Cachecol Vermelho

1477 Palavras
— Você parece bem, querida. — Disse vovó Ruth me olhando sentada na poltrona ao seu lado. — Eu me sinto ótima! — Era impossível não sorrir depois da minha noite de aventuras bem sucedida. — Viu um passarinho verde? — Quase isso. — Respondi fazendo ambas rirem. — Eu tenho um presente pra você querida... — Levantando um pouco a sua colcha ela tirou um embrulho de presente prateado amarrado com uma fita vermelha entregando-me. — Feliz aniversário. — Obrigado vovó! — Disse com um sorriso maior ainda no rosto enquanto tirava a fita. Dentro do embrulho havia uma máscara médica com um sorriso bordado e um cachecol de tricô vermelho extremamente macio, dava até mesmo para sentir o carinho com que ela tricotou e bordou aqueles presentes o que foi o suficiente para fazer meus olhos lacrimejarem. — E-Eu simplesmente amei. — Minha voz saía falha devido às lágrimas de pura emoção. — Vai te manter protegida e aquecida minha filha, quero você bem forte para recebe seu pulmão novo. — Você é um anjo... — Sussurrei tirando a máscara que eu usava e colocando a que ela havia me dado. — Como estou? — Sorridente! — Vovó... Eu quero te contar uma coisa... — Disse enrolando o confortável cachecol ao redor do meu pescoço. — Eu sai... Sai ontem à noite. — Saiu? Para onde você foi minha querida? — Perguntou tossindo com um lencinho branco na boca. — Eu fui a um pub a poucas quadras daqui, eu bebi sucos, dancei e conheci um homem. — Abaixando a máscara até o queixo mostrei a ela o quanto eu sorria de fato. — O nome dele é Tony. — Anna, você saiu do hospital? Não pode se arriscar assim. — Ela parecia preocupada voltando a levantar a minha máscara. — Eu estou bem vovó, de verdade... Eu nunca me senti tão viva quanto naquela noite em toda a minha vida. — Disse tirando a máscara novamente. — Ele tem meu número. — Querida eu sei que não teve muito tempo para viver coisas da sua idade, mas não se arrisque assim, não arrisque sua vida... — Vovó Ruth me olhava séria da forma que poucas vezes a vi. — Não faça mais isso. — Tudo bem... — Assenti baixando a cabeça e a deixando levantar a minha máscara novamente. — Melhor voltar ao seu quarto querida, descanse para ficar forte. — Ela sorriu para mim apertando minha mão. — Descansa... Me levantei beijando sua testa mesmo com a máscara impedindo que meus lábios tocassem sua pele. Saindo do seu quarto caminhei até o meu guardando a máscara sobre o criado mudo e subindo em minha cama. Vovó Ruth não estava errada em dizer aquelas coisas, eu realmente não devia ter saído escondido colocando a minha vida em risco... Mas que vida? Eu não tenho vivido, apenas sobrevivido, não é a mesma coisa... Fui arrancada de meus devaneios ao ouvir meu celular tocando, o pegando assim que li o nome "Tony" na tela senti meu coração pular uma batida fazendo-me sentar bruscamente. A atitude de qualquer um seria atender de imediato, mas eu simplesmente travei olhando para tela e ouvindo Lollipop- Chordettes tocando ao mesmo tempo que o celular vibrava em minhas mãos. — Vamos Annabel, não seja uma covarde! Atenda. — Esbravejei respirando fundo e enfim atendendo pouco antes da ligação cair. — Alô? — Hey Anna! Ainda lembra de mim? — Perguntou com certo humor em sua voz. — Como poderia esquecer do cara que me deu um banho de cerveja?! — Respondi rindo baixo. — Desculpe de novo por isso. — O ouvi rir baixo também. — O que está fazendo? — Nada de mais... Por que? — Estava pensando... — Tony fez uma breve pausa como se tomasse fôlego para terminar sua fala. — Não gostaria de sair comigo? Dar uma volta no parque talvez ou um jantar se preferir, conheço um restaurante ótimo no centro. — Tipo... Tipo um encontro? — Perguntei surpresa. — Sim, um encontro. — Apenas pelo timbre de sua voz sabia que ele estava a sorrir. Droga... Eu queria ir, realmente queria, mas algo me dizia que aquilo era uma péssima ideia, tanto o parque como o restaurante, muitas pessoas, muita exposição... — Desculpe Tony... Não acho uma boa ideia... — Respondi com grande pesar. — Ah... Tudo