capitulo 01

984 Palavras
Gabriela narrando Eu sempre acreditei que Deus tinha me dado mais do que eu merecia. E eu pensava exatamente isso enquanto estava sentada no chão frio do banheiro, encarando o teste de gravidez tremendo entre meus dedos. As duas linhas cor-de-rosa ainda estavam ali, fortes, dizendo que minha vida tinha acabado de mudar — e eu sorri. Sorri como uma boba apaixonada. Meu coração parecia querer explodir de tanta alegria. — Meu Deus… — sussurrei, levando a mão à boca. — Eu tô grávida… Eu encostei a cabeça na parede e comecei a rir sozinha, rindo e chorando ao mesmo tempo. Porque eu sabia que isso ia deixar o Walter radiante. Ele sempre falava que queria ser pai um dia. Sempre me abraçava e dizia que teria orgulho de construir uma família comigo. E eu… eu acreditava nisso com todo o meu coração. — A gente conseguiu, amor… — murmurei para o universo. — Você vai ser pai… e eu tenho certeza que vai ser o melhor pai do mundo. Fechei os olhos por um instante. E como sempre, agradeci. — Muito obrigado meu deus, por ouvir minhas orações. Eu fazia isso desde o dia em que me casei: agradecer a Deus por ter colocado Walter no meu caminho. Ele era meu porto seguro, meu companheiro, meu melhor amigo. Um marido presente, carinhoso, trabalhador. Um policial dedicado. Um homem bom — ou pelo menos era isso que eu acreditava. Eu achava que éramos felizes. Muito felizes. Todos os dias eu agradecia por acordar ao lado dele, por sentir os braços dele em volta de mim. Acreditava que tínhamos sido feitos um para o outro. As vezes eu nem acreditava que o destino tinha sido tão bom assim comigo, sempre acreditei que quem planta coisas boas, colhe os melhores frutos. Então guardei o teste com cuidado, com carinho, pensando na surpresa que eu faria naquela noite. Nosso terceiro aniversário de casamento. Eu ia contar pra ele durante o jantar. Imaginava a reação dele, o sorriso torto, os olhos brilhando. Eu m*l podia esperar. Passei a tarde inteira me arrumando com cuidado, com uma alegria que transbordava. Coloquei o vestido azul que ele adorava. E enquanto passava batom, pensei no que diria: "Walter… a gente vai ser pais." "Amor, a gente conseguiu, vamos ter um bebê". " Walter... eu estou grávida" Só imaginar isso me enchia de um calor tão bom no peito que eu quase flutuava. Quando ele chegou em casa, me deu um beijo rápido, meio sem emoção. Mas eu estava tão feliz que ignorei. Achei que fosse cansaço do plantão. Sei como os dias no trabalho dele é pesado e nãoe nada fácil, então relevei. Entramos no carro. Eu segurava o segredo no coração com tanta expectativa que parecia até criança esperando o Natal. — Hoje o dia tá especial, né? — falei, sorrindo para ele. — Uhum — ele respondeu, sem olhar. Mas eu estava tão focada no que ia contar que não notei o tom estranho, nem o maxilar travado, nem os dedos apertados no volante. Até que ele começou a diminuir a velocidade. Olhei pra ele que mantinha a expressão seria. — Por que estamos parando aqui? — perguntei, rindo sem entender. Ele desligou o carro. O silêncio ficou tão pesado que fez meu estômago afundar. Resolvi contar pra ele pra ver se mudava o clima dessa noite, não queria que nada estragasse o nosso dia. — A gente precisa conversar — Walter disse. Eu inspirei fundo, ainda presa no meu sonho, e sorri. — Coincidência… eu também preciso falar com você, amor. Hoje é um dia perfeito e… A faca apareceu antes que eu terminasse de falar. Por um instante, meu cérebro não entendeu. Tudo aconteceu rápido demais. Eu só senti o toque gelado na minha costela — e depois a dor brutal cortando meu corpo. — W-Walter? — sussurrei, sem acreditar. —p-para... Ele puxou a lâmina de volta. O sangue quente se espalhou pelo meu vestido azul. Pelo meu ventre. Pelo meu bebê. — Ainda tá respirando? — ele murmurou, como se fosse uma inconveniência. — Por favor… não… — tentei me afastar, mas a dor era insuportável. — O que você tá fazendo? Ele não respondeu. Só ergueu o braço de novo. e de novo, e várias outras vezes. — Walter, pelo amor de Deus! — eu gritei, chorando. — Para! Para! O próximo golpe veio certeiro, cortando minha carne como se procurasse apagar minha existência. Eu levei a mão ao ventre instintivamente. — O bebê… — soluçava. — Walter, eu tô grávida… eu ia te contar hoje… nosso filho… Ele parou por um segundo — um segundo — antes de cuspir a verdade: — Não importa mais. Me apaixonei pela Flavia. A filha do meu chefe. Ela tem nome, dinheiro, poder. Pode me levar longe. Você… não tem nada. Não me serve mais. Meu coração simplesmente despedaçou. Eu m*l conseguia respirar. m*l consegui entender. E antes que eu pudesse dizer qualquer coisa… Ele afundou a faca direto no meu ventre. No lugar onde meu bebê estava. Eu não tinha forças para me mexer. Eu gritei, mas o mundo já estava ficando escuro. Minhas mãos tremiam tentando segurar a vida que escapava de mim. Walter jogou a faca no chão, abriu a porta e saiu andando. Sem olhar pra trás. Sem culpa. Sem amor. Eu fiquei ali, morrendo no banco do carro, com o vestido azul ensopado de sangue e perguntando a Deus o motivo de tudo isso ter acontecido comigo. Eu sempre fui uma boa esposa, sempre esperava ele com tudo limpo, tomada banho, e até mesmo com a comida na no prato. E antes que tudo escurecesse de vez, só consegui pensar: Eu ia te dar a melhor notícia da nossa vida. E você me deu a pior morte possível. Me matou no dia em que eu ia te contar que teriamos um filho.
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