- Como assim grávida? – Por muito que a notícia me alegrasse não conseguia perceber como Emily tinha escondido tal coisa de mim.
- A rainha não devia suspeitar de nada majestade, a gravidez não deverá ter mais de duas ou três semanas.
- E tem a certeza que está tudo bem doutor?
- Só o tempo o dirá Senhora. O que nos é possível fazer neste momento é ter a rainha vigiada e ir acompanhando o desenrolar da sua gravidez até que acorde. – Aurora continuou a fazer perguntas ao médico, as quais eu não fui capaz de ouvir porque não conseguia parar de pensar no que aconteceria à minha mulher e ao meu filho.
Deixei Pauline a vigiar Emily antes de sair do quarto. Aurora já se ausentara há algum tempo, voltando para a biblioteca mais preocupada do que nunca. Desci as escadas apressado em direcção à sala do trono, onde esperavam por mim, e cancelei todas as reuniões que tinha naquele dia, encaminhando-me em seguida para perto das mulheres que buscavam incessantemente pelo livro, sem obter quaisquer resultados.
As duas semanas seguintes passaram o mais lentamente possível, fazendo-nos a todos desesperar. Aurora praticamente não saía da biblioteca, assim como a minha mãe, quase enlouquecendo pela falta de novidades sobre Emily. O médico ia e vinha para se certificar que estava tudo bem com a minha esposa e o nosso filho, sem poder fazer nada para melhorar a situação e deixando-me arrasado de todas as vezes que abandonava o quarto onde Emily repousava.
- Está tudo estável – disse ao entrar na biblioteca. – O feto está a desenvolver-se como devia, mas ainda não existem sinais que a Emily vá acordar.
- Nem tudo são más notícias então. – Holly fechou o grande livro que tinha nas mãos, suspirando. – Onde está a Jennifer?
- Ficou com a Emily mais um pouco. – Olhei para o resto da sala, não avistando mais ninguém. Holly percebeu a minha dúvida mesmo antes de eu a proferir.
- Foram descansar. A Aurora não queria mas a este ritmo vai ficar esgotada.
- Já lhe tinha dito isso.
- Então e tu Eliot? Não tens parado nem um segundo durante este tempo.
- O que queres que te responda Holly? Esta situação já é angustiante o suficiente e ainda tenho de tomar conta de todo o reino sozinho, não é um trabalho fácil. – Sentei-me ao lado dela, apoiando os cotovelos na mesa e pondo a cabeça entre as mãos. – Eu bem tento descansar mas é impossível.
- A Emily está bem, o médico deixou isso claro. O vosso filho está a desenvolver-se e não há causa para alarme por enquanto. Tenho a certeza que é só uma questão de tempo para que encontremos o maldito livro e resolvermos esta questão.
- Custa-me dizer isto, mas não vamos poder fazer nada quanto à Emily. – Jennifer entrava na biblioteca cabisbaixa, segurando um pequeno livro de aspecto frágil. – A Aurora tinha razão quando disse que havia algo muito errado na batalha.
- O que queres dizer com isso Jennifer?
- Encontrei o livro – declarou tristemente. – Estava no vosso quarto, numa das estantes. Estava à espera que Pauline aparecesse e fui olhando para os títulos dos livros e lá estava.
- E o que descobriste?
- O feitiço que ela utilizou serve para acabar com todo o poder do inimigo, mas tem o resultado que observámos quando não o faz.
- Mas os gémeos estão mortos, não há maneira de ainda possuírem poderes.
- É aí que quero chegar Eliot, os poderes deles deveriam ter desaparecido por completo e a Emily deveria ter ficado bem, o que não aconteceu.
- O que mais diz aí? – Jennifer entregou o livro a Holly, indicando-lhe a página correcta. – Poderes divididos? Porque os gémeos haviam de o fazer?
- Não faço ideia. Eles queriam m***r a Emily e conquistar Cyon, não faz sentido abdicarem de algum do seu poder antes de um confronto.
- Quer dizer que eles estavam mesmo mais fracos que o costume… - Estremeci com a ideia do que teria sido a batalha se Brook e Keith estivessem com os seus poderes intactos. – Disseste que não havia nada a fazer quanto à Emily…
- De acordo como que está escrito quando o encantamento corre m*l, ou seja quando o oponente tem os seus poderes divididos, a pessoa que o executou entra em coma, assim como quem recebeu os poderes, e não há um tempo definido até que acordem.
- E não há maneira de o prever? – Se o meu desespero já era imenso, aumentou assim que Jennifer terminou de falar, deixando-me em estado de choque.
- Infelizmente não, vamos ter de aguardar até que a Emily acorde.
- E vamos ter de descobrir a quem é que os gémeos passaram parte dos seus poderes – concluiu Holly. – Pelo que sabemos estamos seguros até que a Emily acorde, mas não sabemos se a ideia dessa pessoa, ou pessoas, não será nos atacar.
