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2725 Palavras
• Maria • Assim que eu piso na calçada da Erudição, os soldados da Audácia Aliada apontam suas armas na minha direção e, rendida, eu apenas ergo as mãos no alto. Eu sigo caminhando na direção da portaria e vejo Max sair de dentro do prédio com um sorriso presunçoso nos lábios. Em seu rosto, a marca da coronhada que eu dei nele ainda está visível, embora isso já tenha acontecido há dias. — Foi mais rápido do que eu imaginei. — ele diz sorrindo e puxando uma braçadeira de plástico do bolso — Na verdade, até achei que Eric conseguiria te trazer pra cá. Fiquei em silêncio. Optei por não responder nenhuma provocação. Eu tiro o casaco e sinto as mãos de Max apalparem o meu corpo, me revistando. Ele passa as mãos bem de leve e eu agradeço mentalmente por isso. Colocando meus braços para trás, ele me algema e, segurando meu braço, vai me guiando pra dentro do prédio. Passamos por uma série de corredores e então chegamos ao elevador, onde esperamos por cerca de cinco minutos. Quando estamos no último andar, enquanto Max me arrasta pelo corredor, eu vejo Ali passar carregando uma bandeja com uma seringa e uma arma. Ela arregala os olhos ao me ver e abaixa a cabeça, mudando seu caminho para não esbarrar comigo e com Max. Entramos numa espécie de laboratório gigante onde eu ouço gritos e vejo uma menina de, talvez, uns treze anos se debatendo numa sala de vidro. Ela está usando trajes da Amizade e eu sinto meu peito se apertar. Todos os cientistas malucos da Erudição apenas a observam curiosos. — Eu confesso que, após o fracasso de Eric, achei que Tris fosse se entregar para salvar a cunhada e o namoradinho. — ouço a voz gélida de Jeanine e a vejo se virar para mim, me encarando sob as lentes de seus óculos — Mas é bom ter você aqui. Logan amaria ver que, no final, você veio até mim. Respiro fundo e permaneço em silêncio, observando os olhos azuis de Jeanine brilharem ainda mais por trás dos óculos. Meu pai me disse uma vez que ela enxergava muito bem. Ouso dizer que talvez ela só use essa merda pra parecer mais inteligente. Tento não pensar em nada por um momento, mas ao mesmo tempo em que quero me manter calma, os gritos da garota da Amizade ecoam na minha mente. Meus olhos se enchem de lágrimas e eu choro em silêncio enquanto vejo pelo vidro a menina se retorcer no canto da sala, lutando contra algo invisível que, provavelmente, só existe em sua mente agora. Mais alguns minutos se passam até que a garota pare de se debater e fique estirada no chão. Jeanine suspira de forma pesada e um homem sentado faz um gesto negativo com a cabeça. — A cobaia 5D não resistiu. — Jeanine diz em voz alta — Vamos continuar os testes assim que a próxima estiver pronta. Jeanine não só caçou divergentes na sede da Franqueza, ela também caçou em outras facções. Isso me deixa ainda mais enojada. Ela quer estudá-los e aniquilar toda essa raça. A minha raça. Enquanto Max mantém o aperto firme em meu braço, Jeanine caminha até mim com a mesma máquina que Eric tinha nas mãos, no ataque à Franqueza. Ela o posiciona em meu rosto e Max segura meu pescoço para que eu fique parada. — Divergente: 100%. — a voz robótica diz Jeanine arregala os olhos surpresa e sorri vitoriosa. Através de um holograma, a máquina mostra as mesmas porcentagens e facções que Tris me disse no meu teste. Audácia: 50% Erudição: 15% Abnegação: 15% Amizade: 20% — Incrível. — ela parece maravilhada — A próxima cobaia será ela. — Sim, senhora. — uma mulher diz fazendo anotações — Eu fico me perguntando por quê vocês não tiveram aptidão pra Franqueza. — seu cenho está franzido