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723 Palavras
CAPÍTULO 8 *Gustavo narrando* Fico encarando aquele morro de longe, pensando no que teria sido da minha vida se não fosse a Natália. Eu seria um imundo, igual aquele desgraçado do Marcos. Ela me deu a chance de ser alguém, de ser melhor, mesmo com todas as dificuldades. Se não fosse por ela, eu estaria na mesma vida suja de antes, provavelmente tão perdido quanto o Marcos. Era umas 3h da manhã quando vejo Ruan com uns outros garotos num canto, puxando um baseado. Ele me vê e eu o encaro, sabendo que ele está ali, sem nem se importar com as consequências. A traição dele é amarga, me corrói, depois de tudo que nossa mãe fez por ele. Ele se bandeou para o lado dele, do Marcos. Ingrato, só podia ser. - *Gustavo* - Artur me chama e eu encaro ele, esperando alguma distração para me livrar dessa angústia. - Vamos? No caminho de volta para casa, fico com a cabeça a mil. Assim que chego, vejo que o carro da minha mãe já está lá, então ela já deve estar dormindo. Eu só queria um pouco de paz, mas a noite tinha sido pesada. Tomo um banho rápido e me deito. O dia seguinte começaria cedo, como sempre. - *Bom dia, filho* - Minha mãe fala, colocando o café na mesa. Eu vejo Ruan sentado à mesa, como se fosse a coisa mais natural do mundo. Faz tempo que não tínhamos os dois juntos pela manhã, e, sinceramente, aquilo me incomoda. - *Bom dia* - Ruan diz, me olhando com aquele olhar de quem sabe muito bem o que está fazendo. Claro, ele sabe que eu o vi essa madrugada e veio aqui, provavelmente para garantir que eu não contaria nada para nossa mãe. Não que ele se importasse, mas ele sempre foi assim, esperto demais para as próprias convicções. - *Bom dia* - Eu respondo, seco, sem muito ânimo. - *O que houve?* - Minha mãe pergunta, já percebendo que algo não está certo. - *Cansado apenas* - Eu respondo, tentando esconder o que realmente sinto. - Essa noite foi complicada. - *Serviço?* - Ela pergunta, como se fosse uma conversa trivial. - *É* - Respondo, sem querer entrar em detalhes. - *Ruan veio passar o dia* - Ela fala, tentando aliviar o clima. - Você vai trabalhar? Pensei em fazer algo em família. Eu olho para Ruan, e não consigo esconder o desconforto. A coisa boa que ela acha que estamos tendo, ela nunca vai entender. - *Se for em família, falta uma pessoa* - Ruan diz, apontando para mim. Minha mãe me encara, buscando explicação. - *Arrumou uma namorada e não nos contou? Ou um filho?* - Eu pergunto, tentando desviar da tensão. - *Deixa de ser cínico* - Ele responde, com o tom sempre provocador. - *Chega, os dois* - Minha mãe fala, já com os olhos cheios de lágrimas. - Nossa família é só nós três, e eu não quero ninguém brigando por isso. - *Ele é meu pai* - Ruan diz, como se fosse uma declaração de fato. - E seu também. - *Ele não é meu pai* - Eu falo com firmeza, sabendo que as palavras que saem da minha boca não podem ser tiradas de volta. - E você não deveria considerar ele como pai. - *Não é porque você não tem coração que eu não tenho que ter também* - Ruan diz, com um tom de desprezo na voz. - *Você, Ruan, é um ingrato* - Eu falo, e sei que minha mãe escuta, mas ela já não tem forças para argumentar. - Nossa mãe deveria ter vergonha de ter você como filho. - *E ter orgulho de você? Um policial de merda* - Ele retruca, me atacando com palavras afiadas. - *Chega, os dois, por favor* - Minha mãe grita, as lágrimas escorrendo sem parar. - Eu não criei vocês dois para ficarem brigando. Eu quero paz. Eu me levanto, não consigo mais ficar ali. O clima está insuportável, o rancor é palpável. Só me limito a dizer: - *Eu estou indo trabalhar, perdi a fome* - E saio de casa sem olhar para trás. Os punhos fechados, os socos imaginários na direção do ar, tudo dentro de mim está explodindo. Ruan sabe como me tirar do sério, como ninguém mais.
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