- Não será fácil encontrar alguém se estiverem fora do reino. O que achas Eliot?
- Eu não sei. – Sentia-me baralhado, sem certezas de nada. – Deixem-me pensar durante uns dias, agora não consigo. – Levantei-me e caminhei em direcção à porta, enquanto concluía: - vou avisar a Aurora. Se procurarem por mim informem que não estou disponível.
Encaminhei-me para os aposentos da antiga rainha, enganando-me no caminho mais que uma vez, tal era a minha desorientação. Assim que bati à porta ouvi a voz da minha mãe a dar-me permissão para entrar. Estavam as duas sentadas perto da janela, ambas abatidas pelo cansaço, o que me fez ficar ainda mais angustiado ao informá-las da descoberta de Jennifer.
Os dias foram-se sucedendo sem que nada se alterasse. Depois de muito pensar decidi enviar uma mensagem aos guardas para que procurassem suspeitos no reino, o que começou a gerar dúvidas sobre o que estava a passar no castelo. Jennifer e Holly tinham-se oferecido para fazer buscas por conta própria, mas naquele momento eram muito mais necessárias no palácio e acabaram por ficar, ajudando Aurora na organização do castelo, algo que eu não tinha tempo de fazer por conta das intermináveis reuniões com a guarda real.
Novembro chegou, e com ele a chuva e o frio. O ambiente no palácio voltava, gradualmente, ao normal depois de a notícia sobre o estado de Emily se ter espalhado, e de todo o reino chegavam cartas a desejar as melhoras da rainha, assim como de felicitações e contentamento pela criança que esta carregava no ventre. Apesar da paz que se fazia sentir por Cyon o meu coração não sossegava, tal como o de Aurora, que passava grande parte do dia perto da filha, apesar de estar assegurado o bem-estar tanto de Emily como do nosso filho.
Jennifer e Holly, a meu pedido, continuaram com os preparativos do casamento, embora tivessem sido difíceis de convencer que era o melhor que faziam. A minha mãe ajudava-as sempre que não estava com a melhor amiga ou comigo, ocupando o tempo e o pensamento com outros assuntos que não o do futuro do reino.
As buscas por alguém que estivesse na mesma situação que a minha esposa não adiantaram em nada as suspeitas que tínhamos, sendo que não havia ninguém em Cyon que tivesse entrado em coma no dia do confronto com os gémeos, o que fazia com que aumentasse o temor daqueles que sabiam o que isso queria dizer.
- Não há nada que possamos fazer neste momento. – Aurora bebia o chá calmamente, deixando-me irritado com a serenidade que deixava transparecer. – Até o inimigo se mostrar devíamos agir com naturalidade.
- E deixar todo o reino em perigo? Porque haveríamos de fazer isso?
- O que achas que é preferível Eliot? – A minha mãe pousou a chávena, desviando todas as atenções para ela. – Há mais de cem anos os habitantes de Cyon só conheceram o medo, primeiro com os pais de Sloan, depois com o próprio e por fim com os seus filhos, e agora que finalmente encontraram um pouco de paz vamos acabar com isso? Ninguém sabe quanto tempo a Emily vai demorar a acordar e até lá não existe nenhuma ameaça.
- Já fizemos o que conseguíamos – atalhou Holly, - só nos resta esperar.
- Tu és o rei, a decisão final é tua – acrescentou Jennifer com uma expressão séria, - mas lembra-te que qualquer caminho que sigas tem os seus inconvenientes.
- O que a Jennifer acabou de dizer é a mais pura das verdades Eliot. Se informares o reino sobre o perigo vais instalar o medo e a desconfiança nas pessoas, apesar de as manter alertas para qualquer sinal de risco, e se não o fizeres e houver algum ataque elas vão estar despreparadas mas felizes enquanto a paz durar. Eu sei que não é fácil tomar este tipo de decisões, eu própria tive muitas dúvidas durante o tempo em que fui rainha e nem sempre fiz o certo.
- Não era para ser assim – disse ao mesmo tempo que me levantava e começava a andar às voltas na pequena sala de chá. – Devia ter acabado tudo com a morte da Brook e do Keith, não devíamos ter mais inimigos a combater.
- Ninguém estava à espera que isto acontecesse.
- Eu sei isso Holly, o problema é mesmo esse. Como é que mantenho o reino alerta sem provocar o pânico geral? Como faço para descobrir quem é este inimigo de que ninguém esperava? – Suspirei, voltando a sentar-me com os cotovelos apoiados nos joelhos e a cabeça entre as mãos. Sentia o olhar das quatro mulheres pousado em mim enquanto continuava. – Eu preciso de respostas. São demasiadas preocupações em tão pouco tempo.