e ela parece pensativa ao baixar a mão, tirando a máquina do meu rosto — Será que é m*l de divergente? Continuo em silêncio. Não quero dizer mais nada, não quero ouvir mais nada. — Está mesmo disposta a ficar calada, não é? — ela sorri — Com licença, senhora. — a voz conhecida por mim preenche o ambiente Caleb entra no laboratório e se aproxima de nós. Ele diz alguma coisa no ouvido de Jeanine e ela sorri animada. — Funcionou! — ela diz rindo — Eu fiquei tão empolgada com a sua chegada que havia me esquecido da grande ação suicida de hoje. Parece que eu ganhei mais uma cobaia. A forma como ela fala é tão fria que chega a ser medonha. Ela não parece estar falando de pessoas, de vidas. — Levem-na. — ordena Max me puxa bruscamente enquanto eu ainda estou encarando Caleb e isso faz com que eu tropece um pouco antes de sair do lugar. Saímos do laboratório e caminhamos pelos corredores até o hall dos elevadores. Quando o elevador se abre, eu arregalo os olhos. Tris está algemada como eu e é arrastada pra fora. Ela arregala os olhos ao me ver. — O que você fez, Maria? — ela grita assustada — Tris! — a chamo — Não deve haver interação entre as cobaias. — Caleb diz enquanto se aproxima de nós, caminhando Tris se debate tentando se aproximar de mim e eu faço o mesmo, mas ambas somos arrastadas para direções diferentes. Um rapaz jovem entra com Max e eu no elevador e me aplica algo no pescoço. Eu continuo me debatendo, o que faz com que Max perca a paciência e me jogue contra a parede de metal. — Não faça nada com ela. — o jovem diz — Jeanine não quer as cobaias machucadas. Sinto meu coração ir desacelerando e meu corpo começa a parar de obedecer o meu cérebro, que manda lutar. Vou parando aos poucos até que meus olhos se fecham e eu perco a consciência. • Quatro • Tori e Joanne estavam quase partindo pra uma briga física, já que a primeira queria matar Eric com as próprias mãos e a segunda o defendia. Eu só interferia quando via que a coisa estava ficando muito feia, então eu afastava as duas e dizia para elas irem se acalmar. De onde eu estava sentado, pude ver Maria se levantar sem nem ter comido alguma coisa e ir embora. O clima na mesa dela parecia pesado e eu via Tris, Sam e Christina passando um sermão em Jessie, após ela dizer p************s para a minha irmã. Eu pensei que Drew iria atrás dela, como sempre, mas invés disso ele apenas pegou sua bandeja e foi se sentar em uma mesa vazia, sozinho. Eu imagino que a mente dele deve estar um caos, já que a garota que ele gosta é apaixonada pelo cara que ele odeia. Eu até me levanto, ignorando outra discussão entre Tori e Joanne, e vou atrás da Maria no corredor, mas ela me pede um tempo e vai para a Torre da Liderança. Imagino que vá se esconder no apartamento do Eric. Cansado, eu resolvo vestir minha jaqueta e ir até o beco atrás da Audácia, onde sempre há um grupo Sem-Facção reunido em torno de uma fogueira. — Está tudo certo por aqui? — pergunto ao me aproximar — Você está patrulhando, agora? — uma mulher pergunta fazendo careta Me aproximo de um homem alto vestindo um longo casaco da Abnegação e com um lençol na cabeça, escondendo parcialmente seu rosto. Paro ao lado dele observando o fogo da fogueira noturna já se apagando, restando apenas brasas. — O que tem pra mim? — murmuro — Evelyn está caçando o Marcus. — E há alguma pista? — Talvez Johanna esteja escondendo ele na Amizade. Ela está sondando tudo. — ele respira fundo — Como estão as coisas no complexo? — Turbulentas. — digo baixinho — A decisão de adiar a execução de Eric está dando o que falar. Claro que há mais gente para acusá-lo que para defendê-lo. — Eu