Pré-visualização gratuita Prólogo
Está escuro e tento limpar os olhos para tentar enxergar melhor. Nunca vi esse lugar na vida. Parece com um quarto escuro, e ouço gemidos de dor de onde estou escondida. “Você vai falar o que sabe” diz uma voz grossa enquanto desfere mais socos no rosto do rapaz acorrentado pelos braços e pernas. “Onde está a minha droga, Lucas? ” O homem pergunta, mais uma vez, após desferir mais golpes em seu tórax.
“Juro que não sei, Hades. Eu nunca faria isso com você. ”
— Clarisse, acorda! — Sinto tapinhas leves no meu rosto. — Clarisse! — A voz da minha mãe soa baixinho enquanto acordo sobressaltada olhando para todos os cantos do meu quarto. Lucas! Onde está o Lucas? Penso exatamente isso quando olho para a mulher que nos gerou. Seus olhos verdes, exatamente com os do meu irmão gêmeo e o meu, parecem sem vida; opacos.
Era um sonho. Mais um sonho com o maldito nome que vem me atormentando há semanas, desde que ouvi sair da boca do meu irmão, certa noite, quando ele parecia discutir com alguém por telefone. Perguntei ao Lucas diversas vezes o que estava acontecendo e, como somos muito unidos, ameacei de parar de falar com ele. Lucas nunca gostou de se sentir sozinho e, por ter somente a mim como amiga, acabou me confessando que esse tal de Hades era o dono da favela em que estava frequentando. Claro que fiquei preocupada, contudo, mais calma quando ele me falou o quanto confiava nesse mesmo homem.
Mas o nome dele jamais deixou a minha mente.
— Ele chegou? — questiono, sentindo o frio do ar condicionado assolar-me, enquanto dona Margot solta o ar lentamente. As lágrimas que descem pelo seu rosto, e o grito abafado que ouço do meu pai, de algum lugar da casa, diminuem as minhas esperanças.
— Ele foi encontrado... — sua voz embarga.
— Vivo?
Ela apenas balança os cabelos escuros para ambos os lados, negando. Encaro o edredom que cobre o meu corpo e comprimo com força a minha mão. Lágrimas brotam em meus olhos conforme escuto o choro sofrido do meu pai vir do lado de fora do cômodo. Lucas estava desaparecido há uma semana, e ainda havia um fio de esperança no meu íntimo. Afinal, ele sempre se metia em enrascadas, mas sempre voltava para casa. Pelo menos, até há uma semana.
— O que aconteceu? Como o encontraram? — questiono tentando entender um pouco mais sobre a vida louca que Lucas levava ultimamente.
— O André... — Solto o ar gradualmente ao ouvir o nome do meu ex namorado, que é tenente-coronel da polícia. — Ele está lá embaixo e quer ver você. Quer saber como você vai ficar de agora em diante. Eles o acharam na comunidade do Leão e... — ela faz uma pausa ao engolir em seco — ele foi reconhecido apenas pelas roupas que usava e porque o André o conhecia bem...
Desvio os olhos.
— Vou deixar você trocar de roupa. Vamos precisar fazer o reconhecimento do corpo... — Ela se levanta devagar e, antes de sair do quarto, olha para a minha janela, que permanece aberta. Dona Margot limpa a garganta e completa: — Acho que já pode fechá-la. — E sai, com os olhos marejados.
Encaro a mangueira, que está longe de dar frutos porque estamos na metade do ano, e suspiro pesado. Lucas a escalava e entrava no meu quarto após ficar dias, sumido. Essa era a forma que ele encontrava de nunca dar de cara com os nossos pais no meio da sala. Levanto devagar da minha cama e fecho a janela lentamente. Parece que ainda vou vê-lo gritando o meu nome pelo jardim. Penso no pesadelo que tive e comprimo os meus dedos na madeira da janela.
— Eu juro por tudo quanto é mais sagrado, Lu, vingarei a sua morte, e todos os envolvidos pagarão! — Seco a última lágrima que cai em meu rosto e faço uma promessa mental de que nunca mais chorarei na vida.
Não enquanto não achar os culpados pela morte do meu irmão gêmeo.