bem... — A decepção era clara em sua voz o que estranhamente causou-me um certo aperto no peito. — Mas... O que acha de um jantar na minha casa? — Quando dei por mim já tinha falado sem nem ao menos pensar por um único segundo. — Acho ótimo. — Pude sentir a empolgação voltar a sua voz. — Hoje à noite? — Não... Hoje não... Pode ser amanhã? — Perguntei apertando meus olhos pensando na burrada que eu estava fazendo. — Amanhã eu não vou poder, pode ser na sexta então? — Sexta está ótimo... — Certo... Eu levo o vinho. Pude ouvir que alguém estava se aproximando do meu quarto. — Tony eu preciso desligar. Nos falamos depois, tchau. — Disse desligando em seguida sem nem esperar por uma resposta. Mal havia desligado a ligação e a enfermeira Jackie adentrou o meu quarto empurrando um carrinho com uma espécie de prato metálico que eu conhecia muito bem e mais alguns instrumentos. — Belo cachecol Anna, mas está calor hoje, está com frio? — Perguntou pegando o termômetro do carrinho e já enfiando embaixo do meu braço. — Não Sra. Delicadeza, eu ganhei da vovó Ruth, não é lindo? — Perguntei encolhendo meus ombros para apertar o cachecol contra o meu pescoço. — É lindo sim... — Disse pegando o termômetro que havia apitado. — Hmm... Está normal. Estique o braço querida. — Sabe, acho que tenho mais sangue dentro de tubinhos nos laboratórios do que no meu próprio corpo. — Bufei esticando o braço como Jackie pediu. — Não seja ranzinza Anna. — Jackie prendeu o torniquete no meu braço com cuidado, mas ao mesmo tempo forte como sempre. — Olhe pelo lado bom, você pode estar forte o suficiente para ir para casa, e se estiver, esse exame vai mostrar. — Espero que esteja certa. — Disse apertando meus olhos ao sentir a agulha da seringa penetrar o meu braço. Logo que Jackie saiu do quarto com amostras do meu sangue e um exame de esforço pulmonar relativamente satisfatório, Jess entrou fechando a porta em seguida, e para minha surpresa a deixaram entrar sem máscara. — Me conta tudo! — A ruiva correu sentando ao meu lado. — Como foi? — Ótimo! — Sussurrei fazendo ambas rirem. — Eu bebi, sucos, mas bebi, dancei, conheci um cara. — Hmm, um Cara? — Jess olhou-me maliciosamente. — Quem? — O nome dele é Tony, ele meio que me deu um banho de cerveja e pagou alguns drinks pra mim. — Ele era gato? — Perguntou já começando a brincar com meu cachecol. — De mais! — Pediu seu número? — Na verdade ele acabou de me ligar... — Jess arregalou os olhos para mim enquanto eu terminava de falar. —... Me chamou para um encontro... Percebi o exato momento em que Jess até mesmo puxou o fôlego para dar um dos seus famosos gritos de entusiasmo, rapidamente sem nem pensar por um segundo a mais, cobri sua boca antes que ela o fizesse. — Passou? — Perguntei ainda tampando sua boca quase que a vaco. Ela apenas assentiu. — O que você disse? — Jess estava até vermelha de "prender" seu grito. — Que não podia hoje... — Ela me olhou assentindo entendendo perfeitamente o motivo. — Mas convidei ele pra jantar lá em casa na sexta... — VOCÊ O QUE? — Tenho certeza que todos os pacientes daquele corredor a ouviram. — SHHH! Sua louca! Estamos em um hospital! — Exatamente! Estamos em um hospital! Como você marca um jantar lá em casa daqui a três dias sendo que você não está lá? — Talvez eu receba alta hoje. — Respondi querendo acreditar no que eu dizia. — E se eu não receber é só dizer que houve um imprevisto. — Hm. — Jess me olhou cruzando os braços. — Suponhamos que tudo dê certo, você vai cozinhar? — Claro. — Vai m***r o bichinho de intoxicação alimentar! — Ei! Eu sei cozinhar! Vou usar as receitas da mamãe. — A mamãe cozinhava m*l pra caramba. — Disse fazendo ambas rirem. — Mas Anna, sabe que quando receber alta talvez tenha que tomar alguns cuidados em casa também não é? — Eu sei... Mas Jess... Eu me sinto tão tão viva ao lado dele... É uma sensação diferente sabe? — Sei, é fogo. — Disse rindo e me fazendo revirar os olhos. — Besta... — Acabei cedendo a sua risada contagiante e rindo também.
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