CAPÍTULO 2

2350 Palavras
SEBASTIAN Calvin Maldini conhecia muita gente, era o típico garoto sociável demais, muito mais do que eu conseguia ser. Eu preferia o anonimato, quanto menos gente me conhecer, melhor, até na empresa ou nos hotéis passo batido, e o que sempre papai diz? Você faz parte disso. Minha mãe já rebate, dizendo que é minha escolha querer ficar mais reservadamente. Mas as vezes eu usava quem eu era. Maya, minha irmã, já dizia que eu era um pretensioso, só usava quando precisava. Ela está certa, dividimos a mesma barriga e nascemos juntos, somos gêmeos e ela me conhece. Você pode ter um martelo, deixar ele guardado, mas um dia você vai precisar dele. É isso que acontece. Maya faz a mesma coisa que eu, não usa o sobrenome tanto quando poderia estar usando. E pergunta se ela liga pra isso. f**a-se. Ela fala exatamente as mesmas palavras. As vezes acho que ela se parece demais com aqueles caminhoneiros de ponta de estrada, vocês se surpreenderiam com a quantidade de palavras inadequadas que ela pode falar de uma única vez na mesma frase. Ela não tem filtro. Embora também seja maluca e azarada. Eu estou aqui pra desfazer dois pensamentos sobre essa coisa de ser gêmeos. Eu não sinto o que Maya sente, não acredito nessa coisa de ligação. Ela já foi atropelada por um carro que tentou matá-la e eu não senti nada, caiu mais que internet em dia de chuva e eu também não senti nada, absolutamente nada, tirando a queda de bicicleta em um natal quando ela havia acabado de ganhar, mas eu só senti porque ela tentou me m***r – alguns dizem que não –, caindo com a bicicleta em cima mim, eu lembro disso, do gosto da grama na boca e ela levantando e rindo, de mim levantando e correndo atrás dela, eu sendo segurado pelo meu pai, enquanto ela, se escondia atrás de Nicolau. Outra coisa que eu tenho que desfazer e essa coisa de, um gêmeo bom e outro m*l, eu e Maya estamos no mesmo patamar, somos sortudos e ainda mais azarados. Se tem uma coisa que nós somos é azarados. Tem essa coisa de oposto não, é tudo filhos do mesmo saco, crescido na mesma barriga, nascidos no mesmo dia. Ah, doce irmãzinha. Aquela caminhoneira de ponta de estrada faz falta. Somos o trio imbatível: Maya, Calvin e eu. Éramos, até ela engatar um romance com Nicolau, lembra do garoto que ela usou como escudo? Hoje ela o usa, e não é para escudo. E agora, nesse exato momento, ela não está com a gente. Está grudada com o amor da vida dela. Tudo bem, eu sei que está feliz, mas em um guerra você nunca deixa um soldado para trás. Perdemos uma guerreira. E é nessa perspectiva que eu fico impaciente enquanto me mexo entre as pessoas pedindo pra passar e elas abrem um espaço, enquanto seguro as duas garrafas de cerveja gelada e paro diante a mesa. Calvin está com duas garotas na mesa, uma pra mim e uma para ele, uma e uma ruiva, que dá bastante atenção para ele – quase mama o cara ali –, a outra e uma de cabelos curtos pretos, que tem olhos atentos em mim, mas que ainda não descobriu o que fazer comigo, como lidar comigo. É interessante, ainda mais quando eu deslizo a garrafa de cerveja pra ela e ela pisca surpresa, como se eu fosse uma daquelas novidades super maravilhosas ou um ovinho daqueles com brinquedo dentro. E eu até posso ser um ovinho com brinquedo dentro. Eu não tenho um manual de instrução, mas tem um botão de liga e desliga, saber disso é o suficiente pra lidar comigo. E eu também descobri o que estou fazendo nesse lugar, no mezanino que fica na área VIP dessa boate. E a inauguração, eu só ainda não descobri quem é o dono, mas não posso falar para Calvin, isso entregaria a minha total falta de senso e importância. E família não merece total falta de senso e importância. - Obrigado pela cerveja – A garota da um sorriso, posso ver que ela me encara agora, ela viu uma oportunidade em mim, eu dei o sinal da largada com a cerveja gelada. - O que trouxe você aqui? - Eu olho para Calvin do outro lado da mesa, está tão entretido com a ruiva. - Está gostando? Sinceramente? Não. Calvin tem a péssima mania de querer resolver o problema das pessoas. Uma vez quase me senti uma criança