Vanessa Campos

1600 Words
Dois anos antes... — Vanessa? — Disse a voz do outro lado da linha. — Sim, quem deseja? — Respondi com as pernas trêmulas, pois reconheci o número que estava me ligando. — Eu trabalho no RH da Costa Soluções Jurídicas e gostaria de dizer que a senhora passou na primeira etapa da seletiva para a vaga de estágio. Preciso que esteja aqui amanhã pela manhã para cumprir a segunda fase. — Muito obrigada! Amanhã estarei aí. Assim que o telefone desligou comecei a pular de alegria na minha cama. Essa era a oportunidade que eu precisava. A Costa Soluções Jurídicas era a maior empresa de advogados do Brasil e apesar de faltar um ano para eu me formar, teria uma vaga praticamente garantida lá no futuro. Fora que o salário de estágio era muito bom e eu ia poder alugar um cantinho para viver em paz. Não quero ser m*l-agradecida. A minha tia me acolheu quando eu passei na Federal aqui do Rio de Janeiro e tive que sair do interior de Minas para estudar. Ela não me cobra nada, apenas que eu faça todo o trabalho doméstico da casa, já que ela trabalha. E apesar de ser um pouco pesado, já que o meu tio e o meu primo são dois grandes porcos, faço com prazer, pois é o mínimo que posso retribuir. O problema é que o meu primo, o Gustavo, não me deixa em paz. Ele é da minha idade. Minha mãe e minha tia ficaram grávidas praticamente juntas, mas ele não me vê como parte da sua família. — Tá gostosinha hoje — fala enquanto me surpreende cheirando o meu pescoço. — Que merda, Gustavo. Já falei que não gosto dessas brincadeiras — respondo irritada. — A mãe não tá em casa... borá lá no quarto, aí eu te mostro que não tô brincando. — i****a! — Falo e saio de casa. Já está quase na hora da minha aula e eu não posso me atrasar por causa desse ridículo. Depois de estudar e enrolar o máximo de tempo para voltar para casa e assim ter dado tempo da minha tia chegar, me jogo na minha cama e começo a me preparar mentalmente para a minha entrevista de amanhã. Eu precisava desse emprego e ia fazer de tudo para conseguir. Quando amanheceu, tomei um banho e me arrumei de forma básica e discreta e logo saí de casa. Não queria correr o risco de ficar presa em algum engarrafamento ou de perder o ônibus e por isso cheguei quase quarenta minutos antes da hora. *** Eu estava sentada na sala de espera com mais dois rapazes que também fariam a entrevista. Eles usavam roupas caras e pela tranquilidade em que conversavam pareciam não estar se importando tanto com aquele estágio. Poucos minutos depois das oito da manhã, um homem alto e elegante entra na sala e é abordado pela secretária que lhe entrega os nossos testes e currículo. — Dr. Rick, esses são os candidatos aprovados na seletiva para compor a sua equipe. Meu Deus! Eu quase não me segurei na cadeira. Não sabia que a vaga era para a equipe do Dr. Rick. Ele era uma lenda do Direito. Porém, toda a minha euforia deu lugar à frustação quando ele me olhou de cima a baixo e disse para os garotos que esperavam junto comigo. — Vocês dois me esperem na segunda porta à esquerda e você — apontou para mim — está dispensada. Enquanto os dois candidatos saíam para o lugar que ele indicou, o Dr. Rick permaneceu mais algum tempo conversando com a secretária, dando a ela algumas instruções. Eu sabia que ninguém era obrigado a me contratar, mas eu criei tanta expectativa com aquele estágio, que ao ser humilhada daquela forma não me segurei e disse: — Misógino de merda! Merda! Além de desempregada, agora eu ia ser processada... — O que você falou? Me chamou de misógino? — O homem que caminhou até a mim perguntou. — Desculpe, mas isso não foi justo. Vai dizer que não foi o fato de eu ser mulher que motivou a me dispensar sem nem mesmo me ouvir? — Exatamente! Mulher, jovem e bonita. Vocês não são bem-vindas. Eu fiquei sem entender. Será que por ele ser um advogado famoso já não se importa mais em ser processado? — Isso é loucura... devia ao menos me ouvir pra ver se eu sou tão r**m assim. Ele me olhou como se tivesse tido uma grande ideia e falou. — Ótimo! Vou te ouvir agora mesmo. Vamos para a minha sala — ele fez sinal para a secretária e disse para mandar um dos advogados entrevistar os candidatos que o esperava. — Vamos ver até onde você está