Capítulo III- Isabel Silva

1392 Palavras
Por mais que eu estivesse com os meus irmãos, sendo amparada, sempre ocupada, as noites chegavam e com elas o vazio. Eu ainda não compreendia o porque, se tudo me parecia perfeito. Seria de um homem a meu lado? Era complicado para mim ter essa dúvida enquanto observava meus três filhos dormindo na cama de casal, as vezes a minha mais nova ia para o quarto da tia, madrinha para dormir com ela. Zaya não teve filhas, para a minha sorte. Ao chegar do curso, elas se juntavam para qualquer atividade feminina, fossem passar creme ou simplesmente tomar um chá. Eu não tinha ideia ou tempo para isso, pelo menos achava que não. Havia uma confusão em mim, a vontade de querer fazer tudo, mas ao mesmo tempo preguiça de tentar. Sempre fiz o que me mandava, o que estava imposto por alguém, mas um dia, enquanto ia se apresentar para um estágio Mario ficou desesperado com a blusa nova social dele, estava rasgada no punho, como podia? Meu irmão chorão, super sensível começou a chorar desesperado. - Não sei para quê tanto drama, no caminho passa na loja e compra outra. Murmurei. - Não é a mesma coisa, eu gostei dessa blusa, esse tecido ele é... - Com o choro nem terminou de falar, e mais uma vez sempre disposta a solucionar tudo, Zaya largou as panelas. - Pega a agulha e a linha, isso não pode ser tão r**m que eu não possa consertar. - Disse aflita, o choro de Mário a irritava, era como se a machucasse, eu resolvia tudo no grito, mas ela não. - ou piora né mãe. - O filho dela mais novo zombou do sofá. - Não fala assim da nossa mãe. - Daí falou sério, sempre defensor da mãe. - Que seja meu filho, que seja. - Minha revirava as suas coisas cegamente, e ao achar a linha branca, logo buscava pela agulha, as panelas borbulhavam, eu não sabia mais como mexer. Tudo me fazia sentir uma inútil, boa em nada exatamente como ela. - Zaya, Zaya me ajuda, vai queimar. Ela m*l sabia o que fazer, mexer as panelas, três aos mesmo tempo ou enfiar a linha na agulha. Pelo menos isso eu sabia, de certo, parecia tão simples, que me arrisquei a dizer. - Vem pra cá que eu costuro isso. - Não! - Dois gritos soaram em uníssono, tanto o meu sobrinho como o marido irmão disseram, mas ela afirmou. - Tá, eu confio em você. - Disse passando a agulha e a linha sem nem piscar. E foi meu grande acerto, eu gostava daquilo, descobri desde o primeiro ponto, o segundo ou talvez não, gostava de saber que ela confia em mim. Naquela manhã, eu arrumei as marmitas agoniada, louca para saber como me sairia de verdade ou se foi só fogo de momento, mas não era,a blusa de Mário foi bem pregada, e depois dela, eu saí remendando tudo que era roupa. Eu gostava e era boa em alguma coisa, livre de alguém me dizer pra fazer, e uma semana depois, me vi refazendo um vestido. Um mês depois em meio a tantas costuras, foi como um presente meio equivocado que Mário me deu uma máquina. - Pra quê isso?- Perguntei curiosa, olhando para a máquina Singer meio amarelada. - Se tu não gosta, vende, doa, joga fora, mas como tô vendo que gosta de costura, resolvi te dar, nunca te dou nada. - Saiu falando pela casa. Era eu e ela, ali parada no meio do corredor se olhando, no primeiro dia nem tentei, e o segundo também, mas do terceiro diante, era como um desaforo para mim, mais desaforada era ela. Eu ajeitava um tanto e nada saia, a não ser linha desperdiçada, agulha quebrada, enchia de nome e chute, eu odiava aquele negócio, tentei, e logo resolvi voltar a costurar na mão. As noites depois de arrumar os meninos, outra vez estava eu, com as pernas para o alto, deitada, sentada, fosse como quisesse, agarrada a um pedaço de pano, uma linha e uma agulha. O tempo passava, qualquer barulho ficava em silêncio, o vazio se calava, eu demorei a perceber que era aquilo que eu queria, que eu gostava. Só vim perceber quando me vi tentando mais uma vez labutar com aquela máquina, e diferente da primeira, na segunda estava mais