imagino. Se ainda estivesse lá, talvez fosse o primeiro a arrumar um motim para matá-lo na calada da noite, quando ninguém estivesse olhando. Viro o pescoço para encará-lo melhor. Ezra foi o segundo colocado na classificação da iniciação e, quando o mesmo veio até mim se oferecer para ser meus olhos e ouvidos nos Sem-Facção, eu me surpreendi. Ele sempre foi muito astucioso e sempre pensou muito bem sobre a situação ao seu redor, o que me faz pensar se ele não tem alguma divergência que ainda não foi descoberta. — O que está querendo dizer? — pergunto — Que, se pretende deixar o Eric vivo por mais tempo, é melhor tomar cuidado. — ele me olha de relance, mas logo volta a olhar as brasas — Há muitas pessoas que o odeiam ali e, muitas delas, têm motivo de sobra pra isso. — Obrigado pela dica. — murmuro Saio dali caminhando calmamente, pensando no que Ezra me falou. Por um lado, penso que Eric não seria atacado tão fácil assim, pois sei que, apesar das minhas ordens explícitas para que Maria não se aproxime da cela dele, ela tem seus métodos de persuasão. Com certeza ela está dando um jeito de ignorar esse decreto para vê-lo. Mas isso também me apavora, pois se alguém tentar matá-lo e ela estiver lá, poderá matá-la também. Droga! *** Após passarmos o dia inteiro removendo os dispositivos que grudaram na nossa pele, eu estava exausto. Principalmente porque, apesar de removermos o dispositivo, uma marca azul ficava sob a pele, mostrando que algum soro havia sido injetado em nós. Nós não sabemos que merda Jeanine pretende com isso, mas após o ataque à Abnegação e após a simulação de Eric, está claro que a Erudição tem uma técnica muito avançada para nos controlar por muito tempo, mesmo de uma certa distância. — Não vi mais sua irmã hoje. — ouço Tris dizer — Ela está trancada no apartamento do Eric. — murmuro — As câmeras de lá foram atingidas? — ela me olha — Não, mas são só as dos corredores. Dentro do apartamento, pelo que eu saiba, não há câmeras. — Vocês já tiveram tempo pra conversar sobre vocês e Evelyn? — Sim e não. — dou de ombros — Eu não sabia o que falar, ela também não. Mas concordamos que a única coisa boa com o retorno de Evelyn foi o fato de sabermos que somos irmãos. Eu não sei como é ser um irmão. — a olho — É ser amigo, é proteger, é amar. — Eu não sei se sei ser amigo, Tris. — murmuro — Ela estava certa quando disse que eu só tenho você. — Você sabe, porque é meu melhor amigo. — ela sorri pra mim — É que você tem seu próprio jeito de ser, mas não é um jeito errado. — As pessoas acham que não matei o Eric porque ela pediu. — respiro fundo — Outros acham que é porque eu sou um covarde. Ainda mais agora que todo mundo já sabe que eu sou o Tobias Eaton que apanhou do pai e escolheu a Audácia pra fugir. — Por que você não matou o Eric? — ela pergunta me olhando — Eu não sei. — murmuro — Mas sei que tinha alguma coisa errada acontecendo com ele. Ele atirou no Drew pra salvar a Maria, ele a segurou quando a garota da iniciação empurrou ela no abismo. Ele sente alguma coisa por ela, isso é um fato. O que me tira o sono é não saber o quão forte esse sentimento é. — Se é forte o suficiente pra ele se endireitar ou não, não é? — ela compreende — Exatamente. *** — Eric. — o chamo Eric está no chão, deitado, encarando o teto desnivelado da prisão. Quando o chamo, ele demora para me encarar, mas me encara e depois volta a olhar para o teto. — Talvez a gente precise conversar um pouco, não acha? — pergunto Ele se mantém em silêncio e isso me irrita profundamente. — Não tem nada a me dizer? — Precisa se esforçar mais pra mantê-la afastada de mim. — ele murmura — Isso é você