CAPITULO 3

1503 Palavras
O telefone tocou, seco e direto. Atendi no primeiro toque. — Mudança de planos. Ela vai sair pela lateral. Sigam. Fechei os olhos por um segundo e inspirei. A voz do outro lado da linha era certeira, sem margem para dúvida. Fiz um leve sinal com a cabeça, e o homem de terno preto ao meu lado passou as novas coordenadas para os demais. A equipe já estava posicionada em pontos estratégicos no aeroporto de Teterboro, e as câmeras — todas hackeadas com perfeição — exibiam as imagens em tempo real. O rosto dela apareceu em uma das telas, de perfil, andando devagar, com a mão repousando sobre a barriga. Catarina. Não a via assim há meses. Não desde... Desde que tudo explodiu. Desde a traição. Desde a morte de Luca e de nosso pai. Mas ali estava ela, andando como se o mundo não estivesse desmoronando ao seu redor. Como se não tivesse sangue nas mãos. — Já conseguiram recuperar as imagens do prédio de onde ela saiu? — perguntei ao capanga à esquerda, sem desviar os olhos das telas. — Estamos tentando, Don Mancuso. O sistema de segurança é reforçado, difícil de invadir. Soltei o ar pesadamente pelo nariz. Não gostava de desculpas. Muito menos quando envolviam ela. — Consiga-as logo. Precisamos saber o que ela foi fazer ali. Então uma voz familiar ecoou ao fundo. — Não precisa ser gênio. É só olhar para a barriga dela, está mais do que explicado o que foi fazer nesse prédio. Me virei devagar. Massimo. Claro. — O que você está fazendo aqui? — perguntei, mantendo a voz sob controle. Ele ignorou a minha pergunta. — Don Miguel mandou te chamar. — Diga a ele que já estou indo. — Respondi, firme. — Só preciso saber para onde Catarina está indo. — Agora, Dante. — disse ele, cortando minha linha de raciocínio. Meus dentes rangeram. Eu queria mandá-lo à merda. Queria mandar Don Miguel à merda. Mas não podia. O acordo ainda era recente, frágil. Ele me fez o novo Don da família Mancuso. e pelo bem do que restou da família Mancuso, de Massimo e Matteo, eu engolia meu orgulho diariamente. — Tudo bem — murmurei. Seguimos juntos até o escritório de Don Miguel. À porta, me detive e falei baixo, encarando meu irmão. — Preciso te pedir uma coisa. Massimo arqueou uma sobrancelha, desconfiado. — O quê? — Não conte o que viu nas imagens. Ele franziu a testa, confuso. — Depois de tudo o que essa mulher fez com a gente... Você ainda quer protegê-la? Qual é o seu problema, Dante? — Não estou protegendo ninguém. — menti. — Só não quero dar uma pista errada. Vai saber o que um pequeno detalhe m*l interpretado pode custar pra gente. Massimo revirou os olhos, mas não disse mais nada, apenas entrou. Eu o segui. Don Miguel estava sentado à sua mesa. Um homem de meia-idade com uma cicatriz profunda cortando o lado direito do rosto. Fumava um charuto como se estivesse à beira de um final de tarde ensolarado e não liderando uma das organizações criminosas mais letais da Europa. — Don Miguel — disse, fazendo um leve aceno. — Pediu para nos ver? Ele soltou a fumaça devagar, os olhos se fixando nos nossos. — Pedi. Quero saber como estão as coisas. Já encontraram a c****a da Camorra? — Estamos analisando as imagens — respondi, rápido. — Ela está em Nova York — completou Massimo, antes que eu pudesse impedi-lo. Don Miguel arqueou uma sobrancelha. — É mesmo? Onde? Olhei de canto para Massimo, tentando avisar, mas ele ignorou o sinal. — No aeroporto. Está tentando sair da cidade, mas o mau tempo impediu. Antes disso, foi vista saindo de um prédio cheio de clínicas. — Clínicas? — Médicas — Massimo enfatizou, mirando direto o Don. — Inclusive, obstetra. Senti meu sangue ferver. Interrompi: — Ainda não temos confirmação disso. São apenas suposições. — A localização sugere uma obstetra. — insistiu Massimo. — Chega, Massimo. — rosnei. — Mas suposições embasadas. A postura dela, o jeito que caminha, a mão sempre na barriga... — Massimo, chega — interrompi. — Está falando demais. — Don Miguel precisa saber. Ela deve estar de pelo menos sete meses. — Chega! Agora você está chutando. — CALADOS! — Don Miguel ergueu a voz. O silêncio caiu como um trovão. Ele respirou fundo, lentamente, e voltou os olhos para Massimo. — Massimo — disse ele, calmamente. — Fale. — Pelas imagens... Catarina