Ferradura Narrando
O ronco do motor se misturava ao grito da sirene se aproximando. Os bota já tavam na minha cola.
— ACORDA, PØRRA! NÃO APAGA AGORA! — Rosnei, sacudindo a mina pelo braço. Ela resmungou, a cabeça pendeu pro lado. A p***a do sangue dela escorria pro banco.
Peguei o radinho no painel, a mão suando, o peito batendo forte.
— Coruja, me dá uma saída, caralhø! Tô com um bagulho aqui e os bota no meu cangote!
O radinho chiou antes da voz dele explodir:
— Segue reto, não entra na principal! Tem viatura cercando! — Coruja soltou com a pørra da voz falhada.
Merdä. Joguei o carro pra direita, cortando por uma rua estreita. Pneus cantaram, vidro rachado, mina gemendo do lado. O espelho refletiu as luzes azuis e vermelhas piscando na esquina. A p***a dos bota não iam largar do meu pé.
— Quem é essa mina, chefe? — Coruja perguntou no rádio.
— Não faço ideia, irmão! Peguei no restaurante, tava na merdä!
— Esquerda na próxima! Vai jogar na zona morta, aqui a rádio dos cara não pega! — Gafanhoto entrou na frequência.
Pisei no acelerador, sentindo o motor urrar. O carro pulou num buraco, e a mina soltou um gemido fraco.
— Fica comigo, pørra! Não dorme, caralhø! — Segurei o volante com uma mão e dei uns tapas de leve no rosto dela com a outra. Os olhos abriram, vidrados, assustados.
— Q-quê... onde... — A voz dela era um fiapo de ar.
— Depois a gente troca ideia, agora só respira e não desmaia nessa pørra!
O radinho estalou de novo:
Rádio On
Coruja: Ferradura, tão vindo de moto na tua cola!
Olhei pelo retrovisor e senti o sangue ferver.
Três bota em cima de moto, engatilhados, mirando no meu vidro traseiro.
— Filho da püta! — Eu rosnei, jogando o carro de lado.
O vidro de trás espatifou, a bala passou zunindo, pegando no painel. A mina gritou.
— SEGURA ESSA MERDÄ! — Pisei no freio e puxei o volante, o carro cantando pneu, girando seco. O motoqueiro mais perto não conseguiu desviar.
A moto bateu na lateral e voou pro alto. O bicho se estabacou no asfalto.
Os outros dois desviaram e voltaram a acelerar.
— Gafanhoto, tem um jeito de me tirar dessa pørra ou eu vou ter que derrubar esses filha da püta?!
— Acelera, pørra! Dois quarteirões à frente, dobra na ruazinha do ferro-velho!
Pisei até o talo. O velocímetro bateu no limite. A picape rugia, os faróis cortando o escuro da madrugada.
A mina respirava pesado, tremendo.
— Aguenta firme, já tamo chegando no fim dessa merdä!
Vi a entrada do ferro-velho, mas os bota ainda tavam vindo.
— CORUJA, É AGORA OU NUNCA, PØRRA!
De repente, um estrondo.
Uma van preta atravessou a rua do nada, fechando os bota.
Coruja e Gafanhoto desceram metendo bala.
— BORA, CHEFE! A PISTA DE VOO TÁ TE ESPERANDO!
Joguei a picape pra entrada do ferro-velho, cortando caminho pro avião. A fuga tava só começando.
A pørra da sirene parecia grudar no meu cérebro, cada vez mais alta, mais perto. Os bota não desistiam, tão na caça mesmo.
A mina respirava rápido do meu lado, os olhos arregalados, vidrados na pørra toda.
— Vai dar merdä, vai dar merdä! — Ela começou a murmurar, a voz fraca, mas desesperada.
— Cala a boca e segura! — Rosnei, a mão firme no volante, o pé socado no acelerador.
Foi quando os tiros voltaram a zunir.
— CARALHØ! — Berrei, jogando o carro pro lado. Os bota abriram o dedo de novo.
O vidro do passageiro estourou. A mina gritou e se jogou no assoalho, praticamente se enfiando debaixo do banco.
— Pørra, fica abaixada! — Falei entre os dentes, segurando o carro no tranco. Os estilhaços voaram no meu braço, queimando a pele.
O radinho chiou:
— Ferradura, Dobra à direita! Føde com esses filha da p**a! — Coruja berrou do outro lado.
Vi a entrada da ruela estreita e meti o carro sem dó. O asfalto virou barro, pedra voando, carro pulando.