jogando na minha cara que ela te ama? — cruzo os braços — Não, isso sou eu mandando você... — ele se cala e passa as mãos no rosto, frustrado — Isso sou eu pedindo para você mantê-la a salvo. — Você a ama, Eric? A minha pergunta o faz virar a cabeça para me encarar. — Por que você acreditaria em qualquer coisa que eu dissesse? — ele pergunta — Porque eu quero acreditar que você não é de todo m*l. Não é possível que alguém seja cem por cento bom e nem cem por cento m*l. — Isso é a Abnegação em você. — E sua frieza é a Erudição em você. Ele se levanta devagar e caminha até as grades, fechando as mãos em torno delas e encostando a testa nelas. Só agora consigo perceber que há olheiras grandes em seu rosto e ele parece mais branco que o normal. A barba em seu rosto está despontando e o cabelo está crescendo. Ele está com cara de maluco, mas o olhar está ainda mais profundo. — Eu não sei o que eu sinto, porque eu nunca senti nada assim antes. — ele diz olhando em meus olhos — Eu só quero estar com ela, apenas com ela, e protegê-la de tudo que é r**m. Incluindo de mim. Fico em silêncio o observando. Ele não parece estar mentindo, mas eu ainda não confio nele. Embora ele seja o Eric que venceu meu primeiro caça-bandeiras comigo e que estava no beco quando resgatamos Joanne de ser violentada por dois garotos da Franqueza, ele também é o mesmo Eric que passou anos e anos sendo frio e disputando qualquer coisa comigo, em sua mente doentia. Respiro fundo me perguntando mentalmente se há, no passado dele, algum motivo para ele ser tão fechado, frio e carrancudo assim. Se ele, assim como eu, possui feridas abertas dentro de si. Nosso momento de silêncio é interrompido por passos apressados na nossa direção. Joanne corre até onde estamos e parece ofegante e assustada. — Tori está lá em cima, os dispositivos do soro azul foram ativados. — ela diz apressada e Eric franze o cenho olhando-a — Jessie, Drew e Sam estão na beira do abismo imóveis. Eles vão se jogar. — Cadê a Maria? — pergunto nervoso — Ela não está no complexo. — O que? — a voz de Eric sai esganiçada Olho para Eric e ele parece tão nervoso quanto eu. Olho para Joanne e ela parece pensar o mesmo que eu. Não é seguro ficarmos aqui. Abro a cela do Eric e, juntos, nós três corremos por todo o complexo até o abismo, onde vejo os três amigos de Maria ali. Tris e Christina estão tentando controlar a multidão, pois não sabemos se eles serão ativados assim que qualquer um de nós nos aproximarmos. — Ela consegue ver o que está acontecendo através dos olhos deles. — Eric diz — Essa é a mensagem! — Drew diz em voz alta, mas sua voz soa robótica e sem vida — Enquanto os divergentes se esconderem entre nós, vidas inocentes estarão em risco. — Entregue os divergentes para a facção governante. — Sam diz alto — Isso não vai parar. — Jessie diz — Quatro! — Eric me grita apontando para uma rocha Entendo perfeitamente o que ele quer dizer. Devemos nos pendurar naquela rocha para passar para a ponte por trás deles. Enquanto eles repetem a mensagem, Eric e eu nos esgueiramos pela rocha escorregadia e subimos na ponte. Eu tropeço, causando um barulho, e eles chegam mais pra beira. Quando Jessie repete a última frase, todos eles pulam. Eu me lanço pra frente e agarro o punho de Jessie, a deixando pendurada. Seus olhos estão vazios. Eric se lança ao mesmo tempo que eu e, sem perceber, agarra o pulso de Drew. Sam cai no abismo e nós conseguimos ouvir seu corpo batendo na água. Eric me olha assustado. — Isso não é bom. — ele diz — Maria foi pra Erudição. — constato — E a Tris também irá. — completa
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