Pré-visualização gratuita Episódio 1
Mellisa
Dois meses antes
Me olho no espelho do banheiro sem conseguir acreditar no que acabei de fazer. O meu reflexo parece o de outra pessoa. As minhas bochechas vermelhas e cabelo desgrenhado como se eu tivesse brigado com um ventilador, e aquele olhar culpado que nem eu mesmo engulo. O pior é que, por baixo de tudo, escapa-me um sorrisinho que me denuncia. Gostei. Não deveria ter acontecido, mas aconteceu.
Eu não sou daquelas mulheres que se deitam com alguém sem um relacionamento no meio. Não é meu estilo, não é minha regra, não sou "esse tipo de mulher". Só estive com dois homens em toda a minha vida. O primeiro durou o que um sorvete ao sol. O segundo, meu ex-marido. E agora, adicionei o Ethan.
Não estava nos meus planos. Nunca esteve. Ele é atraente, claro, mas justamente por isso me repeti mil vezes que nada podia acontecer. Ele não quer nada sério comigo e, além disso, o trabalho dele seria um problema. Se já me incomodava que o meu ex ficasse até tarde no escritório, não quero nem imaginar como deve ser namorar um detetive de polícia. Horários malucos, ligações à meia-noite e riscos constantes. Eu ficaria louca.
Definitivamente foi um erro. Algo do momento, um impulso est*úpido que me pegou de surpresa logo depois de ver nas redes sociais a foto do meu ex com a nova namorada... grávida. Sim, grávida. O mesmo homem que jurava que não queria filhos, agora posava sorrindo com a mão sobre a barriga de outra. A conclusão é que ele não queria filhos comigo.
E aqui estou eu, me perguntando o que deu errado em mim. Fui boa esposa, boa companheira, e sei que seria uma excelente mãe. Ou estou errada?
Um soco na porta me assusta tanto que levo a mão ao peito.
— Você está bem? A voz de Ethan se infiltra pela porta como se ele só tivesse perguntado a hora.
Respire, Mel. Não é para tanto. Repito para mim.
Respiro fundo, solto o ar lentamente e caminho em direção à porta. Ao abri-la, encontro-o de pé, com as mãos nos bolsos, completamente fresco. Eu tenho cara de quem foi atropelado por um caminhão, e ele parece ter saído de uma revista.
— Estou bem. Sinto muito. Não estou acostumada com isso. Murmuro, tentando soar adulta, embora a minha voz trema.
Ele me observa com calma, aquela calma dele que irrita e atrai ao mesmo tempo. A sua camisa escura ressalta a firmeza do seu torso, e os seus olhos claros me estudam como se pudessem ler os meus pensamentos.
— Você se refere ao que aconteceu? Ele pergunta, sem rodeios.
Ajeito o cabelo atrás da orelha, desviando o olhar dele.
— Não leve a sério. Eu estava angustiada e você estava lá e eu...
Ele solta uma risada curta.
— Mel, você fala como se tivéssemos acabado de sobreviver a um acidente. Não preciso de relatórios médicos nem confissões sob juramento. Somos adultos.
— Você não é o meu tipo. Digo rápido, como se isso deixasse claro.
Ethan leva a mão ao peito, teatralmente.
— Também. Outra rejeição para a minha coleção. Primeiro a Marge, depois a Electra, agora você. Vou ter que abrir um álbum.
— Tudo bem. Não me interessa fazer parte do seu harém.
Atravesso-o com o olhar. No entanto, ele continua com o seu número.
— Tranquilo, não dramatize. Eu posso fingir que nada aconteceu. Sou especialista em ne*gar a realidade, aprendi isso pagando impostos.
Fecho os olhos por um segundo para não rir. Aquele m*aldito humor dele...
— Se você repetir isso, seria um erro maior. Acrescento com seriedade.
— Olha que eu sou a favor de repetir erros. Assim você aperfeiçoa a técnica. Salvo no trabalho, lá eu os evito.
Olho para ele sem dizer nada, embora os meus lábios ameaçem sorrir.
— Está bem, está bem. Ele dá de ombros, divertido. — Fingimos que nada aconteceu. Por via das dúvidas, não me olhe assim de novo, porque eu não tenho tanta força de vontade quanto você diz.
Saio para o corredor tentando ignorar o calor no meu rosto. Meu corpo, claro, não coopera. Os meus joelhos ainda sentem que estão tremendo. Uma vez foi um deslize. Duas vezes seria uma sentença.
