ISABELA
Depois de tudo que rolou, eu precisei parar… respirar fundo… e pensar em mim. Pela primeira vez, sem colocar ninguém na frente. Nem família, nem namorado, nem ninguém.
Só eu.
Eu tava cansada, sabe?
Cansada de me doar, de confiar, de acreditar e no final só quebrar a cara. Primeiro o Ryan… aquele babaca que me fazia acreditar que eu era insuficiente, que me traía e ainda me batia.
Doía lembrar, mas foi real.
E agora o Jace… tudo bem, ele não levantou a mão pra mim, mas o peso da traição doeu quase igual. A diferença era que o Ryan me quebrava por fora e por dentro… o Jace me quebrou por dentro. E eu não podia deixar ninguém me destruir de novo.
Eu decidi que era hora de me escolher.
Então peguei minhas coisas, respirei fundo e fui procurar um canto só meu. Achei um quartinho simples na casa de uma senhora, Dona Lourdes.
Ela era daquelas velhinhas simpáticas, falava devagar e fazia café forte toda tarde. O quarto era pequeno, uma cama de solteiro, um armário velho, uma mesinha… mas era meu.
Meu cantinho, meu refúgio.
Voltei a focar no meu trampo.
O pessoal lá na casa de shows nem me perguntava muito, já tinham visto tudo nas redes. Teve quem veio comentar, teve quem só respeitou meu silêncio. Eu ia, fazia o meu, dava meu sangue e voltava pro meu quartinho.
E, mano… eu descobri uma força que eu nem sabia que tinha. Eu tava na luta, estudando pra caramba, me matando no estágio, organizando evento atrás de evento… e mesmo cansada, eu via que era capaz. Que não precisava de ninguém pra ser feliz ou me sentir completa.
Volta e meia eu pegava o celular e me batia aquela vontade de ver as redes do Jace… mas eu lembrava do vídeo, da humilhação pública, do nó na garganta… e largava o celular de lado. E toda vez que eu pensava em perdoar, eu lembrava do Ryan.
Do ciclo que parecia que eu tava repetindo, me apaixonar, acreditar, me decepcionar, me diminuir.
Não!
Eu não ia ser aquela garota que sempre aceita migalha.
A real é que tanto o Ryan quanto o Jace tinham me machucado, cada um de um jeito. O Ryan foi violento, abusivo… o Jace foi um galinha, inconsequente. Um não me respeitava, o outro também não.
Eu merecia mais.
Então eu decidi, minha meta agora era me formar, arrumar um emprego bom, ter minha estabilidade. Eu ia ser minha prioridade. Sem distração, sem homem, sem drama.
Só eu e meus sonhos.
E, sabe… pela primeira vez, eu tava me sentindo leve.
Doía?
Doía, óbvio.
Não vou mentir.
Tinha noites que eu chorava baixinho no travesseiro, me perguntando se ele pensava em mim, se tava arrependido…
Mas aí eu lembrava, eu não preciso que ele pense em mim. Eu preciso que EU pense em mim.
Então é isso.
Se ele me quiser um dia… vai ter que provar que merece. E eu não vou facilitar. Porque agora… agora eu sou minha prioridade.
Me escolhi.
Depois de semanas só no corre, dividida entre faculdade, trampo e tentando curar esse coração arrebentado… os meninos do trabalho me chamaram pra sair.
Fiquei na dúvida, mas pensei, pô, eu mereço me divertir também, né?
Não ia ter nada demais, só dançar, rir, tomar uns drinks.
Aceitei.
Essa galera nova da produção era animada, gente boa pra caramba. O show daquela noite terminou cedo, então partimos pra uma balada nova que abriu no Centro. Chegamos lá e o clima tava leve, música boa, gente bonita… tava precisando disso.
Fui direto pro bar pedir um gin tônica, e o bartender me olhou com aquele sorriso de..
"te conheço de algum lugar"
E conhecia mesmo! Ele puxou papo.
— Cê não é a Isa, da produção dos eventos da "A Casa"?
— Sou eu mesma — respondi, rindo. — Mas confesso que não tô lembrando de você.
— Ah, normal… a correria, né? A gente se trombou na festa da Heineken, ano passado.
Ele lembrava de cada detalhe, até da roupa que eu usei naquele evento. Fiquei surpresa. O papo foi fluindo fácil, ele era engraçado, carismático e ainda por cima bonito.
Toda hora meus amigos me chamavam da pista.
— Vem dançar, Isa!
Eu só fazia sinal com a mão, tipo "calma aí", porque o papo tava bom… bom demais, na real.
Ele falava de música, de viagens, de uns perrengues da noite… e eu rindo, achando leve, gostoso. Mas aí eu mesma me dei um chacoalhão mental.
"Ei, garota! Lembra do que você prometeu? Sem se envolver, não tão cedo. Só um mês desde que você largou o Jace. Tu não tá pronta pra isso".
Respirei fundo, agradeci o drink, sorri e disse.
— Valeu mesmo pelo papo… mas vou lá dançar um pouco.
Ele entendeu na hora, não insistiu, só sorriu e disse.
— Quando quiser um papo bom de novo, é só vir aqui.
Fui pra pista com os meninos e me joguei.
Dancei, ri, cantei junto… naquela noite eu consegui, por algumas horas, esquecer todas as dores. Tava ali… leve, livre, redescobrindo a Isabela que existia antes de qualquer relacionamento. A que sonha, que trabalha, que corre atrás, mas que também sabe aproveitar a vida.
Saí daquela balada de madrugada com um sorriso no rosto, coisa rara nos últimos tempos. O vento geladinho da rua me trouxe um alívio, como se eu tivesse tirado um peso das costas.
Meus amigos todos falando.
— Pô, Isa, tu tem que sair mais com a gente, mulher! — o Léo disse, me abraçando de lado.
— Verdade! — a Mari completou — Quando cê tá junto, o rolê fica mais leve.
Eu só ria, mas por dentro tava refletindo. Tava redescobrindo uma parte de mim que eu deixei apagada, sufocada entre problemas, relacionamentos furados e cobrança em cima de cobrança.
Cheguei no meu quartinho alugado, sentei na cama e fiquei olhando o teto. Tanta coisa mudou em tão pouco tempo… eu me sentia outra pessoa. Mais madura, mais pé no chão, mais certa de que a única pessoa que eu posso confiar cem por cento sou eu mesma.
Ainda doía lembrar do Jace.
Doía porque eu amei ele.
O amor ainda.
Do jeito errado, talvez… mas amo. Me entreguei, apostei. E me ferrei. Igual foi com o Ryan, só que sem as agressões físicas, a diferença é que um me machucou na alma e o outro no corpo e na alma.
Mas agora… agora era sobre mim. Sobre minha história. Sobre terminar a faculdade, crescer no trabalho, construir minha vida. Eu não queria mais depender da presença ou da validação de homem nenhum.
Naquela noite, eu apaguei abraçada no travesseiro e, pela primeira vez em muito tempo, sem chorar.
No dia seguinte, acordei cedo e fui correr na praia. Olhando aquele mar imenso, respirei fundo e pensei.
"Isabela, cê sobreviveu a tanto… não vai ser isso que vai te parar. Agora é você por você."
Voltei pra casa, tomei um banho demorado, coloquei minha playlist de música boa, fiz um café forte e sentei pra estudar. Porque meus sonhos não vão acontecer se eu ficar parada lamentando.
Se o Jace queria mudar?
Boa sorte pra ele.
Se ele tava arrependido?
Problema dele.
Eu?
Eu tô ocupada demais me reconstruindo.