Tóxico
Quando deu a hora de eu sair, eu já tava acordado há muito tempo. Acho que nem dormi. 5h da manhã eu já tava de pé na atividade. Quando deu 9h, o carcereiro bateu na minha cela e falou que eu tava liberado. É claro que, antes, eu passei pelo abate, assinei alguns papéis, mas meu advogado tava me esperando naquele pique. Quando eu cheguei do lado de fora, bati de frente com o Marcos. Ele deu um sorrisinho de lado e me abraçou com força.
Marcos: Seja bem-vindo de volta à liberdade.
Tóxico: Vamos sair daqui logo antes que vagabundo decida que eu tenho que voltar pra dentro desse inferno.
Marcos: Vagabundo nunca mais vai colocar os olhos em você, até porque você vai furar condicional. Duvido que tu vai voltar pra dormir nessa p***a, né?
Tóxico: Com todo respeito ao seu trabalho, duvido que eu volte pra dormir em qualquer lugar aqui. Tá maluco? Nunca mais que eu piso nessa p***a aqui, nem se vagabundo me pagar. Agora vamos meter o pé logo, que eu quero ir na casa da minha coroa, quero falar com meu irmão, quero olhar pra cara do Vidigal, quero dar até um tibum na praia, papo reto.
Marcos: Nada de tibum na praia. Vagabundo vai ficar na atividade porque sabe que tu tá na rua. Aí tu vai dar mole da polícia te pegar antes da hora. Eles tão pensando que tu tá saindo daqui pra poder ir trabalhar.
Tóxico: Mas eu tô indo trabalhar mesmo, p***a, na boca. Hahaha! Tô cheio de bagulho pra poder fazer no morro. Tu acha que aquela merda lá não dá trabalho, não?
Ele ficou rindo e nós entramos no carro. Depois de um bom tempo, nós chegamos no Vidigal. Eu saí do carro de braços abertos, fiquei de joelhos na barreira e agradeci a Deus por ter saído daquele inferno. Depois de tanto tempo enjaulado, finalmente consegui colocar os pés na rua. Fiz estouro aqui com os vapores que estavam na barreira, eles começaram a dar rajada de tiro pro alto e eu mandei eles pararem, tá ligado? O Marcos até falou pra eu entrar no carro de novo, mas eu subi o morro andando. Tô em casa. Vim falando com todos os moradores e, quando eu cheguei na porta da casa da minha coroa, eu respirei fundo antes de entrar. Eu falei pro Marcos não falar nada pra ela que eu ia sair, não, tá ligado? Queria que ela tivesse um choque. Bati na porta e, depois de alguns minutos, ela abriu. Quando me viu, me encarou com os olhos arregalados.
Margarida: Théo, meu filho, eu não acredito – ela falou e começou a chorar.
Tóxico: Pode acreditar que eu tô aqui em carne e osso.
Ela me encarou durante alguns segundos, segurou meu rosto e me abraçou de novo. Logo em seguida, me deu o maior porradão. Mão pesada do c*****o, eu já tinha esquecido como ela batia bem.
Margarida: Vê se toma vergonha na tua cara agora, filho da p**a. Para de fazer merda pra não voltar pra aquela p***a. A tua sorte é que agora não tem mais que mostrar a p******a pra poder entrar lá, porque, se eu tivesse que mostrar, duvido que eu ia lá fazer visita pra você. Vergonha nenhuma na cara, eu, hein! Entra, entra. Tá magrinho.
Tóxico: Que mané magrinho, mãe. Falaram até que eu engordei.
Margarida: Só se for essa tua cara de p*u que deve estar gorda. Até parece que eu não reconheço o meu filho. Tá magro desse jeito, deve estar desnutrido. Não tava nem comendo direito dentro daquele lugar, né? Mas também isso é falta de vergonha na cara. Vou fazer alguma coisa pra você comer e vou mandar os vapores chamarem o seu irmão.
Tóxico: Tem alguma roupa minha aqui? Tô precisando tomar um banho, tá ligado, pra tirar essa inhaca de presídio.
Margarida: Tem lá no quarto do teu irmão.
Subi a escada e fiquei olhando cada pedacinho da casa da minha mãe. Eu tava morrendo de saudade até da chamada de atenção que ela me dá, tá ligado? Fala pra c*****o, arruma o maior caô, mas é a melhor mãe do mundo. Entrei no quarto do meu irmão e me bateu uma nostalgia. Tô tanto tempo longe de casa que eu já nem sei mais onde ficam as coisas. Peguei algumas roupas no armário, entrei no chuveiro e tomei um banho demorado, tá ligado, pra tirar a inhaca e pra deixar aquela p***a de lugar pra trás. Quando eu desci, o Picolé já tava na mesa junto com a minha mãe. Ele veio correndo e me abraçou.
Picolé: c*****o, eu nem acredito que tu tá aqui, irmão. Depois de tanto tempo… p**a que pariu, pensei que eu nunca mais ia ver a tua cara na pista.
Tóxico: Tá maluco? É longa, mas não é perpétua, não. Uma hora ou outra eu ia botar o pé na rua. Eu não sabia quando ia ser, tá ligado? Porque eles estavam segurando a minha alma lá dentro. Mas agora eu tô aqui fora e, mais tarde, tem festinha pra comemorar.
Picolé: Já tô ligado.
Margarida: m*l chegou no morro e já vai colocar esse p*u pra fora pra poder comer p**a. Vocês não têm o mínimo de vergonha na cara, né? Ao invés de ficar em casa descansando, vai atrás de r**o de saia.
Tóxico: Ah, ô coroa, vai bater neurose a essa hora?
Margarida: Você fala como se adiantasse bater neurose ou qualquer outra coisa com vocês. Fiz a sua comida favorita pra gente almoçar.
Tóxico: Aí sim! Agora me deu uma moral do c*****o.
Almoçamos e ficamos conversando um pouco. Mas é claro que a primeira coisa que eu queria fazer depois de brotar na casa da minha coroa era vir pra boca resolver os bagulhos. Então, depois do almoço, eu vim correndo pra cá. Tava com saudade desse lugar, saudade dos meus vapores, saudade de tudo, mano.
Picolé: Seja bem-vindo de volta.
Tóxico: E nunca mais vou sair daqui, papo reto. Agora vamos trabalhar que eu quero dar um bailão no sábado pro meu retorno. E mais tarde a gente vai se divertir.
Picolé: É isso.