Podia parecer estranho, mas havia uma mulher que fez questão de chegar 30 minutos antes do seu horário. Era Manuela Medina, ela deixou a bolsa na mesa e ainda com o café abriu as pequenas janelas que deixaria um ar natural entrar.
Ela suspirou fundo. Olhou para o relógio. Precisava fazer duas coisas: abrir a sala e tomar o café calmamente.
Tirou o casaco e deixou no encosto da cadeira, indo direto para a porta do escritório e parando. Não podia entrar. Sentiu um formigamento no pescoço e continuou a encarar a porta.
Estava em uma daquelas regras bosal.
Não entrar na sala sem ele.
Mas tantos dias sem ele, ela sempre abria as cortinas. Mas agora ele estava de volta, mudava a rotina completamente.
- Querendo infligir a regra número dois? - Foi um susto ouvir aquela voz rouca e pesada. Manuela foi se virando, com a expressão assustada e um copo de café na mão. Se perguntando o que ele fazia ali tão cedo.
Ela até olhou para o relógio na parede atrás dele, entre os dois sofás de espera.
- Bom dia senhor, pensei ter ouvido algo na sala. Estava prestes a bater para conferir - Mentiu, descaradamente.
Ela suspirou fundo.
- Não entra ninguém aqui, não se preocupe - Rodolfo falou, olhando para o relógio no pulso, enquanto Manuella olhou para ele, toda constrangida, ele agora estava formal, estava usando um terno e uma camisa branca, sem gravata nenhuma. As calças escuras eram justas, moldadas sobre as pernas dele. Com uma camisa branca, cobrindo o peito largo e bíceps espessos dele.
Certamente ele não era tão adepto a gravatas.
Devia ser isso.
Rodolfo se aproximou.
- Obrigado pelo café, realmente, não precisava - Foi tão rápido que ela só viu o copo ser retirado de sua mão, por uma mão larga, com dedos compridos e no pulso um grande relógio Rolex. - Melhor não ficar aí parada, vamos, temos muito trabalho pela frente, de hoje até sexta-feira.
Ela se pôs a andar atrás dele, tendo que olhar para as costas largas e um bumbum arredondado, parecia bem macio e fofo.
Embora ele não fosse nenhum pouco fofo.
Opressor.
Ao entrar na sala se sentou na cadeia de frente para a mesa de vidro.
De frente para o homem alto.
Viu o infeliz tomar seu café.
Ninguém pegava o café dela e saia com vida. Bem, talvez isso não se aplicava a ele ou talvez a praga para ele se engasgar desse certo.
Rodolfo gostava de chegar cedo quando se empenhava e precisava, pra não pegar trânsito e nem tumulto ao chegar na empresa.
Pegou a agenda dele da empresa e foi folheando, calado e calmo, enquanto sentia a presença de Manuella em sua sala, sentada com uma calça jeans, sapatilhas e uma blusa sem graça, geralmente ele estava acostumado com mulheres mais surpreendentes, não tão comuns.
- Cuida dela com sua vida - Disse, ainda folheando a agenda, até que parou no rabisco do dia três de Janeiro. - Não acredito que ela fez isso.
Sussurrou baixo, olhando o xingamento escrito, era bem sujo o palavreado. Rodolfo sorriu e arrancou a folha, sorrindo e jogando a agenda na mesa, na direção da mulher que olhava tudo atenta.
Margaret foi sua última secretária, talvez tenha nutrido um pequeno ódio ou rancor dele. Talvez não. Era certeza.
- Minha ex-secretária me odiava - Falou. - Espero que não faça o mesmo, certo Srta. Medina? Isso seria um problema grande. Para mim e para você.
- Certo - Ela nem sabia o que dizer. Já havia passado por tantas que queria só ir pra sua mesa. Nunca havia se sentido tão embaraçada como agora. Nunca.
Talvez precisasse de um tempo para pensar ou fazer algo do tipo que não fosse olhar para o copo de café e pensar que perdeu seu café dessa forma.
Tragicamente.
Ela poderia usar as meias horas para tomar o café, mas ele havia pego o café e mesmo antes de começar o expediente ela estava sentada, na cadeira o escutando.
Sem café.
Ela amava café.
Forte e sem açúcar.
- Me dê licença um minuto senhor - Se fosse pra ser certo ela ia ser certa.
Rodolfo Vinelly não havia dispensado a garota, mas ela se levantou e foi. Ela saiu da sala e foi direto para a pequena copa do andar, fazendo a máquina de café funcionar e encher meio copo de café para ela, não era o café da quinta avenida, mas dava.
Voltou para a sala dele e se sentou. Ostentando o café em sua mão, o quentão do corpo de plástico aquecendo a palma de sua mão.
Rodolfo olhou para o copo na sua mesa e para ela. Havia feito uma coisa errada, talvez, só talvez, suspirou fundo e quis rir, mas se inclinou para frente e manteve-se quieto.
- Hoje temos um dia cheio - Ele fez uma pausa. - Preciso pegar de onde eu parei.
- Tenho algumas coisas anotadas, telefonemas e papéis que precisam da sua atenção senhor.
- Mande tudo para minha mesa.
- E-mail, o senhor tem alguns - Ela falou. - Também tem reuniões que foram adiadas, mas que precisam ser revistas também.
Houve um silêncio dele, que só ergueu o olhar e sorriu para ela.
