Oliver fechou a porta do quarto devagar, mais devagar do que o necessário. Quando o clique suave ecoou pelo corredor, ele soltou o ar que estava prendendo sem perceber.
O corpo inteiro parecia tenso.
Não era a cirurgia.
Não era o hospital.
Não era o plantão.
Era Clarice.
Ele caminhou pelo corredor, passos longos e determinados, mas não havia destino real. Precisava andar, tirar aquele turbilhão de dentro do peito ou pelo menos tentar. Entrou na sala de descanso, mas não acendeu a luz. Ficou na penumbra, apoiando as mãos na pia do pequeno banheiro interno, inclinando-se sobre ela.
A imagem dela ainda estava ali, colada na mente:
os olhos azuis brilhando, a pele sensível sob seus dedos, o modo como ela o olhara quando disse:
“Eu confio em você, Oliver.”
Ele fechou os olhos com força.
Isso não podia acontecer.
Isso estava ultrapassando todos os limites éticos, emocionais, profissionais.
E mesmo assim… ele não conseguia se afastar.
Quando tinha perdido o controle desse jeito pela última vez? Quando deixara um paciente atravessar suas barreiras assim?
A resposta era simples, dolorosa, enterrada e ele não ousou pensar no nome.
Oliver puxou a água gelada e passou no rosto, tentando apagar a sensação quente da pele dela sob seus dedos. Foi inútil.
A lembrança era forte demais.
O modo como Clarice tentou ser corajosa.
O medo silencioso que só ele percebeu.
A confiança.
O sorriso tímido quando ele disse que ela tinha sido perfeita.
Perfeita.
Ele realmente disse isso.
Merda.
Ele se endireitou, respirou fundo, encarando o próprio reflexo no espelho: olhar cansado, mandíbula apertada, expressão mais emotiva do que gostaria de admitir.
“Controle-se”, pensou. “Ela está vulnerável. Você está vulnerável. Isso é uma combinação perigosa.”
Mas, no fundo, sabia que não era só isso.
Clarice não o afetava apenas pela situação clínica dela.
Ela o afetava… por quem era.
Pela luz inesperada no meio da escuridão dele.
Pela doçura resistente.
Pela força escondida num corpo ferido.
Ele pegou o celular.
Uma nova mensagem de Corvo piscava na tela:
“O noivo esta dormindo no carro em frente ao hospital, fique atento."
Oliver sentiu o sangue esquentar sob a pele.
Eu vi.
Eu ouvi.
Eu senti.
E havia mais algo instintivo, profundo, perigosamente protetor crescendo dentro dele.
Ele voltou para o corredor, ajeitando o jaleco, controlando a expressão.
Enquanto caminhava de volta para a UTI, uma certeza nua e crua se formou em sua mente:
Clarice estava em perigo.
E ele não ia permitir que nada acontecesse com ela.
Mesmo que isso significasse atravessar linhas que jurou nunca tocar.