branda, ela tinha um manual. Meu sobrinho lia e relia tão pacientemente. Com algumas tentativas fui aprendendo, e como passo principal e muita vergonha fui também fazer um curso, como Zaya, mas a dela era diferente. Ela e Mario faziam faculdade, eu só tinha começado tarde, mas se eles são mais velhos, ainda havia tempo para mim. Fiz o primeiro curso, o segundo, fui pegando roupas para consertar, o tempo foi passando de uma maneira que nem percebi que Zaya estava namorando, Mário procurando um apartamento para morar com o namorado. A minha vida se preenchia com a costura, e não n**o que chorei igual a Mário diante da minha primeira obra feita, diante do vestido preto com fendas e costa nua, como um de revista que a cliente pediu. Sequer sabia ser capaz, mas fiz e de ali em diante, eu não parei mais. Mario se mudou para começar a sua vida, a cinquenta metros da nossa casa. Ele era mais corajoso que eu, para viver com outro homem, então. Eu não tinha essa coragem, não mesmo. Zaya se tornou o meu porto seguro, ou talvez sempre fosse ele. Mas as coisas em casa mudou, a fiscalização começou a pegar no nosso pé. Exigindo um ambiente adequado, legalização da empresa, e por multas, decidimos fechar a delícias da Zaya. Não foi uma decisão fácil, mas a minha irmã parecia ter tudo sob controle. Começou a trabalhar num restaurante, Mário começou a estagiar numa empresa, enquanto eu... me via perdida depois de encaminhar as crias para a escola. Depois de fazer o almoço, malmente ajeitar a casa, o que me sobrava era costurar ou bater pernas, e claro, isso me facilitou mais uma busca por namorados. Zaya namorando, Mário já morando juntos, nos finais de semana por mais que estivéssemos juntos, me faltava uma companhia. Ricardo me parecia uma excelente opção, depois de interrogar sobre ser casado. Ele não parecia ser, e mesmo se fosse, o que me levava todo o meu tempo era o surgimento de festas do lugar, a exigir por fantasias. Os ateliês lotados, faltava costureiras, ou eles cobravam os olhos da cara. Isso eu demorei a entender o porque, afinal tudo na vida levava custo. E na costura, com gastos entre linhas, botões, peças, bordados, tecidos e energia, além de manutenção isso é nada barato. Depois das comemorações, eu achava que sossegava um pouco, mas não, comecei a conquistar clientes, o corredor de casa começou a ficar pequeno. Desconfortável, afinal, era a nossa casa. Trabalhando no restaurante, foram poucos meses para Zaya chegar em casa nos perguntando sobre se habilitar de carro, parecia distante para gente, parecia. Mas ela começou, enquanto eu, abri os olhos para procurar um canto pra abrir o meu espaço, não era nada chique, uma garagem velha, qualquer canto que desse. A verdade é que eu nem sabia se ia dar certo, era um sonho louco. Eu amava fazer e. Não tinha expectativa de vida, mas não foi muito longe de casa que eu consegui uma venda abandonada, aluguei. O dono nem acreditava ser possível, mas os meus irmãos aprovaram, e não só com as bocas, no dia seguinte Mário mandou dois homens, que trocaram a porta, pintaram de branco. Eu nem sabia de cor, enquanto eles já estavam lidando os slogan tão grande e charmoso, o ateliê da Bell, tudo feito sob medida, o nome grande em dourado, acendia a noite. Eu não imaginava chegar a tanto, ainda mais quando costureiras iniciantes me procuraram para trabalhar. Era uma coisa pequena na minha cabeça, até ir caindo as fichas aos poucos oito mil reais num mês? Eu Isabel, a Bell faz tudo pagando salario para duas mulheres, ensinando, costurando, construindo, mas o sonho durou pouco menos de um ano. Mário foi chamado para ir trabalhar no Paraná, e como eu não largava Zaya, ela não largava ele, e de muda fomos todos para o Paraná, não desgrudamos mais para nada depois de ter saido da Bahia.
Leitura gratuita para novos usuários
Digitalize para baixar o aplicativo
Facebookexpand_more
  • author-avatar
    Escritor
  • chap_listÍndice
  • likeADICIONAR