Os bota hesitaram.
— SE FØDE, SEUS FILHA DA PÜTA! — Rosnei, sentindo a adrenalina explodir.
A mina gemia no chão do carro, tremendo, respirando rápido.
— Aguenta, pørra! Tá acabando!
O radinho pipocou de novo:
— Chefe, pista de voo na reta final! Última curva, bora!
Joguei a picape na curva, o motor gritando, as luzes da pista surgindo na minha frente.
Agora era vida ou morte.
O choro da mina começou baixo, meio abafado, mas depois virou soluço desesperado. Ela tremia tanto que parecia que ia desmontar ali mesmo.
— Cala essa boca, pørra! Segura firme! — rosnei, mas minha voz saiu mais nervosa do que eu queria.
O flash veio sem aviso.
Minha irmã... O rosto dela. O sorriso. O sangue..... Não. Agora não.
Balancei a cabeça com força, negandø, espantando aquela merda. Não era hora pra isso, c*****o!
As mãos suavam no volante, os olhos piscando rápido, tentando focar na pørra da estrada.
Mas os gritos da mina misturavam com os ecos dos sonhos.... O cheiro de pólvora virou cheiro de queimado.
A pørra do restaurante pegando fogo?
Não.
Era outro incêndio. Outra lembrança. Outra merda na minha cabeça.
— Caralhø, NÃO! — urrei, sacudindo a cabeça de novo.
Foi aí que a picape derrapou.
As rodas cantaram, o carro deslizou de lado, poeira e pedra voando.... Olhei pelo retrovisor e a cena era de guerra.
Cascata de carro virado, fumaça preta subindo, poeira engolindo tudo.
— Toma no cü, otáriø! — gritei, vendo os bota atolados na própria merdä.
Na frente, o jatinho já tava ligado.
O coração martelou no peitø. Era agora ou nunca.... O radinho chiou no meu ouvido.
Rádio On
Gafanhoto: Vai, caralhø! Dá o bote! A gente tá na contenção! — Gafanhoto gritou.
Coruja veio na mesma pressão.
Coruja: Bora, chefe! Tropa tá segurando os bota, mas não vai durar muito!
Desci da picape num pulo, o barulho dos tiros ainda ecoando atrás. Abri a porta do carona com pressa, meus dedos sujos de sangue escorregando na maçaneta.
A mina tava toda encolhida, os olhos arregalados, tremendo igual vara verde.
— Vem cá, pørra! — resmunguei, pegando ela no colo.
No mesmo instante, ela agarrou meu pescoço.... Os braços dela apertaram forte, as unhas fincando na minha pele... E então ela afundou o rosto no meu peito.
A voz dela veio baixa, mas cada palavra bateu como um grito de socorro:
— Eu não... Eu não quero morrer... Não me deixa morrer... — Meu peitø apertou. A p***a de um nó se formou na minha garganta, mas eu engoli aquela merda. Aqui não tem espaço pra fraqueza.
Encostei o queixo na cabeça dela, sentindo os fios bagunçados roçarem meu rosto.
— Ninguém põe a mão em tu sem passar por mim. — E sussurrei, firme, como se fosse uma promessa gravada na pørra do concreto.
Apertei o passo em direção ao jatinho, Coruja e Gafanhoto fazendo a cobertura.
— Vai, Ferradura, caralhø! Embucha essa mina logo nessa pørra e mete o pé! — Coruja urrou.
Subi no jatinho com o coração na boca.
— Levanta voo, caralhø! AGORA! — gritei pro piloto, que já tava na pressão, os motores roncando forte.
A pørra do barulho das sirenes ainda martelava na minha cabeça. Coruja e Gafanhoto tavam lá fora, garantindo que ninguém chegasse perto. Os bota tavam vindo com tudo.
Me inclinei pra deitar a mina na poltrona, mas ela segurou meu pescoço firme.
Os dedos dela tremiam, mas o aperto era de desespero puro.
— Eu não consigo… Eu não consigo… Por favor, não me deixa… — a voz saiu num sussurro, mas a dor no tom dela me atingiu mais forte que qualquer bala.
O rosto dela tava banhado de sangue, misturado com sujeira, suor e lágrimas.... Meu peitø pesou.
Respirei fundo, tentando manter a cabeça no lugar. Não era hora de travar.
Sem pensar muito, me joguei na poltrona com ela agarrada em mim.
— Tu tá segura, pørra. Eu tô aqui. — Ela não respondeu, só afundou ainda mais o rosto no meu peitø...
Continua.....