está grávida. Fiquei imóvel. Por dentro, meu sangue fervia. Por fora, permaneci frio. Don Miguel se encostou na cadeira. — Grávida? — É só achismo. — disse, tentando recuperar o controle. — Ela está usando isso como disfarce. Já vi esse truque antes, em Moscou. Grávida, ferida, indefesa... Ela sabe manipular. Isso não é uma gravidez de verdade. Don Miguel tragou mais uma vez, pensativo. — Por que usaria esse disfarce agora? — Para ganhar tempo. Para confundir. Se fosse capturada, alguém poderia hesitar em atingi-la. Don Miguel parecia dividido. — Hm... — Ele se levantou. — Vamos ver as imagens. Quero confirmar com meus próprios olhos. Caminhamos juntos de volta à sala de monitoramento. Quando entramos, as telas foram ajustadas. A imagem de Catarina preencheu todos os monitores: ela se levantando da poltrona do lounge, a mão em concha sobre a barriga saliente. O rosto sereno, quase... materno. Don Miguel observava. Massimo observava. E eu… Eu também. Mas meu olhar era outro. Amor. Rancor. Desejo. Medo. Ela matou meu irmão, Luca. Entregou meu pai a morte. E ainda assim… ainda assim… Don Miguel observou em silêncio. — Massimo estava certo. Ela está grávida — Eu discordo. — insisti. — Aquilo é uma barriga enorme, Dante. Ou é um verme quilométrico, ou é um bebê. — Com o devido respeito — insisti — é um disfarce. Uma armadilha. Don Miguel me analisou. — E por que a v***a usaria um disfarce de grávida? — Para nos manipular. Para jogar com nossas emoções. Para termos pena dela. Don Miguel pensou. Muito. Ele virou-se para Massimo. — E se não for disfarce? — murmurou. — Massimo, alguma ideia de quem pode ser o pai? Meu estômago virou. — Sim. — disse Massimo, a voz firme. — Quem? — perguntou Don Miguel, já encarando diretamente a mim. — Adam Scott. — disse Massimo. — Quem? — Don Miguel franziu o cenho. — O noivo dela. — explicou. — Isso é um absurdo. — retruquei.— Ele não era noivo dela! — Ele tinha um anel. — insistiu Massimo. — E praticamente moravam juntos. Se Catarina está grávida, é dele. — Eles terminaram há meses. — falei entre os dentes. — E monitoramos Adam. Catarina não fez contato até hoje. Don Miguel cruzou os braços, olhando de mim para Massimo. — Faz mais sentido o que Massimo diz. Talvez você, Dante, não conheça Catarina tão bem quanto acha que conhece. As palavras dele me feriram mais do que eu gostaria de admitir. — Com todo respeito, Don Miguel. Isso é um erro. Estamos caindo numa armadilha. De novo. Don Miguel se aproximou, os olhos escuros cravados nos meus. — Como todas as outras vezes, você quer dizer? Quando confiamos em você... e perdemos? Engoli seco. O gosto amargo da culpa na garganta. — Don Miguel, eu conheço Catarina melhor do que qualquer um. Sei quando ela está armando. Essa suposta gravidez é uma isca. Mas se o senhor duvida… eu posso provar. — Como? — Deixe-me ir até Nova York. Eu mesmo trago Catarina. E o senhor poderá dar o fim que ela merece. — Agradeço a oferta, mas não. Desta vez, agiremos diferente. Quero todos os homens em Nova York. Vasculhem a cidade inteira. Deu um passo à frente. — E se não encontrarmos a vadia... usaremos o tal Adam como isca. Vamos ver até onde ela vai pelo pai do filho dela. Meu peito se apertou. — Está cometendo um erro. — Está cometendo um erro. — murmurei. Mas ele já se retirava, em silêncio. Voltei-me para Massimo, tomado pela fúria. Agarrei-o pelo colarinho do terno e o empurrei contra a parede. — Você ferrou tudo! — Você é quem está protegendo ela! — ele retrucou, empurrando minhas mãos. — Até quando vai fingir? — Não estou protegendo a Catarina. Estou protegendo você! Matteo! Se isso der errado, um o Adam morre. E aí? Vai ser você o responsável? Massimo me empurrou. — Essas são as consequências da guerra que ela começou! Está mais do que na hora dela perder alguém. E se for o i****a do Adam... azar o dele. Minha mão tremeu de raiva, mas soltei o colarinho dele. Virei as costas e saí da sala sem dizer uma palavra. O corredor parecia mais longo do que nunca. Cada passo ecoava dentro de mim. Se ela estivesse grávida... Aquele filho não era de Adam. Era meu. E se fosse meu… Então o mundo inteiro estava prestes a sangrar. E eu com ele.
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