Jaxton
— Vou até a cidade tomar uma cerveja. Precisa de alguma coisa enquanto estou lá? — perguntou Asher.
— Não, acho que estou bem — respondi, recostando-me na velha poltrona do nosso pai, olhando fixamente para a lareira. — Mas obrigada.
Asher saiu, e eu ouvi a porta se fechando atrás dele e o rugido do motor quando a caminhonete deu partida. Um momento depois, o estalo do cascalho sob os pneus indicou que ele estava saindo da garagem. Com a casa completamente imóvel e silenciosa, e o mundo lá fora preenchido apenas pelo som dos pássaros e, vez ou outra, de um avião cruzando o céu, percebi o quanto eu estava sozinho. O quão isolados estávamos ali, no meio do nada.
Nossos pais haviam falecido dez anos antes, num acidente de carro que não foi culpa deles. Eu m*l tinha completado um ano na época, e Asher havia acabado de fazer dezoito. Nenhum de nós estava pronto para viver sozinho, mas lá estávamos: só nós dois no mundo. De alguma forma, conseguimos nos virar. Eu diria que, de certa forma, até prosperamos.
Financeiramente, nunca tivemos problemas — nossos pais tinham dinheiro. Quando criança, eu sabia disso, mas nunca soube exatamente quanto. Então, dá pra imaginar minha surpresa quando descobri que eles nos deixaram o suficiente para viver confortavelmente pelo resto da vida, sem precisar trabalhar muito, se não quiséssemos. Tínhamos uma casa, dinheiro no banco e a liberdade de fazer o que quiséssemos com nossas vidas.
Mas não tínhamos ninguém.
Bem, tínhamos os Moores, que felizmente nos acolheram quando mais precisávamos. Mas ainda assim faltava algo, e eu sabia que esse vazio jamais poderia ser completamente preenchido.
Nossa casa era pra ser o lar de uma família. Um lugar cheio de crianças. Nunca deveria ter virado um apartamento improvisado para dois homens solteiros e ranzinzas, prestes a completar trinta anos. E, pra ser sincero, eu sempre quis uma família. Não sei quanto ao Asher — ele nunca falava sobre isso —, mas eu sempre imaginei ter um filho um dia. Ou uma filha. Alguém a quem eu pudesse ensinar a caçar, a viver da terra, como meu pai me ensinou. Eu queria transmitir a sabedoria que ele me passou para meus próprios filhos.
Olhei fixamente para o fogo na lareira, ouvindo o crepitar da madeira queimando. A casa estava tão silenciosa ao meu redor que o silêncio parecia ter peso. Era quase opressor.
Levantei-me da cadeira e fui até os fundos da casa. Sempre que o mundo ficava calado demais, ou eu me sentia solitário demais, costumava ir até o quintal. Tínhamos animais que nos ajudavam a nos sustentar: galinhas, que nos davam ovos, e cabras, que forneciam leite. Mas eles eram mais do que provedores. Eram companhia. Um pequeno alívio do silêncio que, às vezes, parecia que ia me engolir.
Eu adorava morar nas montanhas. Adorava nossa casa. E, no geral, eu até amava minha vida. Mas... faltava algo. Havia um grande vazio, e eu não fazia ideia de como preenchê-lo. Pra mim, esse "algo" era uma família. Queria alguém com quem dividir tudo aquilo. Alguém que não fosse meu irmão.
Por enquanto, o mais próximo que eu tinha disso eram os animais da propriedade. Não era muito, mas era mais do que algumas pessoas tinham. Assim que entrei no cercado, as galinhas correram em minha direção, espertas como sempre. Sabiam que humanos significavam comida. Joguei um pouco de ração e as observei bicando o chão, mas elas não se aproximavam mais do que o necessário. Apenas o bastante para comer. Nada de interação de verdade. Ou seja, eu ainda estava sozinho.
As cabras e os cavalos normalmente interagiam mais, mas não era a mesma coisa.
Saí do galinheiro e então percebi algo se movendo na casa dos Moores. Tinha alguém lá dentro. Brien sempre nos avisava quando estava na cidade, passava antes por aqui pra não corrermos o risco de aparecer armados, achando que era invasor. Talvez ele tivesse passado no dia anterior e eu tivesse esquecido. Mas, considerando a porta quebrada do galpão que encontramos outro dia, e agora alguém se movendo lá dentro, fiquei nervoso. Meus instintos gritaram.