amparada por ele. E isso é dele, respeito, mas ele insiste que eu deva conhecer alguém. Como a menina bonitinha ao meu lado, bem mais nova, que daqui a pouco vai começar a flertar comigo, depois se empolgar e falar de um assunto qualquer, sobre a universidade e no fim, vai estar em um canto comigo a comendo, sentindo a b****a inexperiente dela. - Vem aqui – Ela dá uma risadinha, se arrastando até estar do meu lado, onde eu ergo minha mão e seguro o rosto dela, cheira bem, a pele e quente. Me aproximo dela e encaro os olhos dela, tem olhos escuros, não tão negros, mas escuros. - Eu estava em casa, havia dispensado uma mulher que estava fodendo comigo, meu primo chegou e falou que tínhamos um compromisso, no caso esse lugar, para não deixar o garoto pensando que eu não ligo eu estou aqui, ele está com a sua amiga e você comigo. Você perguntou se eu estou gostando – Dou um sorriso. - Não, estou achando um tédio, e se for pra ser minha acompanhante essa noite para sua amiga se comer com meu primo, melhor ser mais rápida e esperta, não sou muito de garotinhas – Vejo ela suspirar fundo e me encarar. - Sebastian – Eu giro o olhar para Calvin me encarando. - Pega leve. Me levanto, segurando a garrafa. - Não era pra me pegar ela? - Gargalo dando as costas, escuto ele pedir desculpa para a garota que estava ao meu lado e reviro os olhos, descendo para o andar de baixo, encarando a pista de dança e indo para a bancada do bar, desfazendo da cerveja. - O que vai ser chefia? - Encaro a parede embutida e as garrafas, enquanto a música soa alto dentro da minha cabeça. Há duas direções quando se fala em bebidas, destiladas e cevadas, e eu sempre escolhia um caminho apenas. Em uma festa você nunca pode misturar suco com água, refrigerante com coca, vinho com champanhe. - Parece que quem é vivo sempre aparece – Eu viro o rosto com a voz e sorrio quando encaro o rosto sorridente. - Florzinha do meu coração. - Como vai? - Rick se aproxima e me cumprimenta com dois beijos no rosto. - Esse lugar está um agito! - Rick se senta na bancada ao meu lado, colocando a câmera sobre o balcão, a camisa florida e a calça escura e a forma que ele mantém a postura me faz sorrir. - O que está fazendo aqui, florzinha? - Fotos, meu querido – Ele me encara, me analisando. - O que foi que esta com essa carinha de cachorro procurando o que fazer? - Fui obrigado a vir. - Pelo visto está em um momento depreciativo dos seus. - Não fode cara – Suspiro. - Eu só não sei o que vim fazer aqui, fui arrastado por Calvin. - E a inauguração, vocês conhecem os donos? - Faço nem ideia, mas eu devia – Dou uma risada. - Eu não dou a mínima, vi pra não fazer desfeita com Calvin. - Um amor com a família Sebastian, adoro isso em você – Ele suspira. - Eu sei que você adora eu também, só não me pegou porque não quis – E era verdade. Mas não, não sou gay ou nem nada do tipo. Uma vez saímos eu e ele, ele me levou em uma boate gay. Sebastian Maldini, dito cujo, em uma boate gay, acreditem, no dia seguinte eu fiquei com essa cara que vocês estão agora. Sai acompanhado por duas lésbicas que precisavam de um PA, o que claro, como sou um bom moço, prontamente ajudei as duas nessa pendência, já estava amanhecendo e eu estava chapado. Rick também jura que me viu em um corredor sendo chupado por um cara antes de sair com as duas meninas, o que eu falei que era coisa da cabeça fértil dele, embora eu sei qual é a verdade e não dou a mínima. Foi um dos melhores boquetes da minha vida, acredito nisso, porque eu sei que homem sabem como quer ser agraciado com tal dádiva, como engolir e como usar a língua. Por fim, meu caro Rick já foi meu objetivo. Eu quase havia ficado com Rick, depois de conhecer a parceria dele, depois dele me dar total apoio, nos tornamos amigos. - Isso estragaria a nossa amizade, não adianta colocar salsicha para quem só como pão – Eu balanço a cabeça com a metáfora. Viram? Ele não me quis. - Você que não quis, eu estava disposto Rick, você que deu pra trás. - Gato, você precisava de um amigo e não um bundinha sexy como a minha, desculpe se não atingir suas expectativas. - Você falou que ia cuidar