Capítulo 15. Mais uma noite de bebedeira

554 Palavras
A madrugada já avançava quando Frederic Pérez empurrou a porta de casa. Ela rangeu alto, quebrando o silêncio pesado do lar. O cheiro de álcool o precedeu, forte, amargo, como se o próprio ar se contaminasse com sua derrota. As lamparinas estavam apagadas, mas a brasa no fogão ainda ardia fraca, lançando uma luz avermelhada pelas paredes. Frederic cambaleou até a mesa, jogando o chapéu num canto e se deixando cair na cadeira. Os olhos cansados e avermelhados revelavam noites sem descanso e o peso de dívidas que pareciam engolir não apenas seu bolso, mas sua alma. De repente, um barulho leve. A porta do quarto rangeu, e Teresa, a mais velha, apareceu com o xale nos ombros. Logo atrás, vinham Clara e Amélie, sonolentas, mas preocupadas. — Papá… o senhor voltou tarde outra vez — disse Teresa, com voz baixa, cautelosa. Frederic passou a mão pelo rosto, irritado. — Tarde? Eu volto quando posso! — respondeu, a voz rouca, trêmula. — Trabalhei o dia inteiro, não mereço um copo de descanso? Clara se aproximou, tentando soar calma: — Ninguém está dizendo isso, papá. Só… estamos preocupadas. Ele riu, um riso seco. — Preocupadas? Vocês não sabem o que é preocupação. Não sabem o que é ter um nome arrastado na lama, ver homens te cercando e chamando de devedor! Amélie deu um passo à frente. — Foram os Cavalcante de novo, papá? O homem ergueu o olhar, furioso. — Não diga esse nome! — gritou, batendo com a mão na mesa. O som ecoou pela casa, fazendo as irmãs estremecerem. — Eles… eles vão conseguir o que querem, esses malditos! — E o que é que eles querem? — perguntou Teresa, com a voz firme, ainda que o medo lhe tremesse nos lábios. Frederic desviou o olhar. Por um instante, parecia um homem completamente vencido o olhar perdido, os ombros caídos, a alma esgotada. — Querem tudo, Teresa. Querem o que tenho, o que não tenho… — murmurou. — E se eu não pagar… — Se o senhor não pagar, o quê? — insistiu Amélie, sentindo o coração acelerar. Ele a olhou e o olhar dele era uma mistura de ternura e desespero. — Se eu não pagar, eles virão buscar o que for mais valioso para mim. As palavras ficaram suspensas no ar, como um veneno lento. As irmãs se entreolharam, o medo crescendo. — O senhor prometeu algo? — sussurrou Clara, trêmula. — O que o senhor ofereceu, papá? Frederic se levantou bruscamente, derrubando a cadeira. — Basta! — rugiu. — Eu não devo explicações a ninguém nesta casa! E antes que qualquer uma tentasse impedi-lo, ele pegou o casaco, empurrou a porta e desapareceu na escuridão da madrugada o som de seus passos misturando-se ao vento frio e ao farfalhar das árvores. Ficaram as três, paradas, olhando para a porta aberta. O medo havia se transformado em algo mais sombrio uma sensação de que algo inevitável estava por vir. Amélie, com o coração apertado, foi a primeira a falar: — Ele vai acabar se perdendo de vez… Teresa a abraçou, silenciosa. Mas, no fundo, todas sabiam: Frederic já estava se perdendo há muito tempo. E agora, talvez, o preço de suas escolhas viesse cobrado não apenas em dinheiro mas em sangue, honra… ou no destino de uma de suas filhas.
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