Voltei para dentro e peguei a primeira arma que vi — o velho rifle de caça do meu pai. Não estava carregado. Peguei alguns cartuchos e os enfiei no bolso, só por precaução. Não queria sair por aí armado como se fosse guerra. Não havia ameaça clara. Mesmo que fosse um invasor, eu preferia assustá-lo a atirar em alguém. Conseguiria carregar o rifle rápido, se fosse necessário. Só esperava que não fosse.
Saí pela porta dos fundos e caminhei em direção à casa dos Moores, sem tirar os olhos de lá. Abri o portão, me encolhendo quando ele rangeu, torcendo pra que o som não tivesse sido ouvido. Pela janela, vi alguém passando outra vez. Estavam na sala de estar. Com sorte, ainda não tinham me visto.
Meu plano era entrar pela cozinha e pegá-los de surpresa. Subi os degraus da porta dos fundos e tentei a maçaneta. Trancada. Claro que estava. Asher estava com as chaves. Eu não queria esperar ele voltar, então fiz a segunda melhor coisa.
Eu sabia que a maçaneta estava solta. Precisava ser trocada, e eu compraria uma nova pra eles depois, sem problema. Compraria até uma porta nova, se fosse preciso. Só queria garantir que ninguém estava mexendo nas coisas deles.
Girei a maçaneta e puxei com força. Demorei algumas tentativas até conseguir que a porta cedesse com um rangido. Fiquei quieto, ouvindo, tentando detectar qualquer movimento. Então ouvi. Passos. Alguém estava andando pela casa.
Entrei devagar, pisando o mais suavemente possível na cozinha, um lugar que eu conhecia bem. Já tinha tomado muitos cafés da manhã ali com os Moores. Um corredor ligava a sala de jantar à sala de estar — e aquele maldito corredor rangia.
Me movi com cuidado, mas precisei me esconder na sala de jantar quando os passos se aproximaram. Eles continuaram pelo corredor, e junto com os passos... eu ouvi outra coisa.
Alguém estava cantarolando. Não cantando de verdade — só uma melodia suave, quase distraída. Era uma voz feminina, delicada, e quando ouvi aquilo, um buraco se abriu no meu estômago. Pode ser que eu não reconhecesse a música, mas reconheci a voz.
Meu peito apertou. Afrouxei o aperto no rifle.
Encostado na parede da sala de jantar, eu não sabia o que fazer. Se eu simplesmente aparecesse, ela teria um troço. E, além disso... eu realmente queria vê-la de novo assim, do nada?
Não tinha certeza se estava pronto.
— Jesus Cristo! — Ava gritou.
Olhei na direção da voz e a vi parada na porta da sala de jantar, com a mão no peito. Ops. Acho que o tempo de pensar tinha acabado.
— Que p***a é essa, Jaxon? — ela gritou de novo, os olhos arregalados, o rosto passando de pálido e assustado para um tom de vermelho furioso em segundos.
Um milhão de pensamentos inundaram minha mente, mas nenhum fazia sentido o suficiente para virar palavra. Eu só conseguia olhar pra ela. Ava. Ela estava tão linda quanto eu me lembrava. Não, droga — ainda mais linda. O cabelo ruivo estava mais comprido, caindo sobre os ombros em ondas suaves. Os olhos azuis brilhavam com uma intensidade que me acertou em cheio. E o corpo dela... Deus. Ela tinha engordado um pouco desde a última vez, o que só acentuava suas curvas naturais. Uma ampulheta perfeita, com músculos definidos e postura firme. Eu tive que me segurar pra não babar feito um i****a.
Finalmente consegui recuperar a voz:
— Desculpa. Achei que alguém tivesse invadido sua casa.
— É, com certeza já invadiram — disse ela, cruzando os braços. — E eu tô olhando diretamente pra ele.
— Eu não sabia que você tinha voltado pra cidade, Ava — falei, passando a mão pela barba, tentando ganhar tempo pra me recompor.
— E isso aqui não é uma hora boa pra reencontros — ela retrucou, mordendo o lábio inferior, os olhos ainda em chamas.