de mim – Debocho. - Você já não é grandinho para isso? - Sou um bebê carente, você deveria ter ficado comigo – Ele me olha incrédulo. - Não me olha assim, você soube o que queria quando deixou eu beijar você, só não continuou porque não aguentou – Rick puxou a câmera do balcão e deixou a garrafa. - Não continuei porque você não é gay, muito menos gilete, pare com isso, seu pretensioso, vai caçar uma mulher que você ganha mais. - Você nem quis tirar umas fotos minhas – Eu bebo a cerveja. - Estava disposto a ficar nu para suas lentes. - A câmara não tinha memória suficiente – Desconversa. - Sabe que admiro suas fotos e suas matérias, não sabe? Meu coração está em pedaço Rick, e o culpado é você – Ele gargalha. - Eu nunca parti o coração de ninguém, essa ironia e deboche só pode ser de família! - Tem quem diga que piora com as gerações. - Certamente – Ele pega a garrafa e para de pé. - Achei quem eu procurava – Eu ergo o olhar para trás, acompanhando o olhar de Rick, para duas mulheres que caminham lado a lado, eu fico parado com um daqueles rostos. E um desses rostinhos bonitos me chama a atenção, enquanto sorri com as outra mulher, mas o sorriso dessa e descontraído e aberto, que me faz querer saber a piada ou contar uma piada para apreciar o sorrisinho. Esse lugar acaba de ficar bem frequentado. Eu não falo de mim, mas da loira. As pessoas ao longo do tempo vivem me chamando de pretensioso. E eu acredito que eu realmente seja. Eu vejo uma pretensão além de tudo e todos. O mundo e das pessoas com boas pretensões, mas também pretensões ruins. Eu estou no meio do bom e do mau. Não dou a minha. Se Deus manda a gente recebe com as melhores pretensões do mundo. Como agora. - Quem é a loira, Rick? - Marhi Paulini – Rick solta uma risada. - E linda, não é? A ruiva ao lado dela é Tris Mclane. São as novas carinhas do estúdio e agência da cidade, a revista cobriu ela desde o começo do contrato. - Eu acho que a conheço – Sussurro com uma sensação pesada dentro de mim. Uma vez peguei uma mulher, mas lembram quando disse pra não misturar cevada com destilada? Então. Dá uma confusão muito grande no dia seguinte. E eu não me lembrava de ter pego ela, era casada ainda por cima, eu não me lembrava dela. Acredito que ela pense que eu lembro daquela noite, mas eu não lembro de nada, mas é bom fazê-la pensar que eu lembro. Vejo elas às vezes, é reconfortante o meio das suas pernas e para minha total falta de sensibilidade e blá, blá! E por isso que eu não posso ignorar a sensação de conhecer a loira. Algumas pessoas sabem o que fizeram no verão passado, mas outras não. Acontece nas melhores famílias. - Ela está pregada no outdoor em frente ao meu prédio querido, certamente o resto da cidade a conheça também – Eu balanço a cabeça e fico de pé. - Não, eu já vi a loira antes. Falo firme. Ah, p**a que pariu! Por alguns segundos eu encaro os olhos azuis, como se eu já tivesse visto aquele olhar em algum lugar, mas quando encaro o rosto eu percebo que também é familiar, uma estranha sensação se abraça a mim e eu percebo que eu devia me lembrar de onde eu tinha visto aquele rosto, mas um branco se forma dentro de mim e eu fico parado, apenas encarando o rostinho bonito e doce. Perda de memória curta. Deve ser isso. - São modelos – Rick mexe na câmara e dá um sorrisinho. - Viu, eu sempre soube que era homem, meu querido. - Você vai me ajudar, não vai? - Me tira dessa. Marhi não precisa disso, até gosto da moça. - Cadê a amizade? - Ele suspira. - Você conheceu ela ou eu primeiro, Rick? Foi ela que estava comigo quando eu fui para o hospital morrendo? Não Rick, foi você! Vamos, já que não deu pra mim me ajuda com uma mulher, não é você que fala que eu gosto de pão e não salsicha? O que me diz? - Você é péssimo em argumentos as vezes Sebastian, um horror. - Vamos Rick, por favor – Eu sigo as duas com o olhar, sem perder ela de vista. - O que tem em mente, Sebastian? Com o tempo o ser humano descobre que a mente pode ser uma caixa. E o que tem dentro pode ser bom, muito bom. Ou pode ter ideias horríveis, como as minhas.
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