disposta a ir por esse emprego. Eu o segui até o final do corredor e entrei na sua sala. Aquilo era um sonho de consumo e eu com certeza gostaria de ter uma assim, com o meu nome na porta, bem chique. Ele mandou eu me sentar e afrouxou o nó da sua gravata enquanto enchia um copo com um líquido amarronzado que parecia ser uísque. — Quer um pouco? — Perguntou levantando o copo — É bom para relaxar. — Obrigada, mas não gosto de beber. Ele deu um gole na bebida e depois outro e então trancou a porta do seu escritório com a chave. Ele estava com a minha pasta em suas mãos e lia cuidadosamente o que constava lá. — Você tem um ótimo currículo. Seria a pessoa ideal para a vaga... — Seria? E por que não sou? — Perguntei. — Por que não sei se está disposta a dar o seu melhor aqui... — É claro que estou. O que eu tenho que fazer para provar? — Respondi sem maldar o que ele estava falando. Ele caminhou até ficar de frente para a cadeira onde eu estava sentada e ainda de pé, desafivelou o cinto da calça e respondeu: — Fica de joelho para mim e me mostre o que a sua boca é capaz de fazer. — Você está louco, velhote tarado? Saia de perto de mim antes que eu chute as suas bolas! — Respondi enquanto me levantava para ficar longe dele. — Viu? É por isso que não contrato mulheres. E agora, vai tentar me processar, v********a? — Não vou, mas se acha que me coloca medo, está muito enganado. Eu vou embora, mas um dia eu volto para trabalhar aqui e só vou sossegar quando chutar essa sua b***a daqui. Eu tentei abrir a porta, mas ela estava trancada. — Abre essa merda — disse quase gritando. — A chave está aqui — balançou-a para mim. Eu estava tão furiosa, que me virei e tentei tomar ela da sua mão, mas ele foi mais rápido do que eu e a colocou no bolso. — O que você quer? Me deixe ir. — Você está contratada e começa amanhã. Não se atrase. — Que merda é essa? Tá achando que vai conseguir alguma coisa comigo por causa de um emprego? Sou pobre, mas tenho dignidade. — Ai meu Deus, me dê paciência — esbravejou. Nós permanecemos em silêncio por um instante e então ele falou. — Vanessa, eu sou gay e muito bem casado. Não tenho nenhuma intenção em te assediar. — Se isso é verdade, por que fez essa cena toda? Não acha que entrevistar o candidato é mais eficiente do que esse teatro todo? — Estava falando a verdade quando disse que não contrato mulheres jovens e bonitas para a minha equipe. Oitenta por cento dos nossos quase trezentos funcionários são homens e grande parte deles é rico e machista. No final das contas, ou você é assediada, sem que eu possa te defender, ou vira amante de um dos muitos poderosos que andam por aqui e se torna uma inútil — de qualquer forma, um trabalho desnecessário. — E por que me deu uma chance? — Perguntei sem entender ao certo o que estava acontecendo. — Por que vi verdade em você. Se isso mudar, te mando embora na mesma hora. Ele então se levantou e abriu a porta. — O que conversamos aqui, fica aqui. E então fechou a porta atrás de mim, quase me expulsando. Uau! O que foi aquilo? Seis meses antes... Já tem mais de um ano que o Rick me contratou como estagiária e ainda que tenha sido daquela forma bizarra, não tem um dia da minha vida que eu não me sinta grata a ele. Primeiro porque ele abriu os meus olhos para o mundo corporativo. Eu era constantemente assediada, mas eu sempre sabia me defender e quando as coisas não saiam como o esperado, ele resolvia. Segundo, foi porque ele foi um grande mentor e me ensinou tudo o que podia me ensinar. Eu tinha acabado de me formar e ele me indicou para uma vaga como advogada assistente. Eu não ia trabalhar mais na equipe dele, porém não ia ser mais uma estagiária. Agora eu estava efetivada e não podia estar mais feliz. Eu já estava morando sozinha há algum tempo e liguei para algumas amigas para a gente comemorar em uma balada que tinha aberto perto de casa. Eu queria dançar e dar alguns beijos e quem sabe, estender um pouco a noite com algum gato. Eu não era nenhuma virgem inocente que esperava o amor e não queria relacionamento sério com ninguém. O meu foco era o trabalho e me divertia nas minhas horas livres. Tudo estava indo tão bem que eu até estava com medo.
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