O olhar dela era puro fogo. Eu entendia estar irritada — eu basicamente invadi a casa dela e a assustei até a alma. Mas a raiva no rosto dela era profunda. Aquilo não era só por causa de uma porta arrombada.
— Me desculpa — repeti. — Quando vi movimento por aqui, só quis garantir que estava tudo bem.
— Está tudo bem, então você pode ir embora agora?
Ela disse isso como quem queria me arrancar dali à força. Caminhei em direção à porta dos fundos, e ela veio atrás de mim. Quando chegamos à entrada danificada, Ava parou, olhou pra madeira lascada e soltou um suspiro pesado.
— Sério, Jaxon? Você quebrou a p***a da minha porta?
— Não se preocupa, eu vou consertar isso pra você — garanti, me virando pra encará-la.
— Nem se incomode — ela balançou a cabeça, empurrando a porta. — Só vai embora, tá bom?
Pisei pra fora e me virei uma última vez pra olhar pra ela. Nossos olhares se encontraram. Por um breve momento, a raiva que queimava no rosto dela cedeu lugar a outra coisa. Algo mais doloroso. Mais humano.
— Ava... o que tá acontecendo?
O lábio inferior dela tremeu, mas Ava respirou fundo, se recompondo com rapidez.
— Você sabe exatamente o que tá acontecendo, Jaxon. Para de bancar o i****a comigo.
— Eu juro que não sei. Eu realmente não sei por que você odeia tanto a gente assim.
Ela balançou a cabeça devagar e murmurou:
— Inacreditável...
— Você simplesmente sumiu, Ava. Um dia, puff. Foi embora. E a gente nunca entendeu o motivo.
Ela revirou os olhos, como se tivesse escutado isso cem vezes e estivesse exausta.
— E se depois de todo esse tempo você ainda não está disposto a admitir... então essa conversa não tem sentido, né? Adeus, Jaxon. Por favor, não me procure mais.
Ela fechou a porta com força, mas o trinco solto fez com que ela voltasse a abrir logo em seguida. Vi Ava sumir pela casa, indo em direção à sala de estar. Fiquei parado por alguns segundos, depois estiquei a mão e fechei a porta com cuidado.
Eu quis dizer o que disse — que consertaria tudo, até a maldita porta — mas não fazia ideia se ela queria me ver de novo tão cedo. E, sendo honesto, não parecia que queria.
Fiquei ali do lado de fora por um tempo, parado, ouvindo o som do meu próprio silêncio e tentando entender o que tinha acontecido entre nós. O que ela queria que eu confessasse? O que tínhamos feito?
A última vez que a vimos antes de ela partir, as coisas pareciam normais. Estávamos numa festa, bebendo, rindo. Brien estava lá. Lila também — a meia-irmã deles. Nunca gostei muito dela, mas naquela noite, até onde eu sabia, não houve nenhum drama.
Ava foi ao banheiro. Voltou minutos depois, com os olhos cheios de raiva, gritou com a gente. Brien foi atrás. Lila também. E foi isso. No dia seguinte, Brien nos disse que ela tinha ido embora e que o melhor era deixá-la em paz. Depois ele mesmo sumiu por um tempo e acabou indo atrás dela em Los Angeles.
A última coisa que soube era que ela estava estudando lá, mas nunca ficou claro se ela queria mesmo deixar a casa nas montanhas... ou se foi algo que a obrigou a ir.
O que quer que tenha acontecido naquela noite — e eu juro por tudo que tentei lembrar — parece ter mudado tudo pra ela. Principalmente em relação a mim... e ao meu irmão.
Se eu soubesse o que diabos rolou, talvez pudesse consertar as coisas. Talvez, se ela dissesse o que machucou tanto, a gente pudesse se redimir de alguma forma.
Eu faria qualquer coisa pra consertar o que fosse. Se ela deixasse. Se ainda houvesse um espaço, por menor que fosse.
Mas naquele momento, tudo o que eu podia fazer era aceitar. Ela queria ficar sozinha. E por mais que doesse, voltei pra casa sem olhar pra trás.
Algumas coisas simplesmente fogem do nosso controle. E às vezes, a única escolha que resta... é aprender a deixar ir.