Desmoronar de Uma Farsa

979 Palavras
A segunda-feira amanheceu estranha, densa. Patrick chegou cedo à empresa, mas sua mente não estava ali. Desde o almoço de sexta-feira, a imagem de Lana rondava seus pensamentos como um perfume doce e persistente. Havia algo naquela garota... algo raro. A leveza no sorriso, a firmeza nas palavras, o olhar limpo. Tudo o que faltava em Cindy. O telefone tocou no fim da tarde de domingo. Patrick olhou o visor com desânimo. Era Cindy. Atendeu sem entusiasmo: — Oi. — Oi, amor... você sumiu esse fim de semana todo. O que houve? — a voz dela era melosa, tentando soar natural. — Não tô no clima pra conversa, Cindy. Tô organizando algumas coisas aqui. Segunda vai ser um dia cheio de reuniões. Se quiser conversar, passe no escritório. — Mas amor... — Segunda-feira, Cindy. Boa noite. E desligou. Na manhã seguinte, Cindy apareceu na empresa com o salto alto mais provocante e a ousadia no olhar. Mas antes de ir ao escritório de Patrick, resolveu “revisar” seu território e passou direto para a sala do diretor Hamilton. A secretária o avisou, e ele prontamente mandou ela entrar. Poucos minutos depois, a porta fechada escondia os sussurros, os risos abafados… e o inevitável. Lana vinha subindo o corredor com uma pasta de documentos. Ao passar perto da sala do diretor Hamilton, ouviu algo estranho. Um gemido alto, algo que soava como dor. Franziu o cenho, hesitou... então se aproximou da sala de Shirley, secretária de Patrick. — Dona Shirley... desculpe, é que... eu ouvi um barulho estranho vindo da sala do Sr. Hamilton. Não sei explicar, parecia alguém passando m*l. — Passando m*l? — Shirley arregalou os olhos. — Certeza? — Eu acho que sim. Posso estar enganada, mas achei estranho. E a noiva do Sr. Patrick entrou lá agora há pouco. Shirley gelou. Imediatamente ligou para Patrick, que atendeu de prontidão. — Doutor Patrick, precisamos do senhor aqui no corredor da diretoria. É urgente. Aparentemente, a Srta. Cindy pode estar passando m*l na sala do Sr. Hamilton. — Já estou indo. Chame a equipe médica e a segurança. Patrick saiu disparado. O som dos saltos ecoava quando ele cruzou o corredor, seguido de perto pelos seguranças e pela enfermeira de plantão. Chegando à porta, não pensou duas vezes. Girou a maçaneta e escancarou. E foi como um soco no estômago. Cindy estava deitada sobre a mesa, o vestido arregaçado, os cabelos bagunçados, ofegante. Hamilton estava ali, sem camisa, tentando recompor-se, completamente pego em flagrante. Os olhos de Patrick ardiam. Os funcionários que haviam se aglomerado, inclusive Shirley e alguns seguranças, testemunharam tudo. — Meu Deus… — murmurou a enfermeira, tentando conter o constrangimento. Patrick não gritou. Não chorou. Apenas olhou com nojo e desprezo. — Tratem de se vestir. Agora. Cindy, trêmula, tentou correr até ele. — Patrick, amor, me deixa explicar! — Fica longe de mim. Você não é mais minha noiva. E a partir de agora, também não faz mais parte da minha vida. E você, Hamilton… aguarde a notificação do conselho. Você não vai mais envergonhar essa empresa. Ele se virou e saiu. Desta vez, não com dor. Mas com alívio. E atrás dele, no fim do corredor, Lana observava discretamente, sem saber que, naquele momento, ela havia se tornado o ponto de virada de uma nova história. Por volta das dez da manhã, Shirley, sua secretária, bateu à porta. — Você é diretor, Hamilton. Acionista. Sabe muito bem o que representa esta empresa. Aqui se trabalha com ética. Com valores. Você traiu a confiança de todos. Da sua esposa, dos seus filhos. E da diretoria. Hamilton tentou falar: — Patrick, eu... — Você não vai me responder. Vai responder ao conselho. O que você faz da sua vida fora daqui é problema seu. Mas dentro desta empresa, você desonrou sua função. E eu vou levar isso à votação. Se os acionistas decidirem te manter, que fiquem com essa vergonha. Eu não. Patrick voltou para sua sala com a mandíbula travada e os olhos fixos em nada. Sentou-se devagar, respirou fundo, e então apertou o botão do telefone interno. — Shirley… por favor, venha aqui. Segundos depois, a secretária entrou, um tanto nervosa. — Diga, doutor Patrick? — Preciso que marque uma reunião extraordinária com toda a diretoria para o final do expediente. E me traga os nomes de todas as pessoas que presenciaram a cena de agora há pouco. Funcionários, equipe médica, segurança, todos. Vamos deixar tudo registrado. — Sim, senhor. E... o Sr. Hamilton? — Avise à secretária dele que ele deve comparecer à reunião. Ele vai ter a chance de se explicar formalmente. Shirley assentiu. Antes de sair, hesitou: — O senhor está bem? Patrick forçou um sorriso sarcástico. — Estou. Quer dizer, com exceção da dor de cabeça latejante, estou sim. Mas fique tranquila, Shirley... não é chifre, é só enxaqueca mesmo. Ela soltou uma risadinha sem graça. — O senhor quer que eu peça um remédio? — Por favor. Um chá de camomila com valeriana. É algo para dor de cabeça. Mas o primeiro chá. — Claro. Peço à Lana que traga. Minutos depois, a porta se abriu suavemente e Lana entrou, com a caneca fumegante nas mãos. — Doutor Patrick, aqui está. — Obrigado, Lana. Ela depositou a bandeja sobre a mesa com delicadeza, sem olhar muito para ele. Mas ele a observava. Os olhos dela, mesmo discretos, carregavam empatia. Aquele gesto simples, o cuidado em meio ao caos, trouxe a Patrick uma estranha paz no meio do furacão. — Lana… Ela parou, voltando-se para ele. — Obrigado. De verdade. Por tudo. Ela apenas assentiu com um sorrisinho tímido, e saiu. Patrick ficou ali, com a xícara nas mãos, olhando para a porta fechada. Pela primeira vez em muito tempo, percebeu que existia beleza na simplicidade. E talvez, só talvez, ali estivesse alguém que ele deveria realmente notar.
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