branca e a metade inferior de azul claro, enquanto o piso é de porcelanato bege. Havia alguns quadros pendurados preto e branco mesclando com as folhas verdes das plantas que enfeitam a sala. Hiroshi senta próximo a janela e fica alguns minutos observando com um olhar sonhador o exterior da faculdade antes de abrir a mochila e retirar o caderno e uma caneta azul. -Ele realmente está um bobo apaixonado. -Anneliese diz a se mesmo. -Irei te ajudar, Hiroshi. Anneliese sai pela a faculdade a procura da garota que conversava com Hiroshi no refeitório. Entrava em todas as salas e até mesmo nos banheiros, mas não encontrava a garota e já estava quase desistindo de procurar quando encontra Hiroshi saindo da sala de aula. -De qual curso é a garota que você estava mais cedo? -Anneliese para ao lado do amigo. -Por que a pergunta? -Hiroshi olha ao redor antes de falar com a fantasma. -Estava procurando por ela, mas esta faculdade é grande demais. -Responde Anneliese andando ao lado do amigo. -Como assim procurando por ela? Por que? -Surpreso com a revelação, Hiroshi para de andar e encara a fantasma. -Eu sei que gosta dela. -Anneliese abre um grande e alegre sorriso. -Eu quero te ajudar a conquistá-la. -Eu não preciso de ajuda, Anneliese. -Diz Hiroshi. -Por favor, não se envolva. -Por que não? -Anneliese ergue a sobrancelha direita ao questionar o amigo. -Como é que vou explicar para ela que uma mulher morta está a seguindo por todo o campus tentando ser o meu cúpido? -Indaga Hiroshi. -Ela não precisa saber dos detalhes. -Ela dar de ombros. -Não se envolva. -Hiroshi volta a andar, com passos rápidos e firmes. -Você apaixonado é tão fofinho. -Anneliese acelera os passos para alcançar o amigo. -Seus olhinhos puxados estão até brilhando. -Jamais pensei que teria uma fantasma tagarela me seguindo pela faculdade. - Comenta Hiroshi. -Jamais achei que eu ia morrer e ia ficar presa na Terra. -Anneliese dar de ombros. À noite, Hiroshi preparava uma refeição tipicamente japonesa, enquanto Anneliese está sentada a mesa de jantar ouvindo música pelo aparelho de som que estava sobre a mesa de centro abaixo da janela da sala de estar. Diferente de Anneliese, Hiroshi prefere músicas mais líricas, principalmente a cantora Enya. -Eu nunca comi comida japonesa. -Comenta Anneliese quando ver Hiroshi se aproximando com uma tigela e os hashis nas mãos. -Eu até te oferecia, mas acho que não conseguiria comer. -Hiroshi senta em frente a fantasma. -Por que você nunca experimentou comida japonesa? -A ideia de comer comida crua não me agradava. -Responde Anneliese observando a facilidade de Hiroshi em segurar os hashis. -Não é só de comida crua que vivem os j*******s. -Hiroshi mostra o conteúdo da tigela para a fantasma. -O famoso macarrão instantâneo que todos amamos e comemos veio do Japão. -Com os hashis ele prende o macarrão e coloca na boca. -Quando eu voltar a vida, irei experimentar comida japonesa. -Anneliese desce da mesa. -Mas nada de peixe cru. -Então você acha que ainda está aqui para ter uma chance de voltar a vida? - Segurando uma batata com o hashi, Hiroshi olha para a fantasma. -Por que deveria voltar a vida? -Eu não sei. -Andando de um lado para o outro, Anneliese roei as unhas da mão esquerda. -Preciso descobrir o propósito ainda. Mas percebi algo enquanto estava com meus pais ontem. -O que? -Hiroshi vira a tigela sobre a boca, para assim beber o líquido do macarrão com verduras. -Que eu ter morrido primeiro que meus pais foi melhor do que o contrário. -Anneliese vai até a janela e observa o céu. -Por que você acha isto? -Hiroshi começa a recolher a louça. -Todos acham que o certo é os pais irem primeiro que os filhos. Primeiro os mais velhos. -O rapaz asiático continua limpando a mesa da sala de jantar. -Por que meus pais já viveram uma parte de suas vidas sem mim, mas em toda a minha vida sempre tive meus pais ao meu lado. -Responde Anneliese olhando fixamente para Hiroshi. Hiroshi olha para Anneliese e sem saber o que dizer, apenas dar um meio sorriso, transmitindo que entende o ponto de vista dela, mas que não consegue elaborar nenhuma frase motivacional no momento.
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