- Não existem respostas para isso Eliot. – Aurora abraçava-me com ternura, fazendo com que as emoções que eu tentava esconder ficassem perceptíveis no meu rosto. – Leva o tempo que precisares e pensa bem no que irás fazer. Se precisares de ajuda estamos cá para isso.
- Obrigado – respondi com a voz a tremer. – Eu vou pensar no assunto. – Levantei-me e saí da sala, caminhando em direcção ao jardim.
O tempo estava nublado e uma trovoada aproximava-se ao longe. Sentei-me perto de uma das entradas do castelo, para o caso de começar a chover, e tentei relaxar um pouco, sendo-me completamente impossível, pois um guarda já corria na minha direcção. Ergui-me e encaminhei-me ao seu encontro, voltando a ficar preocupado assim que vi a sua expressão.
- Majestade, encontrámos a princesa Laila a uns dois quilómetros daqui.
- Ela deve ter ouvido as notícias sobre a prima e vindo nos visitar.
- A princesa estava caída num dos caminhos de acesso ao palácio, majestade. Apresenta sinais de agressão e está muito fraca.
- Para onde a levaram?
- Neste momento já a devem ter instalado no interior. A princesa perdeu os sentidos assim que nos pediu que a trouxesse-mos para o castelo.
- Obrigado por me informares. – Corri em direcção a interior do palácio, encontrando de imediato a minha mãe, juntamente com o médico, a subir as escadas. – O que se passou? Como está a Laila?
- Não sabemos, mas aparentemente está muito maltratada. – Entrámos nos aposentos de Laila e o que vi chocou-me. – Como foi isto acontecer?
- Acho que encontrámos o nosso inimigo – referi num sussurro a Holly e a Jennifer, que se encontravam no quarto completamente horrorizadas. Laila apresentava nódoas negras por todo o corpo, assim como cicatrizes nas pernas, braços e na face.
- O que queres dizer com isso?
- Tirando a Emily, a Laila é a mais forte de todos nós Jennifer. Quem quer que tenha feito isto tem de ter imenso poder.
- Faz sentido… - Jennifer pegou-me no braço e arrastou-me até um dos cantos do quarto, falando tão baixo que quase não a conseguia ouvir. – Estes machucados não são de agora, pelo menos a maioria. Se eu estiver certa, a Laila já estava a ser maltratada antes da queda dos gémeos, então ela deve ter escapado quando o nosso novo adversário entrou em coma.
- Foi isso que pensei – respondi no mesmo tom. – Vamos ter de esperar que ela recupere os sentidos para saber de quem se trata.
Os minutos foram passando, transformando-se em horas, enquanto esperávamos que Laila acordasse. Aurora juntou-se a nós pouco tempo depois de a sua prima chegar, concordando com as nossas suspeitas assim que as proferimos. Laila tinha um braço partido e, segundo o médico, estava desidratada e subnutrida, precisando de repouso absoluto durante algumas semanas. Assim que ela acordou, o doutor apressou-se a fazer-lhe mais alguns exames rápidos, saindo m*l os terminou.
- Como te sentes Laila?
- Agora que estou com vocês estou muito melhor Aurora. Onde está a Emily? – A antiga rainha olhou para mim, deixando a meu cargo a explicação.
- Ela está em coma Laila. A Emily usou um feitiço contra os gémeos e nem tudo correu bem…
- Ela não conseguiu derrota-los?
- Conseguiu querida, mas parece que eles passaram os seus poderes para outra pessoa. – Aurora pegou docemente na mão de Laila, afagando-a gentilmente. – Tanto a Emily como a pessoa que recebeu os poderes dos teus meios-irmãos entraram em coma e não sabemos quando irão acordar.
- Então foi por isso… - O olhar de Laila desfocou-se e ela falava para si própria.
- Sabes alguma coisa sobre isto Laila?
- Sei Holly, infelizmente sei.
- Foi a mesma pessoa que te deixou neste estado, não foi? – Bateram à porta e Elaine e Deise, as aias de Laila, entraram, trazendo água e comida para a enferma. Jennifer aguardou pacientemente, assim como os restantes, que as aias saíssem e Laila respondesse à pergunta.
- Precisamos de saber Laila, todo o reino está em perigo – acrescentei, vendo que ela não queria falar.
- Estás enganado Eliot o reino vai continuar em paz, pelo menos por enquanto. – Suspirando, Laila continuou: - As únicas pessoas em perigo somos nós e a Emily.
- Como assim? Quem está por detrás de tudo isto? – A minha boca abriu-se de horror quando percebi o que Laila não nos estava a contar. – n******e ser…
- Eliot? O que se passa?
- Ele já percebeu Eileen. – Uma pequena lágrima correu pela face da prima de Emily, não de dor mas sim de vergonha. – Quem me deixou neste estado, quem se aliou aos gémeos e quem nos está a ameaçar é uma única pessoa. Tudo isto é culpa do Dylan.