Patrícia narrando:
Meu nome é Patrícia, tenho 19 anos, mas todo mundo me chama de Paty.
Sou uma mulher decidida, alegre, mesmo com a vida me testando todo dia.
Moro aqui mesmo, na Cidade de Deus, o famoso CDD. Lugar que, pra muita gente, é só violência. Mas pra mim é casa. É onde cresci, onde aprendi a me virar.
Tenho um irmão, o Patrick. Ou melhor, tinha. Porque o Patrick que eu conhecia não existe mais. Hoje ele é só mais um perdido no crack.
Depois que nossa mãe faleceu, fiquei sozinha. Ele sumiu no mundo, e quando aparece é só pra pegar o que sobrou da casa e vender. Já levou até as panelas da nossa mãe.
Eu aguentei firme. Trabalhei na lojinha de roupa da dona Lourdes, mas fui demitida mês passado. Motivo? Patrick apareceu lá, fez escândalo pedindo dinheiro, quebrou tudo.
Agora tô tentando recomeçar. Tô no bar do seu Cláudio, um senhor bom demais, que me deu uma chance sem nem perguntar meu passado. Ele diz que enxerga força em mim. Talvez ele esteja certo.
Aqui no morro, todo mundo sabe quem manda: Tatu. O chefe do Comando Vermelho. Temido. Respeitado.
Mas eu nunca me envolvi com isso. Nem quero. Sempre mantive distância desse mundo.
Mal sabia eu que meu irmão tava prestes a me jogar direto no colo do d***o.
Eu tava tranquila no bar do seu Cláudio, limpando o balcão, quando dois vapores entraram de uma vez só. Nem pediram licença. Vieram direto em mim.
— Vem com a gente. Agora.
Tentei resistir, gritei pra soltarem meu braço, mas um deles me puxou com força. O bar inteiro parou, mas ninguém teve coragem de se meter. Aqui é assim. Quando eles vêm, ninguém olha, ninguém fala.
Me arrastaram até a tal boca — o auge do CDD. Um lugar que eu sempre evitava passar perto. Lá era outra realidade: fuzil em punho, olhares frios, cheiro de pólvora e medo no ar.
E lá estava ele. Tatu. O chefe. O dono dessa p***a toda.
Pela primeira vez na vida, eu fiquei tão próxima daquele homem. E ele… me olhou como se já me conhecesse. Olhou dos pés à cabeça, devagar, passando a língua nos lábios como se estivesse decidindo o que fazer comigo.
— Senta aí. — a voz dele era grossa, firme. Não pedia. Ordenava.
Minhas pernas travaram. Mas antes que eu pudesse pensar em qualquer coisa, um dos vapores me empurrou pra cadeira. Sentei com tudo, quase caí.
— Tu que é a irmã do Patrick? — ele perguntou, ainda me encarando.
Só consegui fazer que sim com a cabeça. O medo já tomava conta.
— Pois agora… tu vai trabalhar pra mim, você.
Senti o mundo girar. Meu coração batia tão forte que parecia que ia sair pela boca. Trabalhar pra ele? Como assim? Por quê?
Mas lá, diante daquele olhar, diante de tanto poder… não parecia que eu tinha escolha.