- Saia - Ela se levantou e saiu, direto para a mesa e se sentando, apertando a temporã e suspirando fundo, até que o telefone tocou nos minutos seguintes ali na mesa, puxando o mesmo do gancho.
- Indústrias Vinelly, escritório Rodolfo Vinelly - Esperou a resposta.
- Bom dia, minha cara - A voz de sotaque saiu firme do outro lado da linha. - Sabe me dizer se o mesmo se encontra de volta ao trabalho, preciso deixar um recado.
- Sim, ele deu retorno ao escritório, você deve ter ligado alguns dias atrás, iríamos retornar o telefonema, quer falar com ele ou deixar recado? - Ela puxou o bloco de nota e a caneta.
- Diz pra ele que eu vou f***r com a p***a da vida dele - Manuella se chocou com as palavras. - Diz para o seu chefe que se ele chegar perto da minha filha aí dentro eu arranco as bolas dele e amasso com meus sapatos.
Ela ficou parada, sem reação, abriu e fechou a boca.
- Quem é o senhor?
- Keller.
- Darei o recado.
- Obrigada, doçura!
Ela deslizou o telefone atônita.
Manuella ficou chocada, mas fez a anotação e se levantou até a porta batendo e entrando. Nem a p*u que ela iria fazer uma linha direta dar aquele recado por telefone.
- Diga - Manuella ficou parada na porta, não era necessário ela se aproximar. Era só um recado.
Um bem baixo.
- Recado, telefonema do Keller.
- Qual o recado?- Ela ergueu o papel. - Leia você mesma.
Ela suspirou.
- Diz pra ele que eu vou f***r com a p***a da vida dele - Ela fez uma pausa, olhou para o rosto barbudo de Rodolfo e para o papel. - Diz para o seu chefe que se ele chegar perto da minha filha aí dentro eu arranco as bolas dele e amasso com meus sapatos.
O rosto dela ardia diante aquilo. Rodolfo olhou para ela, horrorizado.
- Bem, ótimo - Nunca mais faria aquilo, deixar alguém ler em voz alta um recado que era para ele. Pareceu ofensivo, mas que só ler um papel. - Preciso dos relatórios das semanas que estive fora, quero que adiante as reuniões adiadas, duas para hoje, reúna todo o pessoa que for necessário.
- Sim, senhor - Ela saiu e fechou a porta.
Manuella se sentou na cadeira e pegou todos os papéis. Colocou cada palavra dele em ordem.
É ela começou, não como uma amadora, ela sabia exatamente o que fazia, ficou ali toda a manhã e precisou adiantar o almoço, quando terminou ela se encostou na cadeira e viu o celular tocar, atendeu e olhou para os lados, para garantir que o opressor não estava por perto.
- Pronto - Ela falou baixo.
- Está no trabalho?
- Sim.
- Pode falar? - A voz feminina saiu fina e calma.
- Talvez.
- O chefe é legal? - A pergunta fez ela revirar os olhos.
- Quase o demônio.
- Manuella?! Você falando isso?
- Não vou mentir pra você Vivi, falei a verdade.
- Me liga quando sair - Houve um silêncio.
- Certo, mas não quero sair hoje, chega das saídas noturnas, pelo menos no meio de semana.
- Certo Manuella, tenho que ir... - Quando ela foi se despedir a voz surgiu e ela ergueu o olhar, deslizando o celular na hora para baixo.
- Interrompo algo? - Manuella ergueu de vez o olhar e viu os olhos dele.
Verdes, bem escuros.
- Perdão.
- Certo, você m*l chegou aqui, então por que não desliga esse celular e faz seu trabalho? - Rodolfo puxou a cadeira e se sentou na frente dela, puxou a caixa de um celular e colocou sobre os papéis na mesa dela, Manuella respirou pesadamente, vendo o gesto pesado e brusco dele. - Aqui, esse e o aparelho que você vai usar, não esse tijolo aí - Manuella deixou o seu celular na mesa e ficou ereta na cadeira. - Não me odeie, só quero uma boa funcionária, que não ache que vai ficar sentada. Manuella se esse é o seu plano você já está na empresa errada.
- Eu já terminei os relatórios e conseguir marcar as duas reuniões, com o extra dos relatórios essenciais sobre a pauta de cada uma, para que o senhor não passe por nenhuma saia justa - Ela puxou as pastas e ergueu até ele, fechando a expressão e só ficando ali de frente para o chefe. - Ah, por falar nisso, o senhor me tirou meia hora do dia, de manhã quando pegou o meu café e tomou como seu, então uma ligação importante de minutos não é algo que vai interferir no meu trabalho ou desempenho aqui dentro, entender o que faço eu entendo, mas levar arrogância do senhor eu não entendo e não quero entender.
No fim Rodolfo estava com os olhos arregalados e muito... surpreso. Confessaria para quem quisesse que se sentiu nervoso e ao mesmo tempo enfrentado, gostou daquilo, do desafio e da afronta.
O homem se levantou, fechando os dois botões centrais do termo e olhando para a moça de belos olhos castanhos.
Talvez agora o RH adivinhou é achou, com toda certeza, alguém bom pra trabalhar ao lado dele.
- Não leve tudo dessa forma, senhorita Manuella - Ele fez uma pausa e se inclinou, colocando uma das mãos na mesa e ficando de cara com Manuella. - Eu só estou fazendo o meu papel, faça o seu.
- Farei isto senhor, não se preocupe.
- Ótimo.