Ethan caminha atrás de mim como se nada, ajeitando o cabelo com aquela tranquilidade irritante. Como se o que aconteceu não tivesse acabado de acontecer. Como se ele só tivesse tomado um café.
Ao chegarmos à cozinha, ambos paramos. Tony está ali, com um jarro na mão, olhando para nós com uma expressão difícil de ler.
Ai, não pode ser. Penso.
O desconforto cai sobre mim como um balde de água fria. Eu fixo o olhar em qualquer coisa que não sejam os seus olhos. Eu poderia jurar que ele sabe ou pelo menos suspeita. Ethan, por outro lado, sorri como se nada tivesse acontecido.
Faço o que qualquer mulher madura faria quando não sabe o que fazer: fugir como uma aluna pega colando num exame.
Caminho direto para onde Ella fala com a mãe da Vic. Tento me integrar na conversa, mas não entendo uma palavra do que elas discutem. Sento-me, sorrio forçadamente e finjo interesse. Evito olhar para Ethan. Sobretudo porque Tony ainda está por aí, e eu não quero enfrentá-lo. Não pelo que aconteceu entre Ethan e eu, mas porque foi na casa dele, no aniversário da filha dele.
De repente, percebo que a mãe da Vic foi embora e me deixou sozinha com Ella, que me observa com a sobrancelha arqueada.
— Aconteceu alguma coisa, Mel?
— Não, tudo bem.
Ela me estuda por mais um segundo e solta uma risada.
— Você parece que fez algo ilegal.
— Não seria ilegal. Só não deveria ter acontecido.
— O que não deveria ter acontecido? Ela cruza os braços e me olha como se fosse um policial me interrogando.
Trago saliva. Sei que se não disser, vou me afogar na culpa. Olho para um lado e para o outro para ter certeza de que ninguém está ouvindo e me aproximo. — Tr*ansei com o Ethan.
Ela abre os olhos com exagero.
— Você? A mesma que tem um diploma em criticar relacionamentos casuais.
— Abaixa a voz. Sussurrei. — Eu sei. Foi um impulso. Estava vendo as redes sociais, apareceu a foto do meu ex com a namorada grávida e... foi um choque.
— Você ainda não o bloqueou?
— Já fiz isso. A questão é que justo apareceu o Ethan, ele tinha manchado a camisa, eu o vi, ele se aproximou... e de repente estávamos... bom, você sabe. Nem sei como aconteceu.
Ela ri, fascinada, e me pega pelos ombros.
— Isso é fantástico. Finalmente saiu a Mel rebelde que você escondia.
— Não é fantástico. Eu não sou assim. Eu só tenho relacionamentos sérios.
— Eu sei, o uniforme de policial não ajuda. Escuta, não se sinta culpada. Passou, você gostou, ponto. Não é como se você acordasse num quarto estranho sem se lembrar de nada. Acredite em mim, eu sei do que estou falando.
Não consigo evitar rir.
— Quem dera que eu pudesse ser mais como você.
— Não. Seja você mesmo. Seja a versão divertida que você era antes de se casar. Você deixou muitas coisas por causa daquele idi*ota, até amizades. Agora você está livre, tem a sua casa, seu trabalho, duas amigas fabulosas e sim, você dormiu com um detetive lindíssimo. Você vai mesmo se amargar por isso?
Respiro fundo, sentindo que a tensão abandona o meu corpo.
— Você tem razão.
— Eu sei. Ela responde com segurança.
— E não vou te contar detalhes. Acrescento rápido.
— Que chata! Ela solta uma gargalhada.
Eu também rio, embora baixo. O riso me ajuda a afrouxar o nó na garganta.
Não é o fim do mundo. Não é como se eu tivesse perdido algo insubstituível ou fosse ficar grávida. Sou divorciada, sim, mas também sou uma mulher adulta que pode lidar com isso.
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Bem-vindos a esta aventura. Sei que estavam esperando por Ethan e aqui o temos na companhia da Melissa.
Para quem vem de ler "Quando o coração silência", já conhece um pouco os personagens e também estarão Victoria e Tony porque são os amigos dos protagonistas. Para quem não os conhece e não leu o outro livro, é legal fazer isso para conhecer os personagens.
Espero que gostem